SAVANNAHOs dias seguintes são marcados por uma frieza cortante. Durante os jantares na cozinha, Rose tenta puxar assunto, mas corto as suas tentativas com respostas frias e monossilábicas. O silêncio que se instala é palpável, carregado de tensão. Percebo que Ryder me observa, o olhar confuso e preocupado. Ele nota a minha mudança de atitude em relação a Rose, a frieza que antes não existia. Mas ele não diz nada, como se esperasse o momento certo para abordar o assunto. Mais tarde à noite, deitados na cama, a distância física reflete a crescente distância emocional entre nós. Deitada de lado, de costas para ele, sinto o peso do silêncio a separar-nos. Ryder move-se, apoiando o cotovelo no colchão, a voz suave dele quebra o silêncio. — Ruiva... O meu coração acelera, a antecipação da conversa inevitável deixa-me tensa. — O que foi? —, murmuro, tentando manter a voz firme. — O que está a acontecer entre tu e a minha mãe? —, pergunta, a sua voz está carregada de uma preocupação
SAVANNAHO ar da varanda está frio, mas não tanto quanto o que ficou na cozinha. Sinto o cheiro da terra molhada e o bolo de cereja que recusei ainda paira no ar, como um lembrete da minha fuga apressada. Cruzei os braços, tentando manter a compostura, quando ouço passos atrás de mim. Ryder chega rápido, determinado, e agarra-me pelo braço com uma firmeza que me obriga a parar.— Savannah, o que se passa? — A voz dele é baixa, mas carrega uma urgência que não consigo ignorar.Endireito as costas, olho em frente, sem ceder. Não vou dar parte fraca, não agora.— Não se passa nada, Ryder.Ele solta um suspiro frustrado, mas não me larga.— Não sou idiota, Savannah. Sei que alguma coisa se passa contigo.Viro-me, os olhos fixos nos dele, e deixo escapar, quase num sussurro, mas carregado de amargura:— Se sabes o que se passa, porque perguntas?Ele recua ligeiramente, surpreendido com a minha defensiva. O maxilar dele trava, como se estivesse a tentar controlar-se.— Sei que não estás bem
RYDERO rancho parece maior desde que Savannah se foi. Os dias arrastam-se, iguais, mas faltando qualquer coisa que não consigo nomear. Tento ocupar-me com o trabalho, mas a verdade é que não sei por onde ela anda. Desconfio que esteja com a Harper em Creekville, mas ninguém me confirma nada. Rose limita-se a dizer que ela precisava de espairecer, e eu fico a remoer o vazio que ela deixou.É já noite quando me sento na varanda da casa principal, o Bear deitado aos meus pés, a cabeça pesada no meu colo. Passo-lhe a mão pelo pêlo, sentindo a respiração lenta do cão, o único som além do coaxar distante das rãs. O cheiro da terra húmida, misturado com o aroma das flores do jardim da minha mãe, traz-me memórias de outras noites, mais leves, em que Savannah se ria ao meu lado, enrolada numa manta.Ouço passos atrás de mim. Hunter surge na penumbra, duas cervejas na mão. Atira-me uma, que apanho no ar, e senta-se ao meu lado, sem dizer nada durante uns segundos. O Bear levanta a cabeça, curi
SAVANNAHCarrego os sacos das compras nos braços como se carregasse o peso do mundo. O corredor do prédio de Harper parece mais longo hoje, cada passo ecoa na minha cabeça cansada. O cheiro a pão fresco mistura-se com o perfume barato de algum vizinho, mas nada me distrai deste vazio que me acompanha desde que saí do rancho. A cada dia aqui, sinto-me mais longe de tudo o que me fazia sentido. Sinto falta do cheiro da terra, dos risos no estábulo, do Bear a correr atrás das galinhas. Sinto falta dele, embora me recuse a admitir sequer para mim própria.Chego à porta do apartamento, tento equilibrar os sacos e procurar as chaves na mala, mas é impossível. Respiro fundo, frustrada, e acabo por tocar à campainha com o cotovelo, rezando para que Harper não demore.Demora quase um minuto até ouvir o trinco rodar. Não vejo nada à minha frente, os sacos tapam-me completamente a vista. Entro, a falar alto, na esperança de que Harper me venha ajudar.— Harper, nem imaginas o caos que estava no
