Festa na piscina era uma boa pedida para um dia de folga.
Imaginei jovens animados dançando no jardim da casa dos meus anfitriões, e embora eu mesma não soubesse dançar, me animei também.
O jantar de boas-vindas tinha me deixado mais à vontade, de forma que eu já não me sentia mais uma completa intrusa, só meia, mesmo. O mesmo poderia ser dito sobre meu bolo de aniversário. Se a intenção dos meus chefes era aumentar meu entrosamento, eles tinham conseguido com sucesso.
– Aquela festa vai rolar hoje e você está convidada – disse Kevin.
– Beleza! – respondi.
Apesar disso, estava tensa, pois não conhecia os amigos dele, nem sabia se era cabível participar desse momento de lazer.
Lena e João eram bons patrões e me tratavam muito bem, mas eu deveria abusar? Isso não era misturar as coisas?
Você que está lendo já deve estar farto das minhas perguntas.
Antes que eu pudesse expor esse pensamento, Kevin tinha dado as costas.Eu subi para escolher um traje de banho dentre os meus poucos. Olhei um por um e selecionei o maiô com estampa de abacaxi, presente da minha irmã pouco antes da minha partida. Me perguntei se ele não era exagerado demais, chamativo.
– A Califórnia tem belas praias – dissera Ester. – Pelo menos é o que Peter diz, ele já esteve lá várias vezes. Às vezes, o invejo, mas sabe de uma coisa? Me sinto feliz onde estou. Feliz como nunca estive. Claro que isso não significa que eu não queira viajar.
Senti saudades pela primeira vez no dia. Ester sim parecia uma cidadã do mundo. Quer dizer, até se apaixonar pelo cara mais tranquilo que nós já tínhamos visto.
A vida no apartamento da minha irmã não era perfeita, até mesmo porque, se fosse, eu não teria me mudado para a Califórnia naquela temporada.
Eu estava me desafiando, no entanto, em alguns momentos, queria, sim, estar sentada no sofá com Ester, esperando a novela das oito começar. Minha zona de conforto era ali.
Desde crianças nós éramos parceiras, e quando ela se casara com Peter, eu havia sentido que perdera minha melhor amiga. Agora ela seria a esposa de alguém, não apenas minha irmã dois anos mais velha que sempre me apoiava em tudo e que me dava a dose de coragem necessária para desbravar o mundo minimamente. Eu precisava me tornar uma mulher independente, afinal era isso que eu era: uma mulher, de forma que, tendo o substantivo, me faltava o adjetivo para compor a expressão.
Minha mãe fizera questão de que eu me mudasse com ela quando se casara, mas Ester e eu fincamos o pé dizendo que ficaríamos bem, juntas. Com ou sem Peter. Eu era grata por ela ter tido forças para lutar pela minha vontade junto a mim, pois mamãe não era do tipo que abandonava a cria. Ir com nossa matriarca não me dava boas perspectivas – a cidade para onde ela fora não oferecia muitas oportunidades, além do fato de meu padrasto ser taciturno demais para que nossa convivência passasse do “bom dia”, “boa tarde” e “boa noite”, o que não me agradava – e ficar no Rio, meu lugar de origem, era mais animador, principalmente porque Ester estaria por perto. E, então, com o coração na mão, minha mãe fora embora derramando muitas lágrimas e ameaçando nunca mais sorrir se eu não atendesse a todos os seus telefonemas, independentemente do que estivesse fazendo. Chorei também, pois sabia que uma mulher criada para ser esposa e que não sabia ser nada além disso, ainda que sua personalidade fosse ensolarada, o que permitiria inúmeras possibilidades caso ela ao menos soubesse da existência delas, acabaria caminhando exatamente para o rumo que estava seguindo. Na tarde em que ela pegara o trem, eu dissera a mim mesma que não queria ser como ela ainda que a amasse. É possível amar alguém e desejar ser totalmente diferente.
Voltando àquela tarde em Los Angeles:
Me olhei no espelho e coloquei meus shorts jeans por cima do maiô que Ester me dera, amarrando o cordão para apertá-lo em meu quadril. A timidez não permitia que eu exibisse minhas coxas brancas ao lado das prováveis beldades que estariam na festa com suas pernas bronzeadas. Era até uma afronta, eu, uma brasileira, me sentir assim. Mas eu não era uma brasileira típica. Nem sambar eu sabia, e se alguém me perguntasse qual era o meu time, eu responderia que era o Vasco da Gama, embora não soubesse o nome de nenhum de seus jogadores.
