Divórcio

Beatrice

Contemplei o guarda-roupa abarrotado de roupas luxuosas, todas provenientes das marcas mais renomadas, apenas o ápice do que o dinheiro poderia adquirir, porém nada daquilo seria viável levar comigo. Arrumei na mala somente os itens que havia trazido para aquela residência há um ano.

Diferente daquele dia, quando cheguei com o coração cheio de amor e esperança, agora tudo o que restava em meu peito era amargura e dor; estava prestes a me afastar daquela casa, que jamais foi realmente meu lar.

Após mais de um ano de um casamento frustrante, no qual jamais experimentei verdadeiramente o que era ser amada por meu marido, tomei a difícil decisão de encerrar aquele relacionamento fadado ao fracasso, onde apenas uma pessoa batalhava pela felicidade do casal, e essa pessoa era eu.

A partir deste momento, Edward não faria mais parte de minha vida, assim como eu não faria parte da dele, e cada um seguiria seu próprio caminho. Com essa perspectiva, dispensei todos os empregados da mansão naquela tarde e aguardei a chegada de meu marido, antecipando o momento em que o veria pela última vez como meu.

Observei a sala ampla, relembrando da nossa conversa rápida por telefone naquela tarde, quando pedi para que ele chegasse mais cedo, e ele prometeu fazer isso. No entanto, Edward já tinha me feito essa mesma promessa antes e não a cumpriu, assim como estava fazendo naquele momento.

Quantas noites eu não fiquei esperando a chegada dele, esperando por um relacionamento normal de casal, onde ele faria o esforço para estar junto de mim? Mas isso nunca aconteceu durante todo o tempo em que estamos casados.

Peguei um pouco do seu uísque favorito, buscando coragem para fazer o que tinha decidido, pois tinha certeza de que, sem aquela bebida, não teria forças para seguir em frente.

Recuperei todas as lembranças dos nossos momentos juntos, que eram escassos, uma vez que ele sempre me evitava, valendo-se de diversas desculpas para permanecer afastado de casa o máximo possível. Contudo, elas serviam como lembrete de como não era amada por Edward.

Tomei um último gole da bebida exatamente no momento em que ouvi o suave ronco de seu carro estacionando em frente à nossa casa. Porém, naquele dia, o motorista não conduziria o Mercedes preferido do chefe até a garagem.

Observei-o entrar e saí das sombras, acendendo o abajur na mesa auxiliar ao lado da poltrona e, então, me ergui, com a única intenção de encará-lo de igual para igual, mesmo que minha altura de um metro e setenta e cinco fosse consideravelmente inferior à sua, que alcançava um metro e noventa e três.

— Oh! — Ele exclama, surpreso com a minha presença na sala escura, sentada em seu lugar de direito. — O que faz aqui? 

Eu poderia ter respondido tantas coisas, entre elas o fato de que morava naquela casa, e tinha todo o direito de estar sentada na sala, aguardando pela chegada do meu marido.

Não o fiz, contudo.

— Estava o esperando. — Informo, tentando manter a voz isenta de toda a tristeza que carregava comigo. — Precisamos conversar.

— Hoje não é um bom momento para isso. — Ele descarta a minha presença, algo que já se tornou rotina. — Amanhã você pode dizer o que deseja, pois hoje estou cansado.

Ele não espera para ouvir a minha resposta, já se encaminhando para o primeiro degrau da escada em espiral, disposto a subir para o seu quarto, do qual eu nunca tive o privilégio de compartilhar.

— Eu preciso falar agora! Não posso mais esperar. — Digo, alto o suficiente para me fazer ouvir.

Ele para, parece pensar sobre a situação, e acaba retornando ao centro do cômodo, um suspiro de resignação escapando audivelmente de seus lábios convidativos, mas os quais só tocaram os meus apenas uma vez.

Edward nunca desejou consumar o nosso casamento, sempre me tratando com cordialidade, ele é um homem extremamente gentil…, mas frio.

— Diga-me. — Ele aceita me ouvir. — O que você tem de tão importante para me falar?

— Eu quero o divórcio. — Proponho, me sentindo quebrar em mil pedaços.

As lembranças mais uma vez me assolam, e os últimos anos passam por minha mente, desde o dia em que o meu pai me pediu para fazer o que ele considerou como um pequeno sacrifício em nome de algo que ele amava como a um filho, a sua empresa.

