#Lucy
Ligo meu celular e telefono para casa, antes da aula de Química, para saber como vai minha irmã. Amora não está nada feliz, porque Karla teve um ataque depois de provar o almoço. Pelo que entendi, Karla jogou sua tigela de iogurte no chão, em sinal de protesto.
Seria demais esperar que minha mãe tirasse um dia de folga no country club, para cuidar da adaptação de Amora em nossa casa?
O verão começou oficialmente. E não posso estar em casa para cobrir as falhas da nova enfermeira de Karla.
Eu bem que deveria me concentrar mais nos meus objetivos. Entrar na mesma universidade que meu pai cursou, a Northwestern, é minha meta principal. Assim, poderei estudar perto de casa e ter mais tempo para ficar com minha irmã.
Depois de fazer algumas sugestões a Amora, respiro fundo, colo um sorriso nos lábios e vou para a classe.
— Ei, baby, guardei um lugar para você. — Samuel me mostra um assento ao seu lado. Mesas altas, de laboratório, com dois lugares cada uma, estão dispostas na sala. Isso significa que vou me sentar ao lado de Samuel, nas aulas de Química, durante o resto do ano. Significa também que faremos, juntos, o tão temido projeto sênior de Química.
Sentindo-me uma tola por ter pensado que as coisas não estavam bem entre nós, eu me acomodo no banco alto, e pego meu pesado livro de Química.
— Ei, veja, Belmonte está na nossa classe! — diz um garoto, no fundo da sala. — Ei, Mattias, venha para cá!
Tento não olhar enquanto Mattias cumprimenta seus amigos com tapinhas nas costas e apertos de mão complicados demais para serem repetidos.
Todos dizem ese uns aos outros; sei lá o que isso significa. A presença de Mattias atrai todos os olhares.
— Ouvi dizer que ele foi preso na semana passada, por posse de metanfetamina — Samuel cochicha ao meu ouvido.
— Não!
— Sim — ele diz, erguendo as sobrancelhas.
Bem, essa notícia não deveria me surpreender. Ouvi dizer que Mattias sempre passa os fins de semana drogado, desmaiado, ou envolvido em alguma atividade ilegal.
A Sra. Benson entra na sala e fecha a porta, com um estrondo. Todos os olhares se movem, do fundo da sala, onde Mattias e seus amigos estão sentados, até a frente, onde está a Sra. Benson, em pé. Ela tem cabelos louros, presos num rabo-de-cavalo bem apertado. Deve ter quase trinta anos, mas os óculos e a expressão de perpétua severidade fazem com que pareça bem mais velha.
Ouvi dizer que ela ficou assim, muito brava, porque no primeiro ano em que lecionou aqui os alunos a fizeram chorar. Também, eles não respeitariam uma professora jovem o suficiente para ser sua irmã mais velha.
— Boa tarde. Sejam bem-vindos à aula de Química. — Ela se senta na borda da mesa e abre uma pasta. — Vejo que já escolheram seus lugares; mas acontece que eu mesma resolvi organizar os assentos... em ordem alfabética.
Reclamo, junto com toda a classe, mas a Sra. Benson não perde a moral... Parando em frente à primeira mesa, diz:
— Samuel Álvarez, sente-se aqui. Sua parceira será Âmbar Smith.
Âmbar Smith faz parte do grupo de torcida do colégio, junto comigo. Sou a líder e ela é uma espécie de co-capitã, ocupando a segunda posição, no grupo. Âmbar me pisca um olho, como se pedisse desculpas, e senta-se ao lado do meu namorado.
Enquanto a Sra. Benson vai lendo a lista, os estudantes relutantemente se deslocam para os lugares por ela designados.
— Lucy Valverde... — A Sra. Benson, aponta para a mesa atrás de Samuel. — Queira sentar-se ali, por favor.
Sem nenhum entusiasmo, obedeço.
— Mattias Belmonte... — E ela indica o banco ao meu lado. — Ali.
Oh, meu Deus! Mattias... meu parceiro de Química durante este ano inteiro? De jeito nenhum, não há como, isso não está direito!
Lanço a Samuel um olhar que é um pedido de socorro, enquanto tento evitar um ataque de pânico.
