3- Priscila

Priscila Narrando

O dia tava corrido na loja. Eu tava ocupada com estoque, notas, clientes, tentando manter a mente longe dele. Do maldito Everton. Mas era impossível. Desde que ele apareceu, eu me sentia como se tivesse acordado dentro de um terremoto emocional. Um caos silencioso por dentro.

Então o motoboy chegou.

— Entrega pra gerente — ele disse, e me estendeu uma caixinha pequena, sem remetente.

Arqueei a sobrancelha, estranhei, mas aceitei. Voltei pro escritório, fechei a porta e sentei com a caixa sobre a mesa. Meu coração já começou a bater mais forte antes mesmo de abrir. Tinha algo ali. Algo que me chamava como se já fosse parte de mim.

Abri a tampa devagar.

O lenço.

Meu lenço.

Azul claro, com meu cheiro de anos atrás… um cheiro que ele não devia mais lembrar. Mas lembrava. E guardou.

Engoli seco. Meus dedos tremiam quando toquei o tecido. Eu não usava aquilo desde… desde as noites com ele. Quando o mundo lá fora era pesado demais e o peito dele era o único lugar que fazia sentido.

O bilhete tava embaixo.

— Algumas coisas a gente não esquece, Pri. Outras, a gente guarda pra nunca perder o gosto.

Você ainda tem o mesmo cheiro.

– E.

Minha respiração falhou.

Arrogante. Provocador. Intenso. Ele sabia exatamente onde tocar. E eu odiei que isso funcionou.

Senti meu corpo reagir. As pernas moles, o estômago quente, o coração acelerado como se eu tivesse corrido uma maratona. E junto com tudo isso, veio a raiva. Dele. De mim. Do que ainda existia entre nós.

— Filho da puta… — sussurrei, com o lenço preso nos dedos como se queimasse minha pele.

Mas o pior de tudo?

Era o quanto eu queria que ele estivesse aqui.

Pra me provocar com os olhos.

Pra sussurrar no meu ouvido.

Pra me fazer esquecer que eu devia resistir.

E foi aí que eu percebi…

Eu ainda não tinha terminado com ele.

E ele sabia disso.

Eu fiquei ali, com o lenço nas mãos, por tempo demais, o calor subindo e descendo pelo meu corpo. Não sabia se estava mais irritada ou enfeitiçada. Talvez os dois. Mas a última coisa que eu precisava agora era cair na tentação dele.

O que ele pensava, que eu ia esquecer tudo? Que eu ia deixar a saudade de lado e ceder àquela provocação barata? Não. Eu não podia. Não mais. Eu não era mais a mesma. Não era aquela garota que ele deixou pra trás, que acreditava que tudo ia dar certo no final. Eu tinha uma vida agora. Um filho. Responsabilidades.

Dei uma risada baixa, quase amarga, e joguei o lenço na gaveta. Não podia mais me deixar levar por isso. Não por ele.

Mas então… por que a sensação de vazio?

Por que o pensamento de que, se eu fechasse os olhos, ainda podia sentir a respiração dele perto de mim?

Por que, se eu me permitisse, a minha mente ainda me levava de volta àquelas noites em que ele me fazia acreditar que eu era tudo que ele queria?

Senti o peso da culpa. E o pior, a saudade.

Bolei uma resposta, uma forma de expurgar tudo isso de mim. Mas eu sabia que, quando ele me visse, quando nossos olhos se encontrassem de novo, tudo ia ruir. Porque era isso que ele fazia comigo. Ele tinha o poder de me destruir e reconstruir num só movimento.

Eu não queria cair. Não queria me perder de novo.

Mas, quando a porta da loja se abriu naquela tarde, e eu vi a silhueta dele, a voz dele me chamando pelo nome…

Eu soube que minha resistência ia se esvair como água.

— Priscila… — Everton disse, sua presença ocupando cada centímetro da sala. Ele não estava mais só provocando. Ele estava ali, com a certeza de quem sabia que me tinha. E era como se eu fosse uma marionete, e ele tivesse as cordas nas mãos.

