CAPÍTULO 02
Theodoro Almeida Quase caí da cama com o susto que levei, aquela louca me expulsou sem motivo algum, provavelmente ficarei dolorido com as pancadas dela, e o pior foi quando vi com meus próprios olhos, que aquele quarto não era o meu. As coisas aconteceram muito rápido, estranhei não me lembrar de ter ligado para chamar uma acompanhante, mas ser tratado assim não dava... olhei pra mim mesmo e me assustei: “Merda! Me fez sair de cueca em pleno corredor!“ Entrei no meu quarto e fui logo me vestindo, sem conseguir raciocinar direito, pegando as primeiras peças que via. . Passei a mão na cabeça, comecei a andar de um lado para o outro, e lembranças da noite que tive vieram de repente. Aquela prostituta me acordou em meio ao surto psicótico e conseguiu me controlar, como ela havia feito aquilo? Ninguém além da mulher que amo conseguiu fazer isso, mas como ela fez? Fiquei olhando pela janela, deveria ter uma explicação, claro que deveria... Abri a porta apressado e fui até o quarto dela novamente, já que era ao lado, mas estava vazio. Olhei para o chão e vi um pano esquisito de tecido leve, se não era meu, só poderia ser dela..., mas quem era ela? Peguei meu celular e liguei naquele número privado novamente. Era nele que eu ligava sempre que queria uma mulher, eles me enviavam uma e o serviço sempre foi muito sigiloso, já que não posso e nem quero me relacionar com ninguém. No segundo toque aquela voz aveludada me atendeu: — Lembrou da gente, gato? É só dizer que sim, e em alguns minutos terá uma bela mulher no seu quarto! — Não, na verdade, eu só queria saber mais da mulher que enviaram ontem! Ela teve a audácia de me expulsar e me bater, qual o problema de vocês? — Calma senhor! Nenhuma das nossas acompanhantes foi até o seu quarto ontem, tem certeza que não levou alguma outra mulher? — bufei, sem acreditar que ela teve coragem de perguntar isso, era só o que faltava..., só então percebi que fui eu quem foi até o quarto da mulher. “Será que tem prostituta fixa aqui do hotel?“ — Verifique no seu sistema aí, e descubra quem veio! Essa acompanhante tem reações bem estranhas, além de me bater com algo, ainda me fez sair correndo, quero que volte aqui, quero saber quem é. — Olha, eu realmente não tenho dúvidas, nenhuma das nossas, esteve no seu quarto. — ouvi conversas paralelas, fiquei tentando entender. — Olha, uma delas disse que viu a mulher que saiu próxima do seu quarto agora pouco, mas a mulher era bem desajeitada para trabalhar com isso. — ouvi gargalhadas. — Certo, ligo outra hora. — Espere, envio uma acompanhante até aí? — Não. — desliguei o celular e quanto mais depressa comecei a procurar por ela, estranhei uma mancha vermelha nos lençóis, mas ignorei, em seguida, fui olhando nos corredores. Olhei para todos os lados, mas pelo tempo que levei, dificilmente encontraria aquela mulher. Fui pelas escadas, observando a cada andar, então quando cheguei na recepção, conversei com a recepcionista: — Tem como você verificar nas câmeras, quem foi que saiu do quarto ao lado do meu, a uma meia hora? — Não é comigo, senhor. Posso te encaminhar para o setor responsável, mas precisa ter um bom motivo, por acaso o senhor foi roubado? — pensei por um momento, mas vi que a mulher me ignorou, já havia voltado a olhar seu computador, e foi aí que improvisei. — Sim, fui roubado. A mulher bufou, me indicou a direção que eu deveria ir e saí apressado, vendo ela me olhar torto. Me atenderam bem na sala que me enviaram, que era de monitoramento, logo começaram a procurar as imagens, e então eu a vi... Uma morena bonita, não dava para ver muita coisa, estava muito assustada. O que foi bem estranho, é que parecia não enxergar por onde andava, como isso seria possível? Uma mulher cega como prostituta? — Senhor, então é essa? — voltei a olhar as imagens, quando o homem me apontou. — Sim, entrou num quarto. Ligue para lá! — apontei na tela, indicando um número. — O senhor encontrou o que lhe foi roubado? — Só ligue, por favor! — falei já sem paciência. Aquele homem ligou, não estou fardado, mas aqui todos já sabem que sou um tenente, então quando ouvi a voz dela, falei: — Quem te autorizou a passar a noite comigo? Me bater e ainda me fazer sair correndo naquelas condições? Para uma moça cega, deveria pensar melhor antes de fazer tais coisas, você não acha? — não ouvi nada, me irritei — Está me ouvindo? — Estou... ouvir, eu ouço muito bem! Agora, o que eu faço da minha vida, é problema meu. É você quem não deveria se preocupar com uma desconhecida, não acha? Se aparecer no meu caminho de novo, a minha bengala se lembrará de você! — sua voz era agressiva, parecia até que era eu, quem havia feito merda ali. — Olha aqui... — Fui reclamar, mas fiquei apenas com o barulho da ligação encerrada: “ela desligou na minha cara?