Não há muito que fazer quando se está em queda livre... Primeiro você pensa na possibilidade de segurar em algo durante o caminho e quando percebe que não há nada em que se segurar você simplesmente se deixa cair. É preciso lidar com as conseqüências da queda, e se não houve morte, é possível se arrastar. Então como a queda não me matou, eu me arrastei catando caco por caco de meu ser e fui juntando-os.Um mês se passou como se fosse um dia de tão rápido. Eu estava tão imersa em minha rotina que em algum momento – não sei qual – acabei perdendo a noção do tempo. O Adam passou a ser parte da coisa toda. Ele estava onde eu estava, se não do meu lado, ao lado de fora me esperando. O peguei algumas vezes em ligação com o Ary e me esforcei para me convencer de que não queria ouvir a voz dele, de que aquele aperto no peito não era saudade. Mas era. Eu sabia que era. Uma saudade indescritível. Forcei-me a focar apenas no bem estar da minha mãe. Levantava mais cedo que todos, preparava o café
Um mês e meio. Metástase. Esse foi o resultado do último exame da minha vó. A quimioterapia não havia funcionado e mesmo com todos os esforços para que houvesse resultados, ela passou para a fase IVB. Sem possibilidade de cura e apenas tratamento paliativo. Apenas um mês e meio. Minha mãe segurou a mão de minha vó, e quando ninguém além de mim e Adam estava vendo, ela desabou. Eu vi seu mundo ruir diante dos meus olhos enquanto segurava sua mão e segurava o choro. Era o que precisava ser feito. Dona Catia sorriu em meio a todo o cansaço e disse que queria voltar pra casa, que queria dormir em sua cama novamente e que tudo aquilo estava a deixando mais exausta do que já estava. Ela disse que estava tudo bem, que éramos forte e que passaríamos por essas tempestades como uma fortaleza. Foi assim que eu as deixei para voltar a Holambra e pegar mais peças de roupas minhas e de minha mãe, e verificar o funcionamento do restaurante.Quando desci do carro de frente a minha casa às oito da noi
Não havia sido um caminho fácil até o cargueiro, o Silva era um homem bastante protegido, mas nada é impossível para um Meyer. Ele tinha brechas, e nem perceberia que passamos por elas. Ele se arrependeria de ter jogado sujo quando visse quantos homens perdeu e o rastro de sangue que deixamos até chegar nele. Antes que eu chegasse ao meu escritório, recebi uma mensagem do Adam avisando que estava ao lado de fora da porta dos fundos. Ele havia falado comigo durante este tempo em que esteve com Jasmim. Dizia-me o quanto ela estava sofrendo e que era notável, mas que não dera o braço a torcer em nenhuma das vezes, havia me dito que Jasmim não chorou uma única vez sequer mesmo quando ele viu todo mundo desabar. Que ela acordava mais cedo que todos e dormia mais tarde que todos, que fazia tudo e estava sempre incentivando, apoiando e consolando a todos, mas que não se permitia ser consolada. Adam me disse que ela estava destruída por dentro e que algumas raras vezes fora possível ver em
Ela abriu os olhos e me encarou, eu retribui. Aqueles olhos, eu só ali me dei conta da saudade que sentia de encarar aqueles olhos. Observei seu rosto, seus traços. Suspirei. Era a imagem que eu precisava para acalmar meu coração. Ela estava ali a minha frente, não era só mais o desenho da garota na janela que eu observava toda vez que a saudade apertava. Era ela. Com o rosto a centímetros do meu e os lábios tão perto que eu podia sentir sua respiração. Nos beijamos. Não partiu de mim, ou dela. Foi simples assim. Quando vi, já estávamos nos beijando. Um beijo urgente, porém suave. Minha língua abriu espaço em sua boca, minhas mãos passaram para a sua cintura, suas mãos pelo meu pescoço. Eu sentia seu toque urgente em minha nuca, outrora em meus cabelos. Ela ainda me queria tanto quanto eu a queria. Mesmo que nós dois soubesse o que era o certo a se fazer. Foda-se ao certo. Minutos após o beijo estávamos fechando a porta do lado de dentro do restaurante, e como numa decisão desesperada