Respirei fundo, tentava manter a postura, mas sentia tudo desmoronando por dentro.

— O que você quer, Everton? — foi tudo o que consegui dizer, minha voz mais fraca do que eu gostaria.

Ele sorriu. Sabia que eu já estava em suas mãos. E eu… eu já não sabia mais o que fazer.

Aquela simples pergunta dele, O que você quer, Everton? parecia uma provocação disfarçada. E, ao mesmo tempo, uma tentativa de manter alguma distância, uma fachada que eu tentava construir. Mas, na verdade, a última coisa que eu queria era manter distância dele.

Eu me odiava por isso. Odiava a fraqueza que ele conseguia extrair de mim com uma única palavra. A maneira como ele me olhava, como se me conhecesse melhor do que eu mesma. Como se ainda tivesse o controle sobre tudo.

Ele deu um passo à frente. Aproximou-se, e eu senti o cheiro dele. Algo entre couro e o sabor amargo de um café forte. Era como um golpe de nostalgia que me atingiu em cheio. Quase senti o gosto do beijo que ele me roubou há anos, e que ainda guardava em algum lugar secreto de mim.

— Você sabe o que eu quero, Pri. — Ele sorriu de um jeito tão confiante que me fez questionar por que eu ainda tentava negar. Ele se aproximou mais ainda. Meu corpo estava em guerra, uma luta interna entre querer sair correndo e querer me jogar nos braços dele.

A sala parecia estar ficando menor. O ar mais denso. Ele ainda não havia tocado em mim, mas o simples fato de estar ali, perto, já me fazia perder a compostura. A última coisa que eu queria era ser mais uma de suas conquistas, ser apenas o passatempo de Everton. Ele não precisava de mais nada, mas eu… Eu ainda me importava. Mais do que eu queria admitir.

— Eu não vou cair nessa, Everton. Não vou. — Minha voz saiu mais firme do que eu realmente me sentia. Eu estava tentando manter minha dignidade intacta, mas meu corpo estava me traindo, reagindo a cada passo dele. Eu sentia o coração batendo mais rápido, as mãos suadas, e sabia que ele estava percebendo tudo isso.

Ele deu um riso baixo, divertido, como se soubesse que eu estava só tentando me convencer do que não era verdade.

— Você diz isso, Pri, mas eu vejo nos seus olhos. O que você sente por mim nunca desapareceu. — Ele se inclinou um pouco mais perto, tão perto que pude sentir sua respiração quente na minha pele, como um lembrete do que já tivemos. — Eu não sou mais o mesmo de antes. E você? Continua a mesma? Ou vai continuar mentindo pra si mesma?

Foi como um soco no estômago. Ele tinha razão, eu sabia disso. Eu ainda sentia a atração, a conexão, o desejo. Eu queria mais do que qualquer coisa naquele momento. Mas a realidade me impedia. Eu tinha meu filho. Minha vida. Não podia ceder à tentação. Não podia deixar ele bagunçar tudo de novo.

— Eu… — tentei dizer algo, mas ele interrompeu, erguendo a mão, tocando suavemente meu braço, o contato fazendo meus nervos estourarem de calor.

— Eu não vou embora, Pri. Não sem você.

Meu corpo se esticou, a pele arrepiada. Ele não estava falando só com as palavras. Estava falando com os olhos, com o toque, com a presença. E tudo em mim queria ceder, deixar as barreiras caírem. Mas eu me segurei.

— Vai embora, Everton. — Foi tudo o que consegui dizer, tentando encontrar forças em algum lugar distante, em algum lugar onde a razão ainda dominava. Mas mesmo enquanto falava, sabia que não era o que eu queria.

Mas eu tinha que tentar.

Ele sorriu, esse sorriso de quem já sabia a resposta, e saiu sem dizer mais nada. Eu fiquei ali, parada, com o coração batendo forte, o corpo queimando e a sensação de que, no fundo, já estava perdendo a guerra.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP

Capítulos relacionados

Último capítulo

Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP