São apenas jovens

Matteo

Eu procurei manter a expressão mais neutra possível enquanto escoltava todo o grupo de jovens desordeiros até a presença da rainha. Eu ainda não compreendia muito bem a dinâmica daquele lugar, e lidar com a Aristocracia não era algo que eu estava acostumado, mas pude notar que não me faltariam conteúdo para entretenimento gratuito. 

Faz duas semanas que eu havia chegado no país depois de deixar minha terra natal em busca de uma vida melhor. Consegui aquele emprego graças a indicação de um amigo, que assim como eu, havia deixado a carreira militar em busca de uma vida mais tranquila.

 E devo dizer que me sentia curioso sobre tudo naquele lugar, e minha curiosidade acabara de aumentar com a presença de Anna Madeline Lechner, o momento em que ela desceu daquele carro, fixando seu olhar ao meu estava gravado em minha mente, e o som dos seus saltos contra duro piso de mármore me deixava consciente de sua presença, apesar de fingir ignorar o grupo de pessoas que eu escoltava.

Eu abri uma grande porta dupla, aguardando do outro lado até que todos tivessem entrado na sala particular da rainha, onde ela e os Brandstatter já aguardavam. Por um momento, eu fiquei em dúvida se assumia meu posto dentro da sala, ou se apenas me retirava, dando a todos um pouco de privacidade.

Decidi pela segunda opção dado a presença de tantas pessoas importantes para a corte real, inclusive o futuro herdeiro do trono, começando a fechar a porta enquanto me retirava, mas a própria rainha Johannah me impediu.

— Sr Bertozzi, fique. Essa conversa não é particular.

Fiz uma breve reverência como resposta, sabendo que nossa voz deveria ser ouvida o mínimo possível enquanto estivéssemos de serviço, fechei a porta e me posicionei em um dos cantos do ambiente. Tentando focar meu olhar em um ponto neutro da sala.

— Ótimo, seremos humilhados em público — meu olhar foi atraído para Anna, que murmurou descontente.

Aquele comentário não passou despercebido pela rainha.

— Disse alguma coisa, Srtª Lechner? — A rainha ergueu ambas as sobrancelhas, lhe lançando um olhar desafiador.

A jovem olhou em volta, parecendo surpresa por ter sido ouvida, enquanto seus pais lhe lançavam olhares irritados.

— Não, majestade, de forma alguma. Eu estou bêbada demais para falar qualquer coisa que faça sentido nesse momento — ela se justificou, fazendo com que seus colegas segurassem o riso enquanto seus pais pareciam prestes a desmaiar.

Um sorriso ameaçou chegar aos meus lábios diante da sua frase, mas os anos em serviço militar me ensinaram a me controlar, mantendo minha expressão neutra. 

— Anna, fique quieta — a senhora Lechner sussurrou.

— Tia, nós não podemos fazer isso depois? Eu estou…

— Silêncio, Frederick — A rainha ralhou, se sentando em uma cadeira antes de indicar os sofás confortáveis onde os pais do príncipe estavam acomodados — Sr e srª Lechner, vocês podem se sentar.

Anna deu um passo em direção a uma cadeira, mas foi interrompida.

— Apenas os seus pais, Srtª Lechner, você fica em pé com os outros — A rainha ordenou. 

Ela parecia disposta a protestar, mas Phillip Brenner a puxou de volta, fazendo com que ficasse parada ao seu lado.

De maneira discreta eu desci meus olhos por suas pernas, observando a bota de cano longo que deveria ter um salto de no mínimo 15 centímetros que lhe deixavam com uma postura elegante e sensual, mas em contrapartida imagino o quanto deve ser difícil permanecer em pé com aqueles saltos, ainda mais estando completamente embriagada.

Subi mais uma vez meu olhar pelo seu corpo, me surpreendendo ao encontrar Anna olhando diretamente para mim com uma expressão questionadora. 

Eu voltei a encarar o vazio me repreendendo por aquele deslize. Sabia que precisava me controlar, não poderia perder esse emprego. Não depois de ter uma oportunidade como essa.

— A senhora não vai falar nada? — o príncipe reclamou após alguns minutos. 

— Estou esperando até que todos estejam presentes — ela declarou.

Os três amigos se entreolharam parecendo surpresos com a resposta, mas antes que pudessem questionar, as portas pelas quais passamos antes foram abertas, revelando mais um rapaz de cabelos castanhos e um casal mais velho acompanhados por outro guarda, que assumiu uma posição ao meu lado em seguida.

Eu supus que aquele era Alexander Weisman, o quarto rapaz por quem estavam procurando durante a noite inteira.

— Finalmente, Sr e Srª Weisman, por favor, sentem-se — a rainha indicou ao casal.

Por um momento eu pensei que a punição que o grupo de jovens receberia seria passar as próximas horas ali em pé enquanto suas famílias confraternizavam com a rainha, mas após alguns minutos conversando como se eles nãos existissem, a mulher se levantou, caminhando diante dos quatro, os observando.

— Aqui estão eles, os maiores exemplos para os nossos súditos, o futuro de nosso glorioso país. Completamente bêbados, envergonhados e vestidos de maneira inadequada — a mulher andou de um lado para o outro na frente do grupo, mantendo uma pose altiva enquanto falava.

