#Mattias
Eu sabia que seria chamado à sala do novo diretor, em algum momento, durante o ano letivo. Mas não esperava que isso acontecesse logo no primeiro dia de aula.
Ouvi dizer que o Dr. Grey foi contratado graças à mão-de-ferro que demonstrou, na direção de uma escola em Milwaukee. Alguém deve ter dito a ele que fui eu quem começou tudo...
E, agora, aqui estou, depois de ter sido praticamente arrancado do ginásio de esportes, para que Grey possa estufar o peito e recitar todas as regras sobre a minha condição de estudante. Sinto que ele está me sondando, tentando prever minhas reações, enquanto me ameaça:
— Contratei dois seguranças armados para trabalhar neste colégio, em tempo integral, Mattias.
Seus olhos me focam, tentando me intimidar. Sim, tudo bem. Percebo de imediato que Grey, mesmo sendo latino, não sabe nada sobre o que acontece nas ruas...
Agora ele começa a me contar que também foi um garoto pobre, como eu. Mas provavelmente nem conhece o outro lado da cidade, onde moro. Talvez eu devesse convidá-lo para dar uma volta por lá.
— Prometi ao superintendente de ensino, bem como ao pessoal do conselho educativo, que me encarregaria de erradicar a violência que tem infestado este colégio, por tantos anos. — Ele para bem diante de mim. — Não hesitarei em dar uma suspensão a quem desobedecer as regras.
Não fiz nada, além de me divertir um pouco com aquela patricinha... E esse cara já está falando em suspensão.
Talvez ele tenha ouvido alguma coisa sobre a minha suspensão, no ano passado... Um pequeno incidente que me deixou fora das aulas, por três dias. Não foi culpa minha... Não totalmente. É que o meu amigo Paco tinha uma teoria maluca sobre a água fria que, supostamente, afetaria os brancos de um modo diferente dos latinos. Nós estávamos conversando sobre isso, na sala das caldeiras, depois dele ter desligado os aquecedores, quando fomos pegos.
Eu não tinha nada a ver com aquilo, mas levei a culpa do mesmo jeito. Paco tentou contar a verdade, mas o nosso antigo diretor não quis escutar. Se eu insistisse mais, talvez ele me ouvisse. Mas do que adianta lutar por uma causa perdida?
Claro que Lucy Valverde é a responsável por eu estar aqui, hoje. Ou você acha que aquele idiota do namorado dela já foi chamado à sala do Grey, alguma vez? De jeito nenhum. O cara é o ídolo do futebol aqui do colégio. Ele pode matar aula e brigar o quanto quiser, que provavelmente continuará a ser bajulado pelo Grey.
Samuel Álvarez vive me provocando, sabendo que pode fazer isso à vontade. Todas as vezes em que estive prestes a revidar, ele encontrou um jeito de fugir ou correr para perto dos professores... Que, aliás, estavam apenas esperando pela oportunidade de me ferrar. Qualquer dia desses...
Olho para Grey:
— Não fui eu quem começou a briga.
Posso até terminar uma briga, mas não sou de provocar.
— Isso é bom — diz Grey. — Mas fiquei sabendo que você desacatou uma aluna, no estacionamento.
Quase fui atropelado pelo reluzente BMW novo de Lucy Valverde... E a culpa é minha? Nos últimos três anos, consegui evitar aquela cadelinha rica. No ano passado, ouvi dizer que havia uma nota C no boletim dela. Mas bastou um telefonema de seus pais e a nota mudou para A.
Um C prejudicaria sua chance de entrar numa boa faculdade.
Que droga. Se eu tirasse um C minha mãe me daria uns tabefes na cabeça e me faria estudar duas vezes mais.
Tenho trabalhado duro para tirar notas boas, embora tenha sido questionado muitas vezes sobre os recursos que uso para conseguir as respostas, nas provas. Para mim, a questão não é entrar na faculdade. A questão é provar que eu poderia entrar... Se meu mundo fosse diferente.
Nós, da zona sul, podemos até ser considerados mais idiotas que os caras da zona norte..., Mas isso é conversa.
Não somos tão ricos ou obcecados com bens materiais, nem com a perspectiva de entrar nas universidades mais caras e prestigiadas do país. Durante a maior parte do tempo, estamos apenas tentando sobreviver e salvar a pele.
