Amber
"Não, não e não! Esse vestido está horrível," Peter arrancou o vestido verde de minhas mãos. "É o evento mais importante do ano, não pode usar qualquer coisa."
Observei através do espelho enquanto ele revirava meu guarda-roupa, jogando peças no chão com desdém. Em três anos, era a primeira vez que me levaria a um evento social.
"Aqui," ele jogou um vestido dourado na cama. "Use este. E pelo amor de Deus, faça algo com esse cabelo." Olhei para meu cabelo preto na altura dos ombros, que pareciam rebeldes demais.
"Peter, as crianças..."
"Já falei com a babá. Ela ficará a noite toda," ele checou o relógio pela terceira vez em cinco minutos. "Não me faça me arrepender de te levar, Amber. É o Baile Anual de Caridade do Setor Hoteleiro, todos os grandes nomes estarão lá. Ou quase..." eu não entendi o que ele quis dizer com isso, mas não iria perguntar. Sabia que ele não responderia.
Mordi o lábio, pegando o vestido. Era lindo, tinha que admitir. O tecido cintilante parecia líquido entre meus dedos.
"Por que decidiu me levar desta vez?" Perguntei, começando a me vestir.
"Porque preciso fechar alguns contratos importantes," ele ajustou a gravata no espelho. "E um homem com uma bela noiva passa mais credibilidade. Só... tente não falar muito, ok? Quanto menos pessoas souberem sobre sua... condição, melhor."
Minha "condição". Era assim que ele se referia à minha amnésia, como se fosse uma doença vergonhosa.
"Os gêmeos perguntaram se você vai levá-los ao parque amanhã," tentei mudar de assunto.
"Não começa, Amber," ele suspirou irritado. "Já te disse mil vezes que não tenho tempo para isso. Se quer tanto ir ao parque, leve-os você mesma."
“Mas...”
"Mas nada! É para isso que você está aqui. Para suprir essa carência de seus filhos." concordei, abaixando a cabeça, resignada com sua resposta.
Voltei a me olhar no espelho e ouvi quando ele bateu à porta dizendo que eu tinha apenas meia hora para terminar de me arrumar.
***
O caminho até o Plaza Royal foi silencioso. Peter digitava furiosamente em seu celular, ocasionalmente soltando suspiros exasperados.
"Lembre-se," ele falou quando o carro parou. "Você é minha noiva, não me envergonhe. Sorria, seja graciosa, mas não muito falante. E por favor, não mencione as crianças. Você fica ridícula quando fala deles."
"Claro, querido." falei sentindo o nó em minha garganta.
Os flashes começaram assim que saímos do carro. Peter instantaneamente mudou sua postura, seu braço envolvendo minha cintura com uma intimidade que não existia em casa.
"Peter Calton!" Os fotógrafos gritavam. "Quem é a sua acompanhante?"
"Esta é minha noiva, Amber Kane," ele anunciou com orgulho ensaiado. "Estamos muito felizes em participar deste evento tão importante." Os flashes continuaram a me cegar, e ele me arrastou para dentro do evento.
O salão era deslumbrante. Cristais pendiam do teto em cascatas de luz, mesas decoradas com arranjos elaborados de orquídeas brancas se espalhavam pelo ambiente, e uma orquestra tocava suavemente em um canto.
"Peter, querido!" Uma senhora elegante se aproximou. "Que surpresa maravilhosa! E esta deve ser..."
"Minha noiva, Amber," ele me apresentou mecanicamente. "Amber, está é Senhora Richmond, uma importante investidora."
"É um prazer," sorri, mas a mulher me olhava de uma forma estranha, como se tentasse se lembrar de algo.
"Igualmente, querida. Seu rosto me é familiar..."
"Amber, pega algo para beber enquanto converso com a Senhora Richmond," Peter me cortou bruscamente. "Assuntos de negócios, você entende."
Me afastei, sentindo o desconforto familiar da rejeição. Não era a primeira vez que Peter me tratava como um objeto decorativo, mas ainda doía.
Caminhei pelo salão, notando os olhares e cochichos. Alguns me observavam com curiosidade, outros com algo que parecia... reconhecimento? Uma garçonete passou com uma bandeja de champanhe e peguei uma taça, precisando de algo para ocupar minhas mãos.
"Dizem que o senhor Martinucci conseguiu chegar a tempo do evento," ouvi uma mulher sussurrar para outra. "Mas Martina está com ele, para o nosso azar."
Senhor Martinucci? O nome fez algo vibrar em minha memória, mas como sempre, a lembrança escapou antes que pudesse agarrá-la.
Continuei andando, observando os grupos que se formavam. Peter estava em seu momento circulando entre empresários importantes, rindo e gesticulando. Nem uma vez olhou em minha direção.
Foi quando aconteceu.
Distraída com meus pensamentos, não vi o homem que se virou bruscamente. Minha taça se chocou contra seu smoking impecável, derramando champanhe por todo o tecido negro.
