A luz da manhã atravessava as janelas do pequeno café, pintando padrões dourados sobre a mesa onde Gabriel e Valentina estavam sentados. Gabriel mantinha as mãos cruzadas sobre o tampo de madeira, o olhar atento à porta de entrada. Valentina, por sua vez, mexia distraidamente em sua xícara de chá, perdida em pensamentos.
— Você acha que ela vai aparecer? — Valentina quebrou o silêncio, sua voz carregada de hesitação.— Ela insistiu para que nos encontrássemos. — Gabriel olhou para ela, o tom mais firme. — Mas sinceramente, não sei o que esperar.Valentina suspirou, encostando-se na cadeira.— Depois de tudo o que ela fez... é difícil acreditar que esteja realmente arrependida.Antes que Gabriel pudesse responder, o som da porta do café se abrindo chamou a atenção dos dois. Renata entrou, hesitante, os olhos varrendo o local até encontrar os dois. Seu cabelo estava preso de maneira desleixada, e ela parecia cansada, uma sombra de sua antiga conO sol começava a surgir por trás das montanhas que cercavam Sant’Elisa, banhando a cidade com uma luz dourada. Valentina estava na varanda do antigo convento, os olhos fixos na vastidão do terreno à sua frente. Os ecos das vozes do passado pareciam mais distantes agora, mas não ausentes. Era um novo dia, um novo começo, e ela sentia o peso da responsabilidade sobre os ombros.Gabriel apareceu atrás dela, com duas xícaras de café nas mãos.— Pensei que um café pudesse ajudar a começar o dia.Valentina se virou, sorrindo ao aceitar a xícara.— Obrigada. Não sei se é o suficiente para lidar com tudo isso, mas ajuda.Ele se apoiou na grade ao lado dela, olhando para a mesma paisagem.— Ainda parece surreal?— Totalmente. — Ela suspirou, tomando um gole de café. — Crescer ouvindo histórias sobre esse lugar e agora ser a responsável por ele... é assustador.Gabriel riu suavemente.— Assustador talvez, mas você tem tudo o que pre
A biblioteca do convento estava mergulhada em um silêncio quase sagrado, quebrado apenas pelo som das páginas sendo viradas por Valentina. As janelas altas deixavam a luz do fim de tarde entrar, criando sombras dançantes nos móveis antigos. Gabriel estava sentado em uma cadeira próxima, observando Valentina com atenção. Ele havia aprendido a decifrar os pequenos gestos dela: o franzir da testa, o modo como ela mordia o lábio inferior quando estava profundamente concentrada.— Encontrou algo interessante? — Gabriel perguntou, sua voz baixa, quase um sussurro.Valentina não levantou os olhos imediatamente. Ela parecia estar absorvendo cada palavra do diário que segurava com tanto cuidado. Depois de um momento, ela finalmente falou:— É mais do que interessante, Gabriel. É... revelador.Ele se inclinou para frente, apoiando os cotovelos nos joelhos.— O que diz?Ela olhou para ele, os olhos brilhando com uma mistura de emoção e tristeza.
Naquela noite, Valentina caminhava pelos corredores do convento, perdida em pensamentos. A ameaça anônima pairava sobre ela como uma nuvem negra, mas sua determinação era inabalável. O peso das expectativas, tanto dos seus pais quanto da cidade, parecia dobrar sobre seus ombros.Ela se encontrou com Gabriel no jardim interno, onde ele estava sentado em um banco de pedra, olhando para as estrelas.— Não consigo dormir. — Ela admitiu, aproximando-se.Gabriel olhou para ela, seus olhos refletindo uma mistura de preocupação e admiração.— Também não.Valentina sentou-se ao seu lado, o frio da pedra atravessando o tecido de seu vestido.— Tudo parece tão... esmagador. Essa ameaça, o legado dos meus pais, o futuro de Sant'Elisa. Às vezes me pergunto se estou pronta para isso.Gabriel virou-se para ela, inclinando-se ligeiramente.— Você está. Não tenho dúvidas disso. Mas ninguém disse que precisa carregar isso sozinha.Valentina