Provavelmente o problema mais difícil, na vida de Lucy Valverde, é decidir em que restaurante jantar, a cada noite.
A garota usa seu corpo estonteante para manipular todo mundo que se aproxima dela.
— Você se importaria de me contar o que aconteceu, no estacionamento? — diz Grey. — Gostaria de ouvir a sua versão.
Isso não quer dizer nada. Aprendi, há muito tempo, que o meu lado não importa.
— O que aconteceu hoje de manhã... — eu digo — foi um grande mal-entendido.
Lucy Valverde não entendeu que dois veículos não podem ocupar o mesmo espaço.
Grey inclina-se sobre sua mesa polida, impecável:
— Vamos tentar não fazer dos mal-entendidos um hábito. Certo, Mattias?
— Mattias.
— Hum?
— Pode me chamar de Matt — eu digo. Tudo o que ele sabe a meu respeito está no meu prontuário escolar, que provavelmente é tão extenso, que deve ter uns vinte centímetros de grossura.
Grey responde com um aceno de cabeça:
— Tudo bem, Mattias. Pode ir, agora. Mas estou atento ao que aconteceu; ficarei de olho em cada movimento que você fizer. E não quero vê-lo aqui, de novo, em minha sala.
Eu me levanto e ele me toca o ombro.
— Quero que você saiba que minha meta é trabalhar para que cada aluno deste estabelecimento seja bemsucedido. Refiro-me a todos os alunos, Mattias... Inclusive você. Portanto, se você tiver algum preconceito a meu respeito, trate de jogá-lo pela janela... Entendeu?
— Sí... Entiendo — respondo, perguntando-me até onde posso confiar nele. No corredor, uma multidão de estudantes se apressa para a próxima aula.
Nem imagino para onde devo ir, para assistir a próxima aula. E ainda estou usando minhas roupas de ginástica.
Vou ao vestiário para me trocar e escuto a música, nos alto-falantes, chamando os alunos... Tiro do bolso de trás da calça o cartão com o horário das aulas: Química, com a Sra. Benson. Que maravilha! Mais uma durona que vou ter que aguentar.
#LucyLigo meu celular e telefono para casa, antes da aula de Química, para saber como vai minha irmã. Amora não está nada feliz, porque Karla teve um ataque depois de provar o almoço. Pelo que entendi, Karla jogou sua tigela de iogurte no chão, em sinal de protesto.Seria demais esperar que minha mãe tirasse um dia de folga no country club, para cuidar da adaptação de Amora em nossa casa?O verão começou oficialmente. E não posso estar em casa para cobrir as falhas da nova enfermeira de Karla.Eu bem que deveria me concentrar mais nos meus objetivos. Entrar na mesma universidade que meu pai cursou, a Northwestern, é minha meta principal. Assim, poderei estudar perto de casa e ter mais tempo para ficar com minha irmã.Depois de fazer algumas sugestõ
#MattiasOk, eu não deveria ter detonado a garota, na tal apresentação.Sábado à noite... Você e eu... Aulas de direção e sexo ardente...Escrever isso no caderno dela provavelmente não foi uma manobra inteligente. Mas eu estava louco para fazer a Pequena Miss Perfeição vacilar, quando me apresentasse à classe... E ela está vacilando!— Srta. Valverde?A Pequena Miss Perfeição olha para Benson e eu observo tudo, me divertindo muito. Oh, ela é ótima... Essa minha parceira sabe como esconder suas verdadeiras emoções, coisa que reconheço muito bem, porque faço isso o tempo inteiro.— Sim? — diz Lucy, inclinando a cabeça e sorrindo como
#LucyEstou mexendo no meu armário, depois da aula, quando minhas amigas Morgan, Madison e Megan se aproximam. Nala costuma chamá-las de As M de Saferat. Morgan me abraça.— Oh, meu Deus, você está bem? — ela pergunta, se afastando um pouco para me observar.— Vi quando Samuel defendeu você. Ele é incrível. Você tem muita sorte, Lu — diz Madison. E seus cachos balançam, como se acompanhassem o ritmo das palavras.— Não foi tão grave assim — digo, cogitando sobre o tipo de boato que a essa altura deve estar correndo... Em contraste com o que realmente aconteceu.— O que, exatamente, Mattias disse? — Megan pergunta. — Jasmín fotografou, com o celular, o momento em que ele e Samuel se encontraram no corredor...— Ei, garotas, não vão se atrasar para o ensaio &mda