"Não olha por onde anda?" A voz grave e irritada me fez congelar.
"Me desculpe, eu..." As palavras morreram em minha garganta quando ergui os olhos.
O homem era alto, imponente, com traços fortes que me eram estranhamente familiares. Seus olhos, de um castanho profundo, se estreitaram ao me fitar. Mas não foi sua beleza arrebatadora que me deixou sem ar.
Foi o quanto ele se parecia com meus filhos.
Louis tinha exatamente o mesmo formato de rosto, a mesma linha forte do maxilar. E Bella... minha pequena Bella tinha aqueles mesmos olhos penetrantes.
"Isso não é..." ele começou a falar, sua expressão mudando de irritação para algo mais intenso, mais perturbador.
Dei um passo para trás, sentindo meu coração disparar.
"Me desculpe, senhor. Eu... eu vou chamar alguém para limpar isso."
Tentei me afastar, mas sua mão agarrou meu pulso. O toque enviou uma corrente elétrica por todo meu corpo.
"Não tão rápido," sua voz estava mais baixa agora, quase um sussurro. "Acho que precisamos conversar... Amber."
A maneira como ele disse meu nome fez meus joelhos fraquejarem. Não era uma pergunta. Era um reconhecimento.
Leonardo"Ouvi dizer que Peter Calton trouxe uma acompanhante," Martina comentou, ajustando seu vestido vermelho. "Dizem que é sua noiva."Ignorei o comentário, como fazia com a maioria das coisas que ela dizia. Meus olhos percorriam o salão automaticamente, avaliando cada rosto, cada contrato em potencial. Era isso que eu deveria estar fazendo, networking, política, jogos de poder. Não pensando em Calton, meu principal concorrente."Que bom para ele. Estava na hora." ela riu sem graça, tentando chamar minha atenção, mas eu não queria saber dela."Léo, não vai me convidar para conhecer alguns de seus fornecedores?" ela me olhou interessada."E por que eu faria isso?" falei sério a encarando."Pare de me tratar assim , Martinucci. Eu sei que ainda está bravo, mas já passou." ela fala, e sinto o ódio subir em minha garganta."Se acha que vou aparecer naquele casamento, está completamente errada. Temos um acordo, e isso não faz parte dele." ela riu, alisando meu terno, e me olhando com g
Amber"Por favor, está me machucando." Minhas costas pressionadas contra a parede começavam a doer, mas o homem não se afastou. Seus olhos, tão parecidos com os de meus filhos, queimavam de ódio.A sala VIP do Plaza Royal, que momentos antes me pareceu elegante com sua decoração em dourado e vermelho, agora mais parecia uma prisão. O segurança, Magnus, como o outro o chamara, bloqueava a única saída."Você não entende," tentei novamente, lutando contra as lágrimas. "Eu realmente não sei quem vocês são. Se me deixarem ligar para o meu noivo...""Noivo?" O homem riu, um som frio que me fez tremer. "Ainda não terminou sua atuação? Quer continuar fingindo que não se lembra de nada?"Tentei me desvencilhar, mas ele era muito mais forte. O perfume dele, uma mistura de hortelã com algo amadeirado, me deixava tonta, despertando sensações que eu não compreendia.A porta se abriu e outro homem entrou apressadamente. Aproveitei a distração para tentar correr, mas não fui rápida o suficiente. Mag
AmberA primeira sensação foi de desorientação. Minha cabeça latejava e minha boca estava seca, com um gosto amargo. Tentei abrir os olhos, mas as pálpebras pesavam como chumbo."Ela está acordando," ouvi uma voz masculina dizer. Magnus, reconheci.Forcei meus olhos a se abrirem e pisquei várias vezes, tentando focar minha visão. O ambiente era amplo e elegante, decorado em tons de cinza e azul. Uma suíte, percebi, maior que qualquer quarto que já tinha visto. E ainda assim... familiar."Onde..." minha voz saiu rouca. "Onde estou?""Em um lugar que você conhece bem," a voz dele respondeu de algum lugar à minha direita.Me sentei lentamente, segurando a cabeça que ainda girava. Estava deitada em uma cama king size, ainda usando o vestido dourado da festa, agora amarrotado. O perfume dos lençóis, um toque de lavanda, despertou algo em minha memória, mas a lembrança nunca vinha completa."Por favor," tentei me levantar, mas minhas pernas tremiam. "Preciso voltar para festa. Peter deve es
