Acordei com a luz fraca da manhã atravessando as cortinas. A primeira coisa que senti foi a maciez do colchão e um cheiro doce, familiar. Abri os olhos devagar e percebi o corpo de Cíntia aninhado ao meu. Estávamos quase enroscados um no outro. Ela estava vestindo um roupão, o que me fez pensar que provavelmente havia acordado no meio da madrugada e tomado um banho, enquanto eu já dormia. Sua perna estava entrelaçada ao meu corpo, e sua mão descansava em meu peito, tão leve quanto a respiração calma que eu podia sentir contra minha pele. Fiquei imóvel por alguns segundos, sem saber o que fazer. Meu coração começou a bater mais rápido, como se ela pudesse sentir cada batida através da proximidade. Antes que eu tomasse qualquer atitude, senti um movimento leve, e seus olhos se abriram lentamente. Por um instante, ela me encarou, como se ainda estivesse tentando se situar. Sua expressão oscilava entre surpresa e constrangimento, enquanto o silêncio preenchia o quarto. — Bom dia… — m
Nós nos enrolamos em roupões secos e voltamos para o quarto, o som suave de nossos passos ecoando pelo piso. A água ainda escorria de nossos cabelos, mas o calor do quarto ajudava a dissipar o frio que vinha de dentro e de fora de mim. Henrique parecia calmo, mas eu sabia que por trás daquela expressão controlada havia pensamentos que ele também tentava esconder. Eu sentei na beira da cama, puxando o roupão ao redor do corpo como se fosse um escudo contra as emoções que me dominavam. Não era só o desconforto do que tinha acontecido, mas o que eu sabia que estava por vir. Estava cansada de lutar contra os meus sentimentos, cansada de me manter distante de tudo o que sentia por ele. Havia tanto tempo que eu me negava a sentir qualquer coisa por alguém que agora tudo parecia vir à tona de uma vez. Eu olhei para Henrique, que se apoiava na moldura da janela, as mãos cruzadas na frente do corpo, olhando para o lado de fora. Ele estava tentando me dar espaço, mas sabia que eu não podia
Depois de nos vestirmos, descemos juntos para o restaurante do hotel. O buffet era tentador, com panquecas, frutas frescas, ovos mexidos e café quentinho. Preparamos nossos pratos e caminhamos até a mesa onde nossos amigos já estavam.O som de risadas e conversas animadas enchia o ambiente, e era impossível não se contagiar pela energia deles.— Finalmente! — Carol comentou com um sorriso acolhedor, acenando quando nos sentamos. — Dormiram bem?— Bem demais até. — Respondi, ajustando a xícara de café à minha frente. — Achei que acordaria péssima depois de ontem.— E quem não achou? — Carmem riu, balançando a cabeça. — Mas acho que é o charme de Vegas, né? Exageros são quase regra.— Só quase? — Rogério completou, com uma risada. — Ontem foi um festival, e acho que ninguém saiu ileso.— Ei, eu saí! — Ana protestou, erguendo a mão com uma expressão orgulhosa acariciando a barriga. — E o Henrique também. Estamos na lista dos sobreviventes.Henrique deu um sorriso discreto enquanto tomava
PrólogoA luz da manhã entrava pela janela, mas eu não conseguia sentir seu calor. Sentada na cama desfeita, o silêncio da casa parecia ecoar as palavras que eu não conseguia pronunciar. O coração ainda pulsava acelerado, e a imagem dele, a expressão de desespero e culpa, se repetia em minha mente.“Cíntia, eu nunca quis que você soubesse assim.” As palavras soavam como uma lâmina, cortando o que restava da confiança que construímos ao longo dos anos. A traição não era apenas um ato; era um golpe na alma, uma reviravolta que eu nunca poderia ter imaginado.Levantei-me e fui até a janela, observando a fazenda que agora era tudo o que eu tinha. A terra que um dia parecia um lar agora era um campo de batalha entre o que fui e o que precisava me tornar. Eu fui a esposa obediente e boazinha, mas isso não tinha me levado a lugar nenhum.Lembrei-me das promessas feitas, das risadas compartilhadas. A lembrança do meu ex-marido me enchia de raiva. Por muitas vezes, me questionei onde eu havia
