Sofia Narrando
No dia seguinte à festa de aniversário da Emily, nossos amigos iriam voltar para a cidade. Mas o destino tem seus próprios métodos de resolver as coisas. O dia amanheceu muito chuvoso, impedindo que eles pudessem viajar. Junto com o Lucas vou até onde eles estão hospedados para acabar com esse contrato de uma vez por todas. A chuva forte, a pista escorregadia eram cenários de que a vida da minha filha foi sempre na escuridão, mesmo diante de tantas cores ela não viveu da forma correta e com essa certeza em mente começo uma conversa com meu marido tentando de todas as formas fazer ele aceitar o fim do contrato. — Lucas, a Emily tem que começar a viver, eles não educaram o Gabriel para este casamento. Sem falar que toda essa história foi feita por eles. Não aguento mais, Minha filha precisa viver, conhecer alguém e se apaixonar, ela precisa viver. — Pare de falar besteiras, esse acordo não será desfeito, não sei se você lembra, mas assinamos um contrato onde entregamos a eles todos nossos bens, inclusive o restaurante e a nossa fazenda. — Lucas, você não entende. O que é um contrato diante da felicidade da nossa filha? — rebati, sentindo meu coração acelerava a cada palavra. Ele virou o rosto para a janela do quarto, o som da chuva martelando o telhado como uma sinfonia desesperada. Seus olhos, sempre tão frios e calculistas, agora pareciam hesitar, mesmo que por um breve segundo. — Não é só sobre nós. É sobre a família. É sobre honra, é sobre legado — respondeu, com a voz cansada, como se dissesse essas palavras apenas para convencer a si mesmo. — Honra? — Soltei uma risada amarga. — Que tipo de honra é essa que prende a vida da nossa filha como uma moeda de troca? Você vê isso, Lucas? Ela nunca teve escolha. E agora, quando finalmente poderia, você quer que ela continue como prisioneira. Ele permaneceu em silêncio, os olhos fixos na dança hipnótica das gotas de chuva que escorriam pela vidraça. Por um instante, pensei ter visto uma fissura em sua armadura, uma rachadura minúscula que deixava escapar uma fração de dúvida. Aproveitei o momento e avancei um pouco mais, a voz embargada mas firme: — Lucas, se continuar assim, vamos perder a Emily para sempre. Não estou falando de perdê-la fisicamente, mas de perder a alma dela, o brilho nos olhos que ela ainda tem, por menor que seja. Se ela continuar nesse caminho, tudo o que restará será um corpo vazio, obediente, mas infeliz. Ele fechou os olhos por um momento e respirou fundo. Pela primeira vez em muito tempo, ele parecia vulnerável. Mas quando abriu os olhos novamente, eles estavam escuros e resolutos. — Se eu disser que aceito desfazer o contrato, eles vão vir atrás de nós, você sabe disso. Não é apenas um acordo de papel. É uma promessa. E quebrar uma promessa com aquela família tem consequências. — E nós lidamos com as consequências juntos. Pela Emily, pelo futuro dela. Não quero que ela olhe para trás e veja que os pais não tiveram coragem de lutar por ela. Um trovão retumbou ao longe, fazendo a casa vibrar levemente. O silêncio entre nós era espesso, como a tempestade lá fora. O som da chuva parecia agora mais um lembrete de tudo o que estava em jogo, uma contagem regressiva para uma decisão que mudaria tudo. Lucas fechou os punhos ao lado do corpo, os nós dos dedos ficando brancos. Finalmente, ele se virou para mim, e pela primeira vez, vi medo em seus olhos. — Vamos acabar com isso — ele disse, a voz baixa e tensa. — Mas se algo der errado, se eles decidirem retaliar... — Ele não completou a frase. Não precisava. O peso daquelas palavras já estava cravado em nós há anos. Um nó se formou na minha garganta, mas uma faísca de esperança