Ramon estava apreensivo. Uma coisa estava bastante clara: alguém tinha grande interesse em que a equipe de resgate não chegasse ao seu destino. Mas quem? E por quê? Agora, mais do que nunca, o cuidado tinha que ser redobrado.
Ramon refletiu por um momento. Era necessário apressar as coisas, pois a escuridão da noite já havia se aproximado. Dirigiu-se até a mala do carro e apanhou uma lanterna.
— Carlão, disse ele, fique de olho na estrada. Eu vou dar uma checada no estrago. Willdson, continuou, dá uma geral no Monza e veja o que pode descobrir. Leve o Henrick com você. Ele precisa aprender como se trabalha.
Willdson apanhou sua lanterna e Henrick seguiu o seu exemplo. Cautelosamente atravessou a pista e se aproximou do Monza. Era um modelo quatro portas Classic, ano 89, verde metálico. Chegou mais próximo e abaixou-se até ao rés do chão. Vasculhou com a lanterna e nada constatou de especial.
— Henrick, vá pelo outro lado e vasculhe. Veja se acha alguma coisa pelo chão, mas não toque em nada!
Disse isso se encaminhando para o lado do motorista. A porta estava aberta. Dirigiu o facho de luz para o interior do veículo na tentativa de encontrar algo que pudesse lhe dar uma pista. Resolveu entrar. Porém, antes disso, era preciso algumas precauções. Colocou a mão no bolso da jaqueta e apanhou um par de luvas propositadamente colocado ali, em função do frio que normalmente assolava a região nas longas madrugadas de julho. Vestiu as luvas e, antes de entrar, deu uma minuciosa checada sob os bancos dianteiros. Nada de interessante.
Henrick, do lado de fora, vasculhou detalhadamente por debaixo do veículo e avançou mato adentro na expectativa de descobrir alguma coisa.
Willdson sentou-se no banco do motorista e abriu o porta-luvas. Lá dentro tinha pouca coisa. Na verdade, muito pouca, mesmo. Três balas de uma automática, do mesmo tipo que Ramon usava, e um maço de Hollywood com cinco cigarros. Coincidentemente, a mesma marca que ele fumava. Fechou o porta-luvas e olhou debaixo do painel.
— Como eu pensava, disse para consigo mesmo. Ligação direta! Significa que esse carro foi roubado!...
Estava ainda refletindo sobre suas conclusões quando ouviu, do lado de fora, Henrick dizendo alguma coisa num tom de total ansiedade.
Saiu do carro e buscou a imagem do filho que do outro lado apontava agitadamente para a porta traseira direita.
— Corre aqui, pai! Parece sangue na porta!
Willdson, num salto, chegou até o lugar em que seu filho estava e procurou tranquilizá-lo.
— Henrick, disse ele sem tirar os olhos da mancha, fala pro Ramon vir até aqui. Se eu não estiver errado, aquele cara estava mesmo machucado.
Henrick atravessou a pista sem nem olhar para os lados. Afinal, nenhum veículo tinha mesmo passado por ali desde o acidente.
Ramon já havia vistoriado a perua e confabulava com Carlos a melhor maneira de tirá-la daquele buraco. Aparentemente não havia danos maiores além de uma porta e um pára-lama amassados.
A luz da lanterna que Henrick portava chamou a atenção e Ramon, imediatamente, encaminhou-se para junto de Willdson, antes que Henrick pudesse dizer alguma coisa.
— O que você descobriu, Will?
— Uma mancha de sangue aqui na porta. Acho que o cara estava mesmo machucado.
— Não pode ser, Will. Nós só vimos um sujeito correr para o Comodoro, e não sairia pela porta traseira.
— É, acho que você tem razão, pois a porta dianteira, a do motorista, estava aberta!
— Que mais você descobriu?
— Três cartuchos sem uso e um maço de cigarros no porta-luvas. Ah! continuou, foi feita ligação direta neste carro. Com certeza foi roubado.
Ramon fez uma pausa. Pensou um pouco e tentou organizar as ideias.
— Se tem sangue na porta traseira...
— É porque nesse carro teve pelo menos um passageiro, completou Willdson como se lesse os pensamentos do amigo. Mas, se isso é certo, continuou, onde ele está?
Ramon calculou passo a passo o seu raciocínio. Depois, como era de seu feitio, buscou as provas antes de apresentar a conclusão.
