Ambos os homens permaneceram em silêncio, observando-se com intensidade, como se com o olhar tentassem decifrar o que o outro realmente pensava. Nenhum parecia disposto a ceder, embora o ambiente não transmitisse inimizade, mas sim uma espécie de duelo emocional difícil de interpretar. Sem desviar o olhar do seu interlocutor, cada um deu mais um gole na sua cerveja.
O capitão Miller acomodou-se na cadeira, cruzou os braços e respirou fundo antes de falar, como era seu hábito, com sinceridade. — Ariel, vais-me desculpar, mas não acho que estejam a fazer as coisas da melhor forma — disse Miller finalmente, de forma direta. Ariel recostou-se na cadeira, claramente intrigado. Semicerrou os olhos e inclinou ligeiramente a cabeça, como se analisasse as palavras de Miller. — O que queres dizer? — perguntou com genuíno interesse. Miller tomAriel parou, o seu olhar perdeu-se por um instante, recriando na sua mente os momentos que, sem dúvida, tinham marcado a sua existência. Miller ouvia-o atentamente, embora não pudesse evitar o amargo sabor das suas confissões. — E sei que eu também a salvei —sorriu levemente. — Por mais difícil que te seja acreditar, a vida que ela levava era… miserável. Nós passámos por experiências realmente amargas os dois, coisas que marcaram as nossas almas. Mas, mesmo nos momentos mais sombrios, quando tudo estava envolto em sombras, havia sempre algo que nos dava uma pequena faísca de luz. Essa faísca manteve-nos a avançar, deu-nos esperança para enfrentar o que vinha pela frente. Essa declaração foi interrompida pelo leve brilho do telemóvel de Ariel, que se iluminou com uma notificação. Sem pensar, deslizou o dedo
Miller respirou fundo, sentindo o peso da declaração de Ariel. Pela primeira vez, talvez, começou a entender aquilo que Ismael lhe tinha repetido tantas vezes: Ariel e Camelia eram inquebráveis. Não perfeitos, não fáceis, mas completamente reais. Era algo que ele não podia quebrar, não porque não tivesse força para tentar, mas porque entre os dois não havia fissuras que ele pudesse aproveitar. O capitão permaneceu em silêncio, assimilando. Ariel, satisfeito por ter sido claro, bebeu o último gole da sua cerveja, mas desta vez o seu gesto não era de celebração nem de relaxamento. Queria deixar espaço para que o capitão dissesse o que tivesse para dizer. Olhou-o com um respeito que parecia quase fraternal. Não com uma superioridade desafiadora, mas como quem compreende o seu interlocutor e lhe dá espaço para compree
Miller fez uma careta, como se aquelas palavras fossem mais difíceis de digerir do que ele esperava. Ariel aproveitou o silêncio para acrescentar, com um tom firme que não admitia dúvidas: — O meu irmão Ismael fala sempre de ti como se fosses parte da família. Diz que és seu irmão e põe as mãos no fogo por ti — fez uma pausa, como se quisesse que as palavras que ia dizer ficassem marcadas. — E eu, Miller... eu acredito nos meus irmãos. Nunca duvidei nem por um momento que respeitas a Camelia. Miller passou a mão pela testa, sentindo o peso da situação a apertar-lhe as têmporas. Pensava que os Rhys eram realmente uma família peculiar, como se tivessem sido moldados noutro mundo. Ismael, com o seu temperamento honesto e direto, sempre lhe tinha dito a verdade sem rodeios. E agora estava Ariel, o irmão mais novo, que, longe de o
