Capítulo 2 - parte 2

Quando entrou na casa observando o organizado, ouviu a voz de Judith, sua mãe. Nunca teve um bom relacionamento com ela, normalmente, Judith era controladora demais para com suas irmãs e, apesar das garotas acharem que aquilo era normal, Marcel não concordava com as atitudes da mãe, que manipulava tudo para arranjar para as meninas propostas vantajosas. Teve medo de voltar de viagem e encontrar Chelsea, que tinha somente 16 anos, casada. 

— Chelsea! O que eu disse sobre receber visitas como um animal selvagem? Olhe seus cabelos! — a voz de Judith ecoou por toda a casa, o grito foi alto o bastante para fazer a mais nova encolher os ombros. 

Marcel suspirou ao notar a irmã murchar, vendo toda a animação e euforia ir por água abaixo. Odiava aquilo, odiava a forma como sua mãe as obrigava a manter a compostura até nos momentos mais íntimos. Sabia que a educação das moças era importante, mas sentia que suas irmãs eram cobradas demais e aquilo o machucava. 

— Não ligue para isso, vá chamar Brista, quero vê-la! — falou, abaixando-se para deixar um beijo na testa da irmã e vendo-a correr para dentro, sumindo de vista. 

Ele seguiu para dentro da grande casa, chegando à sala de estar, Marcel viu sua mãe de pé na escada. Judith nunca mudava, seu porte elegante e altivo estava ainda mais presente, assim como o olhar de julgamento, afinal, ele estava fora há dois anos e aquilo a irritava profundamente, já que a vida boêmia que levava se espalhou até ali e chegou aos ouvidos de sua mãe. 

— Resolveu lembrar que tem uma família, Marcel? — ela perguntou, com uma expressão fechada. 

— Achei que era melhor voltar antes que casasse Brista e Chelsea com algum velho fazendeiro — alfinetou o rapaz, fazendo a mulher unir as sobrancelhas. — Também senti sua falta, mamãe. 

O rapaz se aproximou, estendendo as mãos para ela e segurando os finos dedos de sua mãe com carinho. Apesar de discordar de suas atitudes, a amava intensamente, assim como a suas irmãs. Judith apertou as mãos do filho delicadamente e desceu os degraus restantes, o abraçando e dando alguns beijinhos em seu rosto. 

— Está ainda mais bonito, meu rapaz! — falou, levemente emocionada. 

— Obrigada, mamãe — ele agradeceu, afastando-se dela e tirando o casaco, entregando-o à mulher. — Onde está meu pai? 

— No campo, sabe como ele é — respondeu ela, em tom de reclamação, dobrando o casaco. — Não sabia que vinha, seu quarto nem está organizado! 

Judith estava nervosa. Não havia se preparado para a volta de Marcel, aquilo mudava um pouco seus planos. Seu filho mais velho sempre fora bastante protetor e a situação de Charlotte  estava se sustentando até aquele dia justamente pela distância de Marcel. Não sabia como iria contornar a curiosidade do filho, tinha certeza que Chelsea havia dito alguma coisa, afinal, os olhos azuis e tempestuosos não negavam a curiosidade e a desconfiança que estava estampada no rosto do rapaz. 

— Eu achei melhor vir sem avisar, gosto de chegar de surpresa — ele comentou, erguendo os olhos para a mãe, estreitando as íris claras. — Como está Charlotte? Me disse que tudo estava bem e que ela vinha frequentemente a casa, mas Chelsea me disse que não a vê desde o casamento. 

O tom de Marcel era tranquilo, falava como quem dizia as notícias matinais e tediosas da corte, mas Judith sabia que ele só usava aquele tom quando estava ciente de que havia algo de errado. 

— Ela está ocupada com a vida de casada — justificou. — Tem sua própria casa e família agora. 

A forma como ela falava soou evasiva aos ouvidos de Marcel, que se silenciou, tinha seus próprios meios de descobrir o que estava acontecendo. Judith mentia muito bem, mas ele aprendeu a ler todos os comportamentos da mãe, dessa forma, ele era tão bom quanto ela em mentir e fingir quando queria. 

— Amanhã irei vê-la, quem sabe até levarei as meninas comigo, mas falamos sobre isso depois e… — Marcel estava prestes a falar que provavelmente passaria a tarde com Charlotte  quando sua cintura foi envolvida pelos braços delicados e afoitos de Brista. 

Diferente de Chelsea, Brista havia mudado muito. Seus cabelos estavam muito maiores, desciam como cascatas até abaixo da cintura, alguns fios tomavam uma tonalidade mais escura que outros, era encantador. Sua pele também estava mais bronzeada, assumindo um tom mais vivido e luminoso que combinava perfeitamente com a vivacidade de Brista e a impetuosidade que ela carregava. 

— Marcel! Estou tão feliz que voltou! Soube do duque? — ela disparou as perguntas rapidamente enquanto o soltava. 

— Também estou feliz em vê-la! — respondeu o mais velho, tocando as madeixas loiras. — Sim, inclusive, ele virá passar a temporada em nossa casa!

 — O QUÊ? — perguntaram as três mulheres em uníssono. 

Então, toda a sala se tornou uma confusão de vozes e Marcel se viu num longo interrogatório sobre o visitante que chegaria dali a alguns meses. 

***

Quando a noite já ia longe e a lua estava alta no céu, Judith se levantou de sua cama silenciosamente, vestindo o robe de seda perolado e ajeitando a touca nos cabelos. Saiu discretamente, ouvindo os roncos de seu marido e revirando os olhos, resmungando como ele roncava feito um porco no meio da noite enquanto deixava seus aposentos, não sem antes pegar o saco pequeno de moedas que guardava em sua gaveta de roupas íntimas. 

Caminhou silenciosamente até o escritório do marido, pegando papel e caneta, escrevendo um breve bilhete, dobrando-o e pondo num envelope. Judith não demorou a deixar o escritório e seguir em direção às escadas, ouvindo o ranger da madeira e amaldiçoando o linóleo velho enquanto caminhava, não podia chamar atenção de ninguém. 

Seguiu para os fundos da casa, chegando à porta que levava até os jardins traseiros e ao pequeno casebre, onde sabia que os trabalhadores solteiros ficavam jogando cartas até tarde da noite. Sem vergonha ou timidez alguma ela se aproximou, recebendo um olhar de surpresa dos dois capatazes que jogavam xadrez e bebiam cerveja. 

— Preciso que um de vocês leve isso até a fazenda dos Griffin — anunciou, com uma postura firme. — Meu marido e meu filho não devem saber, esse é o pagamento. 

Ela jogou um saco de moedas de ouro sob o tabuleiro, bagunçando todas as peças. Os homens pegaram o saco e um deles o abriu, sorrindo ao ver a quantidade generosa de moedas. Então, ambos se levantaram e, aproximando-se, um deles pegou a carta de sua mão e disse: 

— Com todo prazer, minha senhora. 

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