Desci logo depois e me deparei com dois convidados sozinhos próximos à piscina.
Eram rapazes da nossa idade, um loiro e outro negro. Eles sorriram ao me ver, e eu sorri de volta sem jeito, forçando simpatia.
Estavam de bermudas, ambos sem camisa. Um deles, o da esquerda, usava uma enorme e grossa corrente envolta no pescoço, e outras mais fininhas compondo o visual, todas também chamativas.
– Então você é a garota brasileira? – perguntou o garoto negro, que se chamava Frank. Ele não usava joias, mas ostentava no topo da cabeça um boné da Looney Tunes.
Respondi que sim e me apresentei.
– Marta era o nome da minha avó – disse o loiro chamado Junior. Era ele quem estava com as correntes penduradas. Parecia uma árvore de natal.
Eu estava sem graça ali, sem ninguém que conhecia para aliviar essa sensação. Sabia que ainda restavam muitas pessoas a chegar, incluindo o próprio dono da festa, que tinha ido buscar umas bebidas, e me arrependi de ter chegado cedo demais. “Chegado” é modo de dizer, pois eu estava hospedada a alguns metros dali na vertical, ou seja, no andar de cima.
–Então, Marta – continuou Junior. – Está gostando da cidade?
– Estou! É bem legal.
Eu sabia que precisava de um pouco mais de traquejo social, mas algumas coisas estão tão entranhadas na nossa personalidade, que são difíceis de mudar.
Eu me sentia à vontade com Kevin, e isso era uma raridade. Falando nele, o anfitrião chegou com as bebidas e mais quatro convidados, quer dizer, um convidado e três convidadas que me olharam de cima a baixo. Elas eram patricinhas dali.
Fui apresentada a todos e assim a festa começou pra valer, junto com a chegada de mais alguns jovens californianos de classe alta.
Kevin colocou algumas faixas de hip hop para tocar em seu rádio, e esses mesmos jovens dançavam ao som das músicas escolhidas enquanto eu me restringia a balançar a cabeça e dar um sorriso xoxo. Isso não era sinal de que eu estivesse infeliz, muito pelo contrário. Era uma diversão observar aquelas pessoas tão diferentes de mim.
Kevin estava novamente com uma camiseta branca, que eu constatei ser a cor que melhor lhe cabia.
– Cheguei com as bebidas – avisou.
Balancei a cabeça.
– Quer alguma coisa?
– Agora não. Obrigada!
Em algum momento, ele se jogou na piscina de roupa e tudo, incluindo seu relógio de pulso. O que isso importava, não é?! Ele tinha dinheiro para comprar quantos relógios quisesse.
Não saiu dela pela escadinha (ok, eu poderia ter deixado essa piada passar), pois isso não era de seu feitio.
Observei seu corpo bem delineado e molhado. Ele era atraente, droga! Eu não podia mais negar que me sentia atraída por ele. Isso porque mal o conhecia. Não era do tipo que me sentia atraída com facilidade, mas Kevin despertara algo inédito em mim.
Me permiti uma metáfora poeticamente pobre: Kevin era quente como o verão.
Respirei fundo.
– Fica à vontade – disse ele se sentando ao meu lado e me entregando uma garrafa de Pepsi, que eu aceitei.
Agora estava sem camisa, apenas com os músculos discretos expostos.
– Como assim? – perguntei observando as veias de seu braço.
– Sei lá! Acho que você está meio tensa.
–Impressão sua!
– Mesmo?
– Uhum!
Decidi não mentir. Era muito educado de sua parte deixar todos os outros convidados para me dar atenção, e diante desse gesto constatei que Kevin tinha puxado aos pais. Aquela velha história: quem sai aos seus...
– É estranho pra mim... Toda essa situação. Eu vivi a minha vida inteira em uma mesma cidade, convivendo com as mesmas pessoas. Comecei a trabalhar na sorveteria ainda na época da escola, então essa é a primeira vez que conheço gente nova em tempos. Acredite, é desafiador. Ainda estou me acostumando. Sou assim, gosto de observar.
– Como uma coruja – ele concluiu. – Eu meio que entendo.
– Mesmo?
