AARONSe existe algo que deveria ser natural, mas que considero desconfortável, são os almoços em família. Eu nunca soube ao certo o que dizer ou como me portar em situações em que toda minha pequena família esteve reunida ao redor de uma mesa. No começo, costumava ser ainda pior, por incrível que pareça. Uma mesa grande o suficiente para abrigar meu pai, Ginger, eu e sua mãe socialite que sempre tinha um comentário negativo na ponta da língua. Hoje, as coisas estão consideravelmente melhores, mas não deixam de ser estranhas.Minha irmã olha ao redor do restaurante quase vazio e abaixa o tom de voz:— Por que há tantos seguranças aqui?— Por que você acha, tonta? — eu digo. — Os paparazzi não deixaram papai em paz desde que ele voltou.Ela encolhe os ombros.— Eu nunca vou me acostumar com isso. Só queria um almoço em família normal com vocês dois.Meu pai sorri.— Estamos tendo um almoço normal, bonequinha. Basta ignorar as pessoas ao redor. Finja que somos apenas nós, ok? — ele diz.
Depois do almoço, Ginger vai embora com o meu pai e eu vou para casa. O evento da mãe de Evelyne é hoje, e faz tempo que não estou tão ansioso para ir a algum lugar.Às seis em ponto, quando paro o carro no estacionamento do seu dormitório, não sofro com a espera. Ela é pontual, e já está na porta me esperando. Seu olhar sobre mim me diz que ela não esperava que eu tivesse um smoking, e eu não posso julgá-la por isso. No entanto, estou mais que deslumbrado com o quão incrível ela está. Estou certo de que esse longo vestido vermelho deixaria qualquer cara apaixonado. Noto que ela também está sem seus óculos, provavelmente decidiu usar as lentes de contato hoje. Eu me inclino e beijo de leve seu pescoço, em vez da boca, para não correr o risco de borrar o seu batom. Ela estremece com meu toque e sorri.— Obrigada por ter vindo — diz. — Você está... uau! Nunca imaginei que fosse ficar tão bem em um smoking.— Ei, você está dizendo que duvidou do meu senso de moda?Ela ri.— Claro que não
Já vi muitas expressões quando dizia às pessoas de quem eu era filho. Pena, inveja, adoração ou simplesmente desinteresse, mas o que a mãe de Evelyne me lança agora é diferente de tudo o que eu já vi. Há certa... nostalgia? Ela parece emocionada também, pois seus olhos brilham. E em vez de perguntar o que eu imaginei que fosse fazer — que sou filho do “astro do rock” — ela me surpreende dizendo:— Você é filho de Aiko?E então, tudo nesse momento muda. Meus músculos se retesam, o ar do ambiente fica mais denso. Minha respiração quase para e meu coração começa a bater mais forte.— A senhora conheceu minha mãe?Ela abre um sorriso emocionado e pisca algumas vezes, parecendo querer afastar as lágrimas.— Sim — assente. — Estudei com ela no Joe Bixby.— Minha nossa — Evelyne diz, tão surpresa quanto eu. — É uma coincidência e tanto.— Trempton é uma cidade pequena, querida — diz a mais velha. — Quase todo mundo por aqui se conhece.Eu tenho tanta coisa para dizer. Tantas perguntas para f
EVELYNEHoje é o Grande Dia, como Ginger decidiu nomear a data do seu aniversário. Mesmo após os inúmeros protestos de Aaron, a festa à fantasia venceu. Confesso que foi um desafio para mim, não somente pelo fato de eu não estar tão acostumada a ir em festas, mas por eu precisar usar algo além das minhas roupas habituais. Já fui a eventos geek algumas vezes, então já tinha algumas ideias em mente, embora nunca tenha me fantasiado antes.Passo a mão sobre a curta saia do vestido azul e branco. Há um laço vermelho enorme na região do meu peito, as luvas e as meias vão até a metade dos braços e pernas e meus cabelos compridos estão presos em rabos de cavalo nas laterais. Nos pés, uma bota vermelha simples, sem salto, o que atribui um ponto à vestimenta que em mil anos eu não me imaginaria usando.— Você pode me ajudar com esse zíper? — pergunto a Eleanor, que está acabando de finalizar sua maquiagem de Noiva Cadáver. Ela tingiu os cabelos de azul especialmente para a ocasião. Confesso qu
