Eu me vi num precipício, eu vi o nada a minha frente... E eu podia recuar, porque eu sabia que mais a frente eu estaria em queda livre sem ao menos saber o que tinha lá embaixo. Sabe quando você dá mais um passo mesmo sabendo que pode dar merda? Foi o passo que eu não dei. Eu estanquei. E esse é o problema de uma guerra, as decisões não tomadas fazem toda diferença! Eu sabia muito bem disso! Eu tinha duas opções: Recuar ou seguir adiante e ver no que daria a minha queda. Eu estanquei na ponta do precipício. E como o mundo não é o precioso conto de fadas literário, a vida decidiu por mim. E de repente, não havia mais chão...Depois da conversa que tive com dona Giovanna eu não vi o Ary durante todo o final de semana. Ele havia viajado na tarde daquele mesmo dia. Eu preferi esquecer o assunto e focar nos últimos preparativos para minha viagem. Durante os dias em que falei com minha mãe, ela a todo o momento tentava me tranqüilizar, mas eu podia ver o seu mundo ruindo, mesmo com uma vó c
Ele gesticulou para que eu entrasse, passei pela porta com dificuldade. Mancando por causa dos chutes. Se eu me olhasse no espelho, jurava que estava irreconhecível. Durante o trajeto havia feito um coque no cabelo, pensando na alternativa de ser pega novamente e o criminoso usar a tática do puxão como havia usado. Eu havia deixado o capote que usava para trás. Estava apenas com um cropped e uma calça jeans. Eu estava suja e ralada pela queda. O segurança tentou me ajudar me dando à mão para que eu me apoiasse, recusei. Eu não queria ajuda, queria entender o que estava acontecendo e porque haviam tentado me seqüestrar ou me matar.— Eu vou pedir que você espere aqui. — O homem falou quando chegamos à frente de um escritório depois de passar por um corredor e subir escadas. Seu sotaque era pesado.— Eu não vou esperar porra nenhuma. — Falei. — Você ou algum dos seus homens vão me conter? Porque se não, eu vou entrar na porra desse escritório agora. — Falei furiosa.— Você não pode faze
Ele assentiu novamente sem coragem de perguntar.— Eu tenho meu restaurante aqui, e eu vou viajar amanhã. E se você está metido com o alto escalão, provavelmente eles conhecem a minha vida. Só acho burrice enviar apenas um homem para seqüestrar a filha de um militar, e por sinal, um homem bem burro. — Eu ri. Não sei se de raiva ou realmente porque a situação foi ridícula. — Não há relatos do meu treinamento militar, mas isso é bem obvio. Enfim... Eu espero que isso não recaia sobre a minha família.— Não vai. — Ele respondeu por cima da lata.— Ok. — Falei me virando para ir embora. — Sobre nós dois... — Me virei para ele novamente. — Sua mãe tinha razão. Eu tenho muito a perder. E não estou disposta a deixar todos os outros na escuridão para ser a luz de alguém. Mesmo que eu ame muito esse alguém. — Suspirei. — Eu não posso... — Engoli a dor que rompeu minha garganta.— Eu sei. — Ele disse. Sua voz saiu embargada. Seus olhos brilharam e por um instante eu senti sua dor de onde estava
— Foi à vida que eu escolhi. Quando você entra neste mundo e jura lealdade, não há volta. É até o fim. Eu não poderia ou posso abandonar meu filho agora, e acima de tudo, eu amo o Heiko. Não concordo com nada do que ele faz. Embora eu esteja envolvida porque sou uma Meyer também, não posso me isentar de minha culpa. Tenho consciência. Mas o amor nos leva a caminhos tortuosos, sabe. E então um dia você ultrapassa um limite onde não há mais volta. — Ele parou por alguns segundos e me encarou. — Foi só uma pequena torção. Com uma tala logo melhora.— Você é medica? — Perguntei.— Enfermeira. Era preciso se formar em alguma coisa para gastar o tempo. Enfermagem. É útil quando seu filho ou seu marido tem o costume de chegar em casa quebrado. Ou quando você fica esperando que ele vá passar pela porta completamente ensangüentado.— Entendi. — Suspirei. — Por que vieram diretamente até a mim? — Perguntei curiosa com aquele fato.— Você já me viu pisar os pés na Meyer Haus? Ou sair de casa soz
