Ninguém tocou em nada. Ramon havia colocado também suas luvas como precaução.
O cadáver era de um homem aparentando cinquenta anos. Suas roupas demonstravam que era uma pessoa de fino trato. Ninguém tocou no morto, mas era possível visualizar suas mãos amarradas às suas costas. Pelas primárias deduções, ele havia sido executado com um tiro na cabeça.
Ramon fechou o porta-malas do Monza ao mesmo tempo em que observava a placa. Não tinha lacre.
— É fria, San!
— O que foi que você disse?
— Eu disse que a placa é fria. Não tem lacre, tá vendo?
Ramon gravou instintivamente a numeração: DX 0454.
— Vamos dar o fora daqui ou vamos ter de explicar muitas coisas, observou Ramon.
Willdson, pela primeira vez, ficara surpreso com o amigo.
— Mas, ... Ramon! Nós temos que fazer alguma coisa, avisar a polícia, ... sei lá!...
— San, disse Ramon calmamente, raciocine um pouco. Olhe pro nosso carro e pro Monza. A primeira impressão é de que nós cometemos o acidente. Eles vão querer saber a nossa história. E pior! Como vamos explicar o cadáver?
— Mas, se fugirmos agora, eles vão descobrir que havia outro carro. Existem marcas no asfalto e no acostamento...
— Nisso, você tem razão. Mas, até lá, nós já estaremos longe. Não podemos nos envolver agora. As coisas já estão complicadas demais.
— Está bem! E como vamos tirar o nosso carro do buraco?
— Vamos ter que rezar para que a estrada continue deserta. Eu já conversei com o Carlão sobre isso. Tive uma ideia, que apesar de arriscada, é a única que pode dar certo.
Enquanto falava, abriu o porta-malas da perua e começou a procurar alguma coisa por entre os equipamentos.
— Achei o que precisamos.
Puxou da caixa de equipamentos uma corda de trinta metros utilizada para descidas em cavernas.
— Carlão, continuou Ramon, já sabe o que fazer!
Carlos imediatamente colocou o casaco de couro e as calças por dentro das botas. Acendeu sua lanterna e se posicionou no meio fio.
Ramon passou a explanar para os demais.
— O Carlão vai dar uma de rodoviário caso apareça qualquer veículo. Se não for a própria polícia, o que eu duvido por aqui, ele vai enganar tranquilamente. Assim, impedirá que outro veículo pare.
Willdson ainda não tinha entendido o plano, mas nem por isso interrompeu.
— Preste atenção, San! Vá até o Monza e dê a partida. Os fios já estão prontos pra direta, não é? Traga-o até aqui, de ré.
Não era preciso dizer mais nada. A ideia era sensacional.
Willdson trouxe o carro e o manteve praticamente atravessado no meio da rodovia. Ramon dobrou a corda de trinta metros para ficar mais consistente e amarrou uma das pontas no eixo traseiro da perua, enquanto Willdson amarrava a outra ponta no eixo do Monza. Henrick fazia o trabalho de iluminação.
Terminado o serviço, Ramon foi para o volante da perua e aguardou que Willdson começasse a guinchá-la.
A perua rapidamente estava pronta para tocar em frente.
Henrick, com um grito de satisfação, soltou rapidamente as amarras e aguardou novas ordens.
— San, continuou Ramon sem sair da perua, coloca o Monza no mesmo lugar e deixa tudo como estava. Amanhã a gente informa a Central e passa a bola pro Fredy. Ele saberá o que fazer.
Willdson fez o trabalho como o combinado e enquanto todos entravam na perua, Ramon, com o seu costumeiro sorriso, finalizou:
— Se liga moçada! Isso é só o começo! Pelo jeito, o pior ainda não veio!
