AMAROK
De volta à minha casa nas montanhas e um pouco longe da vila, joguei Melina no chão de madeira com menos brutalidade do que eu esperava devido à raiva interna que sentia, mas ainda assim sem qualquer delicadeza.
Assim que me desfiz dela, andei até a porta e fechei-a com força, denunciando através desse ato o real ódio que sentia por ela tentar fugir de mim novamente, com o som da madeira se chocando e ecoando pela casa como um trovão. Observei Melinda se levantar devagar e com dificuldade. Sua respiração encontrava-se visivelmente pesada, com seus cabelos longos grudados no rosto suado e sujo de lama. Só que, diferente da primeira vez em que ela me olhou nos olhos, dessa vez não havia mais medo em suas íris verdes.
Havia fúria.
— Eu te odeio, Alfa — as palavras dela cortaram o ar como lâminas.
Encarei ela por um longo momento, vendo seus ombros subindo e descendo com a respiração acelerada. Seus olhos intensos me fitavam como se fosse um fogo prestes a encendear tudo.
— Pode me odiar o quanto quiser — rebati, com a minha voz saindo baixa e ao mesmo tempo perigosa. — Desde que seja minha esposa e não tente mais sair dessa casa.
Melina deu um passo à frente, com o peito e o queixo petulante erguido, mesmo que estivesse visivelmente trêmula por dentro e não chegasse nem na altura dos meus ombros.
— Isso que você tem a me oferecer não é vida, é doente e errado — ela gritou, visivelmente alterada. — Você me caçou como um animal e ainda me trouxe à força até aqui de novo. Quer que eu aceite essa prisão? Um casamento forçado e ainda te agradeça?
Em um piscar de olhos, eu já estava basicamente em cima dela, tão perto que podia sentir o calor de seu corpo e sua respiração descontrolada contra mim.
Travando meu maxilar e me segurando para não jogá-la contra a parede e beijá-la até fazer entrar em sua cabeça dura que agora era minha, proferi:
— Você ainda não entende, não é? Você é minha, minha companheira, a única que o meu lobo reconhece. Se você fugir, se eu te perder e se alguém ousar te tocar... eu perderei o controle, humana.
Ela riu na minha cara, uma risada seca saindo da sua garganta, cheia de deboche e ao mesmo tempo dor.
— Qual parte você não entendeu que eu sou uma humana e não tenho uma loba? — Ela perguntou retoricamente e era visível na sua voz a angústia. — Não tem como eu ser sua companheira, não tem como seu lobo me reconhecer.
Estreitei meus olhos e algo dentro de mim vacilou e, pela primeira vez, desde que parecia tão certo tê-la sequestrado, agora me sentia confuso. Chacoalhei minha cabeça e andei sem rumo pelo espaço livre da minha sala, reorganizando minha mente e me lembrando de ontem, quando coloquei meus olhos nela pela primeira vez.
Eu fui até a aldeia com o intuito de vê-la antes de me casar, pois um Alfa de trinta anos, como eu, e com a minha fama de cruel, nunca tinha conseguido arranjar uma fêmea disposta a se casar comigo por causa do medo que elas tinham de mim e precisava saber se valeria a dor de cabeça me comprometer com uma humana sem loba que nunca vi.
Sempre que eu ficava no cio e era insuportável ficar sem acasalar, eu viajava até outras alcateias distantes e acasalava sem procriar com fêmeas que acasalavam comigo de bom grado, sem eu precisar me esforçar. Só que me casar com uma fêmea de fora do meu bando, e de uma alcateia distante, nunca foi uma opção para mim.
Então, no momento em que seus pais vieram até mim e me deram o passe livre para me casar com a sua filha mais nova, que eles viam como inútil por não ter uma loba, eu já me senti conectado com Melina de alguma forma.
Mesmo eu sendo o Alfa da matilha e que me devessem respeito, sabia que nunca seria visto como um deles e que também não era digno de ter uma esposa submissa que quisesse casar comigo por livre e espontânea vontade, pois sempre fui titulado como um líder cruel que os pais tinham medo de entregar seus bens mais preciosos.
Até boatos mentirosos de que eu era canibal e que devorava minha própria espécie rolavam por algumas bocas da matilha e isso só afastou ainda mais as fêmeas que já tinham medo de mim. Apesar dessas coisas prejudicarem minha vida amorosa, eu não sentia nenhuma necessidade de reverter isso, pois para mim era melhor ser temido do que ser visto como um Alfa fraco e indigno de respeito.