Na manhã seguinte, o convento estava envolto em uma aura de desconfiança. Valentina caminhava pelos corredores com o peso da descoberta de um possível informante. Cada rosto conhecido agora parecia suspeito. Gabriel estava ao seu lado, silencioso, mas atento a cada movimento ao redor. Eles haviam compartilhado com Álvaro a ideia da armadilha e estavam prontos para colocá-la em prática naquela noite. — Você acha que é alguém de dentro mesmo? — Valentina quebrou o silêncio, olhando para Gabriel. Ele hesitou por um instante antes de responder. — Não podemos descartar essa possibilidade. Mas quem quer que seja, está jogando muito bem. Até agora, só nos deram pistas vagas. Valentina parou, olhando para o jardim onde algumas crianças brincavam sob o olhar atento das freiras. — Como alguém pode trair tudo isso? — ela murmurou, o coração apertado. Gabriel colocou uma mão suave em seu ombro. — Não se concentre no "por quê" agora. Foque no "quem". Depois que resolvermos isso, voc
O dia amanheceu nublado em Sant’Elisa. O convento estava silencioso, mas Valentina sentia o peso dos acontecimentos recentes. Ainda tentava processar a traição de Madre Isadora quando uma freira lhe entregou um envelope sem remetente. — Isso chegou esta manhã, senhorita Valentina. Foi deixado na entrada. Ela pegou a carta com cautela e, ao abrir, sentiu um arrepio subir por sua espinha ao ler as palavras escritas com uma caligrafia firme e sombria: "Você acha que venceu, mas a verdadeira batalha ainda nem começou. Seu passado guarda segredos que você não está pronta para enfrentar." Valentina leu a mensagem novamente, tentando entender seu significado. Seu passado? Que segredos poderia haver que ela ainda desconhecia? — Está tudo bem? — A voz de Gabriel a trouxe de volta à realidade. Ele se aproximou, notando sua expressão tensa. Sem hesitar, Valentina lhe entregou a carta. Gabriel a leu rapidamente, cerrando os punhos. — Isso é uma ameaça clara. — Mas de quem? O prefei
O salão do convento parecia pequeno demais para conter a avalanche de emoções que tomava conta de Valentina. Antônio Montenegro, um estranho até alguns minutos atrás, afirmava ser seu tio, revelando uma história que ninguém jamais lhe contara.Gabriel manteve-se ao lado dela, atento a cada gesto do homem.— Você espera que eu simplesmente acredite? — Valentina cruzou os braços, tentando disfarçar o turbilhão em sua mente.Antônio suspirou.— Sei que é difícil de aceitar, mas não estou aqui para mentir. Seu pai e o meu eram irmãos. Eles cresceram juntos, mas seguiram caminhos diferentes.— Então por que ninguém nunca me disse isso? Nem minha mãe, nem meu pai, nem ninguém da cidade? — Sua voz carregava uma mistura de incredulidade e raiva.— Porque era perigoso. — Antônio respondeu. — Meu pai e o seu tiveram uma briga feia. Vicente queria transformar Sant’Elisa em algo que seu pai jamais concordaria. Ele se envolveu com gente poderosa,
O ar da madrugada estava pesado quando Valentina e Gabriel deixaram a biblioteca. O silêncio das ruas de Sant’Elisa parecia mais ameaçador do que nunca. Vicente Montenegro estava vivo. E, se soubesse que ela estava investigando, poderia vir atrás dela a qualquer momento.— Precisamos agir rápido — Gabriel disse, caminhando ao lado de Valentina. — Se Vicente estiver realmente por perto, não podemos dar tempo para que ele faça o primeiro movimento.Valentina assentiu, mas sua mente estava longe. O medo era uma sombra constante, mas havia algo mais: um sentimento de inevitabilidade. Como se tudo em sua vida estivesse levando-a até esse momento.Ao chegarem ao convento, um envelope os esperava na porta. Gabriel se abaixou primeiro para pegá-lo, seus instintos de alerta à flor da pele.— Isso não é bom.Valentina pegou o envelope de suas mãos e o abriu com cautela. Dentro, havia apenas um bilhete curto, mas suficiente para gelar seu sangue:
O amanhecer trouxe uma inquietação difícil de ignorar. Valentina acordou com o coração acelerado, como se seu corpo já soubesse que algo estava prestes a acontecer. Gabriel já estava na cozinha do convento, com uma xícara de café nas mãos, folheando o jornal do dia. Assim que a viu, ele ergueu o jornal e apontou a manchete: "O Fantasma de Sant’Elisa: A Verdade Sobre Vicente Montenegro" Valentina pegou o jornal com as mãos trêmulas. Seu nome estava lá, assim como o de seu pai. Isabela havia exposto todas as conexões de Vicente com corrupção, desvio de dinheiro e, principalmente, com a morte de Antônio Vasquez. — Está feito. — Gabriel murmurou. — Agora ele virá atrás de nós. — Valentina disse, sentindo o peso da decisão que haviam tomado. Gabriel segurou seu olhar por um momento antes de dizer: — E estaremos esperando. Não demorou muito. No meio da tarde, uma viatura