Na manhã seguinte o grupo ainda dormia quando um grito da Dra. Vitina os acordou em sobressalto:
− Ele está morto! Meu Deus, ele está morto!
Todos acudiram a doutora, tentando entender suas palavras de desespero e desamparo. Ela gritava, chorava e soluçava. Ada Kupis a abraçou ternamente tentando de alguma forma consolá-la. O Dr. Meine e o Dr. Kupis acudiram a vítima, realizando massagem cardíaca e respiração boca-a-boca, na tentativa de retomar o pulso; prestando os primeiros socorros. Mas de nada adiantou: o Dr. Takei estava morto. A hipotermia tirou-lhe a vida durante a noite passada.
O Dr. Meine declarou com pesar:
− Ele está morto! Ele não resistiu ao frio, o coração não aguentou tanto esforço! – ele suspirou um profundo lamento e prosseguiu – Há mais de cinco anos o Dr. Takei vinha sofrendo de uma disfunção cardíaca e fazia tratamento para controlar a doença! É lamentável! Realmente lamentável!
− Ele tinha família, tio?
− Sim, claro! Ele era viúvo, mas tinha duas filhas. Era um bom homem, uma mente brilhante, com um trabalho admirável!
Uma tristeza profunda abateu o grupo, e a perda de um dos membros ressaltou a urgência e a consequência das atitudes que seriam tomadas.
− Devemos enterrá-lo para que descanse em paz! – disse solenemente Oscar Kupis.
Ninguém se opôs e instintivamente todos colaboraram. Com respeito, cavaram com as próprias mãos um buraco na duna mais alta e próxima do acampamento.
No deserto branco, improvisaram uma sepultura para enterrar o companheiro de jornada. Durante dez minutos Ada Kupis proferiu uma tocante oração, o resto do grupo acompanhou em silêncio, porque a morte sempre impõe a abstinência das palavras.
Após a despedida, o grupo retornou ao acampamento encontrando Lítica sentada e desperta. O Sr. Felpes sem demora correu em sua direção, abraçando-a. Todos a cumprimentaram por sua recuperação. Meine não hesitou em declarar:
− Enfim uma boa notícia! E então, está se sentindo melhor?
- Sim, já me sinto bem melhor, obrigada.
Felpes se encarregou de informá-la sobre a situação, enquanto isso o grupo optou em fazer o desjejum com mais uma ração de água e comida, que já havido sido separado na noite anterior, a ração extra que seria do Dr. Takei foi repassada a Lítica, sem que ela precisasse saber do fato.
Aos poucos, Lítica parecia absorver as novidades e agradeceu a cada um do grupo por ajudá-la. Neste momento, Dru Ruver se sentiu ainda mais triste e desconsolada, relembrando da perda inesperada do Dr. Takei. Como que lendo os seus pensamentos com elegância e experiência, Meine afirmou:
− Ninguém poderia ter feito nada por ele. É lamentável! Mas precisamos conservar em nossas almas as boas lembranças! Guardando sua conduta e determinação de não ser vencido pelas adversidades!
As palavras e recomendações do cartógrafo comoveram o grupo e dentro de pouco tempo, em decisão unânime retomaram a marcha. Durante boa parte da manhã caminharam calados, em sinal de respeito, para o norte. Esta foi a única forma pela qual puderam dizer adeus ao Oriente.
No início da tarde, o grupo precisou fazer pausas mais regulares na caminhada, no intuito de descansar e recuperar um pouco mais o fôlego. A imensidão branca abrangia todo o campo de visão e o desânimo começou a bater em suas almas e estômagos vazios.
− Será que isto não termina nunca? – indagou Kupis, irritado.
− Nunca é muito tempo, meu amigo! – Meine resfriou os ânimos – Não devemos nos abater tão facilmente. Talvez, a saída daqui não esteja tão longe assim!
− O que quer dizer com isso, Meine? Por acaso acha que alguém vem nos salvar deste fim de mundo? – repreendeu-o Felpes.
O cartógrafo não respondeu, mas o jovem Roddie ficou animado com a sugestão:
− É isso! Quem sabe um helicóptero apareça numa missão de resgate? Vocês são importantes cientistas, e alguém com certeza dará queixa à polícia por desaparecimento! As autoridades serão informadas e mobilizarão as buscas! Já posso ver até as manchetes: “Iminentes cientistas desaparecem misteriosamente!”.
Roddie parecia realmente acreditar no que dizia e Dru logo concordou:
- Solução perfeita, né?
Meine não quis desiludir os jovens e sorrindo disse:
− Isto não seria má ideia! Mas eu estava pensando em uma ajuda mais imediata. Você notou algo, Dru?