Camelia brinca com as crianças no jardim da sua casa; nesse dia decidiu passá-lo com elas porque era sábado. Ariel tinha saído sem dizer para onde ia. Desde que foi à editora, não conseguia tirar Lucrecia da cabeça, nem esquecer a conversa que teve com Nadia. — E dizes que ela estava agachada debaixo da secretária do Ariel? — perguntou a sua amiga. — Sim! Nem imaginas o susto que apanhei. Pensei que estavam a fazer algo… algo mais — disse, ainda assustada com a lembrança —. Mas logo percebi que o Ari nem se tinha apercebido de nada, porque o rosto dele iluminou-se quando me viu feliz. Nadia observou-a por alguns segundos. Apesar de Camelia insistir que não estava a pensar em coisas disparatadas, a sua amiga conhecia-a demasiado bem para não perceber que a dúvida se tinha cravado profundamente no coração da sua quer
Ambos os guardas dirigiram então o olhar para Nadia, esperando que ela interviesse, pois sabiam que era a única pessoa a quem Camelia escutava sem protestar. Contudo, Nadia simplesmente encolheu os ombros, impotente, como quem diz que não há muito mais que possa fazer. Israel suspirou e deu alguns passos para a frente até ficar diante de Camelia, que o olhou com resignação antes de deixar cair os ombros. Depois de um momento, pareceu preparar-se para escutá-lo, ainda que contrafeita. — Senhora, pelo modo como está a comportar-se, parece que voltou a ser a Camelia de antes de conhecer o senhor Ariel. Por isso todos queremos que reaja — disse Israel com determinação, enquanto conseguia que ela o olhasse. E com um tom afetuoso acrescentou: — Para que foi que a treinámos tanto se, à primeira, se esconde em casa? Você não é Camelia Oduar
Caminhando distraído para o seu escritório, Ariel pára ao notar uma luz acesa. Intrigado, aproxima-se com cautela, mas o seu guarda de segurança pede-lhe que espere enquanto verificam a situação. Ariel acede; não quer correr riscos desnecessários na sua vida, especialmente agora. Ouve os passos dos guardas ao entrarem no escritório, seguidos de gritos surpreendidos e alarmados. Sem perder tempo, corre atrás deles e o que vê deixa-o atónito: sentada na sua cadeira, em roupa interior, está Lucrecia, tirando fotos de forma descarada. — O que pensa que está a fazer, senhorita Lucrecia? — interpela Ariel, furioso. — Quem lhe deu permissão para estar no meu escritório? E como raio entrou aqui? — Não é o que pensas, Ariel! — exclama Lucrecia, tentando desesperadamente cobrir-se. — Apenas entornei
A doutora corre para o lado dele e sustenta-o enquanto o examina rapidamente em busca de ferimentos. Pelo que parece, está a par da condição médica do capitão. Pega num braço dele, passa-o por cima dos seus ombros e segura-o firmemente pela cintura para ajudá-lo a manter-se de pé. — Assim está melhor? Vamos, Miller, não desistas — diz-lhe com uma confiança na voz que surpreende o capitão. — Acho que não consigo andar, Elizabeth — responde Miller, fazendo um esforço evidente para se manter consciente. — Bateram-me com muita força na cabeça, exatamente onde tenho o implante de platina. Sinto que vou desmaiar. — Agarra-te bem a mim, Miller, só aguenta até que os outros cheguem — indica-lhe, decidida, enquanto guarda a sua arma para poder segurá-lo melhor. — Vocês a&i
Na casa de Ariel, este caminha até onde Camélia não para de olhar para o telemóvel, evidentemente nervosa. Ao vê-lo chegar, ela olha para ele aterrorizada, com os olhos cheios de incerteza. — O que se passa, Cami? Por que olhas para mim assim? — pergunta Ariel, temendo que Lucrécia, a desequilibrada que tinha deixado a semear o caos na editora, tenha enviado algo perturbador à sua esposa, justificando a expressão de pânico no seu rosto. Aproxima-se mais, notando que ela não responde. Camélia apenas mantém o olhar fixo no ecrã do telemóvel. Ariel tira-o suavemente das mãos dela e lê a mensagem que acabou de chegar. A expressão do seu rosto endurece instantaneamente ao perceber a razão do comportamento da sua esposa. Sem hesitar, abraça-a apertadamente e chama a ama. — Cuida das crianç