Caleb Evans
Continuo na cozinha, observando cada canto familiar, nada aqui mudou muito desde que fui embora. Ainda conseguia sentir aquela sensação reconfortante de estar em casa. Minha vida sempre foi um caos, mas nos anos em que morei aqui foram como um bálsamo para mim. Por quatro anos, tive um pai e uma irmã, mesmo que a palavra "irmã" fosse mais uma ironia do que qualquer outra coisa. Ayala sempre me olhou com carinho, me cuidou e se preocupou comigo, mas eu nunca realmente a vi como uma irmã. E pela maneira como ela sempre me tratou, eu também nunca fui um irmão para ela. Encaro Álvaro entrando na cozinha, se encostando no balcão à minha frente. — Você quer ir ao escritório para que possamos conversar? — ele pergunta, com uma preocupação subjacente na voz. Neguei com a cabeça. Não ia contar a ele que minha mãe escolheu acolher um filho abusivo e quase me fez ser preso. — Na verdade, não quero atrapalhar. Só queria me desculpar por chegar daquela forma tão tarde da noite. Não tinha outro lugar para ir, e aqui foi o primeiro lugar que me veio à cabeça — digo, tentando soar mais tranquilo do que realmente estava. — Eu estava preocupado com você, Caleb. Cristiny esteve aqui, disse que você está passando por uma fase complicada — suspira Álvaro. Uma risada irônica escapa de mim. — É claro que ela disse. Seria estranho se ela dissesse algo de bom sobre mim, pelo menos uma vez. — Tive medo que as atitudes dela pudessem te levar pelo caminho errado. Eu sei como ela pode ser cruel — ele suspira novamente. — Não valeria a pena, eu só não suportei toda a merda que estava rolando e dei um tempo de tudo. Queria distância dela por um tempo e de todo o caos que ela traz — digo, desviando o olhar para as xícaras sujas na bancada. — Pelo visto, você não vai me contar tudo, mas tudo bem. Me diga pelo menos onde você esteve — Álvaro insiste. — Estava dormindo no escritório de um amigo, trabalhei lá também nas férias — suspiro. — Eu só queria mesmo me desculpar, preciso ir para a aula. — Não fique mais na oficina. Se não quer voltar para onde estava com sua mãe, fique aqui então, ou até nos quartos dos alojamentos da faculdade, eu pago — Álvaro oferece. — Não tem vaga nos alojamentos, e a preferência é quem mora fora. Enfim, não quero te dar dor de cabeça. Você é como um pai para mim, mas já sou adulto e preciso me virar — digo, tentando ser independente. — Você precisa focar nos estudos, Caleb. Se formar, fazer o que ama, que é jogar futebol — ele diz, vindo até mim e colocando a mão no meu ombro. — Você lidou com muita merda sozinho esses anos todos, filho. Deixe que sua mãe viva a vida dela e você viva a sua. — Tudo bem, obrigado por isso — murmuro, sinceramente grato. — Sempre imaginei que você voltaria para essa casa, filho. Só não foi da forma que eu esperava — Álvaro diz, saindo. Saio dali também, precisava pegar minhas coisas para as aulas e agradecer meu amigo pela ajuda, por todo esse mês. — Cara, você está péssimo — Jenkins diz quando se j**a no banco ao meu lado no refeitório. — Claro, passei um mês dormindo em um sofá que mal me cabia, e sendo atormentado pela minha mãe até decidir que ia desligar meu celular para ter paz — resmungo, observando as pessoas andando de um lado para o outro no refeitório com suas bandejas de comida e seus assuntos. — O que sua mãe aprontou dessa vez? — ele pergunta, sabendo que não tenho uma boa relação com ela desde os tempos de fundamental. — Nada de muito novo, acredite, mas dessa vez eu não suportei, tive que ir o mais longe de toda essa merda — digo, sem muito entusiasmo. Jenkins nota Ayala à frente, falando com uma garota que parece não parar de falar. — Pequena Green, já não é tão pequena mais, aliás, virou uma grande... — ele começa. — Não termina essa frase — rosno, com raiva. Ele ri. — Ela veio falar comigo ontem, estava preocupada com você. — Cristiny foi lá na casa do Álvaro dar o seu show — reviro os olhos. — Como se realmente estivesse preocupada comigo, ela só queria atormentar o pobre do Álvaro. — E como você vai fazer agora? — Jenkins pergunta, lançando um olhar a Ayala, que está algumas mesas à nossa frente. — Vou esquecer que tenho uma mãe por enquanto, sei que ela não vai me dar paz, e vou ficar no Álvaro — digo, decididamente. Jenkins me encara, depois olha para Ayala. — E como vai fazer com a Green? Ela não é mais uma menina boba. — Vamos conviver como sempre fizemos, e vou mantê-la o mais longe possível das minhas merdas — digo, sabendo que isso pode não durar para sempre. Ele balança a cabeça. — Vocês eram só adolescentes quando rolava todo aquele clima, imagina agora que ela é uma puta mulherão, e eu sou seu amigo, cara, sei que nunca a olhou como uma irmã. O encaro, irritado. — Você não sabe de nada, Jenkins. E outra, não sou mais um adolescente cheio de hormônios, sei me controlar perto de uma garota. Disse isso mais para mim mesmo do que para ele. Eu me encantei por Ayala quando fui morar naquela casa, dois anos de diferença, mas