Lorenzo SalvatoreO sol mal havia despontado no horizonte quando me levantei, já acostumado à rotina que minha vida exigia. Trabalhar para a família Ricciardi era um jogo constante de equilíbrio entre a lealdade, a discrição e o sacrifício. Mas naquele dia, havia algo diferente. Algo que me incomodava desde a noite anterior.O jantar de Giulia com Vittorio não me saía da cabeça. A ideia de vê-la com outro homem, especialmente alguém como ele, mexia comigo de um jeito que eu não queria admitir. Era irracional, e eu sabia disso. Afinal, quem era eu para questionar as escolhas dela? Para interferir em algo que sequer dizia respeito à minha função? Ainda assim, a sensação estava ali, como um peso no peito.Desci para a área principal da mansão, decidido a focar no trabalho. No entanto, como o destino parece gostar de brincar comigo, me deparei com Giulia no corredor. Ela estava saindo de um dos salões, com o cabelo ainda levemente bagunçado, como se tivesse acabado de acordar. Seus olhos
Giulia RicciardiA luz do sol entrava pelas grandes janelas do estúdio do curso de moda, iluminando os manequins, tecidos, e croquis que estavam espalhados pelas mesas. Meu novo projeto estava bem na minha frente: um vestido de várias camadas que ainda parecia uma ideia em construção, mas já conseguia visualizar o potencial dele. Meu professor passou por mim e fez um comentário encorajador, o que ajudou a aliviar um pouco a pressão que eu sentia.Estava tão imersa nos detalhes do desenho que quase não percebi meu celular vibrando sobre a mesa. Peguei-o distraída e vi que era uma mensagem de Vittorio.Vittorio: Buongiorno, Giulia. O que acha de almoçar comigo hoje?Um sorriso escapou dos meus lábios, e Liz, que trabalhava na mesa ao lado, notou imediatamente.— Vittorio? — ela perguntou com um sorriso travesso.— Vittorio — confirmei, enquanto digitava minha resposta.Eu: Claro, que horas e onde?Ele respondeu rapidamente, enviando o endereço de um restaurante charmoso no centro da cid
Giulia RicciardiPassei os dedos pelo tecido macio do vestido vermelho, admirando como ele caía perfeitamente em meu corpo. Longo, elegante, com uma fenda lateral que mostrava parte da minha perna e uma abertura nas costas que revelava minha tatuagem delicada — uma flor de lótus que eu fizera em um impulso, como uma pequena forma de expressão pessoal. Era sensual, mas nada vulgar. Papà nunca aceitaria algo vulgar.O reflexo no espelho me devolvia uma imagem que eu sabia interpretar bem. Filha de Domenico Ricciardi, poderosa, graciosa, uma Ricciardi em todos os sentidos. Mas, no fundo, eu ainda era apenas Giulia, uma mulher de 26 anos que conhecia cada canto desse universo de luxo e perigo, mas que, às vezes, desejava um pouco mais.O som da música e das vozes subia do andar de baixo, onde a festa estava em pleno andamento. Papà fazia questão de comemorar cada vitória, e esta era uma das maiores: um novo território conquistado, um passo a mais para solidificar o poder da nossa família.
