Confesso que não sou o tipo de pessoa que acredita em adivinhações, porém, depois do encontro na casa dos Marchese, como a Sra. Perret, devo admitir, que parte de mim ficou muito feliz com a suposta previsão. "Um homem poderoso, vindo de Nova York", segundo a previsão dela é o homem com quem irei me casar. E é muita coincidência que eu estivesse por perto a alguns minutos e pudesse escutar a conversa entre meus pais. Meu pai convidou Michael Villani para a nossa casa e isso significa que os dois devem chegar a um acordo.
Acordos de casamento são tratados com frequência em nosso meio. E por mais que eu soubesse que um dia isso iria acontecer, estou um pouco nervosa, principalmente porque sei que não será uma conversa fácil ou amena. Nossas famílias carregam rivalidade, ódio e ressentimento a décadas, desde que uma tentativa de aliança entre Nova York e Chicago não aconteceu porque minha tia Donatella Cavalieri, tida como uma das mulheres mais bonitas e cobiçadas entre as famílias, deixou o capo de Nova York no altar enquanto fugia com o executor da facção russa. O casamento não aconteceu, e lá mesmo, na igreja, iniciou-se um grande conflito que tem durado tanto tempo, que me pergunto se um dia será mesmo esquecido.
O capo de Nova York, que foi abandonado por minha tia, morreu recentemente, mas pelo que ouvi meus pais conversando, os dois teriam dado inicio a negociações, para que pudessem acabar com essa rivalidade unindo as duas famílias em um aliança, através do casamento.
— Já era tempo – ouço minha mãe falando, enquanto espio pela fresta, a visão de meu pai acomodado em sua poltrona, no escritório, bebendo seu uísque.
— Sim – ele bebe mais um pouco e continua — Michael assumiu o lugar de Erico quase que imediatamente, e sabe que cabe a ele fazer cumprir-se o último desejo de seu pai.
— Isso é bom para nós, não? – quem ouvisse minha mãe agora, e não a conhecesse como eu, acharia que ela está tranquila, mas não está.
Charlotte casou-se com meu pai em circunstancias como essa, e há quem diga que ela tirou a sorte grande quando seu compromisso foi anunciado, pois não era como se ele fosse do tipo que tinha inúmeros casos, ou alguma amante fixa, e vendo de dentro, é perceptível o quanto eles se amam. Eu não me lembro quando começou essa história de que ela iria nos conseguir, a mim e a minha irmã, casamentos valorosos.
No começo eu achava que era apenas porque ela se orgulha de nós, e sempre quer o melhor para mim e Alessa. Mas a medida que fomos ficando mais velhas eu entendi. Casamentos na máfia são movidos por interesse, e não pelo sonho de cada uma de nós em se casar com alguém pelo qual esteja verdadeiramente apaixonada. Negócios, apenas. E foi na minha festa de dezessete anos que eu percebi que não eram os garotos que eu achava bonitos que pareciam ter chances, e sim homens bem mais velhos, mais importantes, ocupando posições de destaque. Ou seja, algo muito diferente do que eu realmente desejava até aquele momento. Alguns anos de diferença não seriam problema, mas em alguns desses casos essa diferença era grande! E eu não quero me casar com um velho!
Michael Villani é uma excelente opção, com aquele porte de príncipe, jovem e sexy, em seus vinte e cinco anos. E se ele estava vindo a Chicago para acertar esse acordo com meu pai, eu preciso agradecer a Sra. Perret pela previsão assim que puder encontrá-la!
— É bom, claro – meu pai parece incerto sobre o assunto — mas, preciso de um plano caso algo dê errado.
— Querido, nada pode dar errado! – ouço o riso suave da minha mãe — Diana é, sem dúvida nenhuma a jovem mais bela e bem preparada em nosso meio para se casar com o capo de Nova York.
— Eu pensei imediatamente nisso quando Michael me ligou — ele fez uma pausa — mas, se ele respeitar o desejo do pai, tomará Giulia como esposa.
Houve um longo silêncio, e minha vontade é de observar minha mãe agora. Giulia? Minha prima Giulia? Que ninguém faz ideia se está viva ou morta? A filha da mulher que deu inicio a todos os problemas que hoje temos entre Cavalieris e Villanis? Não me ocorre motivo para que Michael Villani queira se casar com ela. Isso não daria certo, de forma alguma.
