MEYEREu não sei em que momento senti que estava perdendo o ar, mas de repente, eu estava. Meu coração se estilhaçou em milhões de pedacinhos ao vê-la toda machucada na porta do meu escritório. Eu não sei. Eu não entendo. Não entendo em que momento fui tão burro a ponto de deixar chegar a este ponto, não sei em que momento baixei tanto a guarda para que chegasse até aonde chegou. Mentira. Eu sei sim. Soube no primeiro momento em que a vi, soube quando a beijei, quando a levei para cama... Fui egoísta demais para abrir mão! Em quatro meses eu descobri o amor da minha vida, e nesses quatro meses havíamos criado um rival a nossa altura no Brasil. E então eu voltei pra minha realidade, eu sou um Meyer e não posso amar ninguém. Por um momento de merda eu pensei que ela fosse à mulher que tomaria o rumo da minha mãe, mas me vi aliviado quando ela não tomou, porque este mundo não é pra ela, esse mundo não é digno dela. Quando ela entrou em meu escritório furiosa, eu senti meu mundo ruir sob
— Oi... — Ele falou com as mãos no bolso do terno ao me encarar na porta da minha casa. — Podemos conversar?— Que seja rápido. — Falei. Minha voz estava rouca do tanto que eu havia chorado a noite.Ele entrou sendo guiado por mim até a sala, onde minha mala já estava arrumada e pronta para viagem. Eu já estava arrumada, havia colocado uma calça jeans e como o tempo estava frio, um moletom e um tênis – o que foi conveniente para esconder o hematoma na costela e a tala em meu braço esquerdo. - Meu cabelo estava preso num rabo de cavalo e eu tirei o óculo escuro que escondia meu rosto lhe mostrando olhos inchados. Um hematoma surgiu perto de minha sobrancelha.— Você está melhor? — Ele perguntou quando eu me sentei no sofá ao seu lado.— Estou bem. — Falei sendo direta. — E você?— Vivo. — Ele falou também sendo direto. Eu poderia ver claramente o vazio. Ele havia sido tomado pela escuridão de suas responsabilidades, eu havia sido o motivo.— Hum. — Esbocei.— Vim lhe pedir desculpas. —
Quando chegamos ao hospital municipal fomos diretamente para a ala de internação do hospital. Não podiam ficar mais de duas pessoas, então o Carlos saiu para que eu pudesse entrar juntamente com a minha mãe, o Adam ficou ao lado de fora da porta.— Meu amor... — Falei indo até minha vó. Seu rosto era cansado. Ela abriu um enorme sorriso ao me ver.— Minha Jasmim... — Ela falou animada.— A benção minha vó? — Falei pegando sua mão e a beijando.— Deus te abençoe, menina. — Ela disse segurando minha mão sobre a sua.— Como a Senhora está se sentindo? — Perguntei dando um beijo em sua testa.— Viva. — Ela riu. — E você? — Minha vó tinha sempre bom humor para lidar com as tempestades alcançadas pela vida.— A Senhora continua não prestando né? Estou bem. E com saudade. — Falei sorrindo.— Já comeu? — Ela perguntou preocupada.— Eu já, e a Senhora? — Perguntei.— Também. A comida daqui até que é boazinha. Não se compara a minha, mas dá pra engolir. — Ela disse fazendo careta.— Eu estava c
Não há muito que fazer quando se está em queda livre... Primeiro você pensa na possibilidade de segurar em algo durante o caminho e quando percebe que não há nada em que se segurar você simplesmente se deixa cair. É preciso lidar com as conseqüências da queda, e se não houve morte, é possível se arrastar. Então como a queda não me matou, eu me arrastei catando caco por caco de meu ser e fui juntando-os.Um mês se passou como se fosse um dia de tão rápido. Eu estava tão imersa em minha rotina que em algum momento – não sei qual – acabei perdendo a noção do tempo. O Adam passou a ser parte da coisa toda. Ele estava onde eu estava, se não do meu lado, ao lado de fora me esperando. O peguei algumas vezes em ligação com o Ary e me esforcei para me convencer de que não queria ouvir a voz dele, de que aquele aperto no peito não era saudade. Mas era. Eu sabia que era. Uma saudade indescritível. Forcei-me a focar apenas no bem estar da minha mãe. Levantava mais cedo que todos, preparava o café
