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Mason e as Ostras Estrelares

Meu pai tinha um pequeno restaurante chamado Ostras Estelares. Não vendíamos ostras, nem qualquer outro tipo de frutos-do-mar; meu pai vendia mesmo os hambúrgueres mais gostosos de todo o mundo. Ele visitou o Brasil quando criança e se deparou com o hambúrguer mais lindo de delicioso de todos os tempos, em uma cruzadinha numa cidadezinha quase esquecida, no interior do Mato Grosso. Ele então decidiu vender hambúrgueres do tamanho de livros de matemática de faculdade, tão saborosos que até mesmo dava vontade de repetir – apesar de ser impossível comer mais de um. A última vez que comi um de seus hambúrgueres fora no último ano do ginásio, na noite em que ele desapareceu.

Eu nunca fui melancólico, solitário ou aqueles garotos estranhos e bizarros que sentem medo até mesmo de conversar com as pessoas. Na verdade, eu sempre fui muito falador, as pessoas apenas nunca me davam uma oportunidade de mostrar o quão legal eu poderia ser. Eu tinha alguns amigos na escola, saiamos para nos divertir e tudo mais. Tinha um bom pai, um avô racista que me odiava, mas era irrelevante. Meu problema era Max Simmons.

Eu era perdidamente apaixonado por Max Simmons, a garota mais popular da escola; ela também estava no mesmo ano que eu. Cheguei até mesmo a nos imaginar casados e com filhos e eu só tinha treze anos na época, seria um sonho se ela me notasse, um sonho que eu jamais poderia sequer se imaginar possível. Mas um dia, Jason, um dos garotos do time de natação, havia vindo falar comigo, dizendo ter um espinhento por aí espalhando que eu era frouxo demais. Eles sabiam que eu era afim da Max e basicamente mexeram comigo e com meus sentimentos.

Eu sempre fui muito ingênuo, facilmente irritado, manipulado e intimidado por qualquer um. Devido às palavras absurdas de Jason, eu resolvi me declarar naquele mesmo dia para Max, que me deu um sonoro não e me chamou de esquisito na frente de todo mundo. Na verdade, não foi só um simples não. Ela me humilhou publicamente de um jeito bem cruel, na verdade.

No dia seguinte, o bom e velho drama adolescente tomou conta de mim: decidi que nunca mais iria para a escola. Basicamente eu chorei por três dias seguidos devido à humilhação gigantesca somado ao coração partido. Meu pai sempre havia sido muito popular na escola, tinha até mesmo namorado a mãe de Jude Wallace na época, mas conheceu minha mãe na faculdade e desde então, apenas a morte os separou. Ele me disse que, se eu quisesse, ele poderia me ajudar, me levar para comprar roupas novas e tentar conquistar Max ou poderia apenas mostrar pra todo mundo quão legal Mason Harris poderia ser. Eu topei.

Uma semana depois, eu voltei pra escola após um merecido descanso de toda aquela confusão e fora uma coisa realmente inesperada:  Max Simmons havia me notado! Ela perguntou se eu gostaria de almoçar com a turma dela no almoço e a partir daquele dia, tudo mudou pra mim. Eu me tornei popular, Max dava em cima de mim o tempo todo e os garotos do time até me ajudaram a treinar pra entrar no time de basquete – apesar de eu realmente não ter entrado, porque eu não fiz os testes, que já havia encerrado naquele ano. Eu nunca quis ser popular, mas aquilo era muito bom.

Então eu comecei a perceber o Jude quando todo mundo era idiota com ele. Os garotos viviam zoando com ele, até mesmo os nerds do clube de audiovisual curtiam com ele; tudo aquilo era um saco, porque ser popular não nos dava o direito de sermos tão escrotos com Jude. Boston – que tinha o mesmo sobrenome que eu, mas graças ao bom Deus, não tínhamos um fio de parentesco qualquer –, estava o provocando na escada. Eu cheguei no instante em que Boston ia esmagar os óculos dele com aquele allstar nojento dele; consegui puxá-lo pelo capuz a tempo de salvar os óculos de Jude, o levando para longe dali.

— Por que fez isso? Você sempre estraga as brincadeiras.

— Para de ser tão implicante, o que ele fez pra você?