Lorenzo SalvatoreO barulho da festa ecoava pelo salão principal, mas para mim era apenas um ruído distante. Meus olhos percorriam cada canto, atento a cada movimento, a cada rosto. Eu sabia exatamente onde estavam as saídas, quem eram os convidados e quem poderia representar uma ameaça. Esse era o meu trabalho.Os Ricciardi eram mais do que minha responsabilidade. Eles eram a razão pela qual eu mantinha minha posição no mundo. Proteger Domenico Ricciardi e sua família não era apenas uma obrigação; era uma honra.— Lorenzo. — A voz grave de Domenico me tirou dos meus pensamentos. Ele se aproximou, acompanhado por alguns de seus aliados mais influentes. — Vamos para a sala de reuniões. Há algo que preciso discutir com eles.Assenti sem hesitar, me posicionando ao lado dele enquanto atravessávamos o salão. As portas da sala de reuniões se fecharam atrás de nós, abafando o som da festa. Lá dentro, os homens se sentaram ao redor da longa mesa de madeira maciça. Eu permaneci em pé, na somb
Giulia Ricciardi A festa finalmente tinha terminado. Eu subi as escadas até meu quarto, meus pés descalços mal fazendo barulho no piso de madeira. A longa noite e o peso da bebida me deixavam um pouco zonza, mas era mais do que isso. Algo mais queimava em mim, algo que eu não conseguia nomear, ou talvez não quisesse.Fechei a porta atrás de mim e encarei meu reflexo no espelho. O vestido vermelho ainda estava impecável, apesar das horas de uso. Meu cabelo, antes tão perfeitamente arrumado, agora caía em cascatas desalinhadas pelos meus ombros. Suspirei. Fui até a penteadeira, pegando um algodão e o removedor de maquiagem.Enquanto esfregava o rosto, tentando apagar os traços da noite, uma batida baixa na porta me interrompeu.— Entre — eu disse, sem tirar os olhos do espelho, esperando ver Francesca ou talvez até minha mãe entrando para perguntar como estava a festa.Mas não era nenhuma delas. Era ele.Lorenzo fechou a porta atrás de si, silenciosamente, como sempre fazia. Ele estava
Lorenzo SalvatoreCheguei ao portão da casa da minha mãe e já sentia a diferença no ar. Não era apenas pelo bairro simples onde ela morava, longe das mansões e do luxo da família Ricciardi. Era o cheiro de café fresco, o som de risadas ao longe, a ausência do peso que carregava nos ombros todos os dias.Estacionei meu carro ao lado da calçada, um sedã preto discreto. Desci, observando a fachada modesta da casa. A pintura branca estava um pouco desgastada, mas minha mãe insistia que não queria reformas. "Está boa do jeito que está, Lorenzo. Use seu dinheiro para a educação da sua irmã, não com isso."Abri a porta da frente, e o aroma de café invadiu minhas narinas imediatamente.— Lorenzo! — Minha mãe virou-se da pia com um sorriso caloroso no rosto. Seus cabelos grisalhos estavam presos em um coque frouxo, e ela usava o avental que eu mesmo tinha comprado para ela anos atrás.Antes que eu pudesse responder, senti um par de braços se jogar contra mim. Minha irmã, Anna, me abraçou com f
Giulia RicciardiA luz dourada do fim da tarde atravessava as janelas do meu quarto, iluminando o cavalete à minha frente. Minha tela quase terminada retratava um campo florido que eu havia visto em um verão distante, quando ainda era criança. Pintar era o meu refúgio, um dos poucos momentos em que eu sentia que podia ser eu mesma, sem as amarras da vida que meu sobrenome impunha.Enquanto passava o pincel pelos últimos detalhes de uma flor, ouvi a porta do quarto se abrir. Francesca entrou sem bater, como sempre fazia, segurando uma maçã meio comida. Seus longos cabelos estavam presos em um rabo de cavalo despretensioso, e seus olhos brilhavam com uma curiosidade irritante.— Giulia, você vai mesmo fazer essa cara de quem comeu e não gostou para o rapaz de amanhã? — ela perguntou, encostando-se na porta.Revirei os olhos, ainda focada no quadro.— Não estou com paciência para isso agora, Francesca.Ela se aproximou, sentando-se na beira da cama, e me olhou com aquele ar travesso que
Giulia RicciardiO som de batidas suaves na porta me tirou do sono. Com esforço, abri os olhos, vendo a luz da manhã já entrando pelas cortinas entreabertas.— Senhorita Giulia — chamou a voz de Sílvia, uma das empregadas da casa. — Seu pai pediu para avisar que a senhorita deve descer em dez minutos para o café da manhã.Suspirei profundamente, sentindo o peso da obrigação logo ao acordar.— Obrigada, Sílvia. Já estou descendo — respondi, minha voz ainda rouca de sono.Levantei-me, sentindo a preguiça do corpo após a noite anterior. Fui direto para o banheiro, onde tomei um banho rápido e frio para despertar de vez. Enquanto a água escorria pelo meu corpo, meus pensamentos vagavam para o que me esperava no dia. A aula do curso de moda começaria hoje, e eu estava animada. Era uma pequena fuga para um mundo só meu, ainda que temporária.Depois do banho, escolhi uma roupa prática: uma calça jeans justa, uma regata branca e uma jaqueta jeans que completava o visual. Coloquei alguns acess