RYDERSaio do apartamento de Harper furioso, a cabeça a latejar e o coração aos saltos no peito. Mal vejo por onde vou, só quero afastar-me dali, fugir daquele olhar de Savannah que me queimou mais do que qualquer palavra. Nem dou conta do que está à minha volta quando, de repente, choco com alguém no corredor. O impacto é seco, ombro contra ombro, e só quando ouço a voz do meu irmão percebo o que aconteceu.— Eh pá, Ryder! — Hunter quase deixa cair o copo take away de café. — Que raio se passa contigo?Não respondo, nem olho para trás. Sigo em frente, determinado, até ao jipe que trouxe com o meu irmão. Ouço-o a comentar com Harper, lá atrás:— Vou resolver isto.Já estou a destrancar a porta do jipe quando o oiço chamar-me:— Ryder! Espera aí.Paro, mas não me viro logo. Sinto o Hunter aproximar-se, o olhar dele cravado nas minhas costas.— O que aconteceu lá em cima? — pergunta, a voz baixa mas firme.Respiro fundo, a raiva ainda a borbulhar-me nas veias.— Savannah está irredutíve
SAVANNAHAssim que a porta do apartamento se fecha atrás de Ryder, sinto o vazio a invadir-me de uma maneira quase física. Fico ali, parada no centro da sala, a olhar para o nada, como se esperasse que ele voltasse a entrar, que dissesse que tudo não passou de um mal-entendido. Mas a única coisa que ouço é o som abafado do trânsito lá fora e o eco da minha própria respiração. O apartamento de Harper parece encolher à minha volta, as paredes a apertarem-se, e eu, perdida neste silêncio, deixo-me cair no pequeno sofá da sala.Abraço as pernas ao peito, tentando encontrar consolo em mim mesma. O tecido áspero do sofá roça-me a pele, mas não me aquece. Sinto uma tristeza funda, como se tivesse perdido algo que nunca foi realmente meu. Não sei quanto tempo fico ali, imóvel, a olhar para o vazio. Só quando sinto o rosto húmido percebo que estou a chorar. As lágrimas escorrem devagar, tímidas, quase envergonhadas, como se não quisessem dar parte de fracas.Ouço a porta do apartamento a abrir
Narrado por Ryder SawyerEu nunca gostei muito de igrejas.Não que eu não acreditasse em Deus. Eu acreditava. Minha mãe sempre dizia que a fé era o que segurava um homem de pé quando tudo o mais falhava. E eu entendia isso. Mas igrejas me davam uma sensação estranha. Um silêncio pesado demais, como se o mundo estivesse esperando alguma coisa de mim.Mas naquele dia, eu estava ali.De terno preto, a barba recém-aparada, o nó da gravata apertando minha garganta. Com as mãos fechadas, os dedos roçando no tecido grosso das calças. Esperando.A capela era pequena, feita de madeira rústica, com vigas expostas no teto e janelas que deixavam a luz quente da tarde entrar. Rosas brancas e girassóis decoravam o altar, entrelaçados com fitas creme que minha mãe insistiu que ficariam bonitas. O cheiro de lavanda e madeira polida enchia o ar.Mas nada disso importava.O que importava era que ela ainda não tinha chegado.Passei os olhos pela capela, tentando me distrair. Tentando encontrar algum ros
Narrado por Savannah Wilder O horizonte se estendia como uma promessa distante. A estrada cortava os campos secos, esticando-se até onde meus olhos podiam alcançar. O céu estava tingido de laranja e rosa, o sol afundando lentamente no horizonte. E eu dirigia sem olhar para trás. O rádio tocava baixinho, mas eu escutava cada palavra. "Ain't no love in Oklahoma..." Luke Combs sempre soube colocar em palavras o que estava entalado no meu peito. "I keep runnin' but I'm standin' still Pray for peace but I need the thrill" Apertei os dedos no volante, sentindo o nó na garganta crescer.Porque era verdade. Não havia mais amor para mim em Oklahoma. Não depois que minha mãe se foi. Engoli seco e olhei para o banco do passageiro. A única coisa que me restava dela estava ali: uma velha caixa de sapatos cheia de fotografias amareladas e um colar que ela usava todos os dias. Agarrei o pingente entre os dedos, sentindo o frio do metal. — Eu tô tentando, mãe... — sussurrei, s