Lyana
Bato a porta da sala de descanso encostando as costas com firmeza, buscando respirar fundo, aquele olhar de um azul acinzentado mexendo com cada uma das minhas estruturas e obrigando a manter a fachada profissional. De alguma maneira entorpecente desde o momento em que esse homem entrou aqui dentro sangrando como um animal, pude sentir as mudanças que ocorreriam. Talvez seja apenas bobagem da neta de uma brasileira cheia de superstições ou algum ser divino tentando alertar para ficar longe dele.
Suas palavras ácidas tentando penetrar cada camada da minha pele, nem ao menos consegui prestar atenção ao que os colegas estavam discutindo apesar de ter a noção, para alguém que sofreu graves lesões não esperávamos que acordasse tão cedo muito menos com tal animo e força. Os múrmuros das enfermeiras ao redor do hospital não disfarçaram as suas desconfianças em relação a ele, pelo que entendi Yurich Romanov é um homem de muito poder e acima de tudo: perigoso.
Solto o ar e inspiro novamente buscando acalmar as batidas frenéticas, tenho muitas coisas para lidar no momento de modo que não posso ficar parada por causa de um homem. Recomponho e saio do cômodo pequeno, caminhando pelo hospital as próximas horas são destinadas apenas aos cuidados pós operatórios de cada um dos enfermos que estiveram na mesa cirúrgica pelas minhas mãos.
Quando o turno se encerra as nove horas da noite, passo pela enfermaria disposta a assinar o livro de registro, porém a curiosidade é mais forte e acabo pegando a ficha do suposto chefe da máfia como escutei comentarem, seus exames apresentam apenas algumas alterações normais para quem passou por uma cirurgia de grande porte. No mais em dois ou três dias receberá alta, quando estou prestes a devolver a pasta tenho a atenção atraída para a última folha. A assinatura do homem alegando estar ciente das suas condições para ser liberado antes do prescrito.
A sensação de preocupação que invade a minha mente é contraditória e irritante, nem ao menos o conheço direito, mesmo sendo um dos pacientes que atendi durante o plantão jamais senti essas sensações desse modo. Bufo frustrada com a maneira em que estou lidando com isso, o dia foi estranho e é apenas isso.
Pelo menos é o que tento colocar na cabeça.
Devolvo a ficha médica e assino o livro, acenando para alguns dos colegas que rapidamente desejam um bom descanso, antes de sair visto o pesado casaco de lã para enfrentar o frio que chega ao país. Não sou russa, na verdade vim para o país quando meu avô paterno adoeceu, tinha uns quinze anos na época por isso com quase oito anos que já resido aqui e claro por ser a língua materna do meu pai falo de maneira fluente com pouco sotaque.
Minha mãe era brasileira, faleceu alguns meses atrás de um infarto me pegando de surpresa, já que acabei ficando sozinha no mundo, após termos vindo para cá por algum motivo que até hoje mão entendo meu pai saiu e não voltou.
Solto o ar observando a forma como se condensa no clima frio, junto com as lembranças doloridas, caminho para fora da área do estacionamento, minha casa fica a dois quarteirões do hospital, por isso costumo vir a pé mesmo. Ultimamente tenho pensado em voltar para o Brasil, lá tenho tias e talvez seja uma boa experiência.
Fico tão perdida nesses pensamentos que apenas noto o quão vazia a rua está quando sinto um arrepio subindo pela coluna.
Um suspiro, um arrepio e no momento seguinte mãos fortes agarrando-me pelos ombros tento bater e acabo acertando um chute, com isso dou dois passos para frente pronta para correr mas sou agarrada pelos tornozelos desequilibrando o corpo como em câmera lenta vejo o chão se aproximando só consigo erguer o braço para proteger o rosto. A batida da minha testa contra o asfalto acaba fazendo tudo girar ao meu redor.
Fico indefesa no mesmo instante, grito com força querendo que alguém me escute, logo um pano vem parar na minha boca enquanto sou erguida e jogada na traseira de uma picape que é coberta com um protetor de couro. Sinto as lágrimas caindo pela minha bochecha se misturando ao sangue, o desespero se mistura com o cansaço e a escuridão abraça os meus sentidos.