— San, pediu Ramon pausando cada palavra, pega a mixa no chaveiro do carro.
Mixa era uma chave estrategicamente trabalhada, capaz de abrir qualquer fechadura.
Willdson não retrucou. Correu até Carlos, que continuava em seu posto, e voltou com o chaveiro.
Ramon, com toda a tranquilidade de quem está cônscio de suas deduções, abriu o porta-malas do Monza, jogou pra dentro o facho de luz e, com a atitude de quem acertou mais uma, suspirou para o seu velho amigo:
— Aqui está o seu passageiro, San.
Ninguém tocou em nada. Ramon havia colocado também suas luvas como precaução. O cadáver era de um homem aparentando cinquenta anos. Suas roupas demonstravam que era uma pessoa de fino trato. Ninguém tocou no morto, mas era possível visualizar suas mãos amarradas às suas costas. Pelas primárias deduções, ele havia sido executado com um tiro na cabeça. Ramon fechou o porta-malas do Monza ao mesmo tempo em que observava a placa. Não tinha lacre. — É fria, San! — O que foi que você disse? — Eu disse que a placa é fria. Não tem lacre, tá vendo? Ramon gravou instintivamente a numeração: DX 0454. — Vamos dar o fora daqui ou vamos ter de explicar muitas coisas, observou Ramon. Willdson, pela primeira vez, ficara surpreso com o amigo. — Mas, ... Ramon! Nós temos que fazer alguma coisa, avisar a polícia, ... sei lá!... — San, disse Ramon calmamente, raciocine um pouco. Olhe pro nosso carro e pro Monza. A primeira
Ramon estava no volante. Já era noite alta e a temperatura havia caído bastante. Era assim naquelas paragens. Durante o dia a temperatura podia chegar a 42°C e na madrugada poderia cair a 2°C. Os pensamentos estavam voltados para os últimos acontecimentos. Ramon começou a refazer a história. Quem os havia atacado conhecia muito bem o trajeto. Sabia que a parada anterior, para abastecimento da viatura, era a última antes de um espaço de aproximadamente 300 quilômetros. Era o chamado posto de segurança, pois até Campo Grande não haveria nenhum posto sequer. Com um carro mais possante, puderam controlar o tempo e a distância e atacar no momento oportuno. O Monza seria apenas uma isca. Provavelmente esperavam que a equipe parasse para socorrer o pseudo-acidentado para então abordá-los. Ou quem sabe, matá-los?... — Ramon, me esclarece uma coisa! Se alguém queria nos matar, por que não atiraram na gente no momento em que emparelharam conosco? — Não sei, Car
Eram duas horas da madrugada do dia seguinte quando a equipe de resgate chegou a Campo Grande. Instalou-se em um pequeno hotel, num apartamento com quatro camas, e procurou descansar naquele final de noite. Após o café da manhã, com toda a equipe descansada, foi dada sequência ao novo cronograma estabelecido. Começariam pela visita ao amigo Guerard. Ele estava no escritório de seu Centro de Pesquisas Ufológicas. Lá era editada a revista UFO Contact de circulação nacional. A recepção como sempre foi fantástica. Guerard ofereceu-lhes um café e, numa sala reservada, procurou se inteirar do objetivo da equipe. — Quer dizer que vocês estão de volta para novas descobertas? Ramon tinha de medir as palavras, pois mesmo para o amigo, algumas coisas deveriam ser omitidas. — Sabe o que é, Guerard, estamos sem contato com a equipe anterior já há algum tempo. Não sabemos exatamente o que aconteceu. Isso está nos preocupando. Ramon colocou a xícara
Fredy andava de um lado para outro em sua ampla sala no décimo segundo andar. Esfregava as mãos uma na outra demonstrando claramente sua aflição. Eram sete horas da manhã e as olheiras fundas no seu rosto denotavam as poucas e mal dormidas horas daquela noite. Marcos, próximo à porta, só acompanhava com os olhos. Havia passado a noite em claro na esperança de um sinal. Tinha de aproveitar que o satélite estava disponível full time nesse primeiro dia. Depois, seu acesso seria de apenas 15 minutos duas vezes ao dia. O telefone tocou. O segurança atendeu e transferiu na frequência especial para a sala da presidência. Fredy deu um pulo e antes mesmo do segundo toque já havia atendido. — Doutor Frederico, é o Coronel Krismmel pro senhor na linha especial. O Presidente odiava o próprio nome. Preferia ser chamado de Fredy, mas não contestou. Acionou um botão em um pequeno painel e travou todas as linhas de acesso. Da
