Alguns dias se passaram e faltava pouco para embarcar rumo ao desconhecido. Olho meu reflexo no espelho mais uma vez e me sinto diferente, não só porque estou completando dezoito anos, mas porque sei que finalmente sairei do meu casulo. Sorrio para minha imagem e saio do banheiro, indo em direção à porta do quarto. Desço as escadas e me assusto quando ouço gritos.
— Surpresa! — sorrio ao ver a vovó, a mamãe, a senhora Salinas e seu marido, alguns vizinhos e até os clientes da confeitaria.
Vovó e mamãe se aproximam, a abuela segurando um bolo com algumas velas acesas em cima.
— Faça um pedido — mamãe diz, com os olhos brilhando.
— Eu já tenho tudo que preciso, mãe, eu só… — fecho os olhos e sopro, vendo as chamas se apagarem. — Só tenho a agradecer.
Sorrio e caminhamos até a mesa.
Mamãe corta o bolo e distribui os pedaços. Ela sabe que não gosto dessa parte, porque não tenho uma “preferida” ou “pessoa especial”. Claro que amo minha mãe, mas todos me ajudaram tanto que seria egoísmo dar o primeiro pedaço para apenas uma pessoa.
••••♥•••••
Aquela noite foi incrível. Nos divertimos muito, com conversas alegres e muitas risadas. Foi o melhor aniversário de todos! Mesmo que mamãe insistisse em me dar uma festa glamorosa, com vestido de babados e valsa, eu não ficaria feliz. Gosto de coisas simples, onde se pode aproveitar ao máximo a vida e tudo o que ela pode nos oferecer.
— Filha! — sinto um aperto na minha mão. Olho para o lado e mamãe me olha preocupada. — Está tudo bem?
— Sim, é... apenas nervosismo.
— Já falei isso várias vezes, mas não me canso de dizer: tenho muito orgulho de você, minha filha — diz mamãe, sorrindo com os olhos cheios de lágrimas. — Seu pai também estaria… estamos tão orgulhosas, né, mãe? — ela diz, olhando para minha avó. Admiro tanto o carinho que elas têm uma pela outra.
Mamãe perdeu os pais ainda muito jovens, então, quando conheceu meu pai, minha avó meio que a adotou como filha. Vendo ambas assim, admiro o amor, o companheirismo e a confiança que uma sente pela outra.
— Claro que estamos. Por favor, cuide-se, minha filha — diz minha avó, acariciando meu rosto.
— Não se preocupem, eu vou me cuidar — respondo, olhando para elas.
— Você colocou tudo o que precisa na bolsa? Não se esqueça de que, quando chegar lá, tem que me ligar e avisar que está tudo bem.
— Não se preocupe, mãe. Vai demorar cerca de uma semana para começar as aulas. Vou ter um tempo e até já conheci minhas colegas de quarto por videochamada! — digo animada.
— Eu sei, meu amor, é que…
— Mamãe! — me abaixo, ficando à sua altura. — Não se preocupe, não sou tão indefesa quanto costumava ser. Saberei me cuidar, fique calma! Ligo para a senhora todos os dias.
Assim que digo isso, ela sorri.
— Você promete? — ela levanta a palma da mão de frente para mim, da mesma forma que fazia quando eu era criança, para garantir que eu não quebrasse minha palavra.
— Eu prometo! — coloco a palma da minha mão contra a dela, e nós giramos até que nossos dedinhos estejam unidos.
— Não esqueça de sacar o dinheiro, caso precise. Deixei uma boa parte do dinheiro que o su padre (seu pai) deixou para a gente, na conta dele e...
— Mãe, relaxa! — Levanto-me, separamos as mãos e me sento ao seu lado.
— Vamos tentar ir te ver, filha — diz ela, enxugando as lágrimas.
— Mãe, não quero que você se mate tentando ir até lá. É longe, e o tempo de viagem é cansativo. Além disso, você não pode ficar sentada por tanto tempo. Então, tome cuidado!
— Está bem, está bem! Mas…
— Atenção, passageiros. Caminhe até o portão AL 3679 com destino a Boston, com conexão em JFK, Nova York.
— Mãe, eu preciso ir — Levanto-me, pegando minha bolsa com meu livro de inglês, que será uma das minhas companhias neste longo voo.
Ela pega meu braço e me puxa para ela, quase me fazendo cair em cima dela e da cadeira de rodas. Mamãe me abraça forte, parecendo que vai me sufocar, mas aproveito os segundos ali, inalando profundamente o cheiro doce de morango que está em seus cabelos. Será um bom tempo longe dela, mas sei que sentirei muita falta.
