capítulo 2

Beatriz

Meus pais decidiram que, aos 50 e poucos anos, é hora de finalmente aproveitar os frutos de tudo o que construíram com tanto esforço. Eles planejam uma longa viagem de seis meses, um descanso merecido depois de décadas à frente da Vieira e Costa Advocacia, um dos maiores escritórios do país.

Ao longo dos anos, sempre contaram com Roger, amigo de infância do meu pai e sócio desde o início. O plano deles era passar o comando da empresa para os filhos, eu, Beatriz Vieira, e Carlos, o filho de Roger. Mas, como escolhi seguir a minha paixão pela moda, deixando o direito de lado, decidiram confiar essa responsabilidade a Theo, que eles consideram como um filho.

Quanto a Carlos... bem, eu quase não tenho lembranças dele. Ele foi morar no exterior com a mãe ainda muito pequeno. Lá, formou-se em Direito e trabalhou em uma das filiais da empresa. Agora, está de volta ao Brasil para assumir a empresa no lugar do pai, que também decidiu aproveitar essa nova fase da vida.

Hoje é o coquetel de apresentação de Theo e Carlos como os novos responsáveis pelo escritório, enquanto os nossos pais estarão fora. Claro que não poderia faltar, tinha que estar aqui para prestigiar o Theo, que é mais que um irmão para mim. Mas o que eu não esperava era que a noite já começasse me testando a paciência.

Assim que entro no salão, esbarro em um verdadeiro “armário humano”. Antes que eu consiga me desculpar, ele se adianta com uma grosseria monumental:

— Você não olha por onde anda? Olha o que fez, sujou todo o meu terno! — reclama com a maior arrogância.

Respiro fundo, tentando não perder a compostura, e respondo num tom mais educado que consigo:

— Você que não prestou atenção e derramou o meu sorvete.

Sem esperar resposta, me afasto furiosa. Para piorar, aquele não era um sorvete qualquer. Era parte da nossa tradição, sempre que algo especial acontece, eu, Theo, June e Flor celebramos com sorvete. E agora, graças ao idiota mal educado, nossa tradição foi arruinada.

Quando chego ao salão principal, vejo o grupo que me espera. Theo, sempre atento, percebe minha expressão irritada assim que me aproximo.

— O que aconteceu, Bia? — June pergunta, preocupada.

Levanto o pote vazio em minha mão e explico:

— Um idiota sem educação esbarrou em mim e derramou todo o meu sorvete. E ainda quis jogar a culpa em mim!

Theo começa a rir, como sempre faz quando estou brava.

— Calma, maninha. Assim que isso aqui acabar, a gente passa em uma sorveteria e resolve isso.

Ele me abraça, tentando me acalmar, mas minha atenção se desvia quando vejo o "idiota do terno" entrando no salão. Agora, vestindo outro terno, impecável como se nada tivesse acontecido.

Theo percebe para onde estou olhando e ri ainda mais.

— Não me diga que foi ele.

— Sim, foi esse grosseiro! — respondo indignada.

Theo apenas dá um sorriso enigmático e diz:

— Isso vai ser interessante.

Antes que eu possa perguntar o que ele quis dizer, meu pai pega o microfone para dar início ao evento.

— Boa noite a todos. Como vocês sabem, eu, minha esposa Elise, e meu amigo Roger dedicamos nossas vidas a construir esta empresa. Mas agora é hora de descansarmos. Por isso, esta noite é para apresentar os novos representantes da Vieira e Costa.

Enquanto ele fala, vejo o “idiota” caminhar em direção ao palco. Meu coração afunda. Não pode ser ele!

— Meu sonho era que minha filha assumisse a empresa. Mas ela escolheu outro caminho, e não poderia estar mais orgulhoso de sua coragem e sucesso. Beatriz é uma das empresárias mais jovens e bem sucedidas do país.

Meu pai me olha com um sorriso, e eu retribuo com um beijo soprado. Mas meu gesto não passa despercebido. Carlos, que já está ao lado do palco, me observa com uma expressão de surpresa, como se finalmente tivesse ligado os pontos.

— Agora, com muito orgulho, apresento Theo, que muitos de vocês já conhecem como parte da nossa família, e Carlos, filho de Roger, que irá dividir essa responsabilidade.

Aplausos enchem o salão enquanto Theo e Carlos sobem ao palco. Meus olhos vão direto para Carlos, e tudo o que consigo pensar é: Ele? O grosseiro vai ficar no lugar do meu pai?

Assim que eles descem, corro para abraçar Theo. Do canto do olho, percebo o olhar carregado de Carlos, como se o gesto o incomodasse. Mas, sinceramente, não estou nem aí.

Momentos depois, o meu pai e minha mãe me chamam para conhecer Carlos oficialmente.

— Minha filha, este é Carlos. Você provavelmente não se lembra dele, porque ele foi para o exterior muito cedo.

— E eu também era criança quando saí. — Carlos interrompe, com um sorriso casual. — Tinha apenas cinco anos. Não me envelheça, ainda nem fiz 31!

Eles riem, mas eu continuo séria. Carlos me estende a mão.

— É um prazer finalmente conhecê-la, Beatriz. Ouvi muito sobre você.

Com a maior indiferença possível, aperto sua mão e respondo:

— Beatriz. O prazer é meu, Carlos.

Depois, me viro para o meu pai:

— Com licença, preciso falar com Theo para saber que horas vamos à sorveteria. Afinal, na entrada, esbarrei em um idiota que derramou todo o meu sorvete e nem pediu desculpa.

Faço questão de lançar um olhar direto a Carlos, que me fuzila com os olhos. Mas, mais uma vez, eu simplesmente não me importo.

Enquanto me afasto, meu pai sorri e me diz:

— Aproveite, minha filha. Te amo.

No caminho, abraço Theo novamente, e não deixo de notar que Carlos continua nos observando de longe. O que ele pensa de mim? Não faço ideia. Mas uma coisa é certa: essa convivência promete ser tudo, menos entediante.

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