MEYEREu não sei em que momento senti que estava perdendo o ar, mas de repente, eu estava. Meu coração se estilhaçou em milhões de pedacinhos ao vê-la toda machucada na porta do meu escritório. Eu não sei. Eu não entendo. Não entendo em que momento fui tão burro a ponto de deixar chegar a este ponto, não sei em que momento baixei tanto a guarda para que chegasse até aonde chegou. Mentira. Eu sei sim. Soube no primeiro momento em que a vi, soube quando a beijei, quando a levei para cama... Fui egoísta demais para abrir mão! Em quatro meses eu descobri o amor da minha vida, e nesses quatro meses havíamos criado um rival a nossa altura no Brasil. E então eu voltei pra minha realidade, eu sou um Meyer e não posso amar ninguém. Por um momento de merda eu pensei que ela fosse à mulher que tomaria o rumo da minha mãe, mas me vi aliviado quando ela não tomou, porque este mundo não é pra ela, esse mundo não é digno dela. Quando ela entrou em meu escritório furiosa, eu senti meu mundo ruir sob
— Oi... — Ele falou com as mãos no bolso do terno ao me encarar na porta da minha casa. — Podemos conversar?— Que seja rápido. — Falei. Minha voz estava rouca do tanto que eu havia chorado a noite.Ele entrou sendo guiado por mim até a sala, onde minha mala já estava arrumada e pronta para viagem. Eu já estava arrumada, havia colocado uma calça jeans e como o tempo estava frio, um moletom e um tênis – o que foi conveniente para esconder o hematoma na costela e a tala em meu braço esquerdo. - Meu cabelo estava preso num rabo de cavalo e eu tirei o óculo escuro que escondia meu rosto lhe mostrando olhos inchados. Um hematoma surgiu perto de minha sobrancelha.— Você está melhor? — Ele perguntou quando eu me sentei no sofá ao seu lado.— Estou bem. — Falei sendo direta. — E você?— Vivo. — Ele falou também sendo direto. Eu poderia ver claramente o vazio. Ele havia sido tomado pela escuridão de suas responsabilidades, eu havia sido o motivo.— Hum. — Esbocei.— Vim lhe pedir desculpas. —
Quando chegamos ao hospital municipal fomos diretamente para a ala de internação do hospital. Não podiam ficar mais de duas pessoas, então o Carlos saiu para que eu pudesse entrar juntamente com a minha mãe, o Adam ficou ao lado de fora da porta.— Meu amor... — Falei indo até minha vó. Seu rosto era cansado. Ela abriu um enorme sorriso ao me ver.— Minha Jasmim... — Ela falou animada.— A benção minha vó? — Falei pegando sua mão e a beijando.— Deus te abençoe, menina. — Ela disse segurando minha mão sobre a sua.— Como a Senhora está se sentindo? — Perguntei dando um beijo em sua testa.— Viva. — Ela riu. — E você? — Minha vó tinha sempre bom humor para lidar com as tempestades alcançadas pela vida.— A Senhora continua não prestando né? Estou bem. E com saudade. — Falei sorrindo.— Já comeu? — Ela perguntou preocupada.— Eu já, e a Senhora? — Perguntei.— Também. A comida daqui até que é boazinha. Não se compara a minha, mas dá pra engolir. — Ela disse fazendo careta.— Eu estava c
Não há muito que fazer quando se está em queda livre... Primeiro você pensa na possibilidade de segurar em algo durante o caminho e quando percebe que não há nada em que se segurar você simplesmente se deixa cair. É preciso lidar com as conseqüências da queda, e se não houve morte, é possível se arrastar. Então como a queda não me matou, eu me arrastei catando caco por caco de meu ser e fui juntando-os.Um mês se passou como se fosse um dia de tão rápido. Eu estava tão imersa em minha rotina que em algum momento – não sei qual – acabei perdendo a noção do tempo. O Adam passou a ser parte da coisa toda. Ele estava onde eu estava, se não do meu lado, ao lado de fora me esperando. O peguei algumas vezes em ligação com o Ary e me esforcei para me convencer de que não queria ouvir a voz dele, de que aquele aperto no peito não era saudade. Mas era. Eu sabia que era. Uma saudade indescritível. Forcei-me a focar apenas no bem estar da minha mãe. Levantava mais cedo que todos, preparava o café