Karina
Não me espantei quando Hassan me tirou. Mesmo assim, sinto uma onda de calor esquentar meu pescoço e meu rosto. Os olhos negros me observam como se estivessem fascinados, iguais aos meus para ele. Tento encontrar no meu cérebro bagunçado uma desculpa para não dançar, mas quando ele pega a minha mão ela morre em meus lábios e eu estremeço. A mão quente dele me deixa perturbada. Ele, então, eleva meu braço, segurando forte minha mão, como se nunca mais fosse soltar, e me conduz para o meio do salão.
Deus! Eu nem sabia que eu era capaz de sentir tamanha atração por um homem. Como se eu estivesse à flor da pele, movida por instintos animais.
Não consigo evitar o arrepio que corre todo o meu corpo quando ele olha para mim novamente, com um lindo e iluminado sorriso nos lábios. Os dentes brancos, grandes e perfeitos, contrastando como o rosto moreno. O salão está cheio, mas eu não consigo ver nada a não ser ele. Parece que tudo está congelado ao meu redor.
A música se inicia novamente, envolvente. Hassan começa a bater palmas e sinuosamente começa a dançar para mim, me cortejando. Ora com a mão na cabeça, ora os braços abertos, com grande habilidade nos passos.
Estou hipnotizada por seus olhos negros, que nem me dou conta de que sou agora o centro das atenções, e que um grupinho de mulheres mimadas me olha com inveja.
Toda a minha resolução de ficar longe dele foi esquecida, pelo menos por ora, e eu fico parada, encantada com a maneira sensual que ele dança. Tanto é que nem me sinto eu, é como se eu estivesse fora do meu corpo, olhando para mim mesma, vendo outra Karina ao lado daquele homem envolvente.
Ele, então, se aproxima de mim, e eu estremeço quando ele passa as mãos nos meus cabelos, se inclina e pede no meu ouvido: “Bata palmas, dance!”.
Eu ofego e faço como ele pediu, entro na dança e bato palmas junto com ele. A música começa a povoar minha mente e logo estou dançando timidamente ao lado dele, sorrindo.
Em um momento da dança, ele pega a minha mão e a levanta, me fazendo acompanhá-lo para frente e para trás. Depois com um braço me pega possessivamente pela cintura, e seu rosto se aproxima do meu e me faz virar com ele, direita. Depois é a vez do outro braço me pegar e me virar para a esquerda… e assim por diante.
Percebo que a música está se findando, e me arrepio quando ele para e me puxa para os seus braços. Nossos olhos se encontram, fogo puro. Ele ofega e olha meus lábios por um momento, então me inclina para trás, finalizando a dança.
Todos nos aplaudem. Hassan me puxa novamente, me endireitando em seus braços. Depois pega a minha mão e a ergue. Então se inclina para agradecer os convidados.
Eu aproveito esse momento para me desvencilhar dele e, como uma fugitiva, saio rapidamente do salão. Agora me sinto como a Cinderela, correndo antes que sua carruagem se transforme em abóbora.
Escolho um canto da casa, longe dos olhos de todos, para me recuperar. Fecho os olhos e aperto minha testa.
Deus! Tudo que eu não preciso é um Hassan na minha vida. Ele troca de mulher como troca de roupa e eu não quero ser mais uma em sua longa lista.
Mas a minha segurança não dura muito tempo e meu nervosismo volta quando abro meus olhos e vejo Hassan na minha frente, observando-me com um sorriso irônico em seus lábios.
Acabou o show! E eu voltei ao meu estado normal, a mulher razão. Cabeça! E que detesta tipos como Hassan. Raissa me deixou bem a par de sua natureza aventureira, então eu sei com quem estou lidando.
Eu quero olhá-lo com firmeza agora. É importante que ele saiba que estou na defensiva. Eu o encaro séria.
É isso mesmo, Hassan, acabou o show.
Ele me encara em silêncio, demoradamente. Seus olhos brilhantes e insolentes percorrem-me de alto até em baixo sem a menor cerimônia. Desde os cabelos castanhos dourados, soltos até os ombros, meu corpo atlético e bem feito, as pernas compridas, cujos contornos estão acentuados pelo vestido, até os sapatos scarpin.
Ofegante, naquele instante, eu desprezei o gesto dele, de todo o coração. O olhar dele tem a insolência de alguém que cobiça um objeto exposto em uma vitrine. Seus olhos se acomodam agora nos meus.