Aturdida e um pouco surpresa pelo questionamento franco de Meine, ela confidenciou:
− Sim, eu notei! Por duas vezes notei um reflexo que parece metálico.
− Onde? Em que direção? – surpreendeu-se Vitina.
− Ao norte!
− Isto é ótimo! Porque também notei aquele reflexo, nós precisamos prosseguir! Esta deve ser a saída deste lugar! – o cartógrafo anunciou, animado.
A esperança despertou com força no coração de cada um do grupo. Dru tinha avistado aquele reflexo e nada comentou, por achar que se tratava de algum tipo de ilusão de ótica.
A novidade trouxe ao grupo um novo alento. Mesmo exaustos, com fome e com sede, continuaram a caminhar para o norte, permanecendo atentos numa corrida contra o tempo, aproveitando o sol e a luz do dia para seguirem o reflexo.
Afinal, a água se resumia a pouco mais de meio litro e suas forças físicas e emocionais decresciam a cada hora. Sem pausa alguma para o descanso e marchando rumo ao norte, eles prosseguiram em sua busca pelo reflexo metálico. Nada sabiam, talvez fosse uma indicação de um acampamento, um avião ou somente um pedaço de metal retorcido. Contudo, era algo visível para depositarem a esperança, já tão enfraquecida.
Somente no final da tarde a busca cessou, calando as dúvidas incessantes. A causa daquele reflexo: não era um acampamento, nem um avião e muito menos um pedaço de metal retorcido; talvez fosse a única coisa que ninguém do grupo imaginou, com exceção do Dr. Meine, que já tinha escolhido a frase certa para aquela situação:
− Enfim, encontramos uma saída!
Os membros do grupo ficaram parados, imóveis, aturdidos, observando a razão do reflexo: ele era metálico e cilíndrico, com cerca de cinco metros de diâmetros, parecia ser feito de ferro ou chumbo, encravado em um monte de areia. Dru foi incapaz de precisar em palavras o que sentiu ao deparar com tão estranho fato. Era um tipo de escotilha, parecida como uma escotilha de submarino, só que bem maior.
− Será que é seguro abrirmos isto? – Ada Kupis perguntou, receosa.
− É impossível saber! Este é o problema! – respondeu Meine – A meu ver temos duas opções: ou abrimos isto ou ignoramos o achado. O que vocês acham?
− Eu não quero morrer neste deserto, vamos abrir! – Vitina foi energética.
− Muito bem, já temos um voto a favor. Quem mais, Roddie?
− Vamos abrir!
− Dru?
− Demorou, vamos abrir!
− Kupis?
− Eu concordo.
− Felpes?
− Eu não vou abrir e muito menos entrar aí!
− Eu também não vou, me desculpem – Ada esfregava as mãos – Me desculpem, eu tenho medo! E se lá não houver mais ar? Vamos morrer sufocados! Não, não! Eu não posso entrar aí! Eu não quero entrar aí! – ela suplicou em lágrimas.
− Está tudo bem, querida! Não tem problema! Calma, se acalme! Tudo vai dar certo! – disse Oscar Kupis abraçando a esposa.
− Lítica, o que diz?
− Prefiro morrer no deserto, se não se incomoda!
− De jeito nenhum! - Meine não se abalou – Então, vamos ver: contando comigo, temos cinco votos a favor e três contra a abertura! Já que a maioria concorda, vamos abrir a escotilha!
Na tampa da escotilha era possível identificar duas alças, uma em cada lado da estrutura metálica.
− Bem, isto parece ser bem pesado! – concluiu Oscar Kupis – Vamos escorá-la com nossas bolsas e mochilas! Você escora, meu bem! Nós vamos levantar a tampa e você coloca três aqui e Lítica, por favor, coloque as outras três aqui! – ele apontou o movimento para a esposa e para a doutora, que não estava nem um pouco animada, e continuou – Roddie, me ajude aqui! Felpes e Meine daquele lado por favor, e cada moça fica no meio, uma em cada alça! Vamos lá, atenção, um, dois, três... Puxem!
A escotilha era pesadíssima, Ada e Lítica rapidamente escoraram a passagem, ficando uma abertura de mais ou menos um metro.
− Bom trabalho! – bradou Meine, satisfeito e olhando de perto a estranha passagem – Está escuro aqui! Uma lanterna, por favor!
Felpes entregou a lanterna já acesa ao doutor e perguntou:
− Vê alguma coisa?