Ramon estava no volante. Já era noite alta e a temperatura havia caído bastante. Era assim naquelas paragens. Durante o dia a temperatura podia chegar a 42°C e na madrugada poderia cair a 2°C. Os pensamentos estavam voltados para os últimos acontecimentos. Ramon começou a refazer a história. Quem os havia atacado conhecia muito bem o trajeto. Sabia que a parada anterior, para abastecimento da viatura, era a última antes de um espaço de aproximadamente 300 quilômetros. Era o chamado posto de segurança, pois até Campo Grande não haveria nenhum posto sequer. Com um carro mais possante, puderam controlar o tempo e a distância e atacar no momento oportuno. O Monza seria apenas uma isca. Provavelmente esperavam que a equipe parasse para socorrer o pseudo-acidentado para então abordá-los. Ou quem sabe, matá-los?... — Ramon, me esclarece uma coisa! Se alguém queria nos matar, por que não atiraram na gente no momento em que emparelharam conosco? — Não sei, Car
Eram duas horas da madrugada do dia seguinte quando a equipe de resgate chegou a Campo Grande. Instalou-se em um pequeno hotel, num apartamento com quatro camas, e procurou descansar naquele final de noite. Após o café da manhã, com toda a equipe descansada, foi dada sequência ao novo cronograma estabelecido. Começariam pela visita ao amigo Guerard. Ele estava no escritório de seu Centro de Pesquisas Ufológicas. Lá era editada a revista UFO Contact de circulação nacional. A recepção como sempre foi fantástica. Guerard ofereceu-lhes um café e, numa sala reservada, procurou se inteirar do objetivo da equipe. — Quer dizer que vocês estão de volta para novas descobertas? Ramon tinha de medir as palavras, pois mesmo para o amigo, algumas coisas deveriam ser omitidas. — Sabe o que é, Guerard, estamos sem contato com a equipe anterior já há algum tempo. Não sabemos exatamente o que aconteceu. Isso está nos preocupando. Ramon colocou a xícara
Fredy andava de um lado para outro em sua ampla sala no décimo segundo andar. Esfregava as mãos uma na outra demonstrando claramente sua aflição. Eram sete horas da manhã e as olheiras fundas no seu rosto denotavam as poucas e mal dormidas horas daquela noite. Marcos, próximo à porta, só acompanhava com os olhos. Havia passado a noite em claro na esperança de um sinal. Tinha de aproveitar que o satélite estava disponível full time nesse primeiro dia. Depois, seu acesso seria de apenas 15 minutos duas vezes ao dia. O telefone tocou. O segurança atendeu e transferiu na frequência especial para a sala da presidência. Fredy deu um pulo e antes mesmo do segundo toque já havia atendido. — Doutor Frederico, é o Coronel Krismmel pro senhor na linha especial. O Presidente odiava o próprio nome. Preferia ser chamado de Fredy, mas não contestou. Acionou um botão em um pequeno painel e travou todas as linhas de acesso. Da
Na guarita do 9º Batalhão de Engenharia de Combate, o Cabo aproximou-se da viatura. Ramon tirou do rosto o Ray-Ban, olhou para o soldado e respondeu a pergunta: — Ramon Karline, da CIFEC. O Coronel Krismmel está nos esperando. — Um momento, senhor! O Cabo foi até a guarita e interfonou. Em seguida, pediu suas identidades e deu-lhes em troca crachás de visitante. — Por favor, senhor, continuou o Cabo. Este soldado vai acompanhá-los. O soldado pediu licença e entrou no carro. Ramon já conhecia o caminho, pois já estivera naquele quartel em outra ocasião. Contudo, era preciso seguir o ritual. Na porta do pavilhão, estacionaram o veículo e um oficial veio apanhá-los. — Por aqui, senhores. O Coronel os espera. Subiram a escada que dava acesso ao gabinete do Coronel. Uma sala espaçosa com dois ambientes. Em um dos lados, uma extensa mesa com um computador. O outro ambiente continha um sofá e quatro poltronas dispostos
