Eu acordei um pouco mais acelarada que o normal, tudo estava pronto e eu não havia escolhido nenhum detalhe. Eu poderia fugir, mas concluí que isso acabaria em uma carnificina pior do que um casamento.
As pessoas já estavam aceleradas andando na pequena saleta do meu quarto quando eu finalmente as encarei com minha cara amassada e meu mau humor matinal.
Os sorrisos falsos a minha volta me davam uma vontade terrível de vomitar, era mais do que óbvio que eu não havia escolhido aquilo para mim, que foi um erro estúpido do meu pai me colocar um acordo falido de negócios.
Eu tenho a percepção de que ele achou que eles não cobrariam desse modo, quem seria o animal a querer se casar com alguém que nem ao menos conhece?
Mas ele se esqueceu de um detalhe dentro do nosso mundo, como se fosse um brasão para a família ao qual eu fui vendida:
OS VICENZZO SEMPRE COBRAM SUAS DÍVIDAS
O pensamento me causou arrepios, quando eu finalmente respirei fundo... Minha mãe veio ao meu encontro, e como sempre, me tratando do pior jeito possível.
- Maria Catarina, você deveria estar acordada á horas, hoje é o dia mais importante de nossas vidas! - Disse ela também de mau humor, que por coincidência sempre tinha a ver comigo de alguma forma.
Minha mãe me odiava, desde o meu nascimento e eu sabia muito bem que o motivo daquele desassossego pessoal era só o fato de estar finalmente se livrando de mim. Sua filha mais nova e rebelde, segundo ela mesma.
- Você fala como se eu estivessse animada com esse dia, é tanta hipocrisia dentro de uma sala que faz o meus ossos doerem! - Eu disse a encarando nos olhos.
Ela não se conteve e me deu um tapa no rosto, tão forte que Lourdes, minha ama deu um grunhido de terror.
- Não se atreva a levantar a voz para mim sua fedelha! - Disse ela com suas pupilas dilatadas e verdes, destacadas em meio as bolotas vermelhas de ódio.
- Vocês estão me vendendo como se eu fosse uma vaca no pasto e eu deveria sorrir e acenar? Não consegue ser benevolente comigo nem em meio a essa situação? Onde está o meu pai?
Apesar de toda aquela situação, eu sabia que o meu pai ao menos me protegeria das selvagerias da minha mãe.
- Hoje você é problema meu, o seu pai não quer vê-la a não ser no altar. Tarefa insuportável a minha, mas cumprirei com prazer! - Disse ela se voltando para o vestido rendado pendurado na porta.
Eu a segurei pelos braços em uma atitude de profundo desespero e olhei dentro de seus olhos tão diferentes dos meus, não pude conter as minhas lágrimas ao dizer:
- Por que mãe? Por que me odeia tanto?
Ela fez sinal de que ia ao menos me dar uma resposta, o meu coração estava aflito, eu precisava saber o motivo de todo aquele ódio e falta de amor. Mas ela não disse nada, como nunca disse e nunca iria dizer, eu concluí.
- Tudo bem senhora - Interferiu Lourdes - Eu posso ajudar a Catarina, assim não temos mais brigas por aqui!
- Acho melhor, não tenho tempo á perder com perguntas estúpidas em uma dia importante como esse, Maria Catarina esteja pronta no salão principal da casa as 15:00 e nenhum minuto a mais, você entendeu? Lourdes, garanta isso! - Disse ela dando as costas com seu vestido pomposo, com certeza comprado com um dinheiro que poderia me salvar daquela ruína terrível.
Eu chorei copiosamente enquanto Lourdes penteava os meus cabelos, como ela fazia desde que eu era criança.
- Ela me odeia tanto ao ponto de nem ter tentado me salvar, e quanto ao meu pai? E quando Liz? Ela nem sequer vai vir ao meu casamento?
- Dona Liz está na sala com o seu pai tem um tempão Catarina, ela chegou a algumas horas. Ouvi dizer que seu pai está arrasado, não consegue te olhar nos olhos.
- E o que eu deveria dizer sobre isso? Eu deveria dizer que ele está me fazendo um favor me vendendo ao homem mais cruel do mundo? Deveria morrer por sua promessa como é o costume da famiglia, pelo menos teria um pouco mais de honra esse filho da puta!
Lourdes se abaixou em um rompante de ódio que me deu arrepios, me encarou nos olhos antes de disparar:
- Não ofenda o seu pai, existem coisas que você não sabe! Existem histórias antigas, acordos de proteção que foram feitos antes mesmo de você dar os seus primeiros passos. Otto é um bom homem e sempre foi, ele te amou profundamente enquanto sua mãe a desprezou, sobre isso você pode falar, mas não vou permitir que você abra a boca para falar mal de seu pai na minha presença Maria Catarina Lion!