— Não brinca — eu digo.Aaron sorri.— O que achou da minha fantasia?Observo encantada sua roupa colada e a capa vermelha, um arco de brinquedo nas costas. Ele está incrível. Tão tentadoramente lindo e isso é... fofo? Mesmo que a roupa do meu super-herói favorito não seja a coisa mais sexy do mundo, nele fica, e isso é o que importa.— Que diabos de fantasia é essa? — Eleanor zomba, claramente confusa.— É Capitão Flecha — eu digo, como se fosse a coisa mais incrível do mundo.— Quem? — Desistindo de entender, ela balança a mão. — Esqueça. Eu vou pegar bebida. Vocês são tão constrangedores.Ela nos abandona e eu ainda fico ali, babando em Aaron.— Você ganhou disparado na melhor fantasia da noite.Ele me puxa para um beijo.— Você também está incrível, mas estou certo de que não preciso dizer isso.Sorrio.— Por que não me contou? Eu teria vindo de Thabita.Sua gargalhada é gostosa.— E estragar a surpresa?— Pensando bem, você tem razão.Ele segura na minha mão.— Vem, vamos pegar u
— Por que diabos alguém sentiria inveja de Eric Ramsay? Ele tem o ego maior que o planeta Terra e tenho a sensação de que o carro dele tem mais importância pra ele que qualquer outra coisa. O seu irmão tem motivos para se preocupar com você, então eu tentaria escutá-lo pelo menos uma vez.Ela puxa seu braço com força, desvencilhando-se.— Eu pensei que você fosse minha amiga, mas você está aqui, outra vez, falando mal do meu namorado na minha frente. O mais engraçado é que você está sendo uma hipócrita, porque tenho certeza de que não acreditaria se fosse com o Aaron, então não tente reproduzir o discurso do meu irmão, porque não vou acreditar. Já estou cansada de todos me tratarem como se eu fosse uma criança!Ela está tão alterada que, em um gesto inconsciente, o seu braço acaba esbarrando no meu e meu copo de refrigerante entorna em toda minha roupa clara. Os olhos de Ginger se expandem em choque e arrependimento.— Oh, meu Deus... me desculpe. — Ela cambaleia em minha direção, ten
AARONA porta da reitoria já está entreaberta quando bato nela. Não é preciso um anúncio para que a Sra. Ramsay saiba que sou eu; afinal, ela já me esperava. Aguardo apenas pela confirmação padrão antes de adentrar a sala. O escritório é sóbrio e organizado. Há muitos detalhes dos quais eu não percebi na última vez em que estive aqui. Ao contrário do que os outros pensam, não sou exatamente um causador de problemas. Bem, não até a noite passada.Ainda com o olhar fixo em mim, Margot Ramsay aponta uma cadeira à sua frente.— Sente-se, por favor.Eu faço exatamente como o ordenado e mantenho o contato visual, no aguardo de seja lá o que ela tem para falar, embora já imagine. Não é muito difícil assumir isso, tendo em vista sua expressão. Basta segundos para que a máscara impassível desmorone e eu veja sua testa vincar.— Eu acho que você já sabe o motivo de eu ter te chamado aqui, certo?Cruzo as mãos sobre minha barriga.— Não faço ideia.Ela pressiona os lábios, a um fio de explodir.
— O que quer dizer com “A criação que tive”?— Todo mundo sabe do histórico do seu pai. Não é preciso ser um gênio para descobrir. É complicado conviver com esse tipo de pessoa em casa, por isso tem minha empatia.— A senhora agora está insinuando que eu só bati no seu filho porque cresci em uma casa violenta, algo que concluiu porque meu pai é um viciado?Sua expressão de fúria se desarma. Agora eu vejo algo como constrangimento. Pelo menos ela reconhece que falou besteira.— Não foi o que eu quis dizer.— Não sei se acredito, senhora. Suas palavras foram bem claras — rebato. — O que é bem engraçado, porque meu pai nunca encostou um dedo em mim ou na minha irmã, portanto sua teoria de que sou violento por culpa da minha criação não faz sentido algum. Se quer mesmo saber, eu bati no seu filho porque queria bater, e não me arrependo.Ela abre a boca, chocada e brava, antes de balbuciar algo que eu entenda.— Isso é um absurdo, Aaron. Como tem coragem de dizer isso na minha cara?! — esb