Quando acordou pela manhã, Charlotte notou que Willian não estava ao seu lado e agradeceu imensamente por isso.
Ergueu o corpo dolorido lentamente, lembrando-se de tudo o que ele havia feito com seu corpo na noite passada e sentindo o estômago se contorcer com nojo. Tudo o que Willian fazia quando se deitavam tornava o ato que deveria ser a consumação do amor de ambos uma tortura infinita. Ele tomava seu corpo com força, de forma bruta e sem cuidado algum, a agredia e a marcava de formas inimagináveis, tanto fisicamente, quanto psicologicamente.
Mas, apesar de ainda poder ver algumas manchas roxas espalhadas pela pele alva, decidiu que não pensaria nisso naquele momento. Guardaria suas lágrimas para chorar depois do desjejum, não o queria irritar, ele odiaria que ela se atrasasse e Charlotte não pretendia apanhar mais uma vez.
Lavou o rosto na bacia de água fria que ficava ao lado do quarto, então pegou um vestido simples de linho e colocou sobre seu corpo, cobrindo as suas roupas íntimas. Era simples, nem um pouco chamativo ou elegante, mas era o que tinha para vestir, afinal, segundo seu marido, mulheres de respeito se vestem de forma casta e não usam cores que chamem a atenção de outros homens.
Desceu os degraus lentamente e, ao chegar à sala de jantar, encontrou a mesa já posta e seu marido sentado na cabeceira. Charlotte se sentou ao seu lado, como sempre fazia, mas não tocou na comida. Esperou pacientemente enquanto Willian se servia, ele pegou de tudo, pão, chá, frutas e manteiga produzida na própria fazenda. Comeu como um animal, sem o mínimo de educação, por longos minutos, sem sequer olhar para ela.
Então, quando a comida já havia o deixado satisfeito, encarou a esposa e, tirando seu prato de perto de si, colocou no prato da jovem moça dois pequenos pedaços de pão, servindo uma xícara de chá e deixando ao lado dela. Para Willian, aquilo era mais que o suficiente para que ela se sustentasse até o jantar e não ganhasse peso.
Charlotte aguardou e, quando ele acenou com a mão, começou a comer, estava faminta. Claro que aquele pouco alimento que lhe foi nado em nada saciaria sua fome, mas era o que tinha e pretendia aproveitar. Enquanto comia, lutando contra o ímpeto de colocar tudo na boca de uma vez e mantendo a classe, como seu marido gostava, ela o viu observá-la por longos instantes.
— Seu irmão está de volta — Willian falou, observando a esposa com cautela.
Percebeu os ombros de Charlotte se erguerem levemente enquanto ela ofegava, também notou um brilho e um reflexo de algo que não soube identificar, cruzar os olhos esmeralda dela. Seria esperança? Talvez, foi o que lhe pareceu, e aquilo o deixou ainda mais apavorado.
Charlotte não disse nada, seu coração estava acelerado e seu corpo parecia querer explodir em muitos pedacinhos. Seu irmão estava de volta e, com ele, a esperança de ser salva do inferno que vivia há dois anos.
Mas a esperança e a euforia não duraram muito.
Charlotte estava tão imersa em seus pensamentos que sequer notou a aproximação do seu carrasco. Willian se ergueu rapidamente e, mergulhando os grandes e calejados dedos entre os fios ruivos, puxou a cabeça da jovem para trás com força, a olhando com os olhos levemente arregalados.
Charlotte sentiu o corpo gelar, nunca havia visto aquela expressão, nem nos piores momentos em que estivera com Willian. Era uma mistura de ódio e medo, seus olhos estavam arregalados, sua boca entreaberta e as sobrancelhas franzidas, ele a olhava com tamanha raiva que, por um momento, ela achou que aquele rosto seria a última coisa que veria na vida.
— Comporte-se bem, Charlotte , ou ninguém irá salvá-la da minha ira, nunca mais verá a luz do dia, eu irei levá-la para longe e você será minha até que eu me canse de você — ele falou, mas sua voz mas parecia um rosnado. — E quando eu me cansar, irei matá-la com minhas próprias mãos.