Três meses se passaram depois que fiz amor com Ary Meyer na cozinha do doce Jasmim. Três meses se passaram desde a última vez em que vira seu rosto. E novamente eu voltei para o automático ao pisar os pés na casa da minha vó, voltei a ser a âncora que todos precisavam e na rotina conturbada que minha vida se retornou, eu parei de me enxergar no espelho. Desde que soubera do estado da minha vó eu nunca mais pegara em minha câmera para tirar uma foto, apenas para observar o sorriso do Ary sem camisa sob a luz do luar numa cama de hotel ao meu lado, ou quando ele estava distraído na única vez em que me permiti andar em algo que flutuasse sob as águas desde minha última missão fracassada. Eu esqueci os meus planos e passei a cuidar dos planos da minha mãe e da alegria da minha vó. Dona Catia havia voltado para casa. Ela estava melhor conosco, comendo a comida que gostava, ao lado das pessoas que a amavam. A casa começou a receber muitas visitas, a família passou a vir nos ver e eu sentia
Quando meus homens entraram na casa tudo que eu sentia era o sangue ferver em minhas veias, entrei com a arma empunhada. Silenciosamente seguíamos as coordenada um dos outros, eu estava coberto e embora eu ainda sentisse a fisgada em meu braço esquerdo e ainda conseguisse me lembrar do rosto de pavor da minha mãe ao me ver sangrando, eu esperava ansiosamente por este momento. Pelo momento em que eu veria a cara do homem que me traiu, que armou a emboscada. Subimos as escadas e fomos até o seu quarto, num único ponta pé a porta se abriu. Ele não tinha como saber que estavam ali porque os seus homens foram apagados por uma arma com silenciador. A cara de assustado dele ao ser acordado com sua porta sendo arrombada foi demais. Uma mulher estava nua sobre sua cama. Sua expressão era de pavor.— Olá, meu caro amigo. — Falei entrando depois de dois dos meus homens. — Surpreso em me ver?Ele me encarou assustado.— Eu imagino que sim. — Falei pensativo. — Mas aqui estamos nós, eu estava ansi
A noite caiu rapidamente e logo a casa estava cheia com todos os nossos parentes. O velório aconteceu como todos acontecem. Todos chorando e se despedindo do corpo. Eu abraçava um e outro, apertava suas mãos e lhe dizia que ela faleceu dormindo, feliz porque agora estaria descansando. Que estava tudo bem, que ela sofreu demais e que agora estava descansando num lugar melhor. Eu disse isso tantas vezes que perdi a conta. Minha mãe passou todo o velório sedada, e ver o seu olhar sobre o corpo de minha vó me destruía. Dona Marília estava destroçada. Dona Catia por outro lado continuava dormindo em seu vestido branco de noiva, e com flores de Jasmim e cattleyas por todo o caixão. As duas flores preferidas de minha vó. Carlos disse que havia sido escolha dela. Eu não me permiti sair do seu lado nem por um segundo. E Adam só saiu do nosso lado quando o seu celular tocou e ele se afastou para atender. Eu sabia quem era, mas naquele momento não me importava.Passamos toda a noite velando o co
Quando só ficaram os mais próximos, eu pedi que dona Giovanna levasse minha mãe para casa. Ela estava abalada demais para ficar ali. Dona Giovanna concordou, e o único momento em que o vi se afastar de mim foi quando ele foi até os seguranças dar ordens. Vi metade dos seguranças seguindo minha mãe e dona Giovanna no carro e outra metade ficaram ali com ele formando um novo estado de alerta. Eu sabia que aquilo era mais do que necessário. Algumas pessoas tentavam entender o que ele estava falando com o segurança, mas suas ordens eram em alemão e em tom baixo e educado. O mais engraçado é que enquanto eu estava passando pela dor de perder mais uma pessoa importante em minha vida, as pessoas estavam tentando identificar quem era Ary. Vi o olhar desconfiado de alguns quando Ary falou algo em alemão para Adam e o mesmo respondeu.— Precisa de mim? — Adam veio até a mim.— Aonde você vai? — Perguntei.— Vou escoltar dona Giovanna. — Ele falou. — Confiança.— Tudo bem. — Sorri sabendo que el