Capítulo 02

—Andria, você conseguiu o contrato com a empresa de medicamentos? —minha “supervisora” que na verdade é outra funcionária que acha que pode cobrar dos outros porque trepa com o patrão, veio me perguntar.

—Com a Medhappy? Sim, consegui. —respondi sem muita animação.

—Hum.. que bom. —ela respondeu, completamente falsa e manipuladora.

—Por quê? Você achou que eu não fosse conseguir? —perguntei de forma irônica e direta.

—Claro, eu conheço um talento quando vejo um, não reconheci nada em você. —ela disse.

—Oh não, querida, você só reconhece aquelas que fodem com o chefe para conseguir promoções. —debochei.

—O que está querendo dizer? —ela perguntou irritada.

—Querendo não, estou dizendo. —enfatizei.

Eu Karine nos odiamos logo que nos conhecemos, ela é insuportável e acha que um dia vai ser chefe disso, porque na cabeça dela, o chefe vai pedi-la em casamento qualquer dia desses. Muito humilde da parte dela.

—Você é apenas mais uma estrangeira tentando tomar o nosso lugar. —ela falou.

Eu a encarei com o rosto o mais debochado que consegui e falei:

—Tomando o seu lugar? Como eu disse, eu estudei para estar aqui, não precisei dormir com ninguém. E outra, se vocês fossem tão bons, não precisariam de pessoas como eu.

Eu trabalhei o mês passado inteiro no contrato da Medhappy, eles precisavam de anúncios e propagandas que conseguisse transmitir o que eles querem. Uma empresa séria que vende medicamentos e deixa o paciente além de saudável e curado, feliz.

Eu estou ansiosa para conhecer mais do lugar onde vou viver, preciso dizer que me sinto animada em ter conseguido alugar esse apartamento. A senhorinha, dona Marieta, disse que eu posso fazer qualquer mudança que quiser, desde que eu avise com antecedência.

Ainda não recebi nenhuma ligação de Thiago, pelo contrário, acho que ele até me bloqueou de seus contatos, mas é isso, nenhum de nós queria assumir que aquele noivado não iria pra frente.

Em meu horário de almoço, dava tempo de ir em casa, mas preferi comer em algum restaurante do quarteirão, eles são caros, mas como eu disse, vida nova, hábitos novos, não vai me matar se eu comer em um restaurante legal pelo menos uma vez.

Saí da sala ouvindo a voz irritante de Karine, dando graças a Deus pelo horário de almoço. A empresa onde trabalho fica no vigésimo andar em um prédio de vinte e cinco andares. Todos os andares são ocupados por empresas, o último andar é onde fica o dono do prédio, que também é dono de uma construtora com várias filiais pelo estado.

O elevador está vazio e eu fico feliz por isso, odeio aquele aperto de várias pessoas juntas ao mesmo tempo. Quando ele ia fechar, uma mão grande entra no meio entre as duas portas e elas voltam a se abrir.

—Bom dia! —eu falei hipnotizada.

—Bom dia! —ele respondeu seco e entrou.

Foi de forma despretensiosa, eu olhei para a pessoa e tenho certeza que foi o homem mais atraente que eu já vi na vida, cabelos castanhos, com alguns fios brancos, olhos castanhos e muito intensos, eu perdi até a noção de onde eu estava indo, tenho a sensação de que já o vi antes. Ele fez uma manobra com a língua, umedecendo os lábios e eu captei tudo. Quando ele virou o rosto para me encarar, eu apenas desviei e olhei para o chão. Depois de alguns segundos, ouvi sua voz grossa e rouca dizer:

—Você não vai a lugar nenhum?

Eu o encarei de forma totalmente patética, balancei a cabeça em afirmação e ele apontou para o painel. Claro, eu não tinha apertado nenhum botão.

—Ah, claro. —eu dei um sorriso nervoso e apertei o térreo.

Não dissemos mais nada, quando o elevador chegou ao meu destino, eu senti que minhas pernas iam desabar, mas consegui sair na frente dele, eu não tive coragem de olhar para trás, mas pude sentir sua presença.

Quando eu saí fora do prédio e me misturei com as pessoas que passavam pela rua, respirei fundo e olhei para trás, ele não estava mais. Balancei a cabeça e tratei de esquecer esse surto de agora.

Um restaurante de comida italiana foi o escolhido, entrei e fiz o pedido, eu nunca havia provado vinho, mas decidi que seria deprimente demais experimentar sozinha pela primeira vez. Quando houver uma boa companhia eu terei a oportunidade.

Meu telefone tocou e eu prontamente atendi, sem olhar o visor.

—Alô

—Andria, como você está? conseguiu a mudança? —minha mãe perguntou do outro lado da linha.

—Oh, sim, mãe. Consegui. —mudei de idioma e recebi alguns olhares, apenas curiosos.

—Ótimo, não deixe de me ligar, seu pai ficou preocupado. —ela comentou.

—Tudo bem, desculpe, eu os avisarei de agora em diante.

Entre uma conversa animada com minha mãe, meu prato foi servido e eu tive que desligar, me concentrei apenas na comida, um macarrão com molho de frutos do mar, eu comi bem devagar porque sei que isso irrita muito minha querida colega Karine.

Como imaginei, o prato custou uma fortuna, mas não me senti mal, pelo contrário, foi uma ótima experiência.

Ao voltar para a empresa, recebi outra ligação, mas por sorte olhei o visor, Karine já me ligava, certamente para perguntar se eu ainda voltaria a empresa, uma forma de dizer que eu tinha trabalho a fazer.

Eu não atendi, quero ver sua cara de raiva em cima de mim, nossa rivalidade faz valer a pena o emprego. Eu estava olhando algumas coisas em meu telefone, algumas fotos que minha mãe me enviou, meus irmãos foram passar o fim de semana com ela. Enviei uma mensagem de voz, em português enquanto o elevador subia.

Voltei a sentir aquela presença, meu corpo enrijeceu e o elevador estava tão silencioso que eu pude ouvir uma respiração pesada.

Quando as portas abriram, eu dei uma olhada apenas para confirmar, um par de olhos castanhos estavam me fitando, uma expressão indecifrável, uma que eu nunca tinha visto antes, virei o rosto para o chão novamente e me afastei.

Nem a voz de hiena de Karine foi capaz de causar algo em mim, passei o resto da tarde trabalhando, vez ou outra lembrando das feições daquele homem.

Ir para casa andando foi uma das melhores coisas que pude ter ao alugar aquele apartamento, pude ir no meu ritmo, presa em meus pensamentos.

Quando cheguei, fui direto tomar um banho, estava anoitecendo e eu queria aproveitar o máximo de tempo antes de dormir, talvez ver um filme, ler um livro.

O quarto é espaçoso, há uma parede toda de vidro, a que fica de frente para outra da mesma no prédio da frente, como eu ainda não vi ninguém lá, deixei a cortina aberta apenas nas laterais e fui tomar banho.

Minhas pernas voltaram a doer, ao me lembrar daquele homem, aquele olhar, suas mãos grandes e bem cuidadas, mudei do jato quente para o frio, para forçar minha mente a pensar em algo real e concreto, e não em uma pessoa que talvez eu não verei nunca mais.

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