“ — Senhor, precisa dar queixa... o que foi roubado? — Esquece! — soltei o telefone apressado, ignorei todos, e comecei a voltar para o andar que eu estava hospedado, mas meu celular tocou perto da recepção. Puxei do bolso rapidamente e atendi, só que antes que eu colocasse os pés no primeiro degrau da escada, paralisei: — Tenente Almeida, gostaria de lhe informar que o soldado Messias passou mal agora de manhã... — Droga! Estou indo pra aí! — desliguei a ligação sem questionar, mudei o percurso e imediatamente fui ver aquele rapaz. “Com você eu converso mais tarde, morena!“CAPÍTULO 03 Valéria Muniz “Não posso mais ficar nesse quarto, não é mais seguro!“ — pensei ao me apressar em me vestir e pegar minhas coisas. Não encontrei meu hijab, cobri a cabeça com um sobre-lençol. Me esbarrando nas paredes, tentando calcular a distância entre aquele quarto e a recepção eu saí chorando, sem conseguir evitar a decepção que me atormentava, até que alguém bateu forte, de frente comigo, quase caí. — É IDIOTA OU O QUÊ? QUASE QUEBROU O MEU SALTO, PUTA DESAJEITADA! EU PELO MENOS, NÃO ANDO DE CABELOS BAGUNÇADOS PELOS QUARTOS, COBERTO COM LENÇOL SUJO!— era uma voz feminina, com um perfume doce fortíssimo, mas eu estava tão desesperada que continuei andando, encontrei o corredor e demorei para conseguir chegar à recepção e conseguir um novo quarto. “Lençol sujo?“ — de repente estranhei, pensando nisso, mas o enrolei de baixo do braço. Quando cheguei no quarto, tranquei com chave, grudei as costas na porta e nem respirei direito, fazendo aquela oração importante
CAPÍTULO 04 Theodoro Almeida O percurso foi rápido, porém a minha cabeça dava voltas, pensando naquela mulher. Eu deveria ter ido antes atrás dela, mas não fui, e acabei atordoado com os seus modos. . Assim que cheguei no quartel, alguns sargentos e soldados bateram continência, mas o meu interesse era no soldado Messias, eu sabia que ficar afastado, traria problemas. — O que aconteceu? — perguntei antes de abrir a porta da enfermaria. — O tenente Soares o fez pagar muitas flexões, ele não comeu nada, porque o tenente disse que não iria tomar o café enquanto não terminasse quinhentas, e ele não aguentou. — Não acredito! O que ele fez? — Acusação de revolta, porque tentou ajudar outro soldado. — eu sabia o que aquele babaca do outro tenente havia feito, se aproveitado que eu não estava, para descontar a sua inveja no jovem rapaz que ele sabe que eu trouxe pra cá e era do orfanato. Entrei no local e fiquei ainda mais revoltado quando vi que o rapaz ainda estava desm
CAPÍTULO 05 Valéria Muniz Era um barulho do alarme de incêndio, aquilo não poderia estar acontecendo comigo, por Deus... como eu sairia sozinha por aqui? Sem conhecer nada? E sem a ajuda de um guia, como encontrei quando cheguei e consegui resolver tantas coisas? Meu corpo ficou tenso, enquanto aquele barulho me assustava. Fui batendo nas prateleiras, senti produtos caírem em cima de mim, mas me esforcei para conseguir sair. Quando cheguei na porta, quase chorei de emoção, não queria morrer bem agora que estava tão perto da minha liberdade, não era justo. Com os ouvidos super em alerta, e sentindo o ambiente mais quente, eu parei em frente a porta do quarto, tentando ser racional e não me desesperar. Pessoas falavam ao mesmo tempo, contei quatro passos da porta para frente e fui andando, mas parei quando percebi que tantas pessoas batiam e encostavam em mim, o que me deixou desesperada, sem saber o que fazer. “Eu queria tanto ver, queria saber o que estava acontecendo!“
CAPÍTULO 06 Valéria Muniz — Calma, aqui está a sua bengala. Por que ficou tão nervosa? — o rapaz perguntou com uma voz suave. — Eu preciso sair desse hotel. Meu irmão está atrás de mim, ele não pode me encontrar, me ajude moço, por favor! — procurei pelas mãos dele, ele segurou. — Meu nome é Rafael, pode me chamar assim. Eu te ajudo a se manter escondida aqui, se esse homem pode te causar mal... — Não, eu preciso ir, ele sempre me encontra, preciso ir. — comecei a andar naquele corredor pequeno e com cheiro ruim, procurando as minhas coisas, apalpando tudo, com medo de encostar no que não devia, peguei a minha pequena bolsa. — Olhe, eu não tenho muito dinheiro, mas posso te pagar para que me ajude a encontrar um quarto em uma pensão mais barata. — Fui tentando sair, e ele me ajudou. — Você está muito nervosa... olha, espera até o final do dia, não posso ir com você, agora. É só ficar lá dentro, posso te trazer uns pães e também almoço, não se apavore. Meu coração estava d