Definitivamente, eu deveria ter ficado em casa, na cama, debaixo das cobertas.
— Matt — ele diz à professora — me chame de Matt.
Interrompendo a leitura da lista, a Sra. Benson ergue os olhos e o observa, por cima dos óculos.
— Mattias Belmonte — ela diz, antes de alterar o nome, na lista. — Sr. Belmonte, tire esse lenço. Tenho uma política de tolerância-zero, em minhas aulas. Não permito qualquer tipo de acessório relacionado a gangues, nesta sala.
Infelizmente, Mattias, sua reputação fala por você. Quanto ao Dr. Grey, ele apoia totalmente minha política de tolerânciazero... Fui clara?
Matt a olha de cima a baixo, antes de fazer deslizar o lenço que traz na cabeça, expondo cabelos tão negros quanto seus olhos.
— É para esconder os piolhos — Samuel cochicha para Âmbar , mas eu o escuto... E Mattias também.
— Vete a la verga — diz Mattias a Samuel, com os olhos negros incandescentes de raiva. — Não meta o focinho onde não é chamado.
— Qual é, cara? — Samuel rebate. E então se dirige a todos: — Ele nem sabe falar Inglês.
— Já chega, Samuel. Sente-se, Mattias. — A Sra. Benson olha para o resto da classe. — Isso vale para todos vocês. Não posso controlar o que fazem fora daqui, mas, na minha aula, quem manda sou eu. — E volta-se para Mattias. — Fui clara?
— Sí, señora — ele responde, lentamente.
A Sra. Benson continua a ler a lista, enquanto faço de tudo para evitar qualquer tipo de contato visual com o cara sentado ao meu lado. Foi uma pena deixar minha bolsa no meu armário; eu poderia fingir que estava procurando alguma coisa, como fez Nala, nesta manhã.
— Que droga — Mattias resmunga, mais para si mesmo. Sua voz é sombria e áspera...
Ou será que ele fala desse jeito, de propósito?
Como vou explicar à minha mãe que sou parceira de Mattias Belmonte?
Oh, Deus, espero que ela não pense que isso aconteceu por minha culpa.
Olho para meu namorado, totalmente entretido numa conversa com Âmbar . Sou tão ciumenta! Por que meu sobrenome não é Allis, em vez de Valverde? Assim eu poderia me sentar ao lado dele.
Seria bom se Deus desse a cada pessoa um Do Over Day: um dia para corrigir o que está errado, para reviver o que é bom. E então a gente poderia gritarn Recomeçando! E um novo dia teria início. Hoje é um dia em que eu, definitivamente, faria isso: começaria tudo de novo. Será que a Sra. Benson realmente acha justo colocar a líder da torcida organizada como parceira do cara mais perigoso do colégio? Ela só pode estar delirando!
A Sra. Delirante termina, finalmente, de designar os lugares.
— Sei que vocês, estudantes do último ano, pensam que sabem tudo. Mas não se considerem pessoas bemsucedidas... Não antes de contribuir para a cura de doenças que afligem a humanidade, não antes de fazer da Terra um lugar mais seguro para se viver. A Química tem um papel crucial no desenvolvimento de remédios, nos tratamentos de radiação para pacientes com câncer, na utilização do petróleo, na camada de ozônio.
Mattias levanta a mão.
— Sim, Mattias? — diz a professora. — Quer fazer uma pergunta?
— A senhora está dizendo que o presidente dos Estados Unidos não é um homem bem-sucedido?
— Estou dizendo que dinheiro e status não são tudo. Use seu cérebro para fazer algo pela humanidade, ou pelo planeta onde vive. Aí, sim, você será um homem bem- sucedido e ganhará meu respeito, coisa da qual pouca gente pode se gabar.
— Tenho algumas coisas de que posso me gabar, Sra. Benson — diz Mattias, obviamente se divertindo.
A Sra. Benson ergue a mão:
— Por favor, poupem-nos dos detalhes, Mattias.
Francamente, se Mattias pensa que o fato de hostilizar a professora vai nos render uma boa nota, está enganado.
É óbvio que a Sra. Benson não gosta de espertinhos... E que meu parceiro já está na sua mira.