Na guarita do 9º Batalhão de Engenharia de Combate, o Cabo aproximou-se da viatura. Ramon tirou do rosto o Ray-Ban, olhou para o soldado e respondeu a pergunta: — Ramon Karline, da CIFEC. O Coronel Krismmel está nos esperando. — Um momento, senhor! O Cabo foi até a guarita e interfonou. Em seguida, pediu suas identidades e deu-lhes em troca crachás de visitante. — Por favor, senhor, continuou o Cabo. Este soldado vai acompanhá-los. O soldado pediu licença e entrou no carro. Ramon já conhecia o caminho, pois já estivera naquele quartel em outra ocasião. Contudo, era preciso seguir o ritual. Na porta do pavilhão, estacionaram o veículo e um oficial veio apanhá-los. — Por aqui, senhores. O Coronel os espera. Subiram a escada que dava acesso ao gabinete do Coronel. Uma sala espaçosa com dois ambientes. Em um dos lados, uma extensa mesa com um computador. O outro ambiente continha um sofá e quatro poltronas dispostos
Marcos cochilava na cadeira. Estava acordado desde a manhã do dia anterior. O vídeo acusou recepção de mensagem com o bip característico. Marcos abriu os olhos e rastreou rapidamente a tela. — São eles! gritou para consigo mesmo. “Acorda, mano! Você não achou que ia ser fácil, não é? Pois é... eles acharam! Mas está tudo bem conosco.” Marcos sorriu satisfeito. Eles estavam bem. Era seu irmão sem dúvida nenhuma. “Graças a Deus, Ramon! O Fredy nem vai acreditar!” “Tivemos problemas com o carro, mas está sob controle agora.” “Já sabe das últimas?” “O Coronel me colocou a par”. “Espere um instante que eu vou chamar o Fredy. Ele quer falar com você.” Enquanto Ramon aguardava, o Coronel saiu da sala com o restante da equipe. — Vamos andar um pouco. Vou mostrar o quartel para os novos. Fique à vontade e o tempo que precisar. Ramon acenou positivamente enquanto aguardava o Fredy do outro la
Logo após o almoço em companhia do Coronel, a equipe deixou o quartel. Até Miranda eram apenas 68 quilômetros e isso seria feito em menos de uma hora. Lá, as equipes da CIFEC eram bastante conhecidas. Miranda era uma cidade pequena e qualquer pessoa de fora era facilmente identificada. Willdson e Ramon haviam feito inúmeras pesquisas naquela região e eram conhecidos por muitos. Como supostamente ninguém imaginaria seu objetivo, o jeito era agir com naturalidade. Para todos os efeitos, tratava-se de mais um trabalho de pesquisa sem maior importância. Assim, poderiam buscar informações sobre o proprietário da fazenda Miranda Estância e confirmar suas suspeitas. Se as coisas se complicassem, pensariam em outra alternativa. O apoio do Exército era importante, mas não podia transparecer. Por isso a equipe tinha de agir sozinha. A Prefeitura seria o primeiro contato em Miranda. O Diretor da Cultura, senhor Sérgio de Almeida, veio recebê-los assim que foram
Euclides Barbosa era o mais velho dos três irmãos que cuidavam da fazenda Boa Vista. Ele tinha um armazém na cidade onde ficava a maior parte do dia quando não estava na fazenda. Já era quase noite quando Ramon parou o carro em frente ao estabelecimento e foi logo entrando. — Boa noite, seu Euclides! Como tem passado? — Oras, se não são os meninos da CIFEC! Quanto tempo...! E aí? Vão pesquisar na fazenda outra vez? Euclides era um bom homem. Dera muita ajuda às equipes da CIFEC desde 1976 quando foi desenvolvido o Projeto Neanderthal. — Não exatamente, acrescentou Ramon. Willdson também entrou no armazém e cumprimentou Euclides. Carlos e Henrick ficaram no carro. — Ué! continuou Euclides. Sabe que lá a casa é de vocês! — Sei disso, seu Euclides. E é por isso que estamos aqui. Precisamos da sua ajuda, complementou Ramon. Lembra-se das escavações que fizemos na ponta limite da sua fazenda, em 1976? — Ué! Claro que