YurichUma criança sem amor, um homem sem moral e uma vida baseada na carnificina é nisso amigo diabólico no qual estou sempre sendo moldado, quando algo de bom ou bonito aparece tenho um gosto perverso em tocar. Ao contrário de Midas não se torna reluzente como ouro mas se distorce em cinzas amontoadas aos meus pés, destruir qualquer bondade é fácil, quebrar a beleza é tão natural quanto o amanhecer. Seus olhos tão inocentes clamam pela perversidade que carrego comigo, então, por qual motivo negaria? Analiso cada traço do belo rosto os fios escuros caindo de maneira tão perfeita, uma princesa sendo envenenada pela crença da proteção aos bondosos de coração. Minha pequena ninfa suspira entre os lençóis vermelhos. Inspiro o perfume delicado completamente obcecado a visão de um paraíso inalcançável para um demônio mas ao alcance das minhas mãos, não deixaria que escapasse. Depois de ter saído daquele quarto fui rápido em organizar tudo para sair o mais rápido possível do hospital, um
LyanaSinto o toque quente contra a pele como uma caricia lenta, fazendo o meu corpo corresponder a voz firme e possessiva é tão tentadora quanto a escuridão na qual estou aproveitando para descansar. Suspiro lutando contra as pálpebras pesadas quando o calor se esvai deixando apenas o lugar vazio, a maciez do que reconheço ser um tecido. Mas são as dores espalhadas pelo corpo que atraem toda a minha atenção, aos poucos vou recobrando a consciência da noite infeliz sentindo o pânico voltando com tudo. Ergo o corpo de uma vez sendo tomada por uma tontura, vou buscando estabilizar a respiração é quando finalmente percebo estar em um quarto altamente luxuoso. A cama enorme coberta por tecidos sedosos sendo iluminado por um feixe de luz entre pesadas cortinas, confiro minhas roupas no lugar antes de levantar, fechando os olhos e agradecendo mentalmente por ter algum sinal de que não fui abusada. Quero muito acreditar que nada daquilo foi real e estou apenas em algum pesadelo distorcido,
LyanaFechei os olhos com força desejando que de alguma forma tudo se transformasse em apenas mais um pesadelo estranho, mesmo lutando contra essas sensações diferentes causadas por estar nos braços de um monstro.—Abra os olhos Lyana. — A voz grave ordena. Incapaz de desobedecer vejo o seu olhar analisando cada detalhe meu, sinto a agitação de antes voltar com mais força ainda, desvio os olhos observando o mesmo quarto no qual acordei. Ele parece esperar por alguma palavra minha, mas não tenho nada a dizer, finalmente deixa que fique de pé e o mais estranho é sentir falta do calor dele. — Não ouse fazer isso novamente, posso não ser tão compassivo. Rapidamente viro a cabeça para olha-lo sinto as bochechas queimando com raiva segurando as lágrimas pela dor em meus pés queimados pelo gelo, as lágrimas pela frustração de estar machucada, frágil e aprisionada por culpa dele. —Não pode me obrigar a ficar aqui!Em um piscar de olhos perco a rapidez do seu movimento a mão firme segura a
YurichObservo o mapa da cidade exposto na enorme parede do escritório, todos os principais pontos marcados sob o nosso controle, a irritação crescente é um perigo para homens como eu, principalmente em situações como essa. Não é momento para perder a consciência diante dessa invasão, um ataque dentro do meu território. Estalo os dedos buscando juntar as peças que faltam para pegar os traidores, mas nada além de ter um traidor dentro da organização passa pela minha mente, alguém próximo o suficiente para causar estragos. Ignoro os gritos dela reverberando pela casa mesmo sendo picado por esse mosquito da indecisão , por qual motivo a trouxe para cá? “Com uma garganta potente como essa posso apostar que é capaz de engolir meu pau.” A voz de Nureyev só serve para irritar-me, não respondo a sua merda não tenho vontade em lhe dar mais motivos para questionamentos que não consigo responder. Caminho pelo comodo e sirvo uma dose generosa de bebida antes de sentar no sofá de couro. Meu irm