LeonardoAndei de um lado a outro enquanto ela descobria sua história."Acha mesmo que é verdade o que ela diz?" Magnus me questionou."Não sei. Espero qualquer coisa dessa mulher." parei e me virei para ele. "Ainda assim, procure por Amber Kane e veja o que descobre. Procure também entender como Peter entrou nessa história. Não acredito que seja por acaso." Ele concordou, puxando o celular e começando a digitar.Voltei para o quarto depois de 15 minutos a encontrando sentada no chão, com várias fotos e relatos espalhados a sua volta."Eu não me lembro de nada disso." sua voz soou firme."Percebo que não. Mas eu posso te ajudar com isso, se você me devolver o que roubou."Ela se levantou e me aproximei perigosamente dela. Por mais que eu negasse, meu corpo ainda a desejava e em um movimento rápido, a puxei pela nuca, a trazendo bem perto do meu corpo."Eu só quero as minhas informações de volta, Amber...e pelo que eu vejo, você quer sua vida. É uma troca justa." Sua boca se moveu sedu
AmberMinhas mãos tremiam enquanto colocava os brincos. Pareciam normais, elegantes até, mas carregavam o peso da minha nova prisão. Deslizei o celular para dentro da bolsa, tentando escondê-lo entre o estojo de maquiagem e a carteira."Quando eu mandar mensagem, você responde em no máximo cinco minutos," Leonardo falou sem tirar os olhos do próprio celular. "Se demorar mais que isso, considerarei uma quebra do acordo."O silêncio que seguiu era sufocante. O som dos dedos dele deslizando pela tela do celular parecia ensurdecedor no espaço confinado do carro."Que horas são?" perguntei de repente, um novo tipo de pânico me atingindo."Quase meia-noite," ele respondeu sem me olhar. "Ficamos fora por pouco mais de uma hora.""Uma hora?" Minhas mãos voaram para o rosto. "Não, não, não..."Abri a bolsa freneticamente, procurando um lenço. O rímel devia estar todo borrado, minha maquiagem arruinada. Peter odiava quando eu não estava impecável. Odiava quando eu desaparecia.Uma risada seca m
AmberO motor do carro roncou quando Peter pisou no acelerador. Me encolhi contra a porta, sentindo o cheiro de uísque em seu hálito, ele devia ter bebido após meu "desaparecimento". Minhas mãos tremiam tanto que as prendi entre os joelhos, tentando disfarçar.As luzes da cidade passavam em borrões pela janela enquanto ele dirigia em silêncio. Era sempre assim antes de suas explosões, primeiro o silêncio sufocante, depois..."Onde você estava?" Sua voz cortou o ar, baixa e controlada. Perigosa."Já disse," engoli em seco, rezando silenciosamente para que Leonardo tivesse pensado em tudo, "estava na enfermaria. Pode checar se quiser, eu-"O carro freou bruscamente no semáforo, me jogando para frente. Peter virou-se em minha direção, seus olhos brilhando de uma forma que eu conhecia bem demais."Você realmente," ele alcançou meu rosto, seus dedos apertando meu queixo com força, "acha que eu sou idiota?""Peter, você está me machucando," tentei me soltar, mas ele apenas apertou mais."Ma
AmberCada movimento era uma agonia. Me arrastei pelo corredor, usando a parede como apoio, guiada pelos gritos das crianças. Meu corpo inteiro protestava, mas o medo pelo que Peter poderia fazer era maior que qualquer dor física."FAÇA ESSAS PESTES CALAREM A BOCA!" A voz dele trovejava do quarto dos gêmeos."Senhor, eles só estão assustados," ouvi a babá tentando acalmar a situação. "Se o senhor pudesse...""CALE A BOCA VOCÊ TAMBÉM!"Quando finalmente alcancei a porta do quarto, a cena me gelou o sangue. Louis, meu pequeno príncipe corajoso, caminhava em direção ao pai com os braços estendidos, como sempre fazia quando queria colo."Papai..."O empurrão foi brutal. Meu filho caiu sentado, seus olhos arregalados em choque antes do choro explodir ainda mais forte. Bella se encolheu em seu cantinho, abraçando o ursinho com força.Vi a mão de Peter se erguer, pronta para descer sobre Louis."NÃO!"Não sei de onde tirei forças, mas me joguei entre eles, empurrando Peter com toda energia q
LeonardoO escritório estava silencioso demais naquela momento, após os gritos de desespero de minutos atrás. Sobre minha mesa, os contratos dos chineses ainda esperavam minha assinatura final. Cinquenta milhões de dólares. O maior acordo da história da MGroup, e amanhã às 10h seria a reunião decisiva. Passei os dedos sobre o papel timbrado, sentindo o peso daquela decisão. Com esse contrato, recuperaríamos tudo que perdemos há três anos."Os documentos da Due Diligence chegaram", Magnus falou tentando me tirar, do topor. Eu tentava encontrar as lacunas, onde tudo o que estava acontecendo se encaixava. "Os chineses estão ansiosos. O Sr. Wong ligou três vezes hoje.""Amanhã às dez horas assinaremos", respondi sem tirar os olhos do monitor à minha frente. O cheiro de café frio que tinha esquecido sobre a mesa se misturava com a tensão no ar. As luzes da cidade piscavam pela janela grande atrás de mim, mas eu só conseguia prestar atenção nas linha fina com pequenas ondulações, que mostra