– Sim! Lembra que estávamos falando de Yale? Então, quando cheguei lá, me senti um pouco como você deve estar se sentindo. Aqui na Califórnia eu tenho meus amigos, lá eu não conhecia ninguém. Lá era como se eu não fosse ninguém. Mas sabe o que descobri depois?
– O quê?
– Que isso era bom.
Eu entendi a profundidade da constatação. Kevin estava me dizendo que gostava de não ser quem era ali naquele momento. Mas por que continuava sendo? O fato de eu ter entendido revelava uma conexão entre nós.
– Vai demorar um pouquinho para eu me acostumar. É um novo mundo!
– Também foi como me senti quando cheguei aqui há uma década.
– E agora você é bem popular – constatei.
Ele sorriu de um jeito diferente, desanimado; o que me encheu de dúvidas.
– Vamos, Marta! Você é uma convidada. Quero que se divirta.
Algumas pessoas estavam na piscina jogando vôlei ou algo do tipo, e eu fiquei com vontade de sentir a água geladinha molhar meu corpo.
Kevin segurou minha mão para me levantar, e eu senti seus dedos longos e macios sobre a palma dela. Fiquei de pé.
Foi nesse momento que uma presença nova e paralisante chegou à festa, ou melhor, entrou em cena.
**
Tratava-se uma garota alta, de cabelos negros e curtos. Sua pele era igualmente negra e brilhante, e seu corpo parecia uma escultura. Os seios eram fartos, e os quadris, embora não fossem largos, eram harmoniosos, formando um conjunto sexy e belo.
Todos olharam para ela, como se sua chegada fosse um evento, assim como ela era.
– Summer! – exclamou alguma das vozes presentes.
Kevin soltou minha mão automaticamente e voltou toda sua atenção para a estranha que agora eu sabia se chamar Summer, e que era irmã de Frank, um dos dois garotos que já estavam na festa quando eu chegara (o que não usava as correntes).
– Oi! – disse ela abraçando os que haviam chegado antes.
Kevin não saiu do lugar, e eu me sentei novamente, deixando meu corpo cair.
Foi a recém-chegada quem se aproximou dele, mas ao invés de abraçá-lo ou cumprimentá-lo, ela apenas o olhou.
Eu, de onde estava, observei o vão entre eles, foi nesse momento que minha ficha caiu: Summer era a ex-namorada de Kevin.
Um clima estranho se instalou ali.
Bem, ela não era loira de olhos azuis como eu supunha, mas era americana e tinha seios fartos. É certo que eles formavam um casal e tanto. Digno de filmes pornôs. Só ali notei que, caso Kevin quisesse, poderia se dar bem nessa carreira.
Eu assistiria, com certeza!
Me levantei para pegar um ponche (embora estivesse com uma garrafa de Pepsi na mão) e sair daquela cena cinematográfica de reencontro. Ok, o ponche era meu pretexto.
– Quase que eu estava indo estourar umas pipocas – disse Junior se aproximando.
Eu ri forçadamente. Não gostei do modo como ele surgiu do nada, atrás de mim, como uma sombra, mas constatei que era coisa da minha cabeça.
– Não é?!
– Acho que é a primeira vez que eles se veem depois de anos.
– Sério?
– Sim! A Summer estava namorando um cara, mas terminou recentemente. Vai ser explosivo.
Eu dispensaria essa última frase dele. Sabia a que ele se referia: reencontros costumam ser ferventes, e aquele tinha tudo para ser.
– Ela foi convidada pra festa?
– Acho que não. O Kevin foi pego de surpresa pelo visto.
Eu concordava com isso. O efeito da chegada de Summer tinha sido genuíno demais para não ser surpresa. O anfitrião não esperava por sua chegada, assim como nenhum dos presentes parecia esperar. O momento de sua entrada tinha sido como o de uma noiva, só que inesperado.
– O Brasil deve ser um lugar quente – Junior disse.
– É sim! Muito quente.
– Tenho vontade de ir para lá.
– Vale a pena passar umas férias – concluí. – Mas você tem que passar muito protetor solar – ele era muito branco, ainda mais do que eu, e havia pouca melanina em seus cabelos, que eram loiros, e em seus olhos azuis como a piscina.
Voltei ao meu lugar e me sentei novamente enquanto bebia o ponche, mas então, ao ver as conversas animadas dos desconhecidos à minha frente, sentindo-me deslocada, decidi dar um novo rumo à minha tarde.