- Não me chame de Lion, esse sobrenome está sendo negado hoje para mim! Serei uma Vicenzzo contra a minha vontade, eu os odeios mais do que tudo e agora vou ser obrigada a cuspir uma prole de novos demônios para o mundo! E ninguém conseguirá me proteger, ninguém conseguiu me proteger e você olha dentro dos meus olhos para me dizer que o meu futuro é justo Lourdes? Você também não tem honra? É do mesmo saco de farinha que Otto e Vanessa Lion!
- Não diga coisas pelas quais você certamente vai se arrepender Maria Catarina, eu aposto que se você se esforçar você e Enzo poderão se amar de verdade.
- Eu jamais poderia amar o meu torturador, jamais poderia amar alguém que me compra como uma cabeça de gado que ia para o abate.
- Ser a mulher mais poderosa da Italia parece um mau negócio para você? Encare esse desafio, sei que você nunca fugiu de um.
- Sempre fui livre para escolher os meus desafios Lourdes, esse desafio só me colocará em uma gaiola dourada. Nada além disso, homens como Enzo Vicenzzo nunca poderão sentir o que significa o amor de verdade, e por causa de um erro do meu pai, eu também nunca saberei o que significa isso.
- Chega de auto compadecimento, se levante, vamos colocar logo esse vestido e acabar com isso!
As batidas na porta nos deixaram em alerta, Lourdes gritou para que a pessoa entrasse.
- Senhorita Catarina o seu pai quer vê-la, pode ir até lá?
Eu não me fiz de rogada, saí como um foguete pelos corredores até o escritório do meu velho pai, com sangue nos olhos, língua afiada e um monte de mágoas que estavam me sufocando.
Abri a porta sem olhar dos lados, não queria encarar a minha invejosa irmã Maria Liz de frente.
- O senhor mandou me chamar, quer ver como está a sua vaca de ouro? - Eu disse arrogante, tentando manter o controle para não chorar.
- Eu só queria dizer que um dia... Deus me permita viver para ver, você irá me perdoar!
- Por ter colocado nossa família em uma ruína tão nojenta que eu estou sendo vendida para o demônio Vicenzzo? Por que não Maria Liz? - Eu disse com o olhar mais desdenhoso que consegui lançar sobre ela.
- Digamos que eu não tenha o pedigree que você tem - Disse Liz com um olhar de deboche - Mas sendo você um demônio pior do que ele, vai conseguir se adaptar com facilidade.
- Basta! Basta vocês duas! Sempre o ambiente dessa casa tem que ser hostil assim? Não podem se ajudar como irmãs!
- Você sabe que ela não é minha irmã! - Disse Maria Liz com os olhos cheios de ódio e lágrimas
- CALADA! SAIA AGORA DA MINHA SALA, QUERO FALAR A SÓS COM MARIA CATARINA!
Ela ia confrontar, mas ao ver o ódio estampado no rosto do meu pai, desistiu desse feito. Saiu com a cabeça baixa o coração pesado e com certeza a mente cheia de ótimos palavrões para soltar pelo ar nessa ocasião.
- Eu jamais vou te perdoar! Desista disso, consiga outro acordo...
- Eu preciso te dar uma coisa, olhe bem para isso... - DIsse ele pegando um amuleto pesado em uma caixa de veludo vermelha, dava para ver que era ouro puro. O que só me deixava com mais raiva.
- Já ganhou alguma parte do pagamento por me vender? Vai dar esse colar para enfeitar o pescoço da minha mãe?
- Não, isso é seu. Foi dado a você no dia do seu nascimento, Quero que guarde isso com a sua vida, no momento certo, você saberá todas as respostas, só acredite minha filha, minha amada filha, eu te amo mais do que consigo traduzir em palavras. Por favor, pegue a caixa com o colar, leve com você para sua nova casa e principalmente, lembre-se desse aviso: Não confie em ninguém, só confie em Enzo, você entendeu?
- Ficou doido? O homem é o diabo encarnado! Como posso confiar em alguém assim?
- Faça o que eu digo para permanecer viva, confie em Enzo! Me prometa Maria Catarina...
- Eu tenho que ir agora, falta uma hora para essa crucificação começar e eu preciso estar preparada, se não sua amada esposa vai espetar minha cabeça no muro da casa.
Dei uma olhada em meu pai e saí em silêncio pela porta, com o coração acelerado, a caixa nas mãos e a mente cheia das maiores dúvidas do mundo. Eu caminhei até meu quarto, joguei a caixa em cima da minha cama, vesti o maldito vestido de noiva com a cabeça alta, sem deixar que alguém além de Lourdes percebesse minha miséria, fiz uma maquiagem básica e ás 14:55 eu já estava na sala como mandou a bruxa que me colocou no mundo.