— Eu gosto de brincar com ele, é engraçado.

— Tenho certeza que ele não acha engraçado — Boston era um imbecil por mexer com Jude, sabia que garoto não gostava, mas continuava agindo como um valentão para cima dele.

Mas a pior de todas com certeza era Max. Antes de me tornar popular, eu não conhecia Simmons de verdade, mas a admirava de longe porque ela estava sempre por cima de todo mundo, ninguém dizia nada para ela, estava sempre acima de todos, mesmo acima de Megan, que era tão popular quanto ela, em seu posto de capitã das líderes de torcida. Ela era conhecida até mesmo pelos veteranos do colegial, o que eu achava insano, porque ninguém fazia amizade com os veteranos do colegial, mas ela era sempre vista saindo com eles pela cidade. Eu a achava maneira. Mas depois que percebi o quanto ela enchia o saco de Jude Wallace, aprendi a conhecer as pessoas antes de decidir se gostava ou não delas; claro que eu não abandonaria o posto de cara popular que havia me tornado – aprendi a gostar e a almejar sempre aquele posto. Entretanto, nada me impedia de também tratar os populares com algum desgosto.

Certo dia, cheguei na escola decidido de que teria meu troco e também uma pequena vingança por Max ter sido cruel com Jude ao longo do ano. Eu sabia que ela queria ficar comigo. Sabia que ela estava afim de mim – não só porque eu estava atraente – porque eu estava, cada dia que passava, mais popular. Naquela terça, ela estava mais grudenta que nunca, parecia nervosa. Será que ela poderia estar mesmo gostando de mim? Sim, ela estava afim de mim, disso eu já tinha certeza absoluta. Boston havia me dito que ela iria me chamar pra sair e todo mundo estava me incentivando e me aplaudindo, dizendo que eu era o cara mais sortudo da escola, porque ela nunca tomava a iniciativa de chamar alguém pra sair.

Mas tudo que eu fiz naquele dia fora a deixar de lado, não incluir a loira nas conversas e a me esquivar sempre que possível. Foi durante o almoço que ela conseguiu me pegar na fila da cantina; eu conversava com Megan enquanto beliscava uma sobremesa doce quando ela apareceu, empurrando meu amigo, mexendo seus cabelos e sorrindo de um jeito sedutor, afirmando que deveríamos sair no fim de semana. 

Sério, eu me segurei até o impossível pra não soltar uma gargalhada com gosto. Respirei fundo para me segurar e então virei pra ela sério, exatamente como os outros olhares que eu havia lançado a ela durante a manhã. Então, deixei ela sozinha, à espera de uma resposta, subi as escadas do mezanino. Eu realmente não daria uma resposta para ela, mas ela foi bem mais nervosa.

— Vai realmente me deixar falando sozinha? Mason! — Parei e olhei por cima da proteção. O refeitório inteiro parecia esperar minha resposta.

— Você tá mesmo falando sério? Pensei que fosse piada. Não. Eu nunca vou sair com você.

O refeitório inteiro soltou um 'Wow' em coro, e aquela fora a melhor sensação. Acabei encontrando um Jude escondido de todo mundo, mas observando a cena, ele estava sorrindo, vermelho igual o batom de Simmons.

Entretanto, tudo não durou muito tempo depois daquilo. Em uma noite qualquer da semana, após meu pai fazer o que seria o último hambúrguer da sua vida, ele saiu, dizendo que iria se divertir em algum lugar. Fiquei em casa, vendo televisão. Foi no dia seguinte que eu me preocupei, quando ele ainda não havia retornado e meu avô não tinha notícias dele tampouco. Fiz o boletim de ocorrência, e mesmo não tendo feito um dia de desaparecido, a polícia se prontificou a procurá-lo imediatamente.

Branville era uma cidade pequena, onde todos se conheciam, portanto, a comoção fora completa entre os habitantes. Mas, ao mesmo tempo em que procuravam meu pai, o pai de Jude também era procurado, porque ele havia fugido da clínica psiquiátrica na noite anterior graças a um descuido de um novo enfermeiro; pior que isso era que seu paradeiro ainda era desconhecido.