Eu me afasto dela, e seu rosto está banhado em lágrimas. Vou para o lado de minha avó e a abraço, ela beija minha cabeça. Fico ali por alguns segundos em seus braços. Era nela que eu costumava correr quando estava com medo ou nos momentos em que mais precisava, nas noites de tempestade… Ela estava lá, segurando-me. Enxugo uma lágrima que escorre e ouço a última chamada de embarque sendo feita.
Me afasto delas, a vovó senta ao lado da mamãe, que está chorando muito. Ela pega a mão da minha mãe e a abraça com o outro braço.
— Te amo, abuela, e te amo, mamá — digo em nossa língua materna, fazendo com que ambas me olhem com espanto. Mas logo sorriem. Me afasto e caminho até o portão de embarque, respirando fundo, deixando para trás as pessoas mais importantes da minha vida e indo em busca de uma vida melhor para elas.Olho para trás uma última vez e ambas acenam em despedida. Ando até onde preciso fazer o check-in e começo os procedimentos para entrar no avião. Passo pela inspeção e segurança, me dirijo ao portão de embarque. Com o cartão de embarque em mãos e a mochila dentro das normas da companhia aérea, concluo a vistoria e já tenho acesso imediato à área de embarque. Verifico mais uma vez o horário e o portão de embarque nos monitores espalhados pelo aeroporto, pois sei que tanto o horário quanto o portão podem mudar a qualquer momento. Isso seria trágico, pois é a primeira vez que viajo sozinha.— Atenção, senhores passageiros! Esta é a última chamada para o voo para Boston. Caminhe até o portão de e
Depois de algumas horas de voo, olho pela janela e vejo o pôr do sol. A vista daqui de cima é ainda mais linda! Pego meu telefone, coloco os fones de ouvido e começo a ouvir minhas músicas favoritas. Estava esperando por outro grande sucesso, mas fico surpresa ao ouvir a voz de minha mãe. Olho para o celular e vejo ser um áudio dela.— Hola, mi amor! (Olá, meu amor) Me desculpe por te incomodar enquanto você ouve suas músicas, mas vim aqui para te agradecer. Obrigada por ser a melhor filha do mundo, por estar comigo todo esse tempo, por se preocupar comigo e por nos ajudar tanto! Obrigada, minha filha, por seguir seus sonhos e não desistir de si mesma! Me perdoe por não ser a melhor mãe do mundo, por não ter te protegido quando você precisou… — a ouço chorar e meu coração aperta. Como ela pode pensar isso? — Você é forte, guerreira! Quero que saiba que sempre estarei aqui para você. Te amo, minha filha, e sou muito grata por ser sua mãe. Agora, espero de todo o coração que você alcan
Chego a Boston e descubro que eu e Kim ficaríamos na mesma hospedagem. Foi maravilhoso! Embora em prédios diferentes, seremos vizinhas. Fomos até o prédio da diretoria para resolver o que era preciso. Kim me acompanhou até o local em que eu moraria no campus e, depois, seguiu para o dormitório dela, que ficava em outra área. Fico parada olhando para aquele prédio cinza espetacular, que é bem grande. Inalo profundamente, olhando para o papel nas minhas mãos que indica o andar e o quarto para onde vou. Sigo até as portas duplas, insiro a senha no teclado e as portas se abrem.Entro e, no saguão do prédio, há alguns sofás e mesas, que imagino serem para estudarmos. Ando até o elevador e aperto o botão. As portas se abrem e entro, seleciono o andar e o elevador sobe tocando uma música alegre. Quando paro no meu andar e saio, o corredor está bem silencioso, para o horário. Ainda não são nem 20h, e nunca havia visto um campus tão tranquilo como esse, embora só tivesse visto em filmes.Passo
— Vem, Lunna! — Kim grita, me chamando. Caminho até ela, e é quando ele me olha. Seus olhos vão da minha cabeça aos pés, me fazendo me sentir ainda mais deslocada. — Mano, essa é a minha amiga Lunna Rivera, nós nos conhecemos no avião.— Uau! Muito prazer, Lunna Rivera! — ele diz, estendendo a mão. Assim que a pego, ele dá um beijo na minha mão, e seus olhos nunca saem dos meus. Acho que vou ter um treco, meu coração está disparado.— O... o prazer é meu! — digo, gaguejando, e ele sorri.A conversa continua, com ele me apresentando algumas pessoas e Kim fazendo o mesmo. Mas, sempre que nos afastávamos, nossos olhares se cruzavam. Eu nunca havia bebido na vida e, naquela noite, também não seria diferente. Continuei tomando meu refrigerante, tentando manter a calma.De repente, ele se levanta e se aproxima, e cada passo dele parece fazer o meu coração acelerar ainda mais. O ar parece me faltar.— Vem, quero te mostrar uma coisa — ele diz, parando na minha frente e estendendo a mão. Olho
