Capítulo 4

Maria Silva

Eu me joguei no banco do carro, ofegante, tentando processar tudo que havia acontecido nas últimas horas. Não era apenas a tensão de estar no velório do homem que destruiu minha vida. Agora, eu estava à mercê de um completo estranho, ou melhor, do irmão do daquele que eu tanto queria esquecer. A presença dele ao meu lado era sufocante, e o silêncio que dominava o carro era ainda pior.

"Você não pode fazer isso, me jogar dentro do seu carro," disse, tentando soar mais firme do que me sentia.

Ele me olhou de soslaio, os olhos estreitos e a mandíbula cerrada. "Você queria que eu te deixasse lá para ser... Deveria ter deixado aqueles homens fazerem o que quisessem com você, talvez você deixasse de ser tão teimosa." Ele estava furioso, mas eu não conseguia rebater, pois sabia que ele estava certo. Se Bruno não tivesse ali, o que teria acontecido? Nem queria imaginar.

Ele continuou, sua voz carregada de desconfiança. "A não ser que eles estivessem com você e tudo aquilo era uma farsa para tentar me enganar."

Eu o encarei incrédula. "Você deve ter algum problema na cabeça, só pode. Pare de ficar falando que estou aqui porque alguém me mandou. Já te disse o porquê. Agora, para o carro, que eu quero descer."

Ele riu, um som curto e sem humor, como se minha irritação fosse algo digno de pena. "Onde é a sua casa?"

"Minha casa? Por que quer saber onde é a minha casa?"

"Vou te deixar lá." Ele respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

Era evidente que eu não ia dizer onde morava. Não podia arriscar. Ele parou o carro, esperando minha resposta, e eu senti o peso do seu olhar. Precisava pensar rápido, passei a mão nos cabelos, estava nervosa.

Lembrei-me de uma história que uma das meninas da boate tinha me contado. Ela havia saído de lá para trabalhar em uma casa no bairro Méier. Uma residência normal vista de fora, mas que na verdade abrigava uma espécie de bordel disfarçado. Cada garota alugava um quarto, e os clientes eram recebidos discretamente. Era seguro, com câmeras e tudo, e as meninas podiam ganhar seu dinheiro sem intermediários. Eu logo respondi a Bruno.

“No Méier. Eu vou te passar a localização, sou péssima como GPS” disse, tentando soar convincente. Ele pareceu não acreditar.

Peguei meu celular e localizei o endereço da casa, minha amiga tinha me passado a um tempo atrás, então foi fácil procurar. Ele olhou para frente e começou a dirigir novamente, sem dizer uma palavra. Senti um alívio passageiro, mas sabia que estava longe de estar segura.

Enquanto o carro seguia pelo trajeto que eu havia indicado, observei pelo retrovisor que um outro carro nos seguia de perto e fiquei com medo quem seriam aquelas pessoas. "Parece que tem um carro seguindo a gente," observei, tentando manter a calma.

"São meus seguranças."

“Você tem seguranças?”

"Tenho, eu não posso sair por aí sem ter pessoas junto comigo," ele respondeu, sua voz era de quem estava cansado de explicar o óbvio. 

“Você é tão rico que precisa deles?”

Ele riu novamente, dessa vez com um toque de ironia. "Você não sabe mesmo quem eu sou ou está se fazendo de boba?"

"Não tenho a mínima ideia de quem você é, te juro." Embora já tivesse uma boa suspeita, preferi manter a farsa.

“Eu sou juiz, Bruno de Alcântara e Leão. Por isso ando com seguranças junto comigo. Minha vida sempre está em perigo”

"Juiz? Sério? Seu irmão era delegado?"

“O que você quer saber do meu irmão? Se você foi lá para tirar fotos do velório dele, deve saber quem ele era,” ele rebateu, desconfiado.

“Na verdade, eu não sabia. Me desculpe, eu não queria ter sido indelicada nem com você nem com sua família. As circunstâncias me levaram a fazer isso.”

Ele me encarou por um instante que pareceu uma eternidade. "Quais circunstâncias?"

Eu precisava de uma desculpa, qualquer coisa que o fizesse parar com as perguntas. "Eu precisava das fotos para vender. Só isso. Me desculpe."

Bruno estreitou os olhos, claramente não acreditando em mim. “Você esconde alguma coisa, e eu vou descobrir.”

Antes que ele pudesse continuar o interrogatório, o GPS do celular me salvou. *"Seu destino está à direita,"* anunciou a voz mecânica, quebrando o clima tenso.

Eu não tinha ideia de onde estava, mas esperava que minha amiga estivesse em casa e pudesse me ajudar. Quando ele parou o carro, senti meu coração acelerar. Desci e ele me seguiu, parando em frente ao portão enquanto eu apertava o interfone duas vezes.

"Quem é?" A voz de minha amiga soou do outro lado, com um toque de irritação.

"Sou eu, amiga. Maria. Pode abrir para eu subir."

"Subir? Como assim? Eu tô com cliente. Nem sei quem é você." Ela parecia confusa e desconfiada.

"Sou eu. Maria do Ben,” era como ela me chamava. “Pode abrir para mim. Por favor, eu quero entrar em casa,” insisti, tentando não soar desesperada.

"Maria do Ben?" Ela hesitou por um momento, e pude imaginar sua expressão confusa. “Maria? O que você…” Antes que ela pudesse perguntar mais alguma coisa, eu cortei.

 “Só abre o portão, por favor.”

Minutos depois, ela apareceu na sacada, envolta em um roupão de seda vermelha e com tamancos que pareciam saídos de um filme dos anos 50 cheio de plumas. Ela desceu as escadas com um sorriso maroto, me olhando de cima a baixo e depois fixando seus olhos em Bruno.

“Maria? Eu ia abrir o portão pra você, mas quando vi o bonitão aí, vim pessoalmente. Ele quer fazer pro…” Não deixei que ela terminasse a frase, meu rosto queimando de vergonha.

“Ele apenas me deu carona até aqui em casa,” disse rapidamente, tentando ocultar meu nervosismo.

Ela me lançou um olhar, jogou o cabelo para trás e ia mostrar seu charme para Bruno, fui mais rápida e a abraçei como se fôssemos as melhores amigas do mundo. "Fala que eu moro aqui, por favor" sussurrei em seu ouvido.

"Claro, nossa casa," respondeu, gesticulando com entusiasmo. “Eu tava brincando. E o bonitão vai entrar?” Ela se virou para ele com um sorriso insinuante.

"Não, ele vai pra casa dele. O dia foi cansativo e ele está cansado. Obrigada pela carona,” falei, com um sorriso tenso.

Bruno apenas me observou, seus olhos fixos nos meus, como se estivesse memorizando cada detalhe do meu rosto. "Até mais, Maria," disse ele finalmente, entrando no carro e esperando que nós duas entrássemos na casa.

Assim que o portão se fechou, minha amiga soltou uma risada alta e me puxou pelo braço. “Que história é essa, Maria? Quem é aquele ricaço? E por que você está tremendo desse jeito?”

Eu suspirei, ainda nervosa, mas agora um pouco mais aliviada. “É uma longa história…”

Ela estreitou os olhos, e seu tom brincalhão deu lugar a uma seriedade inesperada. Parece ter se lembrado de algo. "Ele é o pai do Ben? Porque ele é idêntico ao seu filho."

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