Então, ontem, quando eu estava prestes a bater na porta da casa de Melina, sem me importar se era madrugada, para vê-la antes de me casar com ela, que visivelmente precisava de um marido assim como eu precisava de uma esposa, me vi furioso e seguindo-a quando roubou o carro do seu pai e fugiu.
Achei que nunca sentiria conexão com nenhuma fêmea e que meu casamento com ela seria apenas por conveniência, mas quando eu interpretei o carro na estrada e olhei dentro dos seus olhos assustados e arregalados, eu soube naquele momento que era minha.
Que Melina era minha predestinada.
Então eu realmente não estava maluco e essa humana pequena na minha frente era minha companheira, mesmo que ainda não conseguisse compreender como meu lobo interior se conectou com uma humana sem loba.
Mesmo que ela continuasse negando.
Voltei dos meus devaneios, quando Melinda gritou com raiva:
— Eu prefiro morrer na floresta do que ser sua esposa e viver como uma prisioneira.
As suas palavras me atingiram como um soco no estômago de um jeito tão doloroso e surreal que só reforçava ainda mais o fato de que ela era mesmo minha predestinada, pois companheiros não suportavam ser rejeitados por seus destinados.
Fiquei parado por longos segundos, olhando-a com raiva e tentando decidir se deveria protegê-la como minha ou destruí-la como minha inimiga. Só que antes de fazer uma besteira da qual me arrependeria depois, me virei e caminhei até a porta da minha casa.
Parei com a mão na maçaneta e, sem olhar para trás, ameacei:
— Tente fugir de novo e vou torná-la minha prisioneira de verdade, até você finalmente aceitar o que é para mim e o que somos. Vamos nos casar hoje à noite, diante de todos da aldeia e da lua cheia, você querendo ou não, humana.
E saí batendo a porta atrás de mim.
MELINA Sozinha no silêncio agora doloroso da sala após Amarok sair batendo a porta, caí de joelhos no chão, sentindo o peito doer e meus olhos arderem. As lágrimas vieram com força, mas não de fraqueza, e sim de ódio e de exaustão. De resistência.Porque mesmo que Amarok me forçasse a me casar com ele, eu não iria ceder. Não importa quantas vezes fugisse e o Alfa me trouxesse de volta, eu nunca seria dele.*O céu estava coberto por nuvens espessas, como se o próprio tempo noturno estivesse de luto pelo que estava prestes a acontecer comigo. O ar frio e cortante da floresta parecia pesar sobre meus ombros como um pesadelo sombrio, enquanto me encontrava vestida em um vestido de noiva e usando um véu, que Amarok já tinha comprado para mim. Descia a trilha de pedra em direção à aldeia contra a minha vontade, com os meus pulsos presos por correntes que brilhavam sob a lua cheia. Cada passo forçado que eu dava em direção ao altar ecoava em minha alma como um pedido de socorro.Dois gua
MELINA Assim que o ritual de casamento terminou, a multidão se desmanchou. Vozes sussurradas e olhares de julgamento e curiosidade acompanhavam a gente, um casal recém-unido pela vontade do Alfa e não pela minha.Ainda sentia o peso das palavras do juramento queimando em minha pele e cada passo que dava ao lado dele em direção à floresta escura era como caminhar em cacos de vidro. A mão dele repousava em minha cintura com posse e uma falsa suavidade, me guiando pela trilha que levava à parte mais alta da floresta, onde ficava a cabana dele nas montanhas e que seria meu novo cativeiro.Ao voltarmos para a sua casa depois de uma longa caminhada cansativa para mim, ele abriu a porta com uma mão e, com a outra, gesticulou para que eu entrasse como se fosse um cavaleiro, mas sabia perfeitamente que era um ogro.Eu hesitei por um momento para entrar, por orgulho, por medo do que aconteceria quando passasse por essa porta, já que ele provavelmente estava ansioso pela lua de mel que, se dep
MELINAO amanhecer chegou silencioso, arrastado por uma névoa pesada que cobria a floresta como um véu de luto. Na cabana, o silêncio entre nós dois era espesso e sufocante.Eu já estava de pé, de frente para Amarok, com as costas eretas como uma rival diante do seu inimigo. Ele calçou o coturno de couro sem dizer uma única palavra e pegou sua faca de caçador com uma frieza de um soldado que partiria para a guerra. Mas antes de sair, parou na soleira da porta e olhou para mim, dizendo:— Eu vou caçar alguma coisa para você comer e volto logo. Não respondi e sequer o olhei na sua direção, mas uma ideia já tinha se formado na minha cabeça. Assim que o Alfa se foi e desapareceu entre as árvores, me movi como se fosse uma sombra.Sem levar nada, corri para fora da cabana e mergulhei na mata, tomando todo o cuidado do mundo para não pisar em um graveto e ele escutar. A floresta era densa, úmida e o frio cortava como se fossem facas finas, porém continuei correndo sem olhar para trás e o m