Estamos todos reunidos para auxiliar a instituição Viver Sempre, uma organização não governamental que ajuda crianças carentes, e a nossa faculdade estava arrecadando dinheiro, alimentos, produtos de higiene, entre outras coisas essenciais para que pudessem cuidar dos pequeninos. Claro que muitos estão indo apenas ganhar um ponto na matéria de que estão precisando, mas isso é tão legal e eu amo participar desde que cheguei à faculdade. Eu e as meninas nos voluntariamos para ajudar, então havia várias pessoas vestidas de palhaços, bailarinas, bonecas e alguns como personagens do Mágico de Oz.— Hey! Está no mundo da lua, é? — Kim me pergunta, e Keké e Jully me olham. Estamos sentadas na grama, debaixo de uma árvore enorme, esperando o orientador das nossas turmas.— Não! Estava me lembrando de algumas coisas, e já faz dois anos que nos conhecemos. O tempo voou!— Sim, é verdade! Vocês são as minhas best e não quero me esquecer de vocês nunca! — Kim fala, e sorrimos. Começo a sentir um
Perdi-me nos pensamentos até alguém tocar no meu ombro. Olhei e o rapaz estava me oferecendo uma toalha. Ele a colocou sobre a mesa diante de mim.— Obrigada! — falei, pegando a toalha para secar meu cabelo e braços. Ele se sentou na minha frente, olhando também pela janela. Eu realmente precisava ir ao banheiro conferir minha situação.— Já volto, com licença — falei, levantando. Ele fez um gesto afirmativo com a cabeça e se levantou também, me deixando seguir em direção ao banheiro.Entrei e me olhei no espelho. Me assustei: minha maquiagem estava toda borrada, parecia o Coringa com gripe. Coloquei a toalha sobre a pia e liguei a torneira, lavando o rosto, tentando tirar o que ainda restava de maquiagem. Após limpar o rosto e secá-lo com papel, soltei o cabelo e comecei a secá-lo com a toalha. Olhei para o secador de mãos na parede e tive uma ideia. Caminhei até ele, me abaixei e coloquei a cabeça embaixo do secador.— Assim é bem melhor!Após secar o cabelo e tentar secar meu vesti
Já haviam se passado alguns dias, na verdade, meses. Eu e Romolo estamos nos divertindo muito, sempre nos encontramos para conversar e, na semana passada, rolou um beijo. Não foi o meu primeiro, mas me senti nas nuvens e acho que toda aquela paixonite boba pelo Adam está se esvaindo, esse que não vejo há um tempinho.Estou indo me encontrar com ele na nossa cafeteria. Claro, não é nossa, mas se tornou o nosso ponto de encontro. Vamos jantar com a sua família. Assim que chego, o vejo sentado na mesinha ao lado de fora do estabelecimento. Ele está com os cabelos bagunçados, uma calça jeans, camisa polo branca e um sapatênis, além de um buquê de flores em cima da mesa.Respiro fundo e volto a caminhar, já que parei para admirá-lo. Paro ao seu lado e toco em seu ombro.— Oi! — digo sorrindo, dou um passo para trás e ele vira, se levantando.— Está esperando há muito tempo? — ele me olha e faz um carinho em meu rosto. Fecho os olhos, apreciando este gesto, e, quando os abro, ele está me ol
— Nada de senhora, pode me chamar de Helena — ela diz e sorri. — Venham, vamos nos sentar. Lucille está quase pronta e George está no escritório resolvendo algo sobre o trabalho.Caminhamos até o sofá e nos sentamos. Não demora muito e uma moça de cabelos encaracolados e loiros aparece na sala. Ela vem até o irmão, que se levanta e a abraça, depois faz o mesmo comigo e ele nos apresenta.— Me desculpem a demora — um senhor alto, cabelos grisalhos e olhos cor de mel entra sorrindo. — Achei que seria rápido, mas falhei.— Tudo bem, querido — Helena diz e ele caminha até nós. Romolo se levanta, cumprimentando-o com um aperto de mão e um abraço.— Pai, esta é a Lunna — ele diz, me olhando e sorrindo.— Ah, então esta é a garota? — ele me estende a mão para me cumprimentar e faço o mesmo. — Aperto de mão firme, gostei! — sorrio e soltamos nossas mãos. Me sento novamente, ele caminha e se senta ao lado da esposa, começando a conversar.A parte de “Ah, então esta é a garota?” não sai da minh