— Eu achava que Giulia... — minha mãe toma cuidado com as palavras — ela está viva?
— Está viva e bem — ele parece aliviado em dizer isso, como se tivesse guardado segredo por tempo demais sobre o paradeiro de Giulia — Ela era a preferência de Erico.
— Aquele homem, que Deus o tenha em bom lugar, era obcecado pela mãe de Giulia — Charlotte parece impaciente — agora quer que seu único filho se case com a filha de Donatella?
— Ele teve seus motivos.
— E Diana? — ela pergunta — nossa filha é quem deve ser prioridade nessa aliança, Joe!
— Estou tentando convencer Villani sobre isso. Se ele concordar em casar-se com Diana, poderei trazer Giulia de volta — ele suspira — certo de que ninguém vai atentar contra ela. Aquela menina poderá, finalmente, ter a vida que Donna e Ivenchev a privaram.
— Acha possível que isso aconteça? — ela parece esperançosa — que ele escolha Diana?
— Diana é uma beldade, vários homens solteiros de nosso meio tem demonstrado interesse em compromisso com ela, mas se Nova York a aceitasse, seria o ideal.
— Como o senhor vai conduzir essa negociação?
— Michael Villani virá amanhã pela manhã, para uma reunião. Convidei-o para almoçar conosco — ele diz.
— Não seria melhor um jantar? — ela indagou, quase posso ouvir seus pensamentos. A noite, uma ocasião mais descontraída, e não um almoço logo depois de uma reunião, seria bem mais apropriado.
— Ele volta para Nova York amanhã — meu pai diz — é melhor Diana impressioná-lo se quiser que a decisão dele seja favorável a ela.
— Falarei como ela — Charlotte fala, confiante — ela tem tudo a seu favor para despertar o interesse dele.
— Espero que sim. Conhecendo um pouco Villani, tenho certeza que caso ele não se interesse, irá imediatamente atrás de Giulia — ele levantou-se, certamente para servir-se de outra dose de uísque – ele inclusive já conseguiu descobrir onde ela está.
— Se ele não for obsessivo como o pai, creio que Diana poderá fazê-lo se interessar por ela.
— Não fale assim de Erico. Que ele descanse em paz — meu pai nunca odiou Erico Villani, e sempre me pareceu ter admiração pelo falecido capo.
— Sim, meu marido, me desculpe.
Estou andando lentamente, de costas, enquanto me afasto da porta do escritório de meu pai, quando uma mão cobre minha boca. Sinto que por um momento minha alma deve ter saído do corpo de voltado, tamanho susto antes de reconhecer Ezio Bertoli por cima do ombro. Ele me faz apressar o passo até me tirar de perto do cômodo, me levando em direção a escada.
— Ficou doido, Bertoli? — pergunto baixinho, mas irritada, ele quase me mata de susto!
— A signorina ficou? — ele aponta para a escada, indicando que eu suba, me seguindo e só voltamos a falar quando alcançamos a porta do meu quarto — se seu pai a flagra ouvindo a conversa, a castigaria, Srta. Cavalieri!
— Está me protegendo, Bertoli? — olho para ele, e lhe dou meu melhor sorriso, mas Ezio continua sério – ele não faria nada. Não quando posso lhe trazer inúmeros benefícios.
— Então dê a si mesma o benefício de entrar no quarto e dormir — ele parece não querer muita conversa – já passou da sua hora — Ezio abre a porta — entre.
— Você não manda em mim — me encosto no batente da porta, na verdade, gosto de provocar Ezio, que é quase sempre sério, a não ser pelos momentos que percebo que ele me olha com mais interesse.
— Seu pai iria discordar disso, caso a visse pela casa a essa hora, escutando conversas as escondidas — ele aponta novamente para o interior do quarto.
— Ok, ok, estou indo, Ezio — entro e posso ouvir a porta se fechando atrás de mim logo depois. Me sinto ansiosa enquanto entro no banheiro para uma ducha rápida, sabendo que dificilmente conseguirei dormir após ouvir a conversa entre meus pais.
Longos minutos depois, já pronta para dormir, vejo uma bandeja com água, um frasco de comprimidos para dormir, e um bilhete de minha mãe dizendo que devo me acalmar e me preparar para o dia seguinte. "Não esqueça a previsão da Sra. Perret. Esse casamento acontecerá!".