— Agora... — diz a Sra. Delirante — quero que cada um olhe para a pessoa sentada a seu lado.
Oh, tudo menos isso. Mas não tenho escolha. Olho de novo para Samuel, que parece bastante satisfeito com a parceira que a professora escolheu para ele. Âmbar já tem um namorado... Senão, eu a questionaria, seriamente, sobre por que ela está se inclinando desse jeito para Samuel, ou jogando os cabelos para trás, tantas vezes seguidas. Digo a mim mesma que estou sendo paranóica.
—Vocês não precisam gostar do parceiro — diz a Sra. Benson. — Mas terão de trabalhar juntos, durante os próximos dez meses. Reservem cinco minutos para se conhecer e, então, cada um apresentará seu parceiro, para toda a classe. Falem sobre o que fizeram durante o verão, se têm hobbies, ou sobre qualquer outra coisa interessante ou original, que talvez seus colegas não saibam... Seus cinco minutos começam agora.
Abro meu caderno e o empurro na direção de Mattias:
— Escreva alguma coisa sobre você, aqui, e eu farei o mesmo no seu caderno. Antes isso, do que tentar conversar com ele.
Mattias acena em concordância — embora eu perceba uma leve contração, nos cantos de sua boca — e me dá seu caderno. Será que imaginei esse riso, ou ele realmente aconteceu? Respiro fundo, afasto esse pensamento e me concentro em escrever, até que a Sra. Benson nos pede para parar e ouvir as apresentações.
— Esta é a Âmbar Smith — diz Samuel, o primeiro a falar.
Mas não escuto o resto do discurso de Samuel sobre Âmbar , sua viagem à Itália, suas aulas de dança neste verão. Em vez disso, olho para o caderno que Mattias me devolve e, de queixo caído, leio o que ele escreveu.
#MattiasOk, eu não deveria ter detonado a garota, na tal apresentação.Sábado à noite... Você e eu... Aulas de direção e sexo ardente...Escrever isso no caderno dela provavelmente não foi uma manobra inteligente. Mas eu estava louco para fazer a Pequena Miss Perfeição vacilar, quando me apresentasse à classe... E ela está vacilando!— Srta. Valverde?A Pequena Miss Perfeição olha para Benson e eu observo tudo, me divertindo muito. Oh, ela é ótima... Essa minha parceira sabe como esconder suas verdadeiras emoções, coisa que reconheço muito bem, porque faço isso o tempo inteiro.— Sim? — diz Lucy, inclinando a cabeça e sorrindo como
#LucyEstou mexendo no meu armário, depois da aula, quando minhas amigas Morgan, Madison e Megan se aproximam. Nala costuma chamá-las de As M de Saferat. Morgan me abraça.— Oh, meu Deus, você está bem? — ela pergunta, se afastando um pouco para me observar.— Vi quando Samuel defendeu você. Ele é incrível. Você tem muita sorte, Lu — diz Madison. E seus cachos balançam, como se acompanhassem o ritmo das palavras.— Não foi tão grave assim — digo, cogitando sobre o tipo de boato que a essa altura deve estar correndo... Em contraste com o que realmente aconteceu.— O que, exatamente, Mattias disse? — Megan pergunta. — Jasmín fotografou, com o celular, o momento em que ele e Samuel se encontraram no corredor...— Ei, garotas, não vão se atrasar para o ensaio &mda
#LucyEla não consegue pronunciar bem as palavras, mas em geral consegue um som bastante aproximado.Luwiee significa Lucy. E eu sorrio de volta, enquanto tento colocá-la numa posição melhor, na cama.— Ei, menina... Como está seu apetite, para o jantar? — pergunto, pegando alguns lenços umedecidos e tentando não pensar no que estou fazendo.Enquanto ponho uma nova calcinha e um moletom em Karla, Amora me observa. Tento explicar tudo em detalhes, enquanto executo a tarefa, mas basta-me um olhar para Amora, para concluir que ela não está me ouvindo.— Sua mãe falou que eu poderia ir embora, assim que você chegasse — diz Amora.— Tudo bem — respondo, enquanto lavo as mãos. E Amora desaparece, como num passe de mágica, bem no estilo de Houdini...Levo Karla, na cadeira de rodas, até a