Marcel não dormiu. Rolou na cama a noite inteira, de um lado para o outro, imaginando as inúmeras possibilidades para o que poderia estar acontecendo com sua irmã. Então, na manhã seguinte, seu humor estava amargo para com todos, menos Chelsea e Brista, que ocuparam longas horas da sua manhã experimentando e mostrando para ele como haviam ficado os vestidos que o rapaz havia trazido da capital para as duas. Enquanto as duas garotas se divertiam, Judith observava o filho de longe. Sabia bem que ele estava estranho e tinha medo do que aconteceria à tarde, no entanto, ainda era a senhora daquela casa e Marcel não podia passar por cima de sua autoridade, ao menos era o que ela pensava. As horas se arrastaram durante toda a manhã. Enquanto Judith coordenava os empregados e o chá da tarde, já que as damas iriam tomar chá em sua fazenda naquele dia, Marcel aprontava o cavalo para seguir até a fazenda dos Griffin. — Mas eu queria ir também, irmão! — Chelsea insistia, enquanto o observava
Willian não apareceu na casa durante toda a tarde e, apesar de não querer, Marcel precisou ir embora e deixar sua irmã para trás, com a promessa de que voltaria. Instruiu Charlotte e pediu para que ela ficasse em seu quarto e trancasse a porta. Ele duvidava que Willian retornasse a casa naquela noite, o havia visto ao longe, encarando-os, durante a tarde, sabia que ele estaria na cidade afogando suas mágoas e era exatamente disso que precisava. Quando o sol se pôs e ele retornou a casa da fazenda, sua expressão deixava claro que não era um bom dia para conversas. Encarou sua mãe com um olhar de raiva, mas, ao menos naquele momento, não disse nada a ela. Marcel Capman mal entrou em casa e, logo em seguida, saiu. Cavalgou por longos minutos até próximo à cidade, encontrando a grande mansão. As luzes estavam acesas, havia carruagens e cavalos por ali, então, constatou que, por sorte, estavam presentes os demais membros. Amarrou seu cavalo junto com os outros e deu uma moeda ao garotin
Willian não sabia quantas horas passou na taberna, porém, só parou de beber quando o jogaram para fora como um cão. Estava tão bêbado que mal podia se aguentar de pé e a cidade já estava vazia, a não ser pelas prostitutas, que estavam aqui e ali à procura de um cliente para render seus lucros. Mas não se aproximaram dele, todas elas sabiam dos estranhos gostos do Griffin, de como ele era agressivo e violento, até elas resguardavam seu corpo, que era seu instrumento de trabalho. Jogado no chão sujo, Willian demorou para se levantar. Apoiou-se na parede da taberna e, com um grande esforço, conseguiu se pôr de pé. Havia bebido muito, muito mais do que costumava, e agora iria para casa. Queria ver Charlotte , queria tê-la para si e descobrir o que ela havia dito ao irmão. Sentia a raiva fazer seus dedos estremecerem e o medo gelar seu coração, tinha medo de perdê-la, ela era sua eternamente e não podia permitir que ninguém a tirasse dele. Seguiu até seu cavalo, montando sobre ele de for
Quando finalmente estavam sozinhos, Marcel caminhou até as portas do celeiro e as fechou, voltando-se para Willian novamente e caminhando devagar até ele. A princípio, não fez nada, somente o encarou com nojo e raiva, enquanto Willian o olhava com arrogância. Então, como quem libera uma besta de sua jaula, um furor se acendeu nos olhos azuis e, deixando de lado qualquer cavalheirismo e compostura, ele começou. Os punhos de Marcel o acertavam com tamanha força que Willian sequer conseguia acompanhar os golpes, só conseguia sentir a dor. Marcel o acertou com vários socos no rosto, vários chutes, jogou a cadeira onde ele estava amarrado no chão somente para poder pisar em seu rosto e cuspir nele, tratando-o como o animal que era e deixando que todo o seu ódio se esvaísse em violência, direcionada única e exclusivamente ao agressor de sua irmã. Enquanto era surrado, Willian gemia e pedia por socorro, xingava Marcel dos piores insultos que conhecia e, depois de um tempo, começou a implor
