KevinEu detesto esse tipo de evento, onde os “poderosos” se exibem em uma competição de quem doa mais. Claro, para as instituições é ótimo, mas, se essas pessoas tivessem um mínimo de consciência, não precisariam de um evento para fazer caridade. Eu, por exemplo, contribuo mensalmente para cinco instituições, sem precisar de holofotes. A verdade é que só estou aqui para evitar mais uma briga com meu pai. Cumprimento algumas pessoas, troco palavras com outras, mas minha verdadeira missão da noite é evitar o Dylan. Ele sempre foi um babaca machista, do tipo que humilha qualquer um que não pertence ao seu círculo social. Infelizmente, não fui rápido o suficiente para escapar.Dylan me avistou antes que eu pudesse dar meia-volta e desaparecer na multidão. Seu sorriso presunçoso me atingiu como um soco. Ele se aproximou com passos largos e aquele ar de superioridade que sempre me irritou.— Kevin Stewarth! Quanto tempo, amigo! — Ele estendeu a mão, forçando um aperto de mão que eu não
Lembranças do Kevin— Sua gata não veio hoje? — Davis pergunta ao se aproximar de mim.— Estou tentando ligar para ela, mas não consigo, só dá caixa postal.— Desencana, ela deve ter perdido a hora. Logo ela aparece. Vamos, o sinal já tocou.Vou para a sala, ainda olhando para trás com a esperança de vê-la chegando. Envio mais uma mensagem, mas, como as outras, não chega no celular dela.Estou com uma sensação ruim desde que acordei hoje. “Que não seja nada.”Na hora do intervalo, também não a vejo. Decido perguntar às meninas se elas sabem de algo.— Oi, Emy, sabe da Hanna?— Não. Eu tentei ligar, mas só deu caixa postal, — ela responde com o celular na mão.— Também tentei, e nada — diz Ava, com olhar preocupado.Minha preocupação aumenta. Saio no intervalo e vou até a casa dela. Já a levei para casa algumas vezes, mas nunca entrei.Bato algumas vezes na porta, até que uma vizinha aparece e diz:— Moço, não mora mais ninguém aí, não. Eles foram embora de madrugada. Um carrão preto e
KevinQuando entro na cozinha, vejo Hanna desmaiada nos braços de uma mulher. Sem pensar duas vezes, corro para junto delas. No caminho, ouço uma discussão acalorada.— Não chega perto da minha irmã, seu filho da puta desgraçado! — uma mulher muito parecida com Hanna grita para Dylan.— Eu só quero ajudar! — Dylan tenta acalmá-la.A mulher começa a gritar e xingar descontrolada, podia sentir a raiva que ela sentia, assim como dava para ver o quanto ela amava e protegia sua irmã em seus braços. Com a voz firme e olhar mortal ela disse a Dylan:— Dê mais um passo, e você é um homem morto. Não estou nem aí se vou para a cadeia, vou até feliz por tirar um lixo humano como você do mundo. Repito, você não encosta um dedo nela!— Posso? — pergunto à mulher. Só então ela percebe minha presença.— Por favor — ela responde, olhando para Hanna com preocupação.— Já ligaram para o resgate? — pergunto preocupado.— Sim, eles estão a caminho — responde uma mulher próxima ao balcão onde estamos.— S
Kevin— Ah, eu sei sim. Eu estava lá. — A irmã de Hanna se perde em seus pensamentos e depois começa a falar: — Hanna estava com você. Ela havia me avisado. Meus pais perguntaram se eu conhecia o namorado dela quando alguém bateu na porta. Atendi e vi um homem de terno de primeira, inteiramente preto, com um semblante sério. — “Quero falar com o dono da residência, se é que isso pode ser chamado de casa.” — Fiquei furiosa. Quem ele pensa que é para falar assim da minha casa? — Ela fecha as mãos tão forte que os nós dos dedos ficam brancos. — Tentei fechar a porta na cara dele, mas o embuti colocou seu sapato preto luxuoso e brilhante na porta, impedindo que eu fechasse. Ele entrou e encarou meu pai, dizendo: “Hudson, tenho uma proposta para você”. Meu pai o encarou de volta, sem saber quem ele era e que merda de proposta estava falando.Ela parou de falar, respirou fundo. Permaneci em silêncio, observando cada detalhe que seu corpo expressava. Aquela conversa precisava ser dita,