Eu nunca soube exatamente o que aconteceu, apenas que meu pai havia saído para beber e então, em alguma parte da noite, encontrou o pai de Jude e teve um final tão terrível quando a ex-namorada. Eu não pude ver o corpo do meu pai, e seu enterro fora discreto e reduzido a um número contado de pessoas, incluindo a família de Jude Wallace. Depois disso, fui morar com meu avô, um ex-militar. Um homem rígido, sério, intolerante. E pra ele, eu era tudo o que ele odiava, porque eu havia matado sua preciosa filha.

Eu tinha uma ótima vida, um pai amoroso, um plano para o meu futuro, mas tudo fora arrancado de mim em uma única noite. Fiquei com raiva a cada dia que passava. Raiva da escola, raiva do meu avô, raiva do pai de Jude, raiva do meu pai por ter saído naquela noite. Raiva do próprio Jude Wallace.

Para desespero maior e para encontrar uma fuga para minha dor, foquei em Jude no ato seguinte. Fiquei depressivo e depositava toda a minha frustração em pegadinhas sem graça e apelidei ele de todo jeito; aquilo gerou um dominó de desgraças em sua vida, porque todo mundo achava engraçado. Eu não me importava se ele sofresse, eu só queria que ele se sentisse tão diminuto e triste quanto eu estava me sentindo. E aquilo só piorou a vida dele, porque todo mundo apenas piorou suas atitudes com relação a ele; até que um dia ele sumiu.

Fiquei me perguntando se ele havia me notado quando desapareci por uma semana, após eu ser rejeitado. Então eu apenas imaginei que ele fosse aparecer para o fim do ano letivo, e provavelmente retornaria renovado, assim como eu voltei. E estava pronto pra pegar no pé dele novamente assim que ele retornasse.

Eu só soube que ele havia tentado se matar quando a sua irmã mais velha dele bateu na minha porta e voou no meu pescoço.

— Você quase o matou!

Ela repetia e me batia, mesmo que seus tapas não fossem realmente fortes. Gritava e chorava, até soluçar, me chamando de covarde e indagando porque eu havia feito o que fiz. Ela me contou que Jude havia dado um tiro na cabeça e estava em coma até então, e havia descoberto que eu era terrivelmente cruel com ele sempre que podia, então ela atribuiu a tentativa de suicídio dele em mim. Meu avô e ela tiveram uma feia discussão e, apesar de Josh, esposo dela, a convencer a não prestar uma queixa contra mim, meu avô tomou a próxima decisão da minha vida e então fui mandado pra um reformatório bem longe de Branville, por quase três anos, três longos anos.

Quando fui deixado na porta do reformatório, respirei fundo e me amaldiçoei. Não tinha mãe, não tinha pai e meu avô havia praticamente me deserdado. Eu não sabia se Jude havia acordado do coma, mas todos os dias em que foquei em estudos e em bom comportamento, eu sentia uma angústia no peito, forte e constante, me dizendo que Jude, mesmo se sobrevivesse ao tiro, seria apenas para vegetar. Mas, ao mesmo tempo, meu pensamento mantinha uma sensação de que ele já estava…

Longe.

Longe o suficiente para não sentir mais nenhuma dor. Escrevi cartas e tentei ligar, mas as respostas eram inexistentes. Eu não tinha contato com internet e as ligações se resumiam a uma chamada de dez minutos a cada semana. Passei longos três anos orando por ele e por mim também.

Até que, um dia, precisei voltar. Meu avô estava extremamente debilitado, havia perdido a visão e não poderia mais ficar, então voltei para que ele não ficasse sozinho, voltei para resolver as coisas para ele.

E a primeira coisa que fiz assim que cheguei em Branville fora conseguir alguma notícia de Jude. Pra minha surpresa, havia notícias dele em todos os lugares, mas não sobre sua tentativa de suicídio felizmente falha, mas sobre qualquer outra coisa boba, como ele participando de uma peça boba da escola.

Espera um pouco, Jude Wallace fazendo uma peça na escola? Sendo aplaudido?

Na imagem do site da escola, Jude usava uma coroa, acessório do personagem em questão e sorria como ninguém, estava diferente, bonito. Havia uma covinha em sua bochecha que eu havia visto apenas uma única vez, quando ele sorriu no dia em que dei um fora em Max.

Aquela covinha fez querer voltar pra escola no mesmo instante. 

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