Ela parou na frente da jovem Lechner, a medindo dos pés a cabeça, como se apenas naquele momento tivesse percebido sua roupa.

— O que é isso que você está vestindo, Srtª Lechner? 

— Um vestido, Majestade — ela cruzou os braços em uma pose defensiva, mas um olhar severo de seu pai fez com que ela ajustasse sua postura diante da rainha.

— E onde está o restante desse vestido, Srtª Lechner? Esqueceu em seu armário? Você acha que essa é a forma correta de uma futura condessa se vestir? — a rainha lhe lançou um olhar duro.

Aquilo era um exagero para mim, eles eram apenas jovens que se empolgaram em uma comemoração, quantas vezes em minha vida eu não fiz o mesmo? Mas não ousava interferir naquela interação, mantendo a minha postura, fingindo não estar vendo nada do que acontecia ali.

— Não, majestade. Mas apenas fomos em uma festa, e… — ela começou a se justificar, mas logo foi interrompida por  seu pai.

— Madeline, ouça em silêncio — ele soltou em um tom duro.

Rainha Johannah estreitou os olhos, analisando cada um dos jovens do grupo, deixando um silêncio desconfortável na sala antes de voltar a falar.

— Eu apenas gostaria de entender quem teve a brilhante ideia de tirar o herdeiro do trono do país sem segurança nenhuma, passar a noite inteira sem dar notícias e voltar nesse estado, você poderia me ajudar com essa parte, senhor Weisman? 

— Eu teria que responder que essa brilhante ideia partiu do próprio herdeiro do trono, majestade — o rapaz respondeu com simplicidade, e ao meu lado, eu pude notar o esforço que meu colega estava fazendo para não esboçar nenhuma reação diante daquela cena.

Estava claro que nenhum deles estava levando a situação a sério, talvez por já ter passado por isso diversas vezes.

— Vocês acham que isso é uma piada? Quando passarão a encarar as responsabilidades de vocês? — a rainha ergueu a cabeça, caminhando de um lado para o outro, lançando a eles um olhar altivo antes de parar diante de um dos rapazes mais velhos — Sr Brenner, o que o seu pai diria se te visse nessa situação? Onde está a sua responsabilidade com a sua linhagem, com o título e o nome do seu pai? Você está com quase vinte e seis anos e não tem uma esposa nem filhos!

Aquele comentário parece tê-lo atingido, já que o rapaz desviou o olhar para o chão. Satisfeita com sua reação, a rainha seguiu adiante.

— É melhor você encontrar uma mulher adequada, ou eu farei isso por você. E quanto a senhorita, Anna? O que pensariam se te vissem vestida dessa maneira, sabendo que você saiu sozinha com três rapazes sem estar comprometida com nenhum deles? 

— Creio que o país todo saiba sobre nossa amizade, majestade — ela começou sua explicação, mas foi interrompida.

— E isso justifica suas vestimentas? Ludwig, Por favor me diga, você gostaria de ver sua filha vestida dessa maneira? Ou a futura esposa do seu neto? 

— De maneira alguma, majestade — o homem respondeu.

A jovem estreitou os olhos parecendo confusa com aquela interação.

— Você precisa pensar nas suas responsabilidades como…

— Eu não preciso aumentar família nenhuma, Majestade.

— O que? 

Eu e meu colega trocamos um discreto olhar diante da expressão perplexa da rainha por ter sido interrompida.

— Phillip, como o último Brenner, tem a responsabilidade de dar continuidade a linhagem da sua família, mas eu não. A não ser que a senhora planeje me casar com ele, coisa que eu duvido — eu desviei meu olhar para os Lechner que permaneciam sentados, parecendo cansados de toda aquela situação.

— Nesse caso, talvez você fique melhor servindo no St Mônica — a rainha devolveu.

Aquela declaração arrancou um riso involuntário do príncipe.

— Maddie em um convento? — ele se defendeu diante do olhar que recebeu de sua Tia enquanto a jovem arregalou os olhos em um sinal de aviso para o rapaz.

— Eu juro que…

— Majestade, talvez seja melhor deixar que eu lide com isso — Maximilian Lechner se levantou — vá descansar um pouco e se apronte para os compromissos de hoje.

Nós assistimos a indecisão tomar conta do rosto da rainha, enquanto pensava na proposta.

— Obrigada, Maximilian. E não pensem que acabou, eu vou querer uma audiência privada com cada um de vocês quando estiverem sóbrios — ela avisou antes de se retirar, deixando o imponente homem em seu lugar.

Todos observaram a rainha deixando a sala, e por um segundo o silêncio reinou entre todos 

— Eu me pergunto quando vocês passarão a entender que são o futuro dessa nação — ele começou, fazendo com que os quatro abaixassem a cabeça, apesar de não parecer nem um pouco arrependidos — E nesse momento, o futuro da nação está bêbado e sem rumo. Por Deus, eu quero que vocês saiam da minha frente, tomem um banho, café, qualquer coisa que deixem vocês sóbrios o suficiente para a inauguração da nova área do hospital mais tarde, vocês sabem que é um evento importante para a rainha, espero que estejam impecáveis. 

— Sim, senhor Lechner.

O restante dos familiares presentes naquela reunião se levantaram, prontos para retornar para casa.

— Maddie, nós ainda não terminamos — ele avisou a filha, que soltou um gemido desgostoso.

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