#LucyEla não consegue pronunciar bem as palavras, mas em geral consegue um som bastante aproximado.Luwiee significa Lucy. E eu sorrio de volta, enquanto tento colocá-la numa posição melhor, na cama.— Ei, menina... Como está seu apetite, para o jantar? — pergunto, pegando alguns lenços umedecidos e tentando não pensar no que estou fazendo.Enquanto ponho uma nova calcinha e um moletom em Karla, Amora me observa. Tento explicar tudo em detalhes, enquanto executo a tarefa, mas basta-me um olhar para Amora, para concluir que ela não está me ouvindo.— Sua mãe falou que eu poderia ir embora, assim que você chegasse — diz Amora.— Tudo bem — respondo, enquanto lavo as mãos. E Amora desaparece, como num passe de mágica, bem no estilo de Houdini...Levo Karla, na cadeira de rodas, até a
#MattiasEmpurro o cara contra um belo e reluzente Camaro preto, que provavelmente custou mais do que minha mãe consegue ganhar em um ano.— Escute aqui, Benício... — eu digo — se você não pagar agora, vou quebrar alguma coisa sua... Não um objeto, ou o seu carro danado de bonito... Mas algo que seja permanentemente ligado a você, entende?Benício, mais magro do que um poste telefônico e pálido como um fantasma, me olha como se eu acabasse de condená-lo à morte. Bem, ele deveria ter pensado melhor, antes de assumir dívidas que não pode pagar.Quando Bernie me manda cobrar, eu cobro. Posso não gostar disso, mas faço. Ele sabe que não trafico drogas, nem participo de assaltos. Mas sou bom em cobranças. Às vezes as coisas se complicam: as pessoas não cumprem o que prometeram e tudo vira um
#Matt...Fácil como uma luta entre gangues rivais, num sábado à noite. Tudo o que preciso, para atrair Lucy, é um pouco de esperteza e flerte... Sabe como é... aquele intercâmbio que desperta a consciência sobre o sexo oposto. E, assim, posso matar dois coelhos com uma cajadada: dar o troco ao Cara de Burro, roubando sua garota... E dar o troco a Lucy Valverde, por ter me dedurado ao diretor e também por ter falado mal de mim para seus amigos.Pode até ser divertido.Posso imaginar a escola inteira assistindo a pura e imaculada garotinha branca babando de paixão pelo mexicano por quem ela jurou ódio eterno... Fico pensando em quanto tempo Lucy levará para cair sentada em cima do próprio rabo, quando eu partir pra cima dela.Estendo minha mão para Pedro:— Feito!— Você vai ter que provar...Dou mais uma tragada no
#LucyAcabo de xingar Mattias de idiota e a Sra. Benson chama a atenção da classe:— Cada dupla vai sortear um projeto, entre os vários que tenho aqui, neste chapéu — ela anuncia. — Todos os projetos são um verdadeiro desafio; vocês terão de se encontrar fora da classe, para trabalhar e...— E quanto ao futebol? — Samuel interrompe. — Não posso perder um treino sequer.— E eu não posso perder os ensaios da torcida — diz Âmbar , antes que eu possa reclamar também.— Os trabalhos do colégio devem vir em primeiro lugar. Você e seu parceiro podem combinar um horário que seja bom para ambos — responde a Sra. Benson, parando em frente à nossa mesa e estendendo o chap&ea
#MattiasAh, isso é perfeito! A Benson e o Grey de um lado, na sala da diretoria, e a Pequena Miss Perfeição e seu namorado idiota do outro... E eu, sozinho, em pé. Ninguém está do meu lado, isso é mais do que certo.Grey limpa a garganta.— Mattias, esta é a segunda vez, em duas semanas, que você vem à minha sala. Sim, isso resume tudo. O cara é, definitivamente, um gênio.— Senhor... — respondo, entrando no jogo, porque estou cansado de ver a Pequena Miss Perfeição e seu namorado controlando a droga deste colégio. — Sofri um pequeno acidente na hora do almoço: caiu gordura em minha calça. Para não perder a próxima aula, pedi a meu amigo, Noah, que me arranjasse outra. — E mostro o jea