HANA*Cada quilômetro até em casa foi uma tortura. Enquanto o carro deslizava pela estrada, meu corpo permanecia imóvel, mas minha mente era um turbilhão de pensamentos caóticos. Cada imagem, cada toque, cada palavra nojenta daquele homem se repetia na minha cabeça como um pesadelo sem fim. Eu olhava pela janela, tentando não me desfazer ali mesmo, tentando fingir uma força que já não existia.Sentia o olhar de Jonh sobre mim de tempos em tempos, preocupado, tentando alcançar algo que eu não conseguia expressar. Mas como explicar? Como dizer a ele que eu me sentia suja, indigna, quebrada?Quando finalmente chegamos, saí do carro antes que ele pudesse me deter. Passei pela sala sem olhar para trás, minhas pernas se movendo automaticamente até o banheiro, como se ali fosse o único lugar onde eu poderia encontrar alívio, mesmo que temporário.Fechei a porta e parei por um momento, encarando meu reflexo no espelho. Meus olhos estavam inchados, o rosto marcado pelas lágrimas. Mas o que
Cada quilômetro até a delegacia parecia um teste para minha sanidade. O meu coração estava disparado, e as mãos suavam enquanto seguravam firmemente as de Jonh. Ele dirigia em silêncio, mas seu olhar atento pra mim sempre que podia me dava forças. Nosso filho. Estávamos indo buscar nosso filho. A ideia me dava esperança e medo na mesma proporção.Quando chegamos, o ambiente era frio, cinza. As paredes gastas e os olhares cansados dos policiais mostravam que aquele lugar carregava histórias pesadas. Assim que entramos, vi rostos desconhecidos, mas no fundo do corredor, um movimento chamou minha atenção.Minha mãe estava ali. Algemada. Ela parecia mais velha, desgastada, mas minha raiva não me permitia sentir pena. Desviei o olhar, engolindo a bile que subia na garganta, e foi então que vi.Uma mulher, provavelmente uma assistente social, segurava meu filho. Meu filho. Ele estava ali, vivo, pequeno e assustado. Não pensei. Não hesitei.— Meu bebê!Gritei, correndo na direção dele.A mu
JOHN *Enquanto eu estava cuidando de Hana, o telefone tocou, e o meu coração quase parou. As últimas horas haviam sido uma sequência de horrores, como se o universo tivesse decidido testar todos os limites possíveis da nossa força. Quando ouvi a voz do delegado do outro lado da linha dizendo que haviam encontrado Jonathan, senti algo que só posso descrever como um milagre.Meus joelhos cederam, e por um instante, o mundo giro, mas esse fato passou totalmente despercebido aos olhos de Hana, que estava com o olhar fixo na fisionomia do meu rosto. Nosso filho estava bem. Depois de tanto medo, ele estava seguro.Quando essa notícia foi dita em voz alta, ela balançou a cabeça, murmurando baixinho para si mesma.— Ele está bem. Ele está bem...Era como se ela precisasse repetir para que aquilo fosse verdade. Era doloroso vê-la assim. Hana, que sempre foi tão forte, tão resoluta, naquele momento parecia quebrada, como se a única coisa que a mantivesse de pé fosse a ideia de ter Jonathan
HANA*Depois de tudo o que havíamos passado, estar em casa parecia surreal. Cada canto da sala parecia acolher a nossa dor e, ao mesmo tempo, prometia um recomeço. Jonh estava na cozinha, provavelmente preparando algo para nós com a esperança de trazer algum conforto. Eu me sentei no chão do banheiro enquanto banhava Jonathan, tentando focar apenas nos movimentos suaves de limpar a pele dele, mas o nó na minha garganta não me deixava respirar direito.Então o celular tocou.Olhei para o visor e vi o nome de Ingrid. Suspirei antes de atender, sabendo que a conversa seria longa.— Oi, Ingrid.— Hana! Finalmente! Achei que você tivesse sumido do mapa. Vocês chegaram bem em Las Vegas? Por que não me ligou pra avisar? Eu fiquei preocupada!A pergunta me pegou de surpresa, e por um segundo, eu não sabia como começar. Respirei fundo, tentando manter a voz estável.— Ingrid… a gente não foi para Las Vegas.— O quê? Como assim?— Não deu tempo de sair do Brasil Comecei, minha voz falhando le