− Sim, uma escada – ele sacou do bolso uma moeda de vinte e cinco centavos e atirou-a na passagem, cerca de um minuto depois ela chegou ao fundo – Há uma escada extensa e profunda, mas temos de entrar para investigar melhor!
Meine já se arrastava pela abertura quando Dru decidiu interrompê-lo:
- Eu e Roddie vamos descer! Nós podemos checar primeiro, ver se é seguro, e aí vocês descem!
− Pode ser muito arriscado!
− Eu sei, doutor! E é exatamente por isso! Se algo acontecer, tanto eu quanto Roddie somos os mais ágeis para escapar!
− Tem razão neste ponto, mas você tem certeza de que quer fazer isso?
− Eu tenho certeza! – Dru afirmou sem receio - E você, Roddie? – ela olhou diretamente nos olhos dele como que implorando ajuda.
Roddie compreendeu isto de imediato e, sorrindo com cumplicidade, afirmou:
- Pode deixar com a gente, tio. Vamos descer!
Levando as duas lanternas, os dois jovens rastejaram pela entrada. Roddie tomou a iniciativa e Dru, sem perder tempo, foi logo em seguida. Desde o primeiro degrau deu para notar como a escada e a escotilha eram colossais. Os dois jovens desciam simultaneamente, lado a lado, tateando, degrau a degrau, iluminando com a lanterna os próprios passos. Os degraus eram largos e bem espaçados. Dru suava frio e tinha a boca seca tentando imaginar o que os esperava lá embaixo. O trajeto era lento e só conseguiam ver os degraus e as paredes também metálicas daquele cilindro, que nada revelavam. − Está tudo bem aí? – bradou Meine. − Tudo bem, tio! Em silêncio continuaram com prudência a descida que parecia interminável: vinte degraus, trinta degraus, quarenta degraus... - Veja a moeda! – Dru constatou aliviada quando sua lanterna capturou o reflexo. - Isso! É ela mesma! E assim os jovens apressaram a descida, tocando no fundo
Reduzido o grupo, reduzida a preocupação. Afinal, é certo que todas as situações oferecem prós e contras. Tomar decisões sempre implica abrir mão de uma, em favor de outra possibilidade, e no caso do grupo de Dru Ruver não era diferente. Logo, reuniram suprimentos de água e mais castanhas, porque não sabiam ao certo se encontrariam mais alimento ou água pela frente. Só nos bolsos, Dru carregava praticamente a mesma quantidade de castanhas do resto do grupo e, notando que eles a olhavam surpresos, ela se justificou: − Uma garota prevenida vale por duas! Partiram por volta do meio-dia e tudo em volta da trilha parecia familiar: plantas, árvores, rochas, o céu azul, exceto, é claro, pelas dimensões avantajadas. Caminharam por toda tarde, fazendo pausas regulares para descansar. Dentro de pouco tempo, o grupo se deparou com um achado inestimável: - o que sustentou o ânimo até o anoitecer: batatas doces. Sim, batatas doces e gigantes, cada uma pesava
O Dr. Oscar Kupis, Ada Kupis, a Dra. Lítica e o Sr. Felpes partiram logo após o desjejum, deixando para trás a floresta tropical e o grupo de Dru Ruver. Preveniram-se, carregando rações extras de água, castanhas, a única lanterna que ainda funcionava, um maço de cigarros e dois isqueiros. Naquela manhã, partiam esperançosos, sonhando que em breve pudessem estar no confortável e seguro lar de onde vinham. Para aqueles quatro viajantes, esta esperança era o único elo no qual podiam se agarrar, evitando assim o inconformado desespero. O Sr. Felpes se tornou, mesmo a contragosto, o líder do grupo. − Vamos fazer o caminho inverso. – Felpes declarou – Nós vamos voltar exatamente por onde viemos. Chegando no deserto, vamos para o sul! − Certo, Felpes, isto é muito lógico e racional – concordou a Sra. Kupis – No entanto, o que mais me apavora é que o que vamos fazer, quando chegarmos ao mesmo ponto de partida? − Ada, meu bem, – falou suavemente o Dr. Ku
Já era o segundo dia consecutivo desde a descoberta da escotilha. Apesar da distância percorrida, nada parecia alterar a paisagem daquela floresta tropical, eram apenas árvores e mais árvores, Vitina até brincou dizendo que jamais havia visto, nem mesmo pela televisão, tantas árvores juntas. Contudo, o grupo se considerava com sorte, não sofriam nem com a escassez de alimento e muito menos de água, sem contar que a última noite tinha sido excessivamente tranquila: sem chuva, sem sentinelas, sem nenhum fato inusitado. O dia passou lentamente com a caminhada exaustiva, a noite já caia quando o Dr. Meine sugeriu: − Que tal pararmos? Vamos preparar o jantar e dormir por aqui. Foi um dia longo e estou muito cansado! Todos concordaram, escolhendo uma fresta privilegiada entre duas árvores enormes para passarem a noite. Vitina preparou a fogueira, Roddie a comida e Dru Ruver, por medida de precaução, foi explorar alguns metros ao redor do improvisado acampamento para verifi