Estou desde cedo me preparando para ser apresentada ao capo de Nova York, e apesar do comprimido para dormir, tenho que admitir que minha noite não foi tão tranquila, nem meu sono tão reparador. Me sinto ansiosa, pois sei que tenho a responsabilidade de fazer Michael Villani considerar se casar comigo. Entre os vestidos, sou aconselhada a não escolher o preto, mais justo, mas não gostaria que Michael tivesse a impressão que costumo me vestir muito diferente disso. Danço desde muito jovem, e vou a academia todos os dias, tenho sim um corpo bonito e não vou ficar escondendo-o propositalmente só para que ele tenha impressão que sou tão inocente quanto supostamente deveria ser.Não sou Giulia. Na ocasião em que ela passou alguns dias conosco, ficou óbvio o quanto somos diferentes. Em aparência, personalidade, e apesar que já se passaram cinco anos desde a última vez que a vi, não acredito que ela tenha mudado muito, já que esteve aparentemente exilada em algum lugar, escondida do resto do
Os dias seguintes na casa dos Cavalieri não foram fáceis para mim. E as coisas não melhoraram quando chegamos a Nova York. Charlotte estava uma pilha de nervos, e eu sou seu principal alvo. Principalmente depois do nosso encontro com Giulia, na casa de Linda Villani. Giulia ainda se parece com a imagem que eu tinha dela, de anos atrás, mas tenho que admitir, ela está tão bonita que dá raiva. E tem aquele ar inocente que encanta muito alguns homens do nosso meio em busca de uma esposa jovem e virgem, o que é exatamente o que a maioria deles quer. Michael parece não conseguir desviar o olhar dela cada vez que está por perto, e honestamente não vejo como eu poderia ter alguma chance quando o cara surge no meio da tarde com jeito de que precisa dela com urgência depois de ter passado boa parte do dia com ela. O que vai contra as regras impostas pelo acordo de casamento, a principal delas, que o casal não pode ficar sozinho. Como se Michael Villani fosse apenas cumprir, quando é óbvio que
Minha ideia era ficar bem longe de Giulia e Villani, ao mesmo tempo que sabia que se algo desse errado, eu teria a proteção de Ferretti, então, enquanto a bala deslizava para debaixo da minha língua e eu sentia a música vibrando ao meu redor, era como se eu estivesse entrando em um outro mundo. Um ao qual nunca tive acesso, e jamais me seria permitido, longe da prisão confortável e luxuosa na qual sempre estive presa. Eu não me importo. E farei valer a pena. Há tanta gente bonita aqui. Bebida, e homens que não conseguem parar de olhar para mim. Não que isso seja uma grande surpresa. Eles sempre olham, só não tem colhões para se aproximar porque preferem passar vontade do que enfrentar Joe Cavalieri. Esses nem sabem quem sou, e isso é ótimo! Porque sinto que é uma ótima oportunidade de não ser quem eu tenho me esforçado a vida inteira para ser. Alguém que deveria ser quem nosso meio idealiza. Que é tão bonita, mas não consegue chamar a atenção de quem deveria. Alguém que prefere ser
Sim, eu estava fodida. Meu pai disse que eu deveria ficar longe de suas vistas, e não lhe dirigir a palavra, e agora, de volta a Chicago, sinto uma pontada de desespero ao ver minha mãe seguindo temerosa para o escritório de papai. Por mais que Joe fosse bom para nós, um pai amoroso e protetor, havia momentos que até mesmo a família tinha que enfrentar o capo de Chicago. Eu sabia que estávamos em uma situação complicada enquanto subia para o quarto, e pior ainda, eu finalmente havia chamado a atenção de Michael Villani, mas não da maneira que havia imaginado, e tenho a impressão que ele está tramando para vingar-se de nós, Charlotte e eu. Ele deveria deixar pra lá, meu Deus! Afinal, havia se casado com Giulia, como era da vontade de Erico Villani. Mesmo depois de tudo.Michael e Giulia se apaixonaram, antes mesmo do casamento, então, todos os planos que minha mãe arquitetou para afastá-los agora pesavam sobre nós, que esperávamos apenas o julgamento de Joe. Confesso que estou com m
