Capítulo 3

Pedro acordou animado, "acordar" era uma palavra forte para quem praticamente nem dormiu, tamanha era a ansiedade que ficara boa parte da noite imaginando como as coisas iam ser.

   Chegou a fantasiar como seria o dia dos dois juntos, imaginou como puxar assunto e como iria surgir pouco a pouco intimidade entre eles, já havia sonhado tudo antes mesmo de acontecer; do primeiro olá até o primeiro beijo que dariam, depois de duas semanas de muita conversa e romance a moda antiga, pobre criança iludida!

    Havia preparado um lanche para quando ela chegasse e agradecia a Deus por nenhum de seus pais estarem em casa, não gostaria de passar a vergonha de ter Júlia presenciasse uma discussão de ambos. 

    Seguindo seu cronograma fez faxina na casa e prendeu Edward, seu lindo porém ciumento cão, no cercadinho e depois rumou para o banheiro, onde tomou um banho e se arrumou, escolheu uma roupa confortável, bermuda tactel floral e uma camiseta preta, fez um rabo de cavalo em seu cabelo e colocou seu perfume, tentou ser mais básico para não assustá-la no início.

     Após ter tudo pronto ele se pôs a esperar; até os primeiros trinta minutos ele não estava preocupado, aliás pessoas se atrasam e ainda mais quando era apenas pra fazer um trabalho na casa de um colega, depois de uma hora ele decidiu comer seu lanche sem ela, uma parte de sua fantasia romântica acabara de morrer, e ele começou a se perguntar qual seria a sensação de dividir uma refeição com ela, depois de três horas ele desistiu de esperar, chorando devorou ao lanche dela e toda comida que encontrou em seu caminho, em seguida se trancou no quarto e fez algo que até então nunca tinha feito, cortou-se.

    E enquanto se automutilava sentiu-se melhor, pois conseguiria punir a pessoa a quem mais odiava, a si mesmo.

(...)

    Pedro estava calmo, e tentou não demonstrar nenhuma emoção, Júlia ainda não chegara e Pedro ainda não havia pensado em como iria reagir ao vê-la, e nem teve tempo para formular uma expressão, pois antes que piscasse os olhos a mesma entrou na sala.

    Fez o coração dele se despedaçar em mil pedaços, porém encantou-lhe aos olhos como sempre, ela estava tão linda naquela manhã que ele até pensou em desistir do que estava prester a fazer; contudo sabia que não era justo com ele mesmo e decidiu manter-se firme no seu plano.

    A aula começara e os alunos passaram a apresentar seus trabalhos,  Pedro sentiu o seu estômago se embrulhar, contudo a pequena bolinha de papel que lhe atingira na cabeça acabou o distraindo, já ia se levantar para jogá-la fora, contudo antes que o fizesse viu Júlia sibilando "ABRA", e entendeu que deveria existir uma mensagem ali.

"Passe minha parte do trabalho pelo whats 21997554525"

   Pedro sentiu sua ira aumentar e seguiu para a lixeira, aonde rasgou os papéis em pequenos pedaços e os jogou no lixo, ela o olhava com uma expressão interrogativa no rosto. Em seguida foi a sua vez de apresentar ao trabalho.

-Próxima apresentação Pedro Costa, e Júlia Duarte.-Disse o professor com seu típico tom enfadonho.

-Somente Pedro professor.-Disse ele lançando um olhar frio para Júlia.

-Como assim? Você esta louco?-Perguntou ela atônita.

-O trabalho é em dupla.-Acrescentou o professor em tom impaciente.

-Sim, eu sei, contudo não acho justo incluí-la no meu trabalho, visto que ela não me ajudou em nenhum momento em montá-lo.

-Você é um idiota.-Disse Júlia enraivecida.

-Sem ofensas aos seu colega na minha aula mocinha.-Disse o professor em tom firme.-É verdade que não ajudou seu parceiro na construção do trabalho?