Hassan Hajid se aproxima ainda mais e me indaga:
— Por que você me deixou lá sozinho? Ficou tão perturbada assim com a dança? Ou foi com a minha presença?
Então ele sorri provocador.
Preciso ser firme. Mesmo que o sotaque dele seja lindo… Bem, ele é todo lindo.
Fecho minhas mãos até sentir minhas unhas se enterrarem nas palmas. Estou me punindo por ficar tão encantada com um homem como ele, tão cafajeste. A raiva borbulha dentro de mim, permeada com a atração incontrolável que me envolve. Sim, o que Raissa me disse se materializa bem ali, à minha frente, fazendo-me lembrar de tudo que ela me disse…
“Hassan não é confiável. Ele só quer uma coisa de você, te levar para a cama, e depois, tchau!”
Eu sorrio com desdém.
— Sozinho? Garanto que sozinho o senhor não ia ficar. Os homens egípcios são assim? Presunçosos como o senhor? Colocam sua vaidade acima de tudo?
As sobrancelhas dele se estreitam.
— Allah! Quem é você para falar do meu povo? — ele diz, duro. — Meu povo é cheio de princípios. E presunção e vaidade não fazem parte do nosso vocabulário.
— Eh? Sua irmã me disse o contrário.
— Raissa não é referência. Nasceu neste país. Eu não, morei no Egito até os 18 anos — Deus, isso explica o sotaque.
Sua voz é tão nostálgica, sofrida, que me atinge. Sinto meu corpo reagir, enquanto desço os olhos por seu rosto, sua expressão de enlevo, sua boca tão sensual. Meu coração acelera e meu sangue se torna como lava líquida nas minhas veias, rápido e denso.
— Hassan, foi um prazer te conhecer. Bem, vou procurar Raissa.
Tento passar por ele, mas Hassan é muito rápido e se coloca na minha frente. Seus olhos procuram os meus. Ele tem genes notáveis no departamento de olhar sedutor. É uma pena que seja tão cafajeste, e eu tenho que me lembrar disso uma e outra vez.
— Você não me disse seu nome.
Eu tento controlar minha respiração.
— Karina.
— Karina, lindo nome — ele repete meu nome. Na boca dele, com aquele sotaque, fica mais lindo. Ele, então, respira fundo e diz: — Karina do quê?
Eu não respondo, tenho medo dele. Essa é a verdade, e digo:
— Olha, Hassan, foi um prazer dançar com você, mas preciso procurar Raissa. Ela deve estrar estranhando meu sumiço.
Ele se coloca novamente na minha frente quando faço menção de sair.
— Você está com medo de mim?
— Eu… Não!
Ele sorri.
— Não? Que bom! Então quero que saiba que gostaria de te conhecer melhor. Eu sei que nossa atração é mútua. Eu senti isso, e sei que você sentiu também.
Eu ofego. Droga! Não consigo me mover nem piscar. Tudo o que faço é olhar para ele, um calor se espalhando lentamente. Dentro de mim, o coração bate agitado, se enchendo de sentimentos inexplicáveis. Eu luto para me defender de tanta sensualidade. Não posso deixar a brandura tomar conta da raiva, preciso me apegar a ela para me defender.
Não queria ser tão transparente. Resolvo atacá-lo.
— O que foi, Senhor Hajid? Sou o seu entretenimento para esta noite? — pergunto, secamente.
Ele me bebe com seu olhar, sorri, um sorriso frio, e se aproxima mais de mim.
Deus! O perfume dele é muito bom!
— Se você fosse meu entretenimento para esta noite, o que menos faríamos é conversar — ele diz, sua voz é baixa e rouca.
Minha respiração se atenua com sua declaração dita de forma tão clara, e minhas bochechas se aquecem, por puro choque! Enquanto uma minúscula parte de mim concentra-se em lutar contra seu charme.
Eu ofego.
Deus! Ele é rápido nas palavras e nas reações. Toda vez que tento deixá-lo sem graça ele vem com uma resposta que me faz me sentir pior.
Preciso me apegar à inconstância dos sentimentos de Hassan e ao jeito como ele envolve as mulheres por meio de sutilezas. Não posso me deixar me envolver por um homem aventureiro como ele. Pensando nisso, aumenta a minha raiva. Mas não quero passar isso, e sim indiferença.
Eu balanço a cabeça, tentando sufocar a minha irritação. Não quero mostrar o quanto ele me abala e dou risada na cara dele.
