Após uma semana desde aquela noite, encaro meu reflexo no espelho do banheiro da cafeteria onde passei a última hora tentando criar coragem.
As olheiras continuam sob meus olhos, relembrando as últimas noites em claro, pensando em qualquer alternativa que pudesse me ajudar a restabelecer minha vida sem envolver James Bennett. Mas como fazer isso em uma cidade desconhecida, sem ter onde morar, sem experiência profissional e com apenas dezoito anos? — Você pode fazer isso, Mia — murmuro para mim mesma, ajeitando pela décima vez a alça do meu vestido. Quinze minutos depois, estou novamente diante do imponente prédio espelhado. Hoje é tudo ou nada. Ou encontro James e tento recomeçar, ou terei que engolir meu medo e voltar para Portland. — Bom dia. Preciso falar com James Bennett — digo assim que paro na recepção. A recepcionista, diferente da semana passada, me olha de cima a baixo com uma sobrancelha erguida. — O Sr. Bennett não recebe ninguém sem hora marcada. — Eu… não sabia. Estive aqui semana passada e... — E deveria ter marcado um horário — ela me corta, num tom impaciente. — Se quiser, posso verificar a agenda dele para a próxima semana. Mordo o lábio, sentindo o desespero crescer. Não tenho uma semana. Com o dinheiro que Ethan deixou naquela noite quase no fim, mal tenho alguns dias. — Por favor, é importante. Você pode… — Todos dizem ser importante — ela suspira, quase revirando os olhos, enquanto volta sua atenção para o computador. Olho ao redor e vejo um grupo de pessoas se aproximando dos elevadores. A recepcionista se distrai atendendo ao telefone e, num impulso, me misturo entre eles. É tudo ou nada. Quando entro no elevador, uma mulher pergunta em qual andar vou, e respondo sem pensar muito: — Último. Por que é assim nos livros, não é? Os CEOs sempre ficam no topo, olhando a cidade abaixo deles. As pessoas vão descendo nos andares anteriores e, quando o elevador finalmente para no último andar, meu estômago revira ao ver dois seguranças saindo do elevador ao lado. Nossos olhares se cruzam por um segundo antes de eu começar a correr. — Ei! Pare aí! — um deles grita, mas continuo correndo pelo corredor, procurando freneticamente o nome dele nas portas. — Bennett… Bennett… Bennett… CEO, é isso! — murmuro ao encontrar a placa dourada. Não há nome, apenas o título. Empurro a porta com força, quase caindo para dentro da sala. Fecho-a rapidamente atrás de mim, tentando bloquear os homens que me perseguem, e me viro para encarar o ambiente. Então o vejo. Ethan Hayes. Ele está de pé, ao lado de uma enorme mesa de madeira escura, com alguns papéis nas mãos. Ao ouvir minha respiração ofegante, seus olhos verdes se fixam em mim. Sua expressão muda de surpresa para irritação em questão de segundos, e eu sinto meu corpo congelar. — Você? — Ethan pergunta, estreitando os olhos enquanto inclina a cabeça. — Que porra você está fazendo aqui? Minha respiração fica ainda mais irregular enquanto tento entender o que está acontecendo. Ethan é o CEO da Nexus Group? Como isso é possível? — Eu… estava procurando por… — gaguejo, ofegante, mas sou interrompida por uma risada seca e sem humor. — Eu deveria ter imaginado que aquilo não passava de uma desculpa — ele murmura, mais para si, antes de dar um passo à frente, fazendo com que eu me sinta pequena diante de sua presença. — Do que você está fala… Antes que eu consiga completar a frase, a porta atrás de mim se abre bruscamente e os dois seguranças entram. — Sr. Hayes, ela invadiu o andar. Quer que a levemos? — Um deles pergunta diretamente a Ethan, sem sequer olhar para mim. — Não. — Ele suspira, passando os dedos pelos cabelos loiros como se estivesse tentando controlar a paciência. — Saiam. Cuido disso. Os seguranças trocam olhares, mas obedecem, saindo em silêncio. Assim que a porta se fecha, Ethan volta sua atenção para mim, seus olhos estreitando como os de um predador. — Mia, Mia… — ele começa, esfregando a mão no rosto enquanto balança a cabeça negativamente. — Parece que invadir é sua especialidade, certo? Primeiro meu carro, agora a minha empresa… — Já disse que entrar no seu carro foi realmente um acidente… — murmuro, me sentindo pequena sob seu olhar gelado. — E hoje, não estou aqui por sua causa. Entrei porque achei que o CEO fosse James Bennett, não você! — James Bennett, claro. — Ethan ri novamente, seco. — Queria um dono e acabou dormindo com o outro por engano? O que pretendia, afinal? Abro a boca para responder, mas ele me interrompe com um aceno impaciente. Pega o telefone e me encara, sem me dar a chance de me defender. — Quer saber? Vamos resolver isso agora. — O que você está falando? — pergunto, incrédula com o tom acusatório. Ele não responde. Simplesmente aperta um número no telefone. — Venha