Isabela mal teve tempo de fechar a porta do quarto quando Leonardo a puxou pela cintura, colando os corpos como ímãs de polaridade oposta. A mochila com os pães velhos ainda pendia de um dos ombros dele, e o cheiro de campo e farinha preenchia o ar.— Está me sequestrando, senhor Vasconcellos? — ela provocou, com um sorriso travesso.— Estou, sim, senhorita quase Vasconcellos. E aviso logo: aqui dentro, só entra quem aceitar beijar antes do almoço.— Ai, que ameaça terrível — respondeu, já se rendendo ao beijo que veio quente, doce e despretensioso.O beijo se alongou até que ambos perderam o fôlego. Isabela encostou a testa na dele, o riso ainda vibrando no peito.— A gente parece adolescente de 17 anos.— Errado — Leonardo disse. — Adolescente de 17 anos não tem dor nas costas depois de dormir em colchão de pousada.Ela caiu na gargalhada.— Verdade. A vida adulta é sexy, mas cheia de boletos e hérnia.— Fala isso com essa cara linda, com cabelo preso nesse coque desarrumado e esses
O motor do carro ronronava preguiçoso pela estrada de terra, levantando uma nuvem de poeira dourada sob o céu azul de fim de tarde. Isabela ajeitou os cabelos num coque alto e se encostou no banco com um suspiro.— Acabou a lua de mel improvisada — ela murmurou.Leonardo, ao volante, olhou de relance e sorriu.— Mas começamos a temporada de viver juntos sem fugir.— Com boletos, café requentado e o gato da pousada que quase seguiu a gente até o carro.— Ele era insistente.— Quase tanto quanto você.Leonardo soltou uma risada. Isabela sorriu também, mas o riso se perdeu logo, substituído por um olhar pensativo. O retorno à cidade trazia mais do que compromissos e rotina — trazia também pendências, fantasmas e… surpresas.Quando chegaram no apartamento, era início da noite. A cidade parecia um organismo pulsante, viva em cada buzina, farol e cheiro de comida saindo das janelas. Leonardo estacionou o carro na garagem do prédio e os dois subiram de mãos dadas. Ainda estavam em clima de r
O dia amanheceu com a luz filtrada pelas persianas. Isabela acordou antes de Leonardo e ficou observando o rosto dele, ainda adormecido. Era engraçado como ele parecia mais jovem dormindo, com os traços relaxados e os lábios entreabertos. O peito dele subia e descia em um ritmo calmo, contrastando com o turbilhão de pensamentos que dançava na mente dela.Ela se levantou devagar, vestiu a camisa dele — uma de algodão cinza, larga demais para o seu corpo esguio — e foi até a cozinha. Colocou a água pra ferver, achou duas canecas e preparou café. Enquanto isso, tentava ignorar a pasta sobre a mesa, como se a presença dela fosse apenas um detalhe fora de lugar.Leonardo apareceu com os cabelos bagunçados, vestindo apenas a calça de moletom e os olhos sonolentos.— Você acordou antes de mim... — murmurou, abraçando-a pelas costas.— Eu tive pesadelos. Sonhei que a tal “D” tinha colocado câmeras na nossa casa.— Não duvido mais de nada.Ele beijou seu pescoço, e Isabela se inclinou levement
O antigo prédio da empresa do pai de Isabela ficava na parte mais antiga da cidade. Alto, de fachada imponente e janelas altas com grades enferrujadas, o local estava fechado havia mais de seis anos, desde que a empresa foi vendida e logo abandonada. O clima ao redor parecia carregado de história... e de segredos.— Tem certeza que ainda tem acesso a esse lugar? — Leonardo perguntou, olhando para a porta principal trancada com um velho cadeado.Isabela tirou um molho de chaves da bolsa. Sorriu com um ar de nostalgia.— Meu pai me dava essas chaves como se fossem brinquedos. Mas elas eram de verdade. Ele sempre dizia que “segredos devem ser guardados por mãos que merecem”. Na época, eu não entendia. Agora... acho que entendo.Ela encaixou a chave com cuidado, e o cadeado se abriu com um estalo seco.Lá dentro, o ar era denso, cheirando a mofo, poeira e passado. A recepção estava coberta por lençóis brancos sobre os móveis, como fantasmas guardando memórias. Isabela guiou Leonardo pelos