As pessoas já estavam apinhadas no jardim, eu podia visualizar a tenda branca montada no ponto central, ao lado da fonte da fortuna que fora colocada lá por minha avó, ah se ela estivesse viva para ver o que o sobrenome que ela e meu avô tanto amavam virou.Eu desci as escadas sem me importar com o fato de que eu era a noiva, mas aquilo não agradou minha mãe que caminhou até mim, segurou o meu braço como se fosse um gavião e me levou para a biblioteca.- Você ficou louca menina? Espere até o seu pai vir te buscar aqui dentro, ninguém pode ver a noiva. Eu ri com a inocência dela - Você acha que o demônio Vicenzzo vai se importar de me ver apenas no altar? Ele nem deve ter chegado, eu não vou ficar presa aqui feito um bicho!- Enzo já chegou, ele vai fazer a entrada em poucos minutos, pelo menos uma vez na vida, não estrague tudo Maria Catarina! Eu me sentei, eu era voto vencido e não fazia sentido que eu gastasse a minha energia discutindo com minha mãe, talvez eu devesse guardar en
O dia passou rápido e a noite também o meu estômago já estava ambrulhado pensando que eu teria ainda que enfrentar a noite de nupcias, não era como se minha mãe tivesse me dado uma aula sobre o que ia acontecer, ela só me disse: Fique parada, acaba rápido. Eu me apeguei a essa ideia e não era como se eu fosse uma verdadeira beata, eu sabia muito bem o que podia acontecer, mas estar na presença de um homem tão avassalador causa um pouco de pânico. Nós passamos a noite toda afastados, ele me olhava de longe, talvez para garantir que eu não falasse com mais ninguém que ele desaprovasse. E então uma limusine parou no terreno, a placa de recém casados estampada no vidro de trás e as latinhas que eram parte da nossa cultura. Meu coração acelerou sem que eu pudesse evitar e ele disse mais uma vez "Vamos Catarina" e naquele momento eu não tinha como dizer um não.Entrei dentro do carro e me sentei o mais longe possível e então pela primeira vez eu vi um sorriso no rosto de Enzo, mas o sor
Eu não consegui dormir, mesmo naquela cama confortável. Eu rolei de um lado para o outro e tudo o que eu poderia fazer era andar por aí, sei lá, a ideia de estar trancafiada naquele quarto me incomodou. Coloquei o primeiro roupão que eu achei e saí pelos corredores acendendo todas as luzes, subi mais um andar e pude ver mais da beleza do local. Mas a voz de Enzo no final do corredor me atraiu para lá. Além do fato de que eu sou extremamente curiosa. Ele falava ao telefone concluí, não havia outra voz.- Ela já está instalada, eu não pude continuar [...] - Ela é difícil sim, mas nada disso é culpa dela certo Giovanna? Ela foi metida nisso quando nasceu! [...] Por que está me ligando? Por que está tão interessada em minha noite te nupcias? [...] Lógico que eu não irei te encontrar, você ficou maluca? Eu sou um homem casado! Eu não aguentei, minha personalidade era demais para eu conseguir conter ela e simplesmente ir dormir. Eu abri a porta em um rompante de raiva tão colossal que
Ele realmente ia consumar o nosso casamento na sala pastoral? O meu coração estava pulsando dentro de mim, mais rápido do que o normal. Ele deu a volta na sala toda lentamente, parecia estar procurando alguma coisa para me punir, mas o olhar dele já estava castigando o meu espírito. - O que você está fazendo Enzo? - eu disse visivelmente assustada, mas tinha algo naquela situação que estava me fazendo perder o juízo. - Eu vou dar o que você quer! - Ele disse de maneira gelada, após isso fixou os olhos em mim de novo, e eu podia jurar que eles flamejavam. - Eu só queria me divorciar, eu falei a primeira coisa que veio á minha cabeça... - Tentei me corrigir antes que ele completasse o seu cerco e ficasse perto de mim. - Você veio até a igreja dizer que eu não consumei o meu casamento e esse era o motivo pelo qual você queria o divórcio, pois bem Catarina, eu estou disposto a consumar o casamento agora. - Não precisa ser agora, nós estamos em uma maldita igreja!- Eu nunca tive ap
Eu podia ver a expressão no rosto dele, não era um romance.Ele só queria cumprir o que achava que tinha que cumprir, me olhou nos olhos mais uma vez, tentando não ofegar enquanto fazia isso e disse - Vista suas roupas, o mais rápido possível, eu vou te levar para casa. Eu não consegui dizer nem que fosse uma palavra, fiquei olhando para o chão. Eu o via em conflito com suas próprias emoções em relação a mim, tentei me manter fria, quem eu pensava que era afinal? Eu o conheci ontem basicamente e de repente virei uma princesa precisando ser salva de uma m*****a torre?Enzo abriu a porta e me esperou passar por ele, ainda sem jeito tentando ajeitar o meu cabelo.Passamos pelo padre que claro, evitou a todo custo olhar nos olhos de Enzo, aposto que aquele rato estava morrendo de medo, não se preocupou nem um pouco com a profanação na paróquia, como era de se imaginar. - Problema resolvido padre, estamos casados - disse ele para o padre enquanto terminava de fechar botões em sua camisa.