Edward, no entanto, estava em um relacionamento sério com Louise Orleans, a quem ele amava verdadeiramente, mas ainda assim, aceitou a proposta feita pelo melhor amigo do seu pai, a quem deve muito respeito e gratidão. 

Eu entendi que ele nunca se conformou realmente por ter que se separar da mulher que amava, e eu sentia que esse era o motivo pelo qual ele sempre me desprezou, não fazendo nada para que nós dois fôssemos de fato uma família.

O fato dele ter se tornado ainda mais frio e indiferente comigo, depois de ter recebido o convite de casamento da sua amada, que decidiu que não poderia esperar  pelo tempo que o nosso contrato iria durar e encontrou outro homem para amar, com o qual se casou.

E eu não podia mais conviver com a sua indiferença, e as suas desculpas para nunca estar em casa, sempre trabalhando até tarde e me evitando de modo ferrenho quando estava em casa.

Com as mãos trêmulas pela emoção trazida pelas lembranças, seguro entre os dedos a aliança que mantive em minha mão até agora, e a entrego para o Edward, como uma forma de dar um ponto final em nossa história.

— O que pretende com isso? — Ele questiona. 

Ele se senta, mas não parece triste, tão pouco preocupado com o meu pedido, e ao perceber o copo usado ao lado da garrafa de sua bebida preferida, me encara com desconfiança, mas nem ao menos questiona se bebi.

— Pretendo deixar o seu caminho livre, para que você possa finalmente encontrar a sua felicidade. — Declaro, tentando conter o choro. — Estou saindo dessa casa, Edward.

— E para onde você vai? — Apesar da pergunta, ele não parece realmente preocupado com o meu destino.

— Essa é uma pergunta que não pretendo responder. — Digo, já sentindo o primeiro pingo em meu rosto. — Estou saindo da sua vida e dessa casa, e isso é tudo o que importa.

Coloco a aliança no aparador e espero que ele me peça para não partir, diga que me ama e que vai mudar, vai tentar fazer com que o nosso casamento possa enfim ser algo real, mas nenhuma palavra sai de sua boca.

— Essa é uma decisão muito séria, Beatrice. — Edward afirma, seu tom gentil. — Deve pensar muito bem antes de tomar uma decisão como essa, para não se arrepender depois.

Se eu não estivesse sofrendo tanto, eu teria rido de seu aviso gentil.

— Eu pensei muito bem sobre isso, Edward. Eu pensei por doze meses. Um longo ano! 

Tento não alterar o tom de voz, mas é tão difícil ser fria, quando tudo por dentro está prestes a explodir.

— Vejo então que tem certeza do que está fazendo. — ele fala com tranquilidade.

— O nosso advogado preparou toda a papelada do divórcio e eu já assinei tudo. — informo — Ele enviará a documentação para o seu escritório, você só precisa assinar também e estaremos oficialmente separados. Você estará livre de mim.

— É isso mesmo que deseja? — ele pergunta — Sei que diz que está certa sobre a sua decisão, mas eu preciso ter certeza. Tenho uma dívida de honra com os nossos pais e a sua história, e não quero que sofra.

— Sim, eu tenho convicção do que estou fazendo. — Eu confirmei, mesmo que o coração grite que não! — Eu não quero me separar de você, Edward! Mas eu preciso fazer isso. Eu preciso recomeçar longe de você.

— Entendo a sua angústia, Beatrice. — Ele tem o desplante de dizer, mas o seu rosto era uma máscara de frieza e educação. — Espero que fique bem e que possa encontrar aquilo que procura, Beatrice.

— Adeus, Edward. — falo, o coração sangrando. — Espero que também encontre aquilo que procura.

Saio da mansão luxuosa, e caminho para a escadaria de pedra, chegando ao pátio central, onde um carro me espera, conforme a minha orientação ao motorista. A minha única mala já está acomodada dentro do veículo e entro no banco traseiro, contendo bravamente o pranto e tentando a todo custo não desabar.

Mas o meu coração está dolorido, o pranto rola do meu rosto e eu preciso de muita força de vontade para não desabar completamente, quando estou sofrendo tanto com a separação.

Como poderei viver sem o grande amor de toda uma vida?

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