Ah, as praias de Los Angeles.A melhor escolha do dia fora sair da festa na piscina e ir para a beira do mar. Decisão acertadíssima. Era muito mais divertido ouvir o barulho das ondas do que o das vozes alteradas dos jovens quase bêbados, embora elas tivessem soado divertidas até certo ponto.Preciso dizer que não estava com ciúmes do brilho de Summer, ou da atenção de Kevin, que eu conhecia há tão pouco tempo, sobre ela. A questão é que eu não me sentia parte daquele mundo de mauricinhos de Beverly Hills. Eu estava nele, de fato, mas de passagem, e logo voltaria para minha antiga vida suburbana.Eles eram ricos, bonitos, e tinham sido agraciados com uma vida fácil demais, o que tornava sua existência quase entediante. Já eu, tinha tantos degraus a galgar, que era quase um luxo poder sentir tédio.Por alguma razão, em algum momento eu cogitara fazer parte deste universo, mas não fazia e tinha que aceitar isso, o que não era uma tarefa complicada.Pelo contrário, aquele não era meu lug
Foi a primeira vez que sonhei com Kevin. Um sonho quase erótico com o filho dos meus patrões. Algo tão indevido. Mas eu não tinha culpa, não é?! Ou será que tinha? Ah, Freud que explicasse isso do além, se quisesse. A mim mesma, eu estava reservando o direito de esquecer o assunto.Nossa conversa na praia terminara com ele se levantando, me estendendo a mão e me levando de volta para a festa onde Summer já não estava. Nenhum beijo acontecera. Não até o sonho, é claro.Acordei decepcionada, mas ao mesmo tempo aliviada, pois se a situação fosse real, poderia ter consequências graves (que talvez valessem a pena se ele beijasse tão bem na vida real quanto no sonho)."Ou vai, ou racha", era o que minha irmã costumava dizer quando me via com medo de algo. Apesar de eu estar longe de ser medrosa. Ok, ok, eu admito que era. Entretanto, não gostava dessa frase, pois ela me colocava na obrigação iminente de uma escolha. Às vezes, eu era boa em fazê-las, mas em outras não. Nesse caso, escolhi d
O ambiente era bem diferente da lanchonete dos pais de Kevin, e perdia muito em elegância, não chegando a poder se considerar um concorrente da Milk Shakespeare, sendo, porém, agradável o suficiente para que eu desejasse voltar; desta vez sem os intrusos.O McDonald’s era muito ofuscado na região devido à variedade de estabelecimentos do ramo alimentício. Ronald McDonal’d não era tão venerado quanto eu achava, mas, sendo sincera, era apaixonada por seu molho especial (cebola, picles, no pão com gergelim).Sentamo-nos em uma mesa de quatro cadeiras. Summer e Junior lado a lado e Kevin e eu opostos a eles. Este último estava visivelmente incomodado com a presença da ex-namorada ao lado de alguém que eu julgara ser seu amigo. Devia estar enganado, pois Junior não demonstrava nenhum constrangimento de estar com ela, pelo contrário, ele parecia estar feliz como alguém que tinha acabado de ganhar um troféu, que no caso era uma garota. Talvez ele tivesse ganhado outra coisa na sala de cinem
Pela primeira vez desde minha chegada, Lena iria receber visitas. Tratava-se de algumas das mulheres da vizinhança e do clube que sua família frequentava. Todas madames, eu supunha (e estava certa). Uma versão mais velha e feminina dos amigos de Kevin.Fui para o meu quarto para não atrapalhar, apesar de ter sido convidada a participar daquele momento "mulheres ricas". Eu imaginei que elas discutiriam juntas seus problemas de, adivinhe: mulheres ricas. Não eram, definitivamente, problemas sobre os quais eu poderia falar com conhecimento de causa, então preferi me abster. Se elas quisessem falar sobre contar moedas, aí sim eu poderia participar, mas não era o caso.Queria ligar para minha irmã para perguntar sobre a novela cujo primeiro capítulo eu tinha assistido antes de viajar para a Califórnia, mas que tinha sido o suficiente para ficar curiosa para saber quem seria A Próxima Vítima[1] (era esse mesmo o nome da novela). Nos EUA, as séries eram mais populares, e eu percebi que elas