brilhou em meio à tempestade. Por Emily, pela liberdade dela, estávamos dispostos a enfrentar qualquer tempestade que viesse. Mas o destino tem seus próprios métodos e mais uma vez um raio partiu o céu e dessa vez veio em nossa direção fazendo com que o Lucas perdesse o controle do carro e de repente tudo se tornou um borrão. O som da chuva contra o vidro do carro era ensurdecedor, mas nada se comparava ao grito abafado que escapou da minha garganta quando senti o impacto. Tudo aconteceu rápido demais. O clarão do raio iluminando a estrada, o barulho dos pneus derrapando no asfalto molhado e, então, o carro girando, descontrolado, como se a gravidade tivesse perdido o sentido. Quando finalmente paramos, tudo ao meu redor parecia em câmera lenta. O som da chuva parecia distante agora, abafado por um zumbido insistente em meus ouvidos. Pisquei algumas vezes, tentando organizar os pensamentos, mas minha cabeça latejava. Meus olhos buscaram Lucas ao meu lado, e um frio percorreu meu corpo ao vê-lo com a testa apoiada no volante, o sangue escorrendo lentamente por sua têmpora. — Lucas! — Minha voz saiu trêmula, quase inaudível, enquanto eu me inclinava em sua direção, ignorando a dor que irradiava pelo meu corpo. — Lucas, me escuta! Você está bem? Ele gemeu baixo, um som que me deu um fio de esperança. Com as mãos trêmulas, toquei seu rosto, tentando chamá-lo de volta. — Estou aqui — ele murmurou, a voz rouca, os olhos ainda fechados. — Você está… está machucada? Uma risada nervosa escapou de mim, um som quebrado entre o alívio e o pânico. — Não se preocupe comigo. Você bateu a cabeça. Precisamos sair daqui. Olhei pela janela, tentando entender onde estávamos. O carro havia saído da estrada, parando em um barranco raso. A chuva ainda caía pesada, e as luzes dos faróis iluminavam uma paisagem distorcida pelas gotas na janela. O motor havia morrido, e o silêncio agora era cortado apenas pelo som da chuva e do vento. — Consegue se mover? — Perguntei, tentando esconder o pânico em minha voz. Lucas abriu os olhos lentamente, piscando para afastar o sangue que escorria em sua visão. Ele tentou se mexer, mas seu rosto se contorceu de dor. — Acho que torci o ombro — ele disse, a voz arrastada. — Mas posso sair. Lutando contra a dor, desci do carro. O vento gelado bateu contra mim, e meus pés afundaram na lama, mas eu não me importei. Corri até o lado de Lucas e abri a porta com esforço. Ele precisou de minha ajuda para sair, e juntos nos afastamos do carro, que ainda soltava um cheiro estranho de combustível. — Precisamos de ajuda — murmurei, olhando ao redor, mas não havia sinal de civilização. Apenas a estrada deserta atrás de nós e a escuridão à frente. Lucas apertou minha mão, me puxando levemente para perto. — Vamos ficar bem. Vamos resolver isso, por Emily, lembra? Assenti, mas meu coração estava pesado. O que o destino ainda reservava para nós? A chuva parecia sussurrar promessas de mais provações, mas eu sabia que, enquanto estivéssemos juntos, enfrentaríamos qualquer coisa. Segurando firme na mão de Lucas, e quando pensei que iríamos sair dessa situação uma explosão aconteceu e simplesmente apaguei.Emily Narrando… Estou em meu quarto quando o telefone toca sem parar. Desço as escadas, e vou atender. A voz do outro lado da linha me dá uma notícia que mudaria toda minha vida. Algo que por mais que tente lutar contra não tem nada que possa fazer. Meus pais sofrerem um acidente deixando-me sozinha, meu coração se aperta com a notícia não tenho mais ninguém, não irei escutar mais a voz da minha mãe em meus momentos de incerteza, não receberei o abraço do meu pai depois das minhas conquistas. Estou sozinha, sinto o chão sumir sob meus pés. Tudo à minha volta parece embaçado, como se uma névoa densa tivesse envolvido o ambiente e apagado qualquer sinal de vida ao meu redor. A voz do outro lado da linha continua falando, mas as palavras parecem ecoar em uma bolha distante. É como se cada sílaba golpeasse meu peito, tornando a dor mais profunda. De alguma forma, meus joelhos encontram o chão. Não sei quanto tempo fico ali, imóvel, agarrando o telefone como se ele fosse a única cois