na minha sala. Agora. — Ethan diz de forma curta, desligando antes que o outro lado possa responder. Meu coração acelera ainda mais, se é que isso é possível. A tensão na sala é sufocante, e Ethan não desvia o olhar de mim. — Bem — ele finalmente diz, se encostando na mesa e cruzando os pés. — Já que você parece tão interessada no CEO, será interessante ouvir sua explicação para tudo isso. Tento formular uma resposta, mas minha mente é puro caos. Pouco depois, a porta se abre abruptamente, e um homem alto entra, visivelmente confuso. — Por que tanta… — ele para de falar quando me olha. Seus olhos se fixam nos meus, e sua expressão muda rapidamente, piscando algumas vezes, como se estivesse processando o que está vendo. — Você é... — Mia Mitchell Bennett, sua filha — completo, apesar do nó na garganta. Vejo a boca de James abrir, mas nenhuma palavra sai. Ao meu lado, os olhos de Ethan se arregalam visivelmente. — Filha? — Ethan murmura quase inaudivelmente. — Deus, você é mesmo… minha filha. — James diz, incrédulo. Ele me encara por mais um segundo antes de desviar o olhar para Ethan, claramente confuso. — Mas… o que você está fazendo aqui? Por que está na sala do meu irmão? Sinto minhas pernas fraquejarem. Meu olhar alterna entre os dois homens. Irmão? O pouco que comi antes de vir sobe pela minha garganta sem aviso. Ignorando os olhares, corro até a lixeira mais próxima e vomito. Meu estômago se revira violentamente enquanto as memórias daquela noite invadem minha mente. Meu tio. Eu dormi com meu próprio tio.O gosto amargo na boca é o menor dos meus problemas. Minhas mãos tremem enquanto tento me recompor, evitando olhar para eles. A palavra “tio” continua ecoando na minha mente, me fazendo ofegar.— Mia, você está bem? — James pergunta, num tom preocupado. — Quer um copo d'água?Assinto levemente, finalmente virando para encará-los. No entanto, Ethan se mexe primeiro. Sem dizer nada, ele caminha até o frigobar no canto da sala.— Aqui. — murmura, me entregando uma garrafa de água.— Obrigada. — murmuro enquanto minhas mãos trêmulas seguram a garrafa. Dou um pequeno gole, tentando engolir o nó na garganta. James observa em silêncio enquanto Ethan se afasta, se sentando em sua cadeira de couro.— Mia… — James finalmente fala, olhando para mim. — Está melhor? Quer se sentar?— Estou bem, obrigada. — minto, mesmo sabendo que minha aparência me entrega. — Só… devo ter comido algo que me fez mal.— Certo. Agora posso saber o que aconteceu, Ethan? — James pergunta, mudando o foco da conversa.
Ethan respira fundo, ainda com o olhar fixo em mim, talvez decidindo se vale a pena continuar a provocação. Então, ele balança a cabeça e se afasta, caminhando até a janela. Com as mãos nos bolsos, ele encara a vista da cidade, ignorando completamente minha presença.Após alguns minutos de silêncio insuportável, decido abrir a boca. O desconforto de sua presença já é suficiente; o silêncio só piora.— Pensei que sua sala fosse em outro andar — murmuro, apertando nervosamente a barra do meu vestido. Ethan solta um riso seco, balançando a cabeça.— Aparentemente, James resolveu que seria uma boa ideia me pedir para esperá-lo aqui — ele responde, ainda de costas para mim. — Espero que você não tenha falado sobre o que aconteceu entre nós, porque não estou com a mínima paciência para aguentar um possível problema.Um possível problema. É isso que ele me vê, claro. Ou não teria deixado aquele dinheiro como se quisesse evitar qualquer dor de cabeça futura.Engulo em seco, sentindo minha gar
“Ethan Hayes” Eu não suporto confusão. Detesto desordem. Gosto das coisas claras, resolvidas, longe de problemas emocionais ou dramas desnecessários. Mas é exatamente isso que Mia acabou de trazer para minha vida: confusão. Eu não deveria estar surpreso. Desde o momento em que ela entrou no meu carro, com aquela cara de quem estava completamente perdida, percebi que algo poderia dar errado. E, claro, deu. Primeiro, foi a noite no hotel. Uma noite que deveria ter sido esquecida, como tantas outras. Depois, a revelação de quem ela era: filha do meu melhor amigo. Totalmente proibida para mim. E agora, como se o universo quisesse brincar comigo, meu sócio quer transformá-la na minha nova assistente. Perfeito. O som da porta se abrindo interrompe meus pensamentos. O eco inconfundível de saltos pelo chão de mármore anuncia sua chegada. Miranda Pierce. Advogada da Nexus. E... minha ex. Porque, claro, minha vida não tinha confusão suficiente. — Ethan — ela diz, aproximando-se com a c