Uma semana se passou desde o dia em que tudo chegou ao fim. Os dias que se seguiram foram um misto de cura e reconstrução. Ingrid foi minha rocha, assumindo as tarefas mais simples e me lembrando, a cada momento, que eu não precisava carregar tudo sozinha, que meus medos poderiam ser divididos com ela. Jonathan, meu pequeno, parecia sentir que algo em mim estava se realinhando, pois estava mais tranquilo, mais risonho, como se também estivesse aliviado.Jonh, por outro lado, nunca esteve tão presente. Ele cuidou de mim e de Jonathan com uma dedicação que me comovia. Sempre atento, sempre gentil, mas nunca invasivo. Ele me deu espaço para lidar com a dor, mas também esteve ali para me lembrar de que eu não precisava enfrentá-la sozinha.Naquela manhã, eu estava sentada no sofá da sala, observando Jonathan brincar no tapete com seus blocos de montar. A luz do sol atravessava a janela, aquecendo o ambiente de uma forma reconfortante. Jonh se aproximou com duas xícaras de café, entregand
JONH *Sentei no sofá da sala, observando Jonathan espalhar seus blocos de montar pelo tapete enquanto Ingrid se acomodava na poltrona ao lado. A luz suave do fim de tarde iluminava o ambiente, criando uma cena que parecia tão distante de todo o caos que vivemos dias atrás. Hana, exausta, finalmente descansava no quarto, depois de quase uma semana sem conseguir dormir direito, e eu não conseguia expressar o quanto estava grato por isso.Olhei para Ingrid, que acompanhava cada movimento do Jonathan com um sorriso.— Quem diria, hein?Comecei, me inclinando para frente com os cotovelos apoiados nos joelhos. — Ingrid, a pessoa mais insuportável que conheci, acabou se tornando alguém que eu realmente gosto de ter por perto.Ela arqueou uma sobrancelha, me lançando um olhar desafiador.— Cala a boca, Jonh. Se tem alguém insuportável aqui, é você. — Ela cruzou os braços, mas o sorriso nos lábios denunciava sua diversão. — Mas eu admito, você está cumprindo o que prometeu. Hana está melh
HANA * O dia da nossa viagem finalmente chegou, e foi uma mistura de tristeza por ir sem nosso filho, com a ansiedade de voltar a encarar o meu passado de frente. A viagem correu bem, fora a sensação ruim que eu senti a voltar a entrar naquele aeroporto, reviver essas lembranças me deram calafrios. Ao chegarmos, fomos direto pra casa do John. Eu nunca imaginei que voltaria a cruzar aquele portão. E, no entanto, ali estava eu, dentro do carro, na entrada da casa que um dia testemunhou o meu fundo do poço, tentando controlar a enxurrada de sentimentos que me consumia. Quase dois anos haviam se passado desde que parti, desde que deixei o portão escancarado, como se ele pudesse refletir o estado da minha alma naquele dia. Aberto, vulnerável, despedaçado. Me lembrei de como saí correndo dali, com lágrimas queimando meu rosto e o coração esmigalhado no peito. O peso da dor era tão grande que parecia que eu não conseguiria respirar. Voltando para a casa da Ingrid, pensei
JONH*Chegou o momento em que eu parei e pensei: Finalmente eu vou poder consertar todos os meus erros, encerrar todos os ciclos, e me sentir limpo o suficiente pra merecer a Hana.Eu já estava casado com ela, mas ainda não me sentia digno de todo o amor que ela transmitia pra mim, ela havia me dado o melhor presente de todos, Jhonatan, e ainda sim, eu precisava me sentir limpo o suficiente pra repassar pro meu filho algo de bom, eu não queria me sentir um hipócrita e dar pra ele ensinamentos pelo qual eu não vivenciei, eu não tinha intenção nenhuma de mentir pra ele sobre como a minha história e da mãe dele havia começado, mas eu queria contar essa história de maneira que eu tivesse orgulho de tudo o que me tornei pra enfim merecer o amor da mãe dele, e isso incluía honrar.Voltar pra Las Vegas trouxe junto todas as memórias ruins que passamos lá, não só pra mim, mas principalmente pra Hana, que se manteve em silêncio, encarando a entrada da minha casa, como se tivesse vivenciando t