Charlotte estava nervosa. Havia feito exatamente o que seu irmão mandou, estava, desde a noite anterior, trancada em seu quarto. Havia organizado todos os seus vestidos numa grande mala, sabia que Marcel chegaria logo e não queria desperdiçar um segundo. — Charlotte ! — ouviu o chamado do irmão no andar debaixo e, só então abriu a grande porta, correndo até as escadas e deparando-se com uma terrível cena. Willian estava sendo carregado por dois homens que ela nunca havia visto, eles, bem como seu irmão, usavam roupas totalmente negras. Seu marido estava totalmente machucado, ensaguentado e desmaiado, mas ela não sentiu por ele nenhuma compaixão. — Senhorita Capman, é um prazer conhecê-la — falou Thommas, sorrindo para a mulher mais bela que havia visto em sua vida. Mesmo vestida de forma tão simplória, Charlotte conseguia atrair os olhares de qualquer um naquela sala, no entanto, os rapazes mal a encaravam, afinal, Marcel não estava num dos seus melhores dias e todos sabiam da
As palavras fizeram Brista e Chelsea arregalarem os olhos. Charlotte encolheu o corpo e abraçou-se na esperança de se consolar, pela segunda vez, estava sendo desprezada e amaldiçoada por sua própria mãe. Marcel, num acesso de fúria, ergueu a destra para Judith, mas parou com ela no ar ao ouvir a voz de Charlotte , baixa e sussurrada, sofrida. — Não precisa se preocupar, mamãe — ela iniciou, as palavras saiam como espinhos de sua garganta. — Não ficarei aqui, deixe-me na casa que fica na estrada, irei me manter distante, isolada de todos, a última coisa que desejo é prejudicar minhas irmãs. — Lottie — Brista falou, tocando os ombros da irmã com delicadeza. — Não precisa fazer isso, minha irmã…— Ela não irá, eu não vou permitir que Charlotte seja afastada de todos nós, mais uma vez, pela ganância da nossa mãe! — Marcel gritou, fazendo todas as mulheres na sala se encolherem tamanha a raiva em sua voz. Quando percebeu que as havia assustado, o rapaz massageou as têmporas e, an
Três meses depoisA luz do sol entrava pela janela e ia diretamente ao encontro do rosto da bela ruiva que dormia tranquilamente em sua cama. As cortinas não impediam que a claridade invadisse o quarto, mas isso não a incomodava, ela gostava de sentir o calor confortável dos primeiros raios solares da manhã ao acordar. Primeiro, moveu lentamente os dedos dos pés, inspirando profundamente e esticando o corpo pequeno e delicado ao passo que ouvia as suaves batidas à porta, certamente, seria Dália, lhe avisando que o café já estava na mesa. Assim eram seus dias desde que havia deixado para trás o pesadelo que viveu por dois anos. Charlotte Capman vivia sozinha com suas criadas, e melhores amigas, na casa mediana que ficava quase no final da propriedade de sua família. Não via muito suas irmãs, tentava não entrar em conflito com sua mãe, mas seu irmão ia visitá-la quase todos os dias. — Senhorita, quer dormir um pouco mais? Não precisa se levantar agora — Dália falou, após abrir a por
Então, seguiu para fora pela porta dos fundos, sentindo o sol aquecer sua pele e a brisa fresca e úmida denunciar que a chuva viria logo. Enquanto ela se afastava, as quatro mulheres a olhavam com certa preocupação. — Acha que ela está mesmo bem? Me preocupa que… — Dália iniciou, mas logo foi interrompida por Annie que apoiou sua mão rechonchuda no ombro da mais jovem.— Ela vai ficar bem, é uma moça forte, mas todos precisam de um tempo para superar os obstáculos da vida — dito isto, a senhora entrou na casa e, levando sua fiel companheira consigo, então todas voltaram aos serviços domésticos. Enquanto cuidavam do jantar e do chá da tarde, bem como da arrumação de toda a casa, Charlotte caminhava lentamente até o campo de flores que havia mais a frente de sua casa. Acenou para alguns capatazes que faziam a segurança do lugar enquanto seguia, mas sem aproximar-se muito. Os homens mal a olhavam, mas retribuíam seus cumprimentos com educação. Marcel deixara claro para eles que de fo