O sol já começava a se pôr quando Leonardo e Isabela saíram do prédio abandonado. Carregavam a caixa metálica envolta em um lençol velho, como se fosse apenas uma relíquia de família. Mas os documentos e o pen drive dentro dela tinham potencial para derrubar poderosos e reacender feridas profundas.No carro, Isabela estava em silêncio. Seus dedos apertavam o pen drive como se fosse a chave da liberdade… ou da ruína.— Está tudo bem? — Leonardo perguntou, tirando os olhos da estrada por um segundo para encará-la.— Não. Mas vai ficar. — Ela forçou um sorriso. — Preciso processar tudo isso. Meu pai estava no meio disso há mais tempo do que imaginei.— E você está mais no centro do furacão do que nunca.— Acha que ele confiaria em mim para resolver isso?— Ele confiou, Isa. Está tudo nas suas mãos agora. E eu estou com você.Ela olhou para ele, emocionada. A noite envolvia o carro com um manto de silêncio quebrado apenas pelo som do motor. Quando pararam diante do hotel onde estavam hosp
Na manhã seguinte, o som do celular de Isabela vibrou incessantemente sobre o criado-mudo. Ela abriu os olhos devagar, ainda sonolenta, enroscada nos lençóis e com a lembrança quente da noite anterior pulsando no corpo. Leonardo já não estava ali — o travesseiro ao lado ainda guardava seu perfume amadeirado.Ela pegou o celular, piscando diante da luz da tela. Uma série de chamadas perdidas e uma mensagem com um número desconhecido a fez franzir o cenho.“Nos encontramos no Café do Lago às 10h. Sozinha. Leve o pen drive.”Isabela sentiu o coração acelerar. Quem seria? E como sabiam do pen drive?Vestiu-se rapidamente, optando por algo discreto: jeans escuros, uma camiseta branca básica e um blazer cinza. Prendeu o cabelo em um coque bagunçado e passou um batom claro para disfarçar o rosto cansado. Desceu até o saguão, onde Leonardo tomava café e lia o jornal como se fosse um cidadão comum — o que claramente não era.— Bom dia, meu amor — ele disse ao vê-la, sorrindo. — Dormiu bem?— D
Após o beijo quente no estacionamento do Café do Lago, Isabela e Leonardo voltaram para o hotel. A tensão da conversa com Adriano ainda pairava no ar, mas a presença dele, firme ao lado dela, era um bálsamo que acalmava suas tempestades internas.Já no quarto, ela jogou o blazer na poltrona e se sentou na beira da cama, apoiando o rosto nas mãos.— Você vai ficar repetindo essa cena dramática até quando? — Leonardo provocou com um sorriso maroto, largando as chaves sobre a cômoda.— Até o mundo parar de me dar plot twists dignos de novela das nove — respondeu ela, sem conseguir conter o riso.— Você não acha que é hora de virar roteirista e assumir o controle da história?— Seria ótimo... se a vida deixasse.Leonardo se aproximou, agachando-se na frente dela. Seus olhos escuros encontraram os dela com firmeza.— A gente precisa se antecipar. Você está cercada, Isa. Não adianta só reagir. Está na hora de atacar.Ela respirou fundo e assentiu.— Eu pensei em algo. — Levantou-se e pegou
O sol começava a surgir no horizonte quando Isabela e Leonardo estacionaram o carro em frente à antiga casa de praia da avó dela. Era uma construção modesta, de alvenaria branca com detalhes azuis desbotados, janelas de madeira e um portão enferrujado que rangia ao menor toque.— Uau... isso parece cenário de filme — comentou Leonardo, ajustando os óculos escuros. — Um daqueles filmes que você sabe que alguma coisa vai acontecer... só não sabe se é boa ou ruim.— Acho que é exatamente essa a sensação — respondeu Isabela, descendo do carro.Ela vestia um vestido leve, branco com estampas florais azuis, que balançava suavemente com a brisa salgada do mar. Os cabelos presos em um coque solto deixavam seu pescoço exposto, e Leonardo se pegou admirando-a em silêncio por alguns segundos.— O que foi? — ela perguntou, percebendo o olhar dele.— Nada... só pensei que talvez seja ilegal alguém ser tão bonita às sete da manhã.Ela riu, balançando a cabeça, e os dois caminharam até a entrada. O