— Hassan, desculpe-me, estou lisonjeada, mas eu não estou interessada.
Tento sair de sua presença novamente. Se havia um botão, eu acionei. Hassan me pega pelo braço e me puxa para os seus. Eu ofego. A respiração alterada dele sopra em meu rosto.
— Mulher alguma riu de mim. Você está me provocando com esse sorriso de pouco caso. E pretendo tirar esse seu sorriso agora mesmo.
Deus, eu o encaro como um coelho assustado. Hassan cobre a minha boca com a dele em um beijo possessivo. Na hora sinto o poder da atração que ele tem sobre mim. Forço-me a não corresponder. Ele, muito experiente, me puxa mais perto e me provoca com sua língua. Deus! A experiência é agradável, agradável demais.
Há uma grande excitação se revolvendo dentro de mim. A vontade que eu tenho é agarrá-lo e corresponder ao beijo. Mas me seguro, e fico como uma boneca de pano em seus braços, embora tenho uma vontade enorme de sentir a textura de seus cabelos.
Deus! Fica firme. Melhor é fingir desinteresse.
Ele se afasta, ofegante.
— Linda Karina. Sensações assim, tão intensas e cruas, assustam. Sei que se segurou, sei que está assustada… — Hassan afirma, com voz branda.
Ele, então, me afasta e espera minha resposta com olhos febris. Eu o encaro e limpo minha boca como se o beijo dele fosse algo desprezível.
— É esse seu melhor beijo?
Hassan fica de todas as cores. Graças a Deus eu ouço a voz de Raissa.
— Ah aí estão vocês — ela abraça o irmão pela cintura e, sorrindo para ele, pergunta: — Você conheceu minha amiga? Fiquei surpresa por escolhê-la para a dança.
Hassan se recupera rápido e sorri para ela com os dentes muito brancos, contrastando com o rosto moreno.— Por que surpresa? — Hassan volta seu olhar para mim, agora indecifrável.Raissa sorri para mim e olha para seu irmão.— Porque eu falei a semana inteira de você para Karina.Hassan me encara com um sorriso irônico, como se alguma coisa tivesse iluminado sua mente.— Aposto que falou mal de mim.Raissa ri do comentário do irmão.— Só falei a verdade.Hassan gargalha, uma risada muito agradável, e me olha com intensidade, provocador:— Allah! Já estou ardendo no mármore do inferno, então.Raissa ri e o abraça.Deus! Esse homem mexe comigo: o sotaque carregado é extremamente sedutor. O mover das mãos morenas, olhar de um felino, o caminhar de uma pantera…
KarinaNo dia seguinte, eu acordo tarde. Dez horas. Não levanto com pressa. Depois de me trocar, caminho tranquilamente até a sala. Meu pai está lendo um jornal, enquanto mamãe arruma as flores em um vaso, que fica no canto da sala, em cima de um lindo aparador.Audrey é uma mulher de 50 anos e usa os cabelos grisalhos naturais. O branco misturado ao preto deixa-o com uma cor acinzentada. Seus olhos verdes, iguais aos meus, me focalizam e elaabre um sorriso.— Bom dia — digo a todos.— Bom dia — eles falam quase em coro.Papai deixa o jornal de lado e me encara com curiosidade.— Como foi a festa?Eu disfarço meu nervosismo com essa simples pergunta e respondo sem colocar emoção na voz.— Foi legal.Jonas sorri.— Legal? Já vi que você não gostou. Esse “l
Hassan Preso em pensamentos negativos e aborrecimentos, saio de casa. Estaciono a Ferrari em frente ao Victória Park. Nunca tinha vindo a esta parte da cidade. Mal sabia que existia. O céu está azul, crianças empinam pipas, enquanto suas famílias fazem piquenique. O dia está com uma temperatura agradável, mas nem mesmo a quietude do lugar tira a minha irritação. Meus olhos se voltam para o painel do carro. Onze horas da manhã. Allah! Prometi a mim mesmo que eu iria ignorá-la, que eu não ia me indispor com ela. Tudo por causa de Raissa. Mas não tem jeito, não consigo engolir aquela mulher dissimulada, falsa, adúltera. E ela sabe disso e faz de propósito, torna a minha vida um inferno insuportável para que eu finalmente ceda, procure uma esposa e, contraindo casamento, eu dê logo a parte dela da herança. Se ela não tivesse tido Raissa, ela sairia com uma mão na frente e outra atrás quando meu pai morreu.