Naquela noite, o grupo decidiu manter-se acampado ao redor do lago, presumindo que ali fosse possível avistar ou fazer contato com as criaturas da floresta. Dru já estava desapontada ao esperar tanto tempo, tudo parecia calmo demais e ela tinha uma estranha sensação de que alguém ou alguma coisa a estava observando. Somente na hora do jantar, ela tomou coragem para revelar a sua preocupação: − Eu não sei explicar muito bem, mas tenho a estranha sensação de estar sendo ob-observada – ela gaguejou sem querer. - Eu sinto que alguém está nos vigiando. − Parece absurdo! – disse Vitina, interpelando o sentido de sua frase – Será que não é sua imaginação? Será que isto é possível? − Impossível quase tudo não é! Porque estamos aqui, não estamos? – afirmou muito aborrecido Meine. − Eu não queria dizer nada, sabia que iam ficar preocupados! − É isto! Isto explica tudo! − Explica o quê, doutor? – Dru perguntou não entendendo as conclusões do cart
No dia seguinte, Dru recobrou os sentidos com um forte estrondo. Ela passou rapidamente o olhar em volta da cela metálica. Surpresa, percebeu que logo à sua frente havia dois potes de barro: um com água e outro com comida. Faminta, ela agarrou o pote maior com a comida e com a mão direita comeu compulsivamente uma mistura pastosa e grudenta, de gosto amargo. Ela comeu e bebeu tudo freneticamente, por fim se sentiu revigorada, e sua mente se aquietou por alguns instantes. Deixou-se ficar ali, parada, imóvel, ainda sentindo o estranho gosto da refeição, ouvindo lá de fora o incessante barulho de quebrar pedras. Foi então, que se perguntou: de que modo aqueles potes chegaram até ali? Por garantia, a jovem deitou-se no canto esquerdo da cela metálica agarrada a um dos potes de barro, ao menos assim um deles não sumiria sem que percebesse. Passaram-se horas até que um novo estrondo ecoou dentro do cilindro. Dru despertou, ouvindo sons vindos de cima, imediat
Em liberdade, a primeira providência de Dru Ruver foi escolher um esconderijo seguro. Demorou dois dias, para a jovem encontrar uma fresta espaçosa encravada embaixo de duas árvores. O esconderijo era perfeito! Todas as noites, protegida pela escuridão, Dru se embrenhava pela mata alta a fim de vigiar a prisão das gárgulas e descobrir o paradeiro de Roddie, Vitina e Meine. Em suas observações, descobriu que o território das gárgulas ficava a oeste dos tubos de metal usados como cativeiro, ela contou ao menos oito tubos metálicos distribuídos a cada cinco metros de distância um do outro, e igualmente estarrecida descobriu que o barulho incessante de quebrar pedras vinha realmente de uma pedreira! Dia e noite, as gárgulas utilizavam picaretas de metal e quebravam enormes blocos de pedra calcária, os blocos eram transportados um a um, até as gárgulas anciãs, ao todo dez, que esculpiam com destreza as mais novas companheiras de sua própria raça. Depois de prontas
No dia seguinte os fugitivos decidiram partir. Naquele momento, o problema que o grupo de Dru Ruver enfrentava era o de rota. Não tinham um mapa e tampouco sabiam onde realmente estavam, contando apenas com a experiência, sabiam ao certo que ao sul ficava o deserto, ao oeste estava a floresta e ao norte a prisão das gárgulas. Por isso, decidiram arriscar uma nova rota na direção leste. Pouco a pouco, seguiam caminhando: a mata alta antes densa foi se tornando rasa, as clareiras enormes se resumiam a pequenas folgas em um terreno acidentado, até mesmo a vegetação rasteira se dissipou completamente dando lugar a uma terra roxa e barrenta. Desde então, não tinham visto, por sorte ou azar, nenhum outro ser vivo. Não avistaram nem mesmo um pássaro ou inseto, não havia barulho, nem ruído de espécie alguma: era apenas o silêncio. Naquela terra roxa e barrenta não havia vento, a ausência de brisa os mantinha aquecidos, porém nervosos. Cogitaram ainda a possibilidade