Emily narrando…Depois de uma pequena conversa com a tia Laura, durante a viagem acabei adormecendo durante o caminho até chegar onde seria meu novo lar.Acordo depois de um tempo, o tio Daniel já tinha estacionado em frente a uma bela casa com jardins amplos.— Emily, essa será sua nova casa, espero que você esteja gostando. — confirmo e baixo o olhar, a palavra “nova casa”, mexeu um pouco comigo, me fez lembrar que meus pais não estão ao meu lado.Tia Laura parecendo perceber meu desconforto se aproxima, e me abraça.— Querida, imagine que veio passar umas férias aqui, sei que não será fácil, mas seus pais estarão sempre ao seu lado.— Perdão, titia, não quero parecer mal agradecida é que a falta deles ainda é muito forte, não sei como fazer para amenizar a dor que insiste em queimar dentro de mim.— Não, peça perdão, sei o quanto pode ser doloroso. Quando minha Mãe faleceu, seus pais ficaram ao meu lado todo momento,
Emily narrando…Após uma conversa com a tia Laura, resolvi que seria melhor ficar em meu quarto, pois não estava preparada psicologicamente para encontrar o Gabriel.Sei que não irei conseguir ignorá-lo por muito tempo, pois irei morar na mesma casa que ele, mas mesmo assim não irei descer para o jantar. E tem mais, preciso saber do conteúdo do envelope e entender por que tia Laura ficou tão nervosa ao vê-lo em minhas mãos.Pego o envelope e abro, e o que estava escrito me desestabilizou totalmente:Contrato de casamento Gabriel e Emily. Minhas mãos ainda tremem enquanto seguro o contrato. Meu coração parece uma bomba-relógio prestes a explodir, e meu peito aperta com a mistura de raiva, confusão e indignação. Tento respirar fundo, mas cada tentativa falha, deixando-me mais sufocada. Não consigo simplesmente ficar aqui. Preciso de respostas. Preciso saber o que está acontecendo, e somente tia Laura e tio Daniel podem explicar.Levanto-me, decidido a descer e confrontá-los, mesmo que
Gabriel Narrando...Mais uma vez, meus pais foram para o interior visitar seus amigos de faculdade. Mas uma vez, meu pai perguntou se não vou com eles. Não entendo o porquê dessa insistência, não gosto de lugares pacatos, gosto de curtição, balada, pegar sem me apegar, embora agora esteja namorando a Melina, ela é igual a mim, gosta de curtir e acredito que somos compatíveis.— Gabriel, tem certeza de que não quer ir conosco? — pergunta minha mãe mais uma vez.— Mãe, pela última vez, não vou, não vejo o porquê de ir para um lugar onde não é para mim.— Não tem curiosidade de saber como a Emily ficou depois de adulta?As palavras dela me fizeram pensar um pouco. Ela é a filha do casal que eles sempre visitaram, éramos muito próximos quando crianças, mas acredito que hoje somos bem diferentes.— Não, mamãe, apesar de que ela pode estar namorando ou algo do tipo.— Duvido muito.Depois que meus pais saíram, o silêncio tomou conta da casa. Normalmente, eu aproveitaria a ausência deles pa
