Depois daquele treino teste, Jake não teve paz.
Por algum motivo, Matheus havia contado a todos sobre ele ter sido parte do time quando estava no seu primeiro ano de faculdade ao ponto de ter pisado em quadra logo de cara.
Para um time universitário de grande porte como aquele, era comum que os calouros ficassem na reserva, o que aumentava a curiosidade a respeito do alfa. A curiosidade foi tomada não somente pelos colegas desconhecidos, como também por alguns garotos que queriam entrar para a Rapoxia.
As perguntas em si não eram tão incômodas no geral, respondia com prazer já que muitos estavam interessados em sua rotina de treinos e habilidades.
O problema era quando uma pergunta específica era jogada no ar.
— Por que você parou de jogar?
Quando essa pergunta era feita, Jake se calava tentando ao máximo não transparecer o incômodo. Até os seus amigos davam um jeito de mudar de assunto com alguma piada ou fazendo algum convite para irem comer só para desviarem a atenção. No entanto, a curiosidade continuaria existindo independente de Jake responder ou não.
— Que venha o carnaval!! — Gritava Ricardo junto de outros jogadores quando saíram do vestiário — Uma semana inteira de boa, sem fazer nada!!
— Reza a lenda que se falar isso três vezes na frente do ginásio, o treinador Santiago aparece com um plano de treino pra você fazer em casa — Provocava Matheus ao abraçar o amigo.
— Não brinca com isso! Meu precioso feriado ninguém tira de mim.
— Não seria má ideia aproveitar o feriado para começar uma rotina de treino.
Matheus virou-se para Guilherme e então abriu um enorme sorriso. Um sorriso que causou três tipos diferentes de arrepio em Jake.
— Seria bom, não é? Seria ainda melhor se alguém experiente, mas que foi castigado como reserva do time por ter saído e partido o coração do treinador, pudesse te treinar pessoalmente.
Descaradamente Matheus encarava Jake, que desviou o olhar para o outro amigo fingindo que o assunto não era consigo. Não que tal plano fosse dar certo, já que o alfa de pele bronzeada era insistente só com o olhar.
— Por que eu deveria treinar um líbero? Além disso, eu tenho que trabalhar, o carnaval é a melhor época pra juntar uma grana.
— Ora, deveria fazer uma boa ação para pagar o seu pecado.
— Que pecado?
— O de ter saído sem dizer nada.
Matheus podia ser assustador mesmo quando sorria brincalhão. Jake já conhecia bem aquela história. Mesmo que rejeitasse a ideia, o seu melhor amigo iria insistir até ao ponto de incomodá-lo no banheiro. Não tinha sido assim que o venceu pelo cansaço para que voltasse à faculdade?
— Haa… Pensarei no caso.
Entre risos dos jogadores, o treino daquele dia já havia dado por encerrado. Pelo menos Matheus continuava um mestre em desviar de assunto. Só não esperava que existisse um mestre na insistência.
— Você parece desconfortável quando toca nesse assunto.
Guilherme era curioso também, porém nunca perguntou nada diretamente. Imaginava que seria por eles terem começado a se falar mais depois de ambos iniciarem o treino com o time de vôlei uma semana depois do teste, o que não daria muita abertura para intimidade. Ainda assim os olhos claros do beta brilhavam como se quisesse saber o seu segredo.
— Um pouco, mas não é nada trágico e nem nada do tipo. É mais um desânimo que me pegou forte.
— Acho que entendo — Guilherme suspirou ao terminar de amarrar o cadarço e se apoiar no joelho — Às vezes as pessoas simplesmente não conseguem seguir em frente.
Aquela frase soou bem mais profunda do que Jake esperava. Pelo menos teve a impressão de que Guilherme estaria dando muito crédito para a desculpa do alfa.
No entanto, ao se dar conta de que o beta parecia imerso em algum ponto da arquibancada, Jake seguiu o seu olhar dando-se conta que sentado nas últimas fileiras estava aquele sujeito mascarado.
Desde o dia em que os treinos do time haviam começado, aquele cara estava presente. Quando o treinador estava em quadra, ele escondia a sua presença em algum canto nas laterais da arquibancada. Mas quando os jogadores estavam livres, ele sentava na última fileira e ficava assistindo.
Jake percebeu que aquele mascarado estava lá por causa de Guilherme.
Sempre o acompanhando, o que fazia com que os jogadores comentassem com mais frequência sobre os rumores a seu respeito. Nada fugia muito do que Matheus havia mencionado no outro dia, a ideia estapafúrdia dele ter sido preso e blá blá blá.
Eles podiam falar o quanto quisessem, mas ninguém tinha a coragem de perguntar algo diretamente para o mascarado.
De toda forma, Jake imaginava que Guilherme estaria falando sobre o dito cujo.
