Capítulo 6

**Maria Silva**

Eu era uma mãe desesperada naquele momento, sentindo-me a pior de todas. Havia negligenciado meu próprio filho, deixado ele de lado enquanto me envolvia nas complicações do velório do pai dele e na tentativa de fugir de Bruno de Alcântara e Leão. As lembranças de tudo o que havia acontecido nas últimas horas rodavam em minha mente, me afogando em culpa e desespero. Como pude ser tão egoísta? Meu pequeno Ben precisando de mim, e eu fugindo, me escondendo, vivendo na sombra de um passado que parecia sempre me alcançar.

“Venha, Maria, eu levo você,” a voz suave e acolhedora de seu João, nosso vizinho, me tirou de meus pensamentos sombrios. Ele era um senhorzinho gentil, dono de um Fusca preto que, embora velho e barulhento, sempre estava à disposição para ajudar quem precisasse.

“Obrigado, eu vou aceitar,” respondi, forçando um sorriso enquanto lutava para segurar as lágrimas que ameaçavam cair. Entrei no Fusca, o barulho do escapamento pipocando e me lembrando da fragilidade de tudo ao meu redor. O mundo parecia estar desmoronando, e eu não conseguia encontrar forças para segurar as peças no lugar.

Seu João, sempre tão prestativo, tentou me tranquilizar durante o caminho. "Eu levei sua madrinha e seu pequeno Ben até o hospital," ele explicou, as palavras dele cortando meu coração como facas afiadas. "O menino estava com febre, e sua madrinha não quis esperar mais, então ela me chamou para levar os dois."

A dor em meu peito se intensificou. “Estou me sentindo péssima por não ter atendido as ligações,” confessei, minha voz falhando enquanto tentava controlar a onda de emoções que ameaçava me derrubar.

“Não fique assim, Maria,” ele disse, sua voz gentil como sempre. “Sua madrinha disse que você estava trabalhando e por isso não atendeu, deveria estar ocupada lá no seu trabalho.”

As palavras dele só pioraram meu sentimento de culpa. Meu trabalho? Como ele poderia imaginar o que eu realmente estava fazendo? Mas a verdade era que, independentemente de onde eu estivesse ou o que estivesse fazendo, eu havia falhado como mãe. A preocupação e a ansiedade tomavam conta de mim. Meu menino estava doente, e eu não estava lá para ele.

O trajeto até o hospital parecia durar uma eternidade. O Fusca preto rangia, lutando contra o peso do meu desespero. Finalmente, após quase quarenta minutos, chegamos ao hospital. Assim que seu João estacionou o carro, eu saltei e corri até a recepção, o coração disparado e a respiração curta.

“O meu filho está internado aqui,” eu disse, a voz tremendo, enquanto tentava manter a calma.

A atendente me olhou com uma expressão neutra. “Como é o nome dele?”

“Benício Silva,” respondi rapidamente.

Ela consultou o computador e então levantou os olhos, me informando algo que me fez perder o chão: “Ele foi transferido, moça, para o Hospital Nossa Senhora de Lurdes.”

Meu coração parou. “Mas esse hospital é particular?”

“Estamos lotados aqui, e como ele é um caso grave, abriram vaga para ele em uma de nossas emergências lá,” ela explicou, as palavras dela ecoando na minha mente, me deixando tonta.

“Grave? Como assim grave?” A voz dentro de mim gritava em desespero. Eu precisava de respostas, mas ela continuou com a mesma expressão impassível.

“Senhora, você precisa conversar com o médico,” ela disse, como se não entendesse a urgência no meu coração. “Ele não pode te atender agora, o hospital está lotado.”

Mas eu não podia ficar perdendo tempo ali. Ben não estava mais naquele hospital, e cada segundo que passava me afastava mais dele. Corri de volta para a entrada, e por sorte, seu João ainda estava lá, esperando por mim. Expliquei rapidamente que Ben havia sido transferido, e ele, com a paciência de sempre, me disse para entrar no carro. O Fusca preto barulhento logo se pôs em movimento, saindo pelas ruas congestionadas do Rio de Janeiro.

O som do motor rangendo parecia um reflexo do caos em minha mente. O engarrafamento nas ruas só aumentava minha ansiedade, e a culpa me consumia cada vez mais. Eu me sentia a pior mãe do mundo, por não estar ao lado do meu filho quando ele mais precisava de mim. Passávamos pela cidade em uma velocidade agonizantemente lenta, e então, como um golpe do destino, avistei algo que fez meu coração parar.