A cidade de Belo Horizonte parecia mais caótica do que nunca naquela manhã. Eu dirigia, tentando ignorar os pensamentos que me atormentavam, quando um carro preto surgiu do nada, fechando meu caminho. — Que idiota! — gritei, o coração acelerado pela raiva. Olhei para o motorista, um homem com expressão confusa, e não pude deixar de me sentir insultada. A última coisa que eu precisava era de mais um estresse. Ele não me viu, mas o olhar que lancei em sua direção foi suficiente para saber que aquele cara não tinha ideia do que estava fazendo. Dirigi em frente, segurando o volante com força, tentando acalmar a tempestade dentro de mim. Um segundo depois, avistei um estacionamento e parei lá. Ao estacionar, respirei fundo e saí do carro. O ateliê da Carol estava logo à frente, e a ideia de vê-la me deixou animada. Ela também mencionara que o advogado que poderia me auxiliar na partilha dos bens chegaria hoje. Era hora de esquecer a raiva por alguns minutos. Empurrei a porta do ate
HenriqueA viagem para Belo Horizonte não era algo que eu esperava fazer tão cedo. Receber o convite da Carol para ajudar uma amiga sua foi uma surpresa, mas recusar? Isso não estava em meus planos. Eu devia isso a ela. Ao mesmo tempo, havia uma inquietação que eu não podia negar, um nó no estômago que me acompanhava desde que recebi a mensagem.Carol e eu tínhamos terminado há muito tempo, mas estar na mesma cidade que ela, sabendo que ela tinha seguido em frente, era algo que eu ainda precisava processar. Afinal, nem sempre um término é tão simples. Ainda mais quando nem houve um relacionamento de fato. Não era o que ela queria; mais tarde eu percebi que ela gostava do Fernando, e essa revelação ainda doía, mesmo que eu tentasse ignorar.Quando ela me pediu ajuda com questões legais, minha primeira reação foi hesitar. Aquelas antigas emoções ainda persistiam, como sombras que eu pensava ter deixado para trás. Talvez orgulho, ou apenas o incômodo de saber que ela estava bem e seguind
Sinto minha cabeça latejar e mal posso acreditar que isso esteja acontecendo comigo. — Saia daqui agora! — falo, tentando manter a compostura, embora minhas mãos estejam tremendo de forma incontrolável. Olho para a mulher à minha frente que exibe um sorriso cínico no rosto, mas sabia que a única coisa que ela estava fazendo era tentar me desestabilizar. Ela sabia exatamente onde atacar. — Cíntia, é egoísmo da sua parte querer ficar com uma propriedade deste tamanho quando o Alonso e eu só queremos construir nossa família juntos. E é claro que esse é o lugar mais adequado para isso. — Júlia olha ao redor, como se já pudesse visualizar tudo. — Já até imagino os filhos que teremos, frutos de muito amor, correndo por essa sala gigantesca. Meu coração parece apertar no peito. Não sabia como Júlia havia conseguido entrar dentro da propriedade, mas também não era tão difícil. Eu não possuía um sistema de proteção com seguranças como a fazenda Belmonte, mas sabia que precisaria da ajuda
— Quer conversar sobre o que aconteceu? — Henrique perguntou, sua voz calma, quase cuidadosa, como se temesse ultrapassar um limite invisível. Minhas mãos se apertaram involuntariamente no volante, e pela primeira vez me perguntei: Será que posso confiar nele? Havia algo em seu tom que soava genuíno, mas, depois de tudo o que passei, confiança era algo que eu já não distribuía tão facilmente. Eu sabia muito pouco sobre ele. Ele era apenas alguém de confiança da Carol, o que deveria ser o suficiente. Deveria. No entanto, havia algo nele, algo que me deixava intrigada. Talvez fosse o jeito como ele mantinha a calma diante de todo o caos da minha vida, ou o fato de que, mesmo sendo meu advogado, ele parecia enxergar além das questões legais. Mesmo assim, eu tentava lembrar a mim mesma: ele está aqui apenas para me ajudar, Cíntia. Só para isso. Mas, no fundo, sentia que era mais do que isso. — A Júlia é a mulher com quem o Alonso me traiu, eles vivem uma relação pública desde então… — s