O silêncio que agora se fazia na nossa pequena casa de madeira era torturante, enquanto eu lutava contra as minhas pernas trêmulas para permanecer em pé. As minhas mãos estavam frias e suadas e me forçava a continuar olhando para a minha família na minha frente, depois de anunciarem que tinham me prometido em casamento a Amarok Mavros, o Alfa da nossa alcateia, e eu me negar. Se fosse em outras circunstâncias normais, seria o sonho de qualquer fêmea da nossa matilha se casar com o líder do grupo, porém nenhuma mulher da vila queria ser esposa do temido e cruel Alfa e, como eu não passava de uma simples humana sem valor por não ter uma loba, estavam me entregando de bandeja para ele. Para um assassino sanguinário. Diante de mim estavam a minha mãe, o meu pai e a minha única irmã mais velha. — Você deveria se sentir honrada, Melina Katsaros — Zena, minha mãe, disse após eu rejeitar o casamento arranjado com aquele monstro. — Finalmente arranjamos alguém da alcateia que tem coragem
Pisei o pé mais forte no acelerador da caminhonete barulhenta, sentindo a adrenalina reverberar pelo meu corpo e vendo os faróis de luzes amarelas clarearem o caminho terroso e escuro, sabendo que, a essa altura do campeonato e devido ao barulho do motor velho quando dei partida na garagem, meus pais a essa hora já sabiam da minha fuga.O céu estava nublado, anunciando que choveria em breve, e ao longe era possível ver alguns raios cortando o céu e fazendo um enorme clarão. Um novo trovão seguido de um raio caiu bem próximo e olhei assustada pela janela do motorista quando vi um vulto preto correndo pela floresta adentro.Com as minhas mãos começando a suar e agora com medo, continuei acelerando o carro com o meu pé trêmulo, me agarrando na esperança de fugir desse lugar que só me trouxe tristeza e recomeçar uma nova vida em algum lugar bem distante.Eu só pisquei meus olhos em uma fração de segundos e tomei um susto quando, de repente, um homem enorme apareceu no meio da estrada e no
MELINA O som cada vez mais próximo dos galhos estalando sob suas passadas pesadas era como uma ameaça velada, enquanto Amarok rosnava e se aproximava do buraco pequeno entre as pedras onde eu entrei para me esconder.Tentei recuar instintivamente para trás, mas como o buraco onde me enfiei só tinha entrada e nenhuma saída, apenas arregalei meus olhos, com o meu coração pulsando como um tambor frenético dentro do meu peito. Ele parou a alguns passos de mim e me olhou de cima, com aqueles olhos vermelhos que denunciavam a fera interna que era. Amarok não estava totalmente transformado em lobo, pois seu corpo, que estava apenas coberto por uma calça jeans surrada, era uma mistura de lobisomem, com uma barriga definida da sua forma humana e garras expostas nas mãos do seu lobo.Um rosnado baixo, mas intimidador, saiu da sua garganta, fazendo-me encolher ainda mais como um bichinho assustado. Antes que pudesse gritar ou correr, ele me puxou para fora com suas garras afiadas e me jogou so
MELINATotalmente o oposto do monstro sem coração que achei que me jogaria dentro de uma jaula e me manteria presa como um bichinho de estimação, Amarok me deu uma camisa quente sua para me trocar no banheiro, já que me tremia inteira de frio por causa da roupa molhada e suja de lama, e me ordenou deitar entre as lãs quentes de pele de ovelhas que ele espalhou em frente à lareira para me aquecer.Estava tão sem forças para lutar com meu captor pela minha liberdade e fugir, que apenas fechei meus olhos cansados e me permiti dormir entre as peles macias e quentinhas dos animais indefesos que ele matou. Acordei na manhã seguinte, sentindo todo o meu corpo dolorido e com uma forte dor de cabeça. Olhei em volta, demorando para processar mentalmente onde eu estava. Me levantei em um pulo ao perceber que não tinha sido um pesadelo e que eu realmente fui prometida e sequestrada pelo Alfa.A madeira rangeu sob meus pés descalços enquanto caminhava lentamente e meio desorientada, apenas queren