mesmo assim não consegui vê-la como uma irmã. Estava sempre a observando quando ninguém estava por perto. Não foi difícil aprender todas suas manias, mas foi difícil fugir quando ela se aproximava, quando cuidava de mim era como se só existisse nós dois e mais nenhum problema. Mas existia, eu era um fodido com uma mãe que adorava me humilhar, e ela era uma boneca, linda, delicada e com uma vida descomplicada, não precisava do meu caos. Ele dá de ombros. — Se você diz, mas bem que podia chamar ela para algumas festinhas, a amiga dela é uma gostosa. Dou um tapa na nuca dele. — Não vai se meter com a garota para partir o coração dela, você não presta, Jenkins. — Por que mesmo que eu sou seu melhor amigo? — ele pergunta, rindo. — Porque eu sou o cara — piscando para ele. — E o único que suporta essas piadinhas ruins. Continuamos conversando sobre os treinos e os jogos que estão por vir. Meu amigo não perde a oportunidade de me encher quando me pegava encarando Ayala como um maldito obcecado.Ayala GreenEu e Martina estávamos a caminho do refeitório para almoçar. Como sempre, estava um formigueiro, e por sorte, achamos uma mesa que tinha poucas pessoas, algumas mesas de distância de Caleb e Jenkins. Fiquei aliviada ao vê-lo sentado ali, com Noah, parecendo estar presente nas aulas e nos treinos.— Olha, agora faz sentido todo o crush que você tem no tal de Caleb. O cara é um gato — Martina comenta enquanto tomamos nossos lugares.Nego com a cabeça, mantendo os olhos desviados na direção onde eles estavam sentados. — Eu tinha um crush, não tenho mais. Fora que ele tá diferente, cheio de tatuagens agora.— Eu acho sexy, se quer saber. Deixa ele com um ar de bad boy, sabe? — Martina comenta com um sorriso malicioso.— Você não tem juízo — resmungo, ignorando a provocação.— Falando em juízo, o que você acha que aconteceu para ele chegar daquele jeito? — Martina pergunta, passando a mão distraidamente pelo cabelo.Dou de ombros, soltando um suspiro, enquanto olho rapidamente
Ayala Green Dizem que a primeira paixão a gente nunca esquece, e hoje eu tenho certeza disso. Eu era apenas uma garota de doze anos quando tudo começou, cheia de sonhos e expectativas, vivendo um dos momentos que até então só conhecia nos livros que devorava em segredo. Naquele dia, eu estava no meu quarto, absorta na melodia de "One Less Lonely Girl" de Justin Bieber, quando ouvi a voz do meu pai chamando meu nome.— Ayala, venha para a sala! Quero te apresentar algumas pessoas.Suspirei, interrompendo minha música favorita e me perguntando quem seriam essas "pessoas" que ele queria que eu conhecesse. Saí do meu refúgio, ainda com a cabeça nas nuvens, imaginando que algo mágico estava prestes a acontecer, como nos romances que tanto adorava ler.Ao chegar à sala de estar, o mundo ao meu redor pareceu parar. Lá estava ele: Caleb Evans. O cabelo escuro caía desordenado sobre sua testa, e seus olhos da mesma cor transmitiam uma seriedade que eu não entendia, mas que me fascinava. Havia
Ayala Green Acordei de sobressalto com o toque insistente do meu celular. Peguei o aparelho ainda sonolenta, só para perceber que se tratava de uma chamada de vídeo de Tina — minha melhor amiga e parceira inseparável desde o ensino médio. Ela odeia ser chamada por seu nome completo, Martina, e faz questão de me lembrar disso sempre que me esqueço.Assim que atendi, a imagem dela surgiu na tela, eufórica como sempre.— Ayla, pelo amor de Deus, você ainda está dormindo?! — exclamou, quase me deixando surda. — Eu já estou pronta há horas e você nem saiu da cama!Esfreguei os olhos, tentando me situar.— Tina, nossas aulas começam às 7:30. Ainda nem são 6:00. Você pode, por favor, respirar? — murmurei, a voz rouca de sono.Ela revirou os olhos, impaciente.— Como você consegue estar tão calma? É o nosso primeiro dia na faculdade! Trabalhamos tanto pra isso! — disse, agitada. — Não me diga que não está nem um pouco animada!— Estou sim, só que acabei dormindo tarde ontem. Terminei de ler
Ayala Green Acordo no meio da madrugada, assustada, com o barulho de algo quebrando. A sensação de terror que toma conta de mim é indescritível. Sinto como se o mundo ao meu redor tivesse desabado, e, por um momento, não sei se o som do vidro se estilhaçando vem da realidade ou do pesadelo que estou tendo. No sonho, Caleb está morto, jogado em uma vala escura, e o frio que me percorre a espinha agora parece real, mais real do que o pesadelo que ainda ecoa na minha mente.Levanto da cama com um pulo, tentando afastar a sensação de angústia que me domina. O barulho vindo de baixo é cada vez mais alto. Algo pesado foi jogado no chão, e a agitação das vozes abafadas me faz pensar que algo está fora de controle. Duas vozes masculinas. Uma delas reconheço de imediato: meu pai. A outra... é a de Caleb. Meu coração dispara, a preocupação começa a tomar conta de mim. Será que estão sendo assaltados? O que está acontecendo ali?Desço devagar pelas escadas, tentando fazer o mínimo de barulho