Yurich Bato os dedos contra a mesa de vidro completamente impaciente, já faz um mês que deixei aquela mulher ir embora, sou atormentado por sua voz enquanto durmo durante o dia mantenho os olhos atentos as câmeras de vigilância daquele hospital. Sinto raiva de mim mesmo por ter deixado que fosse embora.“Avisei para ficar com ela.” “Você parece a merda de um papagaio.” Respondo completamente irritado. Sentados esperando por um dos meu maiores inimigos na porra da Rússia, meu irmão caçula ainda consegue ser insuportável. O esquema de segurança dentro dessa porcaria de restaurante é mais forte do que da casa branca. De alguma forma estupida italianos estão se infiltrando nas nossas terras como uma peste. Precisei averiguar se em outras regiões o mesmo estava acontecendo, descobri que Nabokov enfrenta os mesmos problemas no sul do país talvez seja a hora de unir os lados e engrandecer a Bratva como soberana. Pelo menos é o que espero, ficar pensando na médica apenas atrapalhara os pl
LyanaCaminho de volta para o hospital após comprar um lanche completo, tenho a mesma sensação de dias na qual estou sendo obeservada, reconheço estar com algum tipo de trauma porém, não sinto vontade em falar com alguém ou pedir ajuda. Do momento em que desci do carro sendo deixada no centro da cidade próximo a praça vermelha, a pertubação em meu estado psicologico tem sido crescente as lágrimas passaram a cair sempre fico sozinha como uma lembrança do dia em que perdi minha mãe. Entro no hospital por uma das portas de acesso indo na direção do consultório, sinto medo das pessoas ao redor mas principalmente medo de ir para a emergência e dar de cara com aquele homem outra vez. Fingi estar adoentada como um motivo plausivel para não receber questionamentos e devido aos meus bons atendimentos o chefe da ala cirurgica foi compreensivel.Quando finalmente entro dentro da minha sala, rodo a chave três vezes conferindo que está realmente trancado, coloco a comida por sobre a mesa pesand
Lyana Seus olhos escuros como os meus brilham com o pedido posso ver o alivio que toma sua face ao receber uma chance para falar. Ergo a mão o impedindo de começar. “Escutar você não significa que estou te perdoando por todos esses anos.” Declaro firme. A magoa existente dentro do meu peito é algo do qual não sei se sou capaz de desfazer mesmo que a minha vida inteira seja uma mentira inventada pelas duas pessoas que mais amei. “Imagino o quanto tem magoa principalmente de mim.” Ele fixa seu olhar no meu enquanto passa a mão na barba. “Não, você não tem a noção do quanto mas principalmente pela minha mãe irei escutar o que tem a dizer.” Declaro de modo firme. Ele se recosta contra a cadeira apoiando os braços parece analisar não só minhas palavras mas cada um dos meus gestos e expressões, hoje, relembro a maneira como sempre acreditei que ele sabia tudo sobre mim, que era o homem mais maravilhoso do mundo e estaria sempre presente até não estar, até o momento em que sua presença
LyanaRespiro profundamente encarando o espelho, as bochechas coradas pela maquiagem e os cilios espessos, o batom rosado junto ao vestido azul escuro com um decote formando um semi-coração deixando os meus seios volumosos ainda mais marcados. A cintura marcada por uma parte do tecido aveludada fazendo o tecido abraçar as minhas coxas grossas. Lavo as mãos nervosa buscando certo conforto no fato do meu pai estar ao meu lado, mas em nenhum momento ao lado desses seguranças todos consegui relaxar. Balanço a cabeça saindo de dentro do banheiro e encarando o homem alto que descobrir fazer parte da minha segurança, durante cada momento no qual estava me preparando em casa para esse jantar fiquei tentada a questionar onde eles estavam quando fui sequestrada, mas o medo de criar outro problema foi mais alto. A lembrança do sangue sendo derramado e os gritos daqueles homens ainda roubam alguns minutos dos meus pensamentos isso é frustrante, busco manter a respiração com a cabeça baixa volta