Um mês e meio. Metástase. Esse foi o resultado do último exame da minha vó. A quimioterapia não havia funcionado e mesmo com todos os esforços para que houvesse resultados, ela passou para a fase IVB. Sem possibilidade de cura e apenas tratamento paliativo. Apenas um mês e meio. Minha mãe segurou a mão de minha vó, e quando ninguém além de mim e Adam estava vendo, ela desabou. Eu vi seu mundo ruir diante dos meus olhos enquanto segurava sua mão e segurava o choro. Era o que precisava ser feito. Dona Catia sorriu em meio a todo o cansaço e disse que queria voltar pra casa, que queria dormir em sua cama novamente e que tudo aquilo estava a deixando mais exausta do que já estava. Ela disse que estava tudo bem, que éramos forte e que passaríamos por essas tempestades como uma fortaleza. Foi assim que eu as deixei para voltar a Holambra e pegar mais peças de roupas minhas e de minha mãe, e verificar o funcionamento do restaurante.Quando desci do carro de frente a minha casa às oito da noi
Não havia sido um caminho fácil até o cargueiro, o Silva era um homem bastante protegido, mas nada é impossível para um Meyer. Ele tinha brechas, e nem perceberia que passamos por elas. Ele se arrependeria de ter jogado sujo quando visse quantos homens perdeu e o rastro de sangue que deixamos até chegar nele. Antes que eu chegasse ao meu escritório, recebi uma mensagem do Adam avisando que estava ao lado de fora da porta dos fundos. Ele havia falado comigo durante este tempo em que esteve com Jasmim. Dizia-me o quanto ela estava sofrendo e que era notável, mas que não dera o braço a torcer em nenhuma das vezes, havia me dito que Jasmim não chorou uma única vez sequer mesmo quando ele viu todo mundo desabar. Que ela acordava mais cedo que todos e dormia mais tarde que todos, que fazia tudo e estava sempre incentivando, apoiando e consolando a todos, mas que não se permitia ser consolada. Adam me disse que ela estava destruída por dentro e que algumas raras vezes fora possível ver em
Ela abriu os olhos e me encarou, eu retribui. Aqueles olhos, eu só ali me dei conta da saudade que sentia de encarar aqueles olhos. Observei seu rosto, seus traços. Suspirei. Era a imagem que eu precisava para acalmar meu coração. Ela estava ali a minha frente, não era só mais o desenho da garota na janela que eu observava toda vez que a saudade apertava. Era ela. Com o rosto a centímetros do meu e os lábios tão perto que eu podia sentir sua respiração. Nos beijamos. Não partiu de mim, ou dela. Foi simples assim. Quando vi, já estávamos nos beijando. Um beijo urgente, porém suave. Minha língua abriu espaço em sua boca, minhas mãos passaram para a sua cintura, suas mãos pelo meu pescoço. Eu sentia seu toque urgente em minha nuca, outrora em meus cabelos. Ela ainda me queria tanto quanto eu a queria. Mesmo que nós dois soubesse o que era o certo a se fazer. Foda-se ao certo. Minutos após o beijo estávamos fechando a porta do lado de dentro do restaurante, e como numa decisão desesperada
Três meses se passaram depois que fiz amor com Ary Meyer na cozinha do doce Jasmim. Três meses se passaram desde a última vez em que vira seu rosto. E novamente eu voltei para o automático ao pisar os pés na casa da minha vó, voltei a ser a âncora que todos precisavam e na rotina conturbada que minha vida se retornou, eu parei de me enxergar no espelho. Desde que soubera do estado da minha vó eu nunca mais pegara em minha câmera para tirar uma foto, apenas para observar o sorriso do Ary sem camisa sob a luz do luar numa cama de hotel ao meu lado, ou quando ele estava distraído na única vez em que me permiti andar em algo que flutuasse sob as águas desde minha última missão fracassada. Eu esqueci os meus planos e passei a cuidar dos planos da minha mãe e da alegria da minha vó. Dona Catia havia voltado para casa. Ela estava melhor conosco, comendo a comida que gostava, ao lado das pessoas que a amavam. A casa começou a receber muitas visitas, a família passou a vir nos ver e eu sentia