Marcos cochilava na cadeira. Estava acordado desde a manhã do dia anterior. O vídeo acusou recepção de mensagem com o bip característico. Marcos abriu os olhos e rastreou rapidamente a tela. — São eles! gritou para consigo mesmo. “Acorda, mano! Você não achou que ia ser fácil, não é? Pois é... eles acharam! Mas está tudo bem conosco.” Marcos sorriu satisfeito. Eles estavam bem. Era seu irmão sem dúvida nenhuma. “Graças a Deus, Ramon! O Fredy nem vai acreditar!” “Tivemos problemas com o carro, mas está sob controle agora.” “Já sabe das últimas?” “O Coronel me colocou a par”. “Espere um instante que eu vou chamar o Fredy. Ele quer falar com você.” Enquanto Ramon aguardava, o Coronel saiu da sala com o restante da equipe. — Vamos andar um pouco. Vou mostrar o quartel para os novos. Fique à vontade e o tempo que precisar. Ramon acenou positivamente enquanto aguardava o Fredy do outro la
Logo após o almoço em companhia do Coronel, a equipe deixou o quartel. Até Miranda eram apenas 68 quilômetros e isso seria feito em menos de uma hora. Lá, as equipes da CIFEC eram bastante conhecidas. Miranda era uma cidade pequena e qualquer pessoa de fora era facilmente identificada. Willdson e Ramon haviam feito inúmeras pesquisas naquela região e eram conhecidos por muitos. Como supostamente ninguém imaginaria seu objetivo, o jeito era agir com naturalidade. Para todos os efeitos, tratava-se de mais um trabalho de pesquisa sem maior importância. Assim, poderiam buscar informações sobre o proprietário da fazenda Miranda Estância e confirmar suas suspeitas. Se as coisas se complicassem, pensariam em outra alternativa. O apoio do Exército era importante, mas não podia transparecer. Por isso a equipe tinha de agir sozinha. A Prefeitura seria o primeiro contato em Miranda. O Diretor da Cultura, senhor Sérgio de Almeida, veio recebê-los assim que foram
Euclides Barbosa era o mais velho dos três irmãos que cuidavam da fazenda Boa Vista. Ele tinha um armazém na cidade onde ficava a maior parte do dia quando não estava na fazenda. Já era quase noite quando Ramon parou o carro em frente ao estabelecimento e foi logo entrando. — Boa noite, seu Euclides! Como tem passado? — Oras, se não são os meninos da CIFEC! Quanto tempo...! E aí? Vão pesquisar na fazenda outra vez? Euclides era um bom homem. Dera muita ajuda às equipes da CIFEC desde 1976 quando foi desenvolvido o Projeto Neanderthal. — Não exatamente, acrescentou Ramon. Willdson também entrou no armazém e cumprimentou Euclides. Carlos e Henrick ficaram no carro. — Ué! continuou Euclides. Sabe que lá a casa é de vocês! — Sei disso, seu Euclides. E é por isso que estamos aqui. Precisamos da sua ajuda, complementou Ramon. Lembra-se das escavações que fizemos na ponta limite da sua fazenda, em 1976? — Ué! Claro que
A viatura parou em frente ao Hotel Pantanal. Durante o percurso, Carlos e Henrick haviam se inteirado do assunto no armazém. O hotel era simples, mas tudo muito limpo. Havia uma varanda na entrada e um jardim todo arborizado. Os quartos ficavam em um pavilhão lateral, também ladeado por uma varanda. Não havia muro na entrada, e era possível ir aos quartos sem passar pela recepção que ficava junto ao restaurante. Os hóspedes, na maioria, eram pescadores vindos de São Paulo. Como dissera Euclides, não foi difícil localizá-lo. Após as apresentações, Roberto se mostrou uma pessoa incrível e amável. Era um homem de estatura mediana, aparentando uns quarenta anos. Usava um bigode não muito espesso e seu sotaque mostrava claramente não ser daquela região. — Mas o que traz vocês a lugares tão distantes? Ramon expôs os objetivos da equipe tendo o cuidado de não deixar transparecer qualquer intenção secundária, mesmo porque a equipe do Projeto INCA pene