Gabriel Narrando...No dia seguinte, acordo atordoado, mesmo com a Melina em meus braços, fiquei a noite inteira pensando nas palavras da minha mãe e nas insinuações sobre a Emily. Tento me levantar, mas os braços da Melina me prendem.Meu celular toca sem parar e acaba acordando a Melina.— Atende logo isso, que saco. Ninguém pode dormir em paz.— Melina, bom dia para você também. Meus pais estão ligando, deve ter acontecido algo.Levanto-me da cama já atendendo o celular, deixando uma Melina irritada para trás.— Pai, bom dia, aconteceu algo? Era para vocês já terem chegado?— Então, filho, aconteceu um acidente com a Sofia e o Lucas e eles não resistiram. Nós vamos ficar uns dias aqui para organizar tudo com a Emily, até ela poder ir conosco para Nova Iorque.Minha mente deu um giro de 360º, como assim a Emily em morar aqui?— Pai, a Emily, como ela está? Precisa que eu vá?— Ela está muito abalada, mas sua mãe está com ela. Dando o apoio de que precisa. E não, não precisa vir, já
Gabriel Narrando...Os dias passam em um borrão. Meus pais finalmente chegam, e com eles, Emily. Eu ainda não a vi. Meu pai, no entanto, faz questão de me ligar para conversar assim que chegar.Estamos sentados no escritório dele. Ele fecha a porta e suspira antes de começar.— Gabriel, preciso falar algo importante, e quero que me escute com atenção. — Seu tom sério já me deixa tenso.— Tudo bem, pai. O que aconteceu?— No passado, o Lucas e eu fizemos um acordo quando vocês eram duas crianças que não se largavam. Na verdade, um contrato... — Ele hesita, procurando as palavras certas. — Para um casamento entre você e Emily.Minha mente parece travar. Por um momento, penso que não ouvi direito.— O quê? Pai, você está falando sério? — Meu tom sobe, e a incredulidade é clara.– Sim. É uma forma de garantir o futuro dela, já que perdeu os pais. Você sabe que nós estamos em dificuldades financeiras. É a melhor decisão para todos. Pois as terras da fazenda são muito lucrativas.— E a Meli
Emily Narrando... — Tia, por que fizeram isso? Por que decidiram sobre nossa vida? — Perdão, filha, na época pensava que era o certo a se fazer. Vocês eram tão ligados, tão próximos que imaginávamos que seriam inseparáveis. Quando recebemos a notícia do pai do Daniel e tivemos que vir embora, foi de partir o coração ver vocês chorando abraçados um ao outro. — Tia, éramos duas crianças, naquele momento era o fim do mundo, qualquer coisa. Não entendíamos nada, só sentíamos. E o que eu sentia naquele dia... era como se alguém tivesse arrancado parte de mim. Minha tia me olhava com um peso nos olhos que eu nunca tinha notado antes. Era como se ela também carregasse a culpa de uma decisão que talvez nem tivesse sido dela. Ela suspirou fundo e tocou-me a mão, como se procurasse as palavras certas para justificar o que era impossível justificar. — Eu sei, Emily. Sei que parece cruel agora, e talvez tenha sido. Mas na época, tudo aconteceu tão rápido. Meu sogro teve um infarto e o
Gabriel Narrando... Após a Melina discutir com a Emily, fui levar a Melina em casa. — Dorme aqui, Gabriel — pede a Melina. — Não posso, tenho que ir para casa, o clima lá não está bom e não sei como está depois do que você fez com a Emily. — Agora a culpa é minha, Gabriel? Eles decidem sua vida por meio de um maldito contrato e eu sou culpada de colocar aquela garota no lugar dela. — Melina, você não entende, a Emily está passando por muita coisa nos últimos dias. Ela perdeu os pais, teve que se mudar para uma cidade que ela não conhece ninguém e ao chegar descobrir que está prometida em casamento a um cara que está namorando outra. — Esta com piedade? Gabriel, ela é uma oportunista, está se fazendo de vítima para ficar com você. — Vai dizer que ela se aproveitou da morte dos pais dela também, Melina? Não viaja, nós somos o que a Emily tem mais próximo de uma família. Fica em casa e pensa em todos os absurdos que você falou e quando estiver mais tranquila, conversamos. Saio da