Charlotte pediu para uma criada que me trouxesse um chá calmante, mas acho que não fez efeito algum, eu a ouvia falar sobre como deveria me vestir à partir daquela noite, me lembrando mais uma vez que essa situação nem precisaria estar acontecendo se eu tivesse a mínima competência em chamar a atenção do homem que segundo ela, seria perfeito para mim!Sinceramente, eu já não acredito nisso. Aliás, gostaria de encontrar a Sra. Perret para dizer pessoalmente que ela é uma farsa! Talvez eu não seja adequada. Talvez um casamento de aparências seja tudo que me resta, ou seja o que eu mereça por ser exatamente quem sou. Por querer as coisas do meu jeito. Por ter cruzado limites que dentro do nosso meio são proibidos para as mulheres. Sou a escolha de um futuro incerto. E nenhum homem quer isso quando se casa.Minha mãe havia convidado alguns capitães e suas esposas, que certamente gostariam de estar presentes, nem tanto pelo anuncio, mas por quem o faria. A esperada união entre Cavalieris
Saio do elevador e sigo tranquilamente até o confortável apartamento que tenho ocupado desde que cheguei a Chicago. O Sr. Cavalieri foi gentil o suficiente para me oferecer alguns de seus imóveis na cidade, garantindo que eu estivesse bem instalado durante minha estadia. Já é tarde e a noite foi tensa e estranha. Ainda há uma das criadas acordada e ela se aproxima da sala onde estou, acabando de tirar o paletó. Afundo-me em uma poltrona de couro, e digo a ela que pode ir dormir, que não preciso de nada.Assim que a mulher deixa o ambiente, tento relaxar e fecho os olhos. Suspiro demoradamente, refletindo sobre o turbilhão de emoções que me invadem. Há muito tempo, eu não cogitava a hipótese de voltar a me casar. Não depois de Chiara. Não depois de perdê-la de maneira tão cruel, e também ao nosso primeiro bebê. Era algo que mesmo dez anos depois, eu tenho certeza que nunca irei superar. Quando se está na escuridão, a gente acaba se acostumado, e não importa quanto tempo se passe, eu es
Saí do quarto de Alessa com um sorriso forçado nos lábios, tentando ignorar a ansiedade que me consumia. Não faz nem um dia que meu noivado com o executor Bosco Capasso foi anunciado, e aqui estou eu, tentando manter a postura de que está tudo bem, quando tudo o que eu consigo pensar é como escapar dessa união! Minha irmã está radiante, como sempre, enquanto se prepara para sua festa de aniversário. Eu queria estar tão feliz quanto ela, mas não posso evitar a tensão que parece ter tomado conta de nossa mãe, que sem dúvida nenhuma, me culpa por estar nessa situação.— Senhorita Diana — uma criada se aproxima discretamente — sua mãe pede que vá ao escritório.Enquanto caminhava pelos corredores, eu sentia o peso da responsabilidade e das expectativas que a máfia impunha sobre mim. Ser obrigada a me casar com um homem dez anos mais velho, apenas por conveniência e para manter a estabilidade entre as famílias, é sufocante. E não é nem de longe o que Charlotte planejava para mim.Cheguei à
Depois daquela noite, parece que tudo passou como um borrão diante dos meus olhos. Como se eu tivesse chegado ao meu limite, e todo o resto ao meu redor. Acho que, por alguns dias, oscilava entre tentar recuperar o mínimo de bom senso e dignidade e escapar dessa casa, e ignorar que talvez as palavras realmente tenham poder.Voltei do hospital há alguns minutos, onde passei parte da tarde na capela. Giulia está em estado grave depois de agir como uma tola e ficar entre Michael Villani e Nikolai Dotreiev, servindo de escudo para o marido, levando um tiro em seu lugar, antes que ele pudesse atirar no russo. Nikolai está morto, felizmente. Mas isso não sai da minha cabeça nem por um instante, não depois do que eu disse a ela. Talvez ela quisesse conversar naquela noite, e tudo que eu fiz foi culpá-la por tudo que está acontecendo. Talvez ela só quisesse me contar que está grávida, e tudo que eu disse a ela me faz queimar de vergonha e arrependimento.— Não seja tola, Diana — ouço minha mã