Lá estava ele, Bruno de Alcântara e Leão, saindo de um carro de luxo. Eles caminhavam com a habitual arrogância, os seguranças ao lado, como se fossem intocáveis. Quando passamos em frente ao fórum, Bruno parou e, como se pudesse sentir minha presença, virou-se lentamente em minha direção. Um calafrio percorreu minha espinha. Era como se ele soubesse exatamente onde eu estava, o que eu sentia, e o medo voltou a me dominar.

“Por favor, vá mais rápido,” sussurrei para seu João, a voz quase não saindo. O Fusca acelerou, o barulho do motor mascarando o som do meu coração batendo descompassado. Eu só queria sair dali, queria fugir de tudo, mas mais do que tudo, queria encontrar meu filho.

Finalmente, chegamos ao Hospital Nossa Senhora de Lurdes. Era um hospital particular, e eu só podia esperar, com todo o meu coração, que não precisasse pagar por aquele tratamento, porque eu não tinha como. Quando saí do carro, seu João me disse que esperaria para levar minha madrinha de volta. Agradeci rapidamente e corri para dentro do hospital.

Dentro, tudo parecia um labirinto de corredores sem fim. Uma moça na recepção me deu as coordenadas para chegar até meu filho, e eu segui suas instruções, meu corpo movendo-se sozinho, enquanto minha mente estava em outro lugar. Quando finalmente encontrei o quarto, meu coração quase parou. Lá estava ele, meu pequeno Ben, deitado em uma cama, os olhos fechados e a carinha de choro. Minha madrinha se levantou e veio ao meu encontro.

“Filha, que bom que você chegou,” ela disse, o alívio em sua voz era claro, mas minha preocupação só aumentava. “Eu não tinha como te ligar.”

“O que aconteceu com o Ben, madrinha?” Minha voz era apenas um sussurro, o medo dominando cada parte de mim.

“Ai, minha filha,” ela começou, os olhos dela se enchendo de lágrimas. “Nosso menino está doente.”

Antes que eu pudesse processar o que ela disse, um médico entrou no quarto. Ele se aproximou de nós, e pela expressão no rosto dele, eu sabia que as notícias não seriam boas.

“Olá, você é a mãe dele?” ele perguntou, a voz dele calma, mas carregada de preocupação.

“Sim, eu sou a Maria,” respondi, tentando manter a compostura. Ele me pediu para sair com ele do quarto para conversarmos em particular, e eu o segui, sentindo um nó se formar no meu estômago.

Quando paramos no corredor, ele virou-se para mim e começou a falar. “Seu filho fez alguns exames, e infelizmente, ele está doente.”

Aquelas palavras fizeram meu mundo girar. “O que meu filho tem, doutor?” perguntei, a voz quase não saindo, o pânico tomando conta de mim.

“Ele vai precisar de um transplante,” ele respondeu, a voz firme mas gentil. “Precisamos de alguém da família que possa ser doador, se for compatível.”

Um transplante? As palavras dele ecoavam na minha cabeça. “Doador? O pai dele faleceu ontem, doutor. E ele nem sabia que tinha um filho. Eu posso doar, eu sou a mãe, eu tenho que ser compatível.”

“Sinto muito pela sua perda,” ele disse, a compaixão nos olhos dele era palpável. “Mas as coisas não funcionam assim. Precisamos fazer exames de compatibilidade com todos os familiares. E, infelizmente, esse tipo de tratamento é bastante caro, o sistema público não cobre certos gastos.”

A realidade me atingiu como uma avalanche. Não apenas meu filho estava gravemente doente, mas eu também não tinha os recursos para salvá-lo. As palavras do médico continuavam a ecoar na minha mente, me deixando ainda mais perdida, mais desesperada.

O que eu iria fazer? Como eu salvaria meu filho? A incerteza e o medo me consumiam, e eu só podia esperar que, de alguma forma, tudo isso fosse apenas um pesadelo do qual eu acordaria em breve. E que Deus ajudasse que eu fosse compatível ou teria que procurar a família Alcântara e Leão. E eu não queria de forma alguma fazer isso. Não mesmo.

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