KevinNão consigo mais encarar a irmã da Hanna.— Com licença.Saio do quarto, desnorteado. O mundo ao meu redor parece girar, mas não consigo focar em nada. Vou até o terraço, e ali, no meio do vazio, grito. Grito tão alto que minha garganta dói, um som primitivo que ecoa na madrugada. Caio de joelhos e deixo as lágrimas caírem. Choro por mim, por ela, por tudo que perdemos. Eu a julguei tanto. Passei noites ensaiando como confrontá-la, como humilhá-la, e agora descubro que ela foi apenas mais uma vítima do meu pai.Quando a dor se aquieta, como uma tempestade que vai perdendo força, me levanto, exausto. Vou até a lanchonete mais próxima, compro dois cafés e uma água. Volto para o quarto, onde Hanna está deitada. Sua irmã me olha surpresa, mas não diz nada. Seus olhos, ainda que silenciosos, parecem questionar minhas intenções.— Trouxe café — digo, hesitante. — Não sabia como você gosta, então trouxe açúcar também.Antes que ela pudesse responder, o celular dela começa a tocar. Ela
HannaAcordo com um bip incessante em minha cabeça, tento abrir meus olhos, mas a luz é forte demais. Tenho que abrir e fechar várias vezes antes de conseguir me ajustar. Quando finalmente consigo, percebo que estou em um quarto branco, bem iluminado. Tento me levantar, mas uma voz familiar me impede.— Não, Hanna, por favor, não levante. Você desmaiou. — A voz de Kevin soa carinhosa, mas me incomoda.— O que você está fazendo aqui? — Pergunto, ríspida, sem esconder meu desconforto.— Sua irmã pediu ajuda, estava desesperada. Eu ouvi os gritos e entrei sem pensar. Ela estava nervosa, xingando Dylan, enquanto você estava desacordada nos braços dela. — Ele faz uma pausa, seus olhos preocupados. — Ele fez alguma coisa com você?Viro o rosto, evitando encará-lo. Só de ouvir o nome de Dylan, meu corpo começa a tremer. A lembrança de anos atrás me invade, e não existe a menor chance de eu contar a Kevin o que aconteceu.— Você não precisa ter medo. Estou aqui agora, vou te proteger, seja do
HannaÉ nítido as emoções que eu e Kevin estamos tentando controlar. Ele suspira, nos encaramos, respondo carinhosamente para Kat, que estava grudada em mim.— Em breve, amorzinho. A mamãe já está terminando aqui — Kat, minha pequena luz, a chegada dela, não vou mentir, não foi bem-vinda e nem esperada. Mas hoje posso dizer eu ela se torno o meu mundo. Tudo o que faço é para o bem dela. Ela se aconchega mais no meu colo.Kevin continua ali, mas parece distante, olhando para a janela, mas dava para perceber que ele estava longe e não observando as copas das árvores pela janela. Eu não sei o que ele está pensando exatamente, mas consigo sentir sua emoção, e tenho a sensação que nos tomamos as mesmas lembranças. Aquele momento em que nossas vidas eram perfeitas. A saudade daquela época ainda me dói. “Será que dói nele?” — Me pergunto, observando-o.Do nada ele volta a nos observar, de repente uma voz grave quebra o silêncio: — Ela é linda, Hanna — seus olhos estão voltados para Kat, mas
HannaEle continua a se aproximar lentamente, seu olhar é penetrante, ouso dizer que ele está vendo minha alma, meu corpo parece congelar, dividida entre a incerteza e o medo do que virá. Mas antes que eu possa processar o que está acontecendo, Kevin inclina-se para mim, suas mãos encontrando meu rosto, e ele me beija. Um beijo doce e calmo. Fico paralisada, o choque tomando conta de mim, mas a certeza de que queria ser explorada por aqueles lábios novamente. A saudade, a mágoa, o amor que eu havia tentado sufocar... tudo isso explode com força. O toque dos seus lábios se tornam urgentes, carregado por anos de desejo contido. Então, cedo. Sem hesitar mais, eu o beijo de volta, com a mesma intensidade desesperada, como se o tempo não existisse mais. Nossas bocas se encontram com um anseio que só os que já amaram profundamente entendem. É como se estivéssemos tentando recuperar tudo o que foi roubado de nós, como se o mundo pudesse parar naquele exato segundo e nada mais importasse.M