Cecília sentiu um arrepio subir pela espinha. Seu avô raramente falava com tanto cuidado. Ela pousou a xícara sobre a mesa, a mão trêmula.

____ Como... como assim ele fugiu?Então por isso que a policia estava por aqui ? — A voz de Cecília falhou, a boca ficando seca.

— Sim ,mas pelo que ouvimos falar foi também para resgatar a filha de um deputado que se meteu com um dos soldados do trafico e o pai inventou que ela foi sequestrada por ele ...mas quanto ao Tiago ,com certeza ele teve ajuda de alguns policiais corruptos que têm ligação com o tio dele e facilitaram sua fuga — disse seu avô, os olhos sombrios.

___ Fizeram uma emboscada no caminho quando ele estava para ser transferido para outro presídio.

Cecília olhou para sua avó, o coração batendo tão forte que ela sentia o pulsar em seus ouvidos.

___Ele apareceu por aqui? Será que ele ainda lembra de mim? Afinal, já se passaram sete anos desde sua prisão — perguntou, mal reconhecendo sua própria voz.

___ Não... — respondeu Dona Lurdes, com a voz trêmula.

___ Graças a Deus que não, filha. Nós estávamos rezando para que ele tivesse te esquecido, mas a Carol veio aqui ontem e disse que ele andou fazendo perguntas a ela sobre você, já que sabe o quanto vocês duas são amigas.

As palavras da avó eram como um soco no estômago. Tiago sempre a perseguira, como uma sombra ameaçadora. E agora ele estava solto, no mesmo morro onde ela vivia.

____ Tenho certeza de que a Carol o recebeu em casa só por medo do que ele poderia fazer com ela e o Diego se ela se recusasse. Ela também não o suportava, assim como eu — disse Cecília, com a voz trêmula.

___ Sim, é verdade. Ele a procurou armado e acompanhado de outros soldados do tráfico. Claro que ela não podia negar recebê-lo — disse seu avô.

___ E por que será que ele não veio direto me procurar?

___ Segundo a Carol, ele disse que queria comprar algo para você primeiro... A verdade, filha, é que estamos muito preocupados, apavorados com esse homem de volta ao morro e, pelo jeito, ainda obcecado por você como antes.

___Não quero que fiquem tão preocupados, vovó. Eu sei me cuidar e sempre soube fugir do Tiago. Uma das vantagens de o tio dele ser o chefe do morro é que o Marcelo era muito amigo do meu pai. Apesar de meu pai nunca ter pertencido ao tráfico, isso serviu para que o Tiago nunca me obrigasse a nada, por ordem do tio.

___ Nós sabemos disso, filha, mas isso não diminui nossa preocupação. A meu ver, o tempo que ele passou na cadeia pode te-lo deixado ainda pior do que já era — disse Seu Joaquim, preocupado.

____ Por favor, vovô, não quero que se preocupe tanto. Não se esqueça de que o senhor é cardíaco e já sofreu um infarto. Eu não quero perder o senhor e a vovó, que são as pessoas que mais amo neste mundo. Como eu disse, eu sei me cuidar, e o Tiago não pode me obrigar a nada, mesmo que quisesse. Disse Cecília para tranquilizar os avós disfarçando o medo que sentia daquele homem.

___Ele respeita e teme muito o tio para passar por cima de uma ordem dele. Agora eu vou indo, porque já estou atrasada. Se cuidem, ok? Hoje eu chegarei mais tarde, mas podem ficar tranquilos, é que vou ajudar uma colega a organizar algumas vacinas que chegaram.

Cecília saiu da casa dos avós com o coração pesado.

O sol quente daquela manhã de segunda- feira batia em seu rosto, mas não era o suficiente para espantar o frio que tomava conta de seu corpo.

O pensamento de Tiago estar de volta ao morro, ainda mais perigoso depois de sete anos preso, a deixava inquieta.

Ela caminhava apressadamente em direção ao hospital onde trabalhava, tentando afastar as lembranças de como ele a perseguira no passado.

Chegando ao trabalho, Cecília se preparou para mais um dia de serviço.

Apesar do esforço para se concentrar, sua mente não parava de voltar à conversa com os avós.

Ela sabia que Tiago era implacável, e o fato de ele estar perguntando por ela deixava sua pele arrepiada.

Cecília passou o dia inteiro no hospital, mas não conseguia afastar os pensamentos sobre Tiago. Enquanto atendia pacientes e organizava vacinas com sua colega Rita, sua mente estava em outro lugar.

O medo de que ele voltasse a persegui-la como antes a consumia.

Cada gesto, cada palavra de seus avós ecoava em sua cabeça.

Ele estava de volta, e pelo jeito mais perigoso, e, pior, obcecado por ela.

No entanto, entre essas preocupações, outro homem invadia seus pensamentos: Gael.

Ele também lhe causava medo, mas era um tipo diferente. Não era o medo da violência ou da obsessão como com Tiago. Com Gael, era um medo que a deixava confusa, pois estava ligado à intensidade da atração que ele despertara nela. Algo sobre ele a fazia perder o controle, e isso a apavorava ainda mais.