O salão do convento parecia pequeno demais para conter a avalanche de emoções que tomava conta de Valentina. Antônio Montenegro, um estranho até alguns minutos atrás, afirmava ser seu tio, revelando uma história que ninguém jamais lhe contara.Gabriel manteve-se ao lado dela, atento a cada gesto do homem.— Você espera que eu simplesmente acredite? — Valentina cruzou os braços, tentando disfarçar o turbilhão em sua mente.Antônio suspirou.— Sei que é difícil de aceitar, mas não estou aqui para mentir. Seu pai e o meu eram irmãos. Eles cresceram juntos, mas seguiram caminhos diferentes.— Então por que ninguém nunca me disse isso? Nem minha mãe, nem meu pai, nem ninguém da cidade? — Sua voz carregava uma mistura de incredulidade e raiva.— Porque era perigoso. — Antônio respondeu. — Meu pai e o seu tiveram uma briga feia. Vicente queria transformar Sant’Elisa em algo que seu pai jamais concordaria. Ele se envolveu com gente poderosa,
O ar da madrugada estava pesado quando Valentina e Gabriel deixaram a biblioteca. O silêncio das ruas de Sant’Elisa parecia mais ameaçador do que nunca. Vicente Montenegro estava vivo. E, se soubesse que ela estava investigando, poderia vir atrás dela a qualquer momento.— Precisamos agir rápido — Gabriel disse, caminhando ao lado de Valentina. — Se Vicente estiver realmente por perto, não podemos dar tempo para que ele faça o primeiro movimento.Valentina assentiu, mas sua mente estava longe. O medo era uma sombra constante, mas havia algo mais: um sentimento de inevitabilidade. Como se tudo em sua vida estivesse levando-a até esse momento.Ao chegarem ao convento, um envelope os esperava na porta. Gabriel se abaixou primeiro para pegá-lo, seus instintos de alerta à flor da pele.— Isso não é bom.Valentina pegou o envelope de suas mãos e o abriu com cautela. Dentro, havia apenas um bilhete curto, mas suficiente para gelar seu sangue:
O amanhecer trouxe uma inquietação difícil de ignorar. Valentina acordou com o coração acelerado, como se seu corpo já soubesse que algo estava prestes a acontecer. Gabriel já estava na cozinha do convento, com uma xícara de café nas mãos, folheando o jornal do dia. Assim que a viu, ele ergueu o jornal e apontou a manchete: "O Fantasma de Sant’Elisa: A Verdade Sobre Vicente Montenegro" Valentina pegou o jornal com as mãos trêmulas. Seu nome estava lá, assim como o de seu pai. Isabela havia exposto todas as conexões de Vicente com corrupção, desvio de dinheiro e, principalmente, com a morte de Antônio Vasquez. — Está feito. — Gabriel murmurou. — Agora ele virá atrás de nós. — Valentina disse, sentindo o peso da decisão que haviam tomado. Gabriel segurou seu olhar por um momento antes de dizer: — E estaremos esperando. Não demorou muito. No meio da tarde, uma viatura
O convento estava silencioso, mas dentro da mente de Valentina, um turbilhão de pensamentos e medos se acumulava. Ela andava de um lado para o outro no pequeno escritório, enquanto Gabriel, apoiado contra a mesa, observava atentamente. — Precisamos expor Vicente de uma vez por todas. Não podemos mais agir na defensiva — Valentina disse, quebrando o silêncio. Gabriel cruzou os braços. — Se formos até a delegacia amanhã, como querem, estaremos entrando no território dele. Isso pode ser exatamente o que ele deseja. Ela parou e olhou para ele. — Então precisamos nos antecipar. Gabriel assentiu. — Há um promotor na capital que já investigava Vicente antes, mas ele nunca teve provas concretas. Se entregarmos o que temos diretamente para ele, podemos tirá-lo do poder sem precisar nos expor tanto. Valentina ponderou por um momento. — Como podemos confiar que