CAPÍTULO 07 Valéria Muniz A pior parte quando não se consegue ver, é saber que você está sozinha, não há ninguém por você. Se você cair, terá que se levantar, se não encontrar o seu caminho, terá que depender de estranhos, correndo riscos que você nunca saberá ao certo a profundidade deles e, sobretudo, se sentir numa escuridão interna, sabendo que ninguém poderá te encontrar lá dentro, porque você não tem ninguém. É exatamente assim que me sinto... numa completa escuridão. Se sempre foi assim? Não, já tive uma vida coberta de luz, mas se apagou. Assim o meu coração dói, segurando na porta de um carro estranho, onde o vidro está totalmente aberto, mas me sinto presa, implorando internamente para que ainda existam pessoas boas, e me deem apenas uma chance, de provar que não sou inútil por ser cega. O silêncio me mata a cada segundo, “mamãe, me sinto tão perdida!“ “Você me disse que sempre estaria comigo, mas onde está? Eu não consigo te ver!“ . — Você disse que sabe cuidar d
CAPÍTULO 08 Valéria Muniz Momentos seguintes, na casa de Anelise: Eu concordei com tudo o que ela dizia, só queria um trabalho e também fugir de Aaron. Ela me deixou conhecer um bebezinho muito cheiroso, de apenas cinco meses, que se chamava Samuel, e na mesma hora me acalmei com um anjinho daqueles, “ela confiou em mim”. — Olha, filho, a sua babá chegou! — se aproximou de mim, e senti ela com o bebê, me entregando. — Nossa, ele é tão quietinho! Não estranhou. — Como sabe que ele está acordado? Samuel é bem silencioso. — ajeitei o pequeno nos meus braços, e ouvi pequenos resmungos. — Através dos sons, movimentos corporais, mesmo que poucos, consigo identificar. — encostei o bebê perto de mim, gosto de sentir a respiração, a temperatura, me sinto mais confiante. — Puxa... — ela se expressou mostrando que estava impressionada com algo. Naquele dia, ela me mostrou toda a casa, tudo que o bebê usaria, e como funcionava. Dona Anelise me deu um quart
CAPÍTULO 09 Theodoro Almeida [Mensagem de texto de Anelise] — Você está bem? Não consegui te achar por esses dias, você vem no meu casamento, não é? — fiquei olhando para o celular e pensando que poderia ter sido eu o escolhido para se casar com ela, mas não disse nada. Respirei fundo, comecei a digitar uma mensagem, mas apaguei, pensei melhor e comecei novamente, eu não gostaria de ferir o coração da minha doce Ane. — Vou sim, estou muito bem, porém cheio de trabalho! — digitei, enviei e depois joguei o celular sobre o criado. “Era hoje... o dia em que eu precisaria enterrar esse sentimento que tenho por ela, esquecer que um dia já a amei, e pensar nela apenas como uma amiga. Sem muita cerimônia, olhei o único traje social que tinha no armário. Não era dos mais novos, então decidi ir fardado para Curitiba. Levarei o soldado Messias, mesmo que meu coração seja outra vez esmagado, não será a primeira vez, então eu aguentarei. . Enquanto Anelise casava com Vicente, tentei
CAPÍTULO 10 Valéria Muniz As palavras daquele homem eram dolorosas demais pra mim. Aguentei firme a cada insulto, não deixaria que ele me fizesse abaixar a cabeça, como meus irmãos sempre fizeram, eu o responderia à altura e precisaria esquecê-lo o quanto antes. Vi seu vulto a alguns passos. — Você é muito atrevida, sabia? — ouvi e senti a aproximação dele, estava muito perto de mim. — Se é cega... como sabe que estou fardado, para tentar me diminuir? — Uma pessoa cega sabe identificar muitas coisas, através do som, cheiro e percepções que seres humanos “perfeitos” não são capazes, sabia? — essas palavras doeram em mim, porque já estou tão cansada de julgamentos, por isso não gosto que fiquem me ensinando as coisas que já sei, me esforço para aprender rápido. — Olha, eu não quis ser indelicado, sei perfeitamente sobre isso que acabou de dizer, eu só estou perguntando como sabia que estou fardado? Você consegue ver algumas coisas com os óculos? — me virei para o outro lado,