Graças a isso, imaginou que a sua nova rotina continuaria daquela maneira.
Não falaria com o tal do coringa, treinaria Guilherme para desenvolver mais táticas em quadra e ajudar Matheus com o time. Acreditava que não teria motivos para conversar com o mascarado, ou de saber a verdade por trás dos rumores. Que os seus mundos jamais seriam iguais ou os mesmos.
Cada um viveria em sua realidade, distante um do outro.
Isso é, se não fosse pelo o que aconteceria no dia seguinte.
Na sala de aula os alunos permaneciam quietos e concentrados em um trabalho quando um cheiro sutil começou a se espalhar no ar. A maioria do pessoal era beta, sendo que havia umas três garotas ômegas na turma, por isso, ao farejar o ar, Jake imediatamente reconheceu os feromônios de uma delas.
Tum tum.
Tum tum.
— Ei! O que pensa que está fazendo liberando feromônios numa sala fechada? — Gritou uma beta, cobrindo o nariz.
O calor começava a subir pelo corpo e o coração apenas acelerava. O único alfa daquela sala de aula parecia ter sido atraído por aquele adocicado aroma.
— E-Eu… Sinto muito, haaa…
— Abram as janelas! — Orientava a professora — Vamos tirar ela daqui e levá-la para a enfermaria!
Aos poucos as vozes foram ficando mais e mais distantes. Tudo o que Jake sentia era o seu corpo suar e reagir aqueles feromônios. Doce como um suave convite para envolvê-lo.
Mesmo cobrindo o seu nariz para não inalar mais, já era tarde demais. Ele mesmo começou a liberar os seus feromônios inconscientemente, fazendo com que a ômega notasse a sua presença e piorasse a situação.
— Ei, se controla, tem um alfa na sala!
— Puta merda, Jake, se controla! Não ouse sair do lugar! — Brigava um colega cobrindo o rosto do amigo com um lenço de pano.
O coração batia rápido e o seu corpo reagia em um suor intenso. Mesmo assim, Jake segurou firmemente na sua mesa olhando na direção da garota, estando completamente atento aos seus movimentos.
Uma vez que uma ômega descobre que tem um alfa perto, ela começa a liberar mais e mais feromônios com a intenção de seduzi-lo. E pela intensidade dos hormônios, era nítido que aquela moça havia entrado no cio no meio da aula.
— Alguém tem água aí? — Gritava a professora. — Eu tenho um supressor e posso medicar ela.
— Eu tenho!
Um instinto alfa sempre busca dominar tudo e todos.
Quando era provocado de tal modo, ele não descansaria até que conseguisse mostrar a sua força e autoridade. Tratava-se de um instinto que dificilmente poderia ser acalmado de uma hora para outra.
Somente se acalmaria quando sanasse cada desejo seu.
Com muito custo, Jake também revirou sua mochila pegando o frasco de comprimidos e tomando uma pílula. Enxugando o suor em sua camisa, ele respirou fundo também se esforçando para manter o controle e evitar que os seus feromônios vazassem.— Eu tomei meu supressor, tá de boa! Mas alguém aqui consegue levar ela pra enfermaria?Os rapazes da sala de aula até tentavam se aproximar da garota, mas Jake não pôde ignorar a malícia que alguns deles mostravam em seus rostos.Era uma mulher ômega fragilizada pelo seu cio repentino.Um filho da puta poderia se aproveitar da situação.— Vocês duas são amigas dela, não são? — Perguntava Jake se aproximando, se esforçando ao máximo para fingir não ser afetado pelos feromônios da ômega.— Ah, sim.— Eu posso carregar
Nunca tinha passado por uma situação daquelas, onde precisava urgentemente envolver o corpo de alguém com os seus feromônios para aliviar aquela sensação de possessividade. Assim como também era a primeira vez que encontrava alguém que não tinha cheiro algum, nem mesmo o singelo cheiro de beta.Bem… Imaginava ter sentido o cheiro de ômega quando tocou a sua máscara antes. Contudo o cheiro era tão fraco, que Jake cogitou a hipótese de ter se confundido.A questão era que o seu corpo latejava completamente, ainda sofrendo com os desejos impulsivos do seu lado alfa. Quando tinha vontade de atacar a pessoa da qual estava abraçado, Jake mordia o seu próprio braço tentando se conter.— Não fique se mordendo, por favor.Aquela voz era abafada, mas ainda assim gentil. Jake apertava os olhos tentando se conter de liberar mais do