-É claro que não, ele só esta despeitado, pois esta apaixonado por mim.-Ela o olhou com desafio, aquela afirmação o balançou, mas não tanto quanto a que viria a seguir.- Eu não tenho culpa que ele não tenha espelho em casa, vive olhando pra mim e suspirando, até parece que eu me envolveria com um lixo feito ele.-Pedro não respondeu mais, não tinha força, apenas sentiu suas lágrimas caírem sem controle, e saiu correndo da sala em busca de algum lugar pra se esconder.

(...)

-Ei cara não fique assim, aquela garota é uma idiota que não sabe o que diz.-Disse Túlio o abraçando, ele tinha braços calorosos que lhe fizeram sentir bem, mesmo sem motivos.

-Ela disse a verdade, eu estou apaixonado por ela e nunca teria chance, pois sou feio.

     Túlio lhe abraçara com ternura, e o guiara para um dos bancos que havia no horto, em seguida envolveu suas mãos em seus cabelos e passou a acariciá-los suavemente.

-Mesmo se você fosse feio, o que você não é, ninguém tem o direito de ofender alguém dessa maneira.

-Eu sei Tulio, eu sei.-Disse Pedro entre as lágrimas.

-Você precisa falar na direção, isso não pode ficar assim.-Disse ele incisivo.

-Eu não quero; só vai piorar as coisas.

-Eles precisam de limites!-Falou Túlio impaciente.

-Olha; eu preciso ficar só.-Falou Pedro se levantando e caminhando para longe de seu amigo, sem dar nem sequer a chance de que ele pudesse retrucar.

(...)

-Aquele nerd nojento, minha nota esta zerada.-Disse Júlia com a voz carregada de raiva.

-Não é pra tanto, você nem se importa com essa coisa de notas.-Disse Isabela, sua melhor amiga.-Aliás é só pedir pro seu pai fazer um cheque e seu boletim fica azul.

-Ele decidiu bancar o "pai exemplar" e me cobrar boas notas; disse que eu preciso de trabalho na vida.-Falou Júlia revirando os olhos.

-Nossa, que barra hein amiga.

-Sim, e o pior que se eu levar bomba ele irá me punir, disse que retiraria meu cartão de crédito.

-E o que você pretende fazer?-Perguntou Isabela enquanto retocava o seu batom vermelho, o banheiro feminino soava mais como um camarim do que qualquer coisa.

-Eu não tenho escolha, preciso estudar.

-Putz amiga.

-Mas isso não vai ficar assim.-Falou Júlia com um sorriso maléfico nos lábios.

-O que você pretende fazer?-Disse Isabela curiosa.

-Viva e verá.-Concluiu saindo da sala radiante em seguida.

(...)

    Pedro caminhava para sua casa só, não chorava mais, contudo agradecia que seus pais só chegariam mais tarde, ele teria tempo pata descansar e desinchar os olhos.

    A dor que assolava era dupla, claro que machucava ouvir críticas a sua aparência, contudo doía mais ouvir isso de uma pessoa de quem gostava, e sobretudo saber que nunca teria a chance de estar com ela, pois ela te achava repugnante.

   Ele queria gritar; e fugir para um lugar distante quando sentiu que ela zombava de seus sentimentos, quando se viu exposto da pior maneira possível, estava tão absorto em seus pensamentos que nem viu que tinha companhia:

-cof cof.-Ele se virou imediatamente para ver quem fizera aquele som, e ao ver Júlia com um sorriso doce nos lábios ficou sem reação.-Posso acompanhar você? - Perguntou ela com uma naturalidade que lhe assustou; ele pensou em dizer não, nem tanto por raiva, mas sim por desconfiança, uma atitude daquelas era de se estranhar, contudo ao vê-la ali tão perto e tão bela só conseguiu assentir, ela por sua vez se pôs ao seu lado logo em seguida.

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