“Mia Bennett”Bato continuamente com a caneta em cima da mesa enquanto leio pela terceira vez o parágrafo nos formulários da minha admissão. Não que eu tenha algum problema com interpretação de texto; muito pelo contrário, tudo que está escrito é bem fácil de entender. Mas minha mente insiste em vagar para outro lugar. Para ele.A decisão de aceitar ser a assistente de Ethan ainda parece surreal, como um daqueles sonhos ruins dos quais você acorda suando frio. Ou, no meu caso, não acorda. — Quem em sã consciência se colocaria de bom grado nessa posição? — resmungo.“Isso foi ideia sua, Mia”, minha mente responde, mas eu me recuso a aceitar que seja culpa exclusivamente minha. James também insistiu nisso.Respiro fundo e forço a atenção de volta ao papel, mas tudo o que consigo enxergar é a expressão impaciente de Ethan, considerando minha presença uma afronta pessoal.— Chega — resmungo, assinando a última página com um pouco mais de força do que deveria. Empurro os papéis para long
“Mia Bennett”Enquanto o motorista de James se aproxima da Nexus, aproveito o pouco tempo que me resta para pegar o pequeno espelho na minha bolsa e conferir a leve maquiagem que arrisquei fazer enquanto me arrumava. Pela primeira vez em semanas, não me pareço com um panda. A noite passada foi a primeira vez, em muito tempo, que consegui dormir sem que meus pensamentos me arrastassem para um buraco sem fim. E as olheiras que me acompanhavam desde a morte da minha mãe finalmente deram uma trégua.É como se, ao resolver parte dos meus problemas, minha mente tivesse desligado para que eu conseguisse descansar. Claro, ainda há muito que não consigo controlar; minha vida está longe de ser perfeita agora, mas pelo menos hoje pareço um pouco mais com a garota que costumava ser.Guardo o espelho assim que o carro entra na garagem da Nexus. Olho rapidamente para James, que está com o semblante tranquilo desde que o encontrei mais cedo, como se o hoje fosse apenas mais um para ele. E, de certa
Fecho os olhos e respiro fundo, tentando acalmar as batidas descompassadas do meu coração. A pressão que sinto no peito me faz pensar que talvez eu devesse ter pedido um desfibrilador como parte do kit de boas-vindas.— Vamos lá, Mia. Você consegue — murmuro, finalmente começando a me afastar da zona de perigo.Sem saber exatamente para onde ir, decido procurar Gabriel novamente. Ao me aproximar da sala, o encontro está mexendo em alguns papéis. Ele sorri ao me ver.— Por que essa cara? — ele pergunta, levantando a sobrancelha como se pudesse sentir minha tensão de longe. — Já quer desistir?— Não. Quero fugir! — respondo, soltando o ar em um suspiro pesado enquanto me aproximo dele. — Esse homem deveria vir com um manual de instruções ou, sei lá, um aviso do tipo “perigo, não se aproxime”.— Bem-vinda ao mundo do Sr. Hayes — ele diz, rindo. — Mas você sobreviveu, e isso já é um bom começo.— Sobrevivi? — arqueio uma sobrancelha, apontando para mim mesma. — Olha para mim, Gabriel. Est
Minhas mãos tremem levemente enquanto me levanto da cadeira. O tablet está tão apertado entre meus dedos que começo a sentir dor. Bato na porta, tentando não parecer tão assustada ao entrar. — Sente-se — ele aponta para a cadeira à frente de sua mesa. Obedeço, me sentindo pequeno sob seu olhar. Por um momento, ele permanece em silêncio, o que só aumenta meu nervosismo. — Srta. Bennett — finalmente ele começa a falar. — Nos papéis que preencheu para a sua admissão, você disse que fala francês fluentemente. — Sim, senhor. — Obviamente, não é uma pergunta, mas respondo. — Aprendi por… motivos pessoais. Sinto meu rosto esquentar quando ele levanta a sobrancelha, desconfiado. Mas o motivo real é vergonhoso demais para ser dito em voz alta. Como explicar que aprendi francês por conta de uma paixão adolescente, apenas porque ele comentou que amava o idioma? — Então vamos testar suas habilidades — ele diz, sério. — Temos um cliente importante, Jean-Pierre Dubois, CEO da Dubois Technologi
Trinta minutos. Foi o tempo que tive para respirar antes que Ethan me chamasse para sua sala novamente.Ao entrar, ele está ao telefone, os olhos fixos em mim enquanto gesticula para que eu me sente. Faço o que ele pede, tentando ignorar o frio na barriga. Quando desliga o telefone, se ajeita na cadeira e me encara, sem pressa.— Precisamos revisar isso — Ethan diz, apontando para a pilha de papéis em cima da mesa. — Agora.— Agora? — murmuro, ciente de que Gabriel estará ocupado demais para me ajudar.— Algum problema, Srta. Bennett?— Nenhum, Sr. Hayes. Mas… ainda não sei fazer isso sozinha.— Óbvio — ele resmunga, se inclinando para frente. A paciência em sua voz está por um fio, mas ele começa a explicar os documentos. — Esses são os contratos da Sutton & Co. Quero que você revise cada parágrafo, marcando qualquer inconsistência ou erro.— Certo… — respondo, pegando uma caneta.Tento me concentrar, mas sua presença é sufocante. Cada página que passo aumenta minha insegurança, porq