A festa ainda bombava nas nossas costas, quando a aniversariante me acompanhava até meu carro com uma tigela de bolo na mão. Cléo vestia um vestido azul-escuro de veludo, alça fina, não muito justo, com um "V" profundo na parte de trás e que bailava no meio de suas coxas. Minha opinião levou-a a calçar sandálias de salto raso e optar pelas mexas soltas à altura de sua cintura.
Estava bonita e radiante. Falava sem parar e era, sem dúvidas, uma mulher que dispensava a falta de assunto.- Tens mesmo que ir? Logo agora que a festa realmente vai começar? - lançou algumas tranças finas para trás de seu ombro.
- Tenho. Já está tarde.
- Tem alguma coisa para fazer amanhã? - parou de frente para mim e me observou abrir a porta do carro.
- A questão não é essa... - quando ia me justificar, a voz alta de Lionel chegou até nós.
- Cléo, não lhe deixa entrar nesse carro! - seu indicador estava em nós qua
— Você deve estar exausta. — Cléo falou, de frente para mim, enquanto secava o prato em sua mão.— Um pouco. — franzi o nariz — Mas tenho a tarde toda para dormir.— Acho que agora ele vai te deixar ir para casa. — riu — Lio é confuso.— Pois é. Já esperava aquela reação dele. — terminei de empilhar os pratos e lavei as mãos.— Estou com uma ressaca das boas. Meu Deus! — suspirou, seguindo até o prato de sopa sobre a mesa que repousava.— Imagino que não sejas a única. — me aproximei e me sentei.— Lio também exagerou. Estou a espera do momento em que vai entrar por aquela porta e exclamar por algo gelado e de limão.— Como assim?— É assim mesmo. Depois de exagerar no Uísque, só um líquido de limão e bem gelado é que cura o mau humor dele.— Espero que tenha. — esfreguei as mãos sobre minhas coxas e sorri para ela, que esvaziava a
Quarta-feiraContraí meu peito enquanto caminhava pelo corredor azul, acompanhado pelo eco dos meus passos, em direcção a porta no final do mesmo. Dela escapava o som abafado da música que as vozes masculinas cantavam. Pude ouvir melhor quando entrei nela e vi uma roda larga no centro.— Mestre! — um deles gritou por cima do canto assim que me viu, sem deixar de bater suas palmas.Larguei minha pasta próximo a parede, descalcei meus pés e me aproximei da roda com os olhos atentos nos dois dentro dela. Faziam movimentos calmos e bem elaborados, fazendo com que tendesse mais para uma dança do que uma luta. Apesar de algumas falhas, pude ver que desde a última aula, tinham melhorado imenso.— Calma, Mauro! — gritei para o mais novo entre os dois — Isso! — depois que fe
— Olá! — ornamentou sua saudação com um sorriso largo, depois de ter aberto a porta para mim.— Tudo bem?— Pode-se dizer que sim, aí? Pode entrar. — arrastou seu corpo para o lado para me dar passagem.Assim que atravessei a porta, deixando-a para trás, um aroma de dar água na boca invadiu meu olfato, enquanto apreciava a pequena sala diante de mim.Eu e Judite decidimos que nos juntariamos para um jantar rápido na casa dela, depois que nossos expedientes encerrassem. Pensamos que seria melhor e mais prático, tendo em conta que não ia interferir tanto no último dia laboral de ambos.— Estou bem. — me virei para vê-la fechar a porta e olhar para mim.— Seja bem-vindo, mais uma vez. — esfregou suas mãos nas laterais de duas coxas — Fica avontade. — me acomp