Cortei as cebolas e as armazenei em um pote para que Alejandro utilizasse conforme preparava hambúrgueres.– Vai fazer o que hoje? – ele perguntou.– Que eu saiba, nada – dei de ombros. – Sem planos.– Quer conhecer a parte pobre de Beverly Hills?Aceitei o convite. Eu estava curiosa para saber mais sobre essa parte do bairro desde que ele me falara sobre o lugar onde morava. Até ali havia me alimentado com a imagem de pessoas ricas.– Vou preparar uma Tamale para nós.– Tamale? – perguntei.– É um prato típico mexicano.Antes de irmos, passamos no supermercado mais próximo para comprar os ingredientes para o tal prato. Alejandro colocou milho, queijo, pimentões e outras coisas em sua cesta.– Você veio para trabalhar aqui? – o interpelei.– Que nada! Vim sem emprego mesmo. Procurei muito em restaurantes de comida mexicana, mas não encontrei. Aí em um belo dia, acordei e decidi conhecer a famosa Beverly Hills (nessa época morava a alguns quilômetros de Bel Air). Sem a intenção, dei de
No final de semana seguinte, Lena estava de maiô na sala quando desci. Eu ainda ficava tensa de perambular pela casa, mas era inevitável; tinha que passar pela sala em algum momento, caso contrário pareceria uma princesa presa na torre.E a mansão realmente parecia um castelo moderno.Na tarde em que eu fora à casa dos meus amigos mexicanos, voltara cedo para não dar motivos para reclamações.– A fim de ir ao clube comigo? – ela convidou.– Clube?– Sim! E aí, vamos? Às vezes, eu trabalho tanto na lanchonete que preciso de um respiro, compreende?De fato Lena trabalhava muito. Eu ficava abismada com o fato de que uma madame, o que era o seu caso, continuasse fazendo isso mesmo estando rica o suficiente para se dar ao luxo de relaxar um pouquinho. Muitas, em seu lugar, estariam apenas colhendo os frutos do trabalho, ao invés de permanecer trabalhando. Ela era aficionada pela lanchonete, e isso me causava admiração. Eu queria ser como ela quando crescesse.– Kevin vai mais tarde – ela c
Se era atração sexual o que eu sentia por Kevin, então a única saída era deixar de sentir, já que essa era uma atração impossível. Parecia uma solução óbvia demais? Sim, parecia, mas o que não era nada óbvio eram os meios que eu usaria para chegar até lá. Ou tentar. Não que houvesse muitas chances de dar certo, contudo, eu precisava ser otimista.Me lembrei de certa vez em que Ester me dissera, após uma das suas dezenas de desilusões amorosas que duraram apenas dois dias:– Não há nada melhor do que gogoboys para nos fazer esquecer dos garotos que não são gogo!– Oi?! – eu perguntara na tentativa de compreender aquela frase insana.Era um trocadilho que precisava de mais de um idioma para ser compreendido. Segundo ela, havia dois tipos de garotos no mundo: os gogo e os não gogo. Os gogo eram autoexplicativos: caras que dançavam e recebiam dinheiro para fazer isso e outras cositas más (no Rio de Janeiro havia muitos desses espalhados, uns dançavam, outros só recebiam por sexo), e os nã
– Hoje não vou te esperar – disse Alejandro. – Tenho que comprar ração para o nosso gato e depois Daniel vai levá-lo ao veterinário.– Eu gostei do apartamento de vocês.– Aposto que ele não é nem a sala da casa da Lena.Eu sorri. Já tinha feito essa mesma comparação com o apartamento da minha irmã.– Talvez seja a sala e um banheiro.Me calei. Não queria ser pega fofocando.– Martinha! – Lena exclamou minutos depois de o assunto ter terminado.Completava meu primeiro mês na Califórnia, e assim eu receberia meu primeiro salário.Se fosse fazer um resumo da minha estadia ali, eu diria que as coisas tinham sido melhores do que eu poderia desejar. Eu estava aprendendo muito sobre culinária, incluindo pratos norte-americanos como as panquecas tradicionais deles, torta de maçã, molho barbecue... E tinha aprendido também uma forma de deixar as batatas bem sequinhas e crocantes.Vez ou outra eu ficava além do horário, coisa que não me incomodava nem um pouco.– Hoje é dia de sorrir, menina!