#MattiasEmpurro o cara contra um belo e reluzente Camaro preto, que provavelmente custou mais do que minha mãe consegue ganhar em um ano.— Escute aqui, Benício... — eu digo — se você não pagar agora, vou quebrar alguma coisa sua... Não um objeto, ou o seu carro danado de bonito... Mas algo que seja permanentemente ligado a você, entende?Benício, mais magro do que um poste telefônico e pálido como um fantasma, me olha como se eu acabasse de condená-lo à morte. Bem, ele deveria ter pensado melhor, antes de assumir dívidas que não pode pagar.Quando Bernie me manda cobrar, eu cobro. Posso não gostar disso, mas faço. Ele sabe que não trafico drogas, nem participo de assaltos. Mas sou bom em cobranças. Às vezes as coisas se complicam: as pessoas não cumprem o que prometeram e tudo vira um
#Matt...Fácil como uma luta entre gangues rivais, num sábado à noite. Tudo o que preciso, para atrair Lucy, é um pouco de esperteza e flerte... Sabe como é... aquele intercâmbio que desperta a consciência sobre o sexo oposto. E, assim, posso matar dois coelhos com uma cajadada: dar o troco ao Cara de Burro, roubando sua garota... E dar o troco a Lucy Valverde, por ter me dedurado ao diretor e também por ter falado mal de mim para seus amigos.Pode até ser divertido.Posso imaginar a escola inteira assistindo a pura e imaculada garotinha branca babando de paixão pelo mexicano por quem ela jurou ódio eterno... Fico pensando em quanto tempo Lucy levará para cair sentada em cima do próprio rabo, quando eu partir pra cima dela.Estendo minha mão para Pedro:— Feito!— Você vai ter que provar...Dou mais uma tragada no
#LucyAcabo de xingar Mattias de idiota e a Sra. Benson chama a atenção da classe:— Cada dupla vai sortear um projeto, entre os vários que tenho aqui, neste chapéu — ela anuncia. — Todos os projetos são um verdadeiro desafio; vocês terão de se encontrar fora da classe, para trabalhar e...— E quanto ao futebol? — Samuel interrompe. — Não posso perder um treino sequer.— E eu não posso perder os ensaios da torcida — diz Âmbar , antes que eu possa reclamar também.— Os trabalhos do colégio devem vir em primeiro lugar. Você e seu parceiro podem combinar um horário que seja bom para ambos — responde a Sra. Benson, parando em frente à nossa mesa e estendendo o chap&ea
#MattiasAh, isso é perfeito! A Benson e o Grey de um lado, na sala da diretoria, e a Pequena Miss Perfeição e seu namorado idiota do outro... E eu, sozinho, em pé. Ninguém está do meu lado, isso é mais do que certo.Grey limpa a garganta.— Mattias, esta é a segunda vez, em duas semanas, que você vem à minha sala. Sim, isso resume tudo. O cara é, definitivamente, um gênio.— Senhor... — respondo, entrando no jogo, porque estou cansado de ver a Pequena Miss Perfeição e seu namorado controlando a droga deste colégio. — Sofri um pequeno acidente na hora do almoço: caiu gordura em minha calça. Para não perder a próxima aula, pedi a meu amigo, Noah, que me arranjasse outra. — E mostro o jea
#LucyEstou atrasada. Falta apenas meia hora para acabar o ensaio, na quadra de esportes. Enquanto troco minhas roupas comuns pelo uniforme de ginástica, penso no que aconteceu na sala do Dr. Grey... A Sra. Benson me repreendeu tão duramente quanto fez com Mattias.Minha nossa... Mattias Belmonte já está arruinando meu último ano, e ele mal começou. Visto o short. O som de passos no piso me avisa que não estou sozinha, no vestiário.Vejo Cristina Malony e cubro os seios com a blusa. Oh, não.— Hoje deve ser meu dia de sorte — ela diz, me encarando com a expressão de um puma pronto para o ataque... Embora os pumas não tenham cabelos castanhos, longos e lisos. Mas certamente têm garras, as garras de Cristina estão pintadas de vermelho brilhante.Ela se aproxima.Tenho vontade de recuar. Aliás, tenho vontade de fug