KarinaChego à mansão às duas horas da tarde. Os seguranças, logo que avistam meu carro, já abrem os portões para eu passar. Meu coração está agitado, desde o momento em que resolvi que eu viria à casa de Raissa me sinto perturbada.Sempre que eu vou à casa dela vou entrando, já tínhamos combinado assim. Então abro a porta da mansão e entro no hall espaçoso, sigo até a sala e dou de cara com Hassan sentado no sofá, inclinado, os cotovelos apoiados nas pernas, segurando sua cabeça.Fico ali sem ação ao vê-lo, sem saber se me esquivo e dou a volta passando por suas costas e vou direto para o quarto de Raissa ou chamo sua atenção o cumprimentando.Como se pressentisse minha presença, ele se ergue. Quando me vê, muda imediatamente sua postura. Seus olh
— E Raissa? — ele indaga, e espera minha resposta com o rosto sério.— Ficou bem depois que soube que você não sairá mais do país. Por que você não sobe e fala com ela?Ele assente.— Já vai? — me questiona.— Sim, amanhã preciso levantar cedo.Hassan ergue as sobrancelhas interessado, e eu me repreendo por ter dado brecha para um diálogo:— Você trabalha?Eu solto o ar.— Sim. Me formei em Design de Moda, desenho roupas para uma loja de grife.Seus olhos passam pelo meu corpo, e eu sinto como se um rastro de fogo percorresse por onde quer que ele se deteve. Arfei, pois já não conseguia respirar direito. Ele pareceu notar, pois reagiu com aquela aura selvagem que notei nele.— Esse vestido é uma arte sua?Eu assenti.— Eu não gosto dele &mda
KarinaNo dia seguinte, chego ao meu trabalho um pouco mais cedo, embora não tenha dormido muito bem. Temo que Hassan não saia mais da minha mente. Então tomo a resolução de me dedicar naquilo que eu mais sei fazer: ser criativa. Pretendo tirar Hassan definitivamente dos meus pensamentos.Entro na loja, que ainda está vazia, e me dirijo aos fundos dela. Passo pelas costureiras e entro no meu ateliê. Sento-me em frente à minha prancheta. Observo o vestido que desenhei. Agora preciso definir o tecido e a cor. Pego várias amostras de tecido e estendo sobre o papel, tentando imaginar como ele ficaria com eles.Aos poucos o vestido vai tomando forma na minha cabeça. Coloco tudo no papel e vou até a sala de costuras para pedir sua produção e explicar como o imaginei.Conversando com elas, decidimos fazê-lo em três tamanhos. P, M e G e poucos n&
Em um piscar de olhos, é sexta-feira, fim de tarde…Hassan enviou o convite na minha casa na quinta-feira. Graças a Deus fui eu que peguei na caixinha de correio e ninguém viu. Eu não vou a essa festa mesmo, e o que menos quero é falar sobre isso com meus pais. Engraçado que na terça-feira, quando conversei com Raissa, ela me falou várias coisas, mas nem por um momento ela tocou no assunto “festa”, e eu não comentei nada também.Vitor também sumiu, nem mensagem ele me mandou. Minha atitude o espantou. Não acho ruim isso. Ele precisava dessa sacudida para seguir sua vida e parar de alimentar esse sentimento platônico por mim. Mesmo porque eu não consigo sair com um homem por sair. Para mim, estar com um homem é estar ligada por um sentimento irresistível, como uma droga potente. Mas, acima de tudo, essa relação precisa me fazer
HassanFico em transe ouvindo o que ela me diz. O entendimento da situação me atinge como um trem de carga.Que merda é essa?Meu sangue ferve e eu sinto como se a raiva tivesse sido injetada em minhas veias. Não.Não. Não pode ser verdade. Ela está brincando comigo. Sim, é isso. Só pode ser. Hoje ela deu para me contrariar, para me ver nervoso. Relanceio o olhar para ela, aparentando calma, mas a vontade que me dá é de jogar o carro para o meio-fio e mostrar a ela quem manda aqui. Eu a encaro, e sorrio sem acreditar em suas palavras.— Sério? Você só pode estar brincando comigo. Com 25 anos você nunca saiu com ninguém? Ela me encara ofegante, a testa franzida.— Por que o espanto? Sim, sou virgem.O choque só se intensifica.Então é verdade?— Ghabi! Ghabi! —