— Pronto. — invadi a sala, flagrando-o atento a TV — Podemos ir jantar?— Podemos. — se levantou e passou a me acompanhar até a cozinha.— Demorei?— Não muito.— Ainda bem. Sinta-se avontade. — indiquei a mesa e ele assentiu antes de se sentar.— O cheiro aqui está de dar água na boca. — ouvi dizer por trás de mim, enquanto desligava as panelas para começar a servir.— Confia que o sabor compensa.— Não tenho dúvidas. — soltou alguns risos roucos — Há uns 11 anos duvidaria, mas agora não.— Estou ligeiramente ofendida. — me virei, plantei as mãos na cintura e ri — Mas é verdade. Eu não era lá essas coisas, na cozinha.— O que mudou isso?— Não sei. — alcancei duas travessas e colheres para servir — As coisas simplesmente foram mudando.— Bom saber.— Como vão as coisas
— Mamaaã! — arregalei os olhos por conta do que ela perguntou — Claro que não!— O que foi então?— Um simples jantar entre amigos, no qual rolou muita conversa. Só isso. — respondi, olhei para frente e apertei o volante.— Então foi o quê? Um mosquito? — desentendendo, me virei para vê-la girar o dedo perante seu pescoço, me fazendo lembrar que eu tinha um chupão bem feito.— Jesus do céu! — sussurrei antes de rir, totalmente encuralada na minha mentira — Eu não vou falar sobre isso contigo, meu amor.— Você não é a tal aberta, sem tabús, sem restrições?— É diferente. — tirei uma das mãos do volante para erguer o indicador em defesa.— Ta
Tranquei as portas do carro, enfiei as chaves no bolso da minha camisola e entrei no lugar com cheiro de Café e Uísque. Meus olhos vasculhavam o espaço em busca dos dois rostos conhecidos, até achá-los numa das mesas do centro.Lola e Júlio já me pareciam bem animados, quando me receberam com alegria acima da medida. Arrastei a cadeira, me sentei e olhei para as canecas e os pratos vazios diante dos dois.— Lio, como vai, irmão?— Bem, mas não melhor que vocês. — afundei na cadeira e coloquei meu telefone sobre a mesa.— Nós vamos casar. — Lola ergueu seu anelar, ao qual apontava enquanto mexia seu corpo numa dança empolgada.— É sério isso?— Muito sério. — se aproximou da mesa — No dia 14 de fevereiro do próximo ano, sábado, eu vou colocar um anel nesse dedo, com areia branca em nossos pés e praia nas nossas costas! — passou o braço pelos ombros de sua amada e beijou seu pesco
Uma semana depoisEnquanto acompanhava os passos dela, que seguia pelos caminhos estreitos entre as campas, passava os olhos pelas lápides espalhadas pelo enorme cemitério, de nome Lhanguene.Judite segurava um buquê de flores e vestia tons escuros, como se revivesse um luto. O silêncio entre nós me permitia ouvir apenas o barulho dos nossos pés e de nossas chaves agitadas em nossos bolsos.Virou a esquerda, passou por quatro campas e finalmente parou, se agachou e colocou sua mão sobre o mármore escuro.- Eurico D'Matos. - leu o nome num tom nostálgico, depois olhou para mim - Faz uns 4 meses que não venho para cá. - com a mesma mão, passou a proteger seus olhos do sol.Me a
— Há quanto tempo ela se mudou para cá? — perguntei assim que tirei o pé do último degrau.— Há uns 6 ou 7 anos, por aí. — sacou de seu bolso um pobre molho de chaves.Respirei fundo enquanto o observava introduzir e girar uma das pequenas chaves na fechadura.— Você tem chave da casa da tua mãe. — ergui as sobrancelhas em surpresa.— Como vês. — girou uma última vez e empurrou a porta — Acredita, eu não queria.— Ficaria menos surpresa se batessemos e ela viesse abrir. — enfiei as mãos nos bolsos traseiros das minhas calças e comecei a dar passos lentos para dentro.— Mas ela não está. — depois de me dar passagem, fechou a porta nas minhas costas.— Então nós viemos ver uma pessoa que não está? — ri.— Não exactamente. — franziu o nariz — Ela já vem. Enquanto isso, nós aguardamos. Pode ser? — seu olhar castanho e intenso grudou no meu.