O armazém ainda estava cercado por policiais, a luz vermelha e azul das viaturas refletindo nos rostos de Valentina e Gabriel. O caos ao redor parecia distante para eles. Depois de tantos dias de tensão, investigações e ameaças, finalmente Vicente Montenegro estava sob custódia.Valentina ainda sentia seu coração acelerado, não pelo medo, mas pela adrenalina que corria em seu corpo. Gabriel, ao seu lado, limpava o sangue no supercílio com um lenço improvisado.— Você devia ir ao hospital — ela disse, tentando manter a voz firme, mas o tom preocupado era evidente.Gabriel sorriu de lado, como sempre fazia quando queria aliviar a tensão.— Já passei por coisas piores.Ela franziu a testa.— Isso não significa que não deva se cuidar.Ele segurou o olhar dela, e por um momento, o mundo ao redor desapareceu. Valentina sentiu uma estranha mistura de alívio e nervosismo. Gabriel sempre teve aquele efeito sobre ela, mas agora parecia mais intenso.— Se eu me cuido ou não, acho que isso não é
O vento frio da noite cortava a pele de Valentina enquanto ela caminhava rapidamente pela rua de paralelepípedos. O convento estava a poucas quadras dali, mas sua mente parecia estar a quilômetros de distância. Seu coração ainda pulsava forte no peito, não pelo medo, mas pelo beijo que ainda queimava em seus lábios.Ela entrou pelos portões laterais do convento, evitando qualquer contato com as irmãs que poderiam estar acordadas. Ao chegar ao seu quarto, fechou a porta e se apoiou contra ela, tentando recuperar o fôlego.O que eu fiz?A pergunta se repetia em sua cabeça como um eco interminável. Ela levou os dedos até os lábios, sentindo ainda a presença de Gabriel. A intensidade, o calor, o desejo… tudo que deveria ser reprimido, mas que explodiu de maneira incontrolável.Valentina caminhou até a pequena escrivaninha e abriu sua Bíblia, tentando encontrar nas palavras sagradas alguma resposta para o que sentia. Mas, em vez de conforto, encontrou mais dúvidas.Ela havia escolhido esse
Valentina sentia o gosto do pecado nos lábios. Ainda conseguia sentir o calor de Gabriel, a forma como ele a segurara, como se o mundo inteiro dependesse daquele beijo. Mas agora, no silêncio de seu quarto no convento, tudo parecia errado.Ela se ajoelhou diante do crucifixo na parede, as mãos trêmulas.— O que eu fiz? — murmurou, fechando os olhos com força.O peso da culpa pressionava seu peito. Passara anos se dedicando à vida religiosa, lutando para ser uma mulher íntegra, e agora… Um único beijo tinha colocado tudo em dúvida.No entanto, mais do que a culpa, o que a assustava era outra coisa.Ela queria mais.•••Na manhã seguinte, Valentina evitou olhar para qualquer pessoa. A madre superiora notou seu silêncio, mas não questionou. Talvez pensasse que era cansaço, talvez sentisse que algo estava errado.Mas Gabriel não a deixaria fugir tão fácil.Quando Valentina saiu para inspecionar as reformas
A chuva castigava o telhado do convento naquela madrugada. Valentina revirava-se na cama, incapaz de encontrar paz. As palavras de Gabriel ecoavam em sua mente, a sombra de seu toque ainda queimando sua pele.Ela tentou rezar, tentou sufocar o desejo que a consumia, mas nada adiantava.Então, ouviu um ruído.Seu corpo congelou.A porta de seu quarto estava entreaberta. O vento não era forte o suficiente para tê-la empurrado daquela maneira.Levantou-se, os pés descalços no chão frio, e foi até a porta. Olhou pelo corredor vazio e, por um instante, sentiu que estava sendo observada.Seu coração acelerou.Respirando fundo, fechou a porta e voltou para a cama, mas o desconforto permaneceu.•••Na manhã seguinte, Valentina encontrou Gabriel do lado de fora do convento, perto das obras do orfanato. Ele parecia diferente — mais sério, mais sombrio.— O que houve? — ela perguntou, notando as olheiras