Precisava arranjar um jeito de agradecer a ele.Mesmo quando era carregado por Matheus para o seu carro e levado para casa, ou então quando ficou acamado pelos próximos dois dias por causa de uma febre e dor muscular, Jake continuou pensando em encontrar o tal do Nath para agradecê-lo.Mesmo que fosse algum tipo de híbrido que não reagiria aos seus feromônios, isso não significa que ele poderia ser abraçado daquela forma. Ele sempre andava com o Guilherme, e pela proximidade talvez fossem mais que amigos…Porra! Será que eles estavam juntos?— Porra, Jake, que mancada.Só de lembrar que ele ficou longos minutos abraçado aquele coringa, Jake sentiu a sua febre aumentar. Esticando os braços para o ar, o alfa encarava as suas mãos ainda se lembrando da sensação de tê-lo ali.O seu corpo não era pequeno, tinha o presse
Jake jamais julgaria alguém pela aparência.Se havia algo que aprendeu nos últimos anos, é que as pessoas podiam ser melhores ou piores do que aparentavam. Por isso preferia ser educado com todos para evitar problemas, apesar de que às vezes não tinha como escapar de discussões e mal entendidos.Mas aquela era a primeira vez que Jake não fazia a menor ideia do que fazer.Os boatos que Matheus tinha contado antes giravam em torno de assassinatos e mandatos de prisão. Certamente aquilo era besteira, no entanto encarar aquela cicatriz causou arrepios em sua espinha como se aquela mentira estapafúrdia fosse uma verdade imutável.— Sei que é desconfortável, mas assim que eu terminar de comer colocarei a máscara de volta.Piscando aturdido, Jake voltou à realidade se recriminando por ter encarado demais o pobre rapaz.— Tá de
Haa… Como ele tinha se metido naquilo?Certamente o seu melhor amigo tinha algum plano por trás daquele sorriso bobo. A desculpa esfarrapada de que era apenas uma forma de se desculpar por ter sumido por dois anos não era tão crível. Pelo menos, Jake não acreditava.— Muito bem, vamos começar esse treino extra.— Conto com você, Jake.Segurando a bola embaixo do braço, o alfa analisava Guilherme de cima a baixo.Faz alguns dias que ele começou a seguir o treinamento de Santiago, provavelmente o seu corpo ainda estava se acostumando com a nova rotina. Apesar dele também ser um reserva, já que era um calouro, as suas habilidades como líbero eram interessantes o suficiente para que entre na quadra antes do esperado.Provavelmente Matheus queira que Jake lapidasse aquele diamante bruto.— No dia do teste, você não parec
A maior felicidade de um universitário eram os feriados.Em especial, o carnaval.Era praticamente uma semana inteira sem ter que ir pra aula. E se fosse esperto, poderia adiantar algumas tarefas para deixar o feriado livre sem nenhuma preocupação.Essas foram as medidas que Jake havia tomado, já que pretendia terminar o seu turno no restaurante e sentar para beber com os seus amigos. Mas para a sua infelicidade, o restaurante teve mais movimento que o esperado, postergando o fim do turno.— Mais cerveja pra mesa 8!— Saindo!— Garçom!— Opa, mestre!Jake serpenteava pelo restaurante desviando das pessoas até alcançar a mesa que o chamou. Retirou o bloco de notas e a caneta, logo anotando os pedidos feitos pelo cliente. E assim, voltou a desviar das pessoas para chegar até o balcão onde passaria o pedido pela pequena janela da cozinha.
Definitivamente a sua paz não duraria muito.Na medida em que os seus amigos bebiam e comiam, mais animados ficavam, principalmente depois que o treinador Santiago foi embora. E pareceu piorar assim que um cantor local começou a tocar algumas músicas ao vivo. Quando começou a tocar "evidências", a cantoria deslanchou. Era a primeira vez que Jake via o efeito manada acontecendo na sua frente.Começou com os bêbados do seus amigos, e quando chegou no refrão, o restaurante todo estava numa cantoria só.E para piorar tudo, os rapazes do time Akaguia reconheceram a Rapoxia.— Não me admira que aqui esteja fedendo, parece que tem um bando de selvagens aqui.Matheus não deixou passar batido a provocação. Sobre o ombro, ele abriu um sorriso malicioso sem demorar em responder.— Passarinho, que som é esse? Que som, que som é esse? Quem s
O que aconteceria se o cérebro humano tivesse um pequeno botão que desliga as emoções? Será que as pessoas teriam coragem de apertá-lo para fugir das dores que tais emoções causam? Provavelmente não, já que isso as impedia de sentir as boas emoções também. Abrir mão da felicidade para fugir da dor era algo que nem todos estavam dispostos a fazer.No entanto, havia uma pessoa que escolheu algumas emoções para trancá-las atrás de uma porta. Foi necessário trancafiá-las para a sua sobrevivência.As suas emoções poderiam matá-lo a qualquer momento.Então não seria melhor não senti-las?Tal ideia funcionou por alguns anos, mantendo não somente a si mesmo como as pessoas que lhe são queridas a salvo. Só importava que aqueles que viviam dentro de sua bolha