Perla
Segredo, mistério, sofrimento. Essa é a minha vida, uma vida que não escolhi para mim. Sou obrigada a viver uma mentira, uma mentira que me faz prisioneira dentro da minha própria casa.
Não me reconheço mais, não sei quem sou.
Sorrisos, casamento. A vida que levo a vista dos outros é perfeita, mas mal sabem que é pura falsidade. Que sou falsa, que tudo em mim é falso. Fiquei muito boa nisso, são muitos anos fingindo ser quem não sou, se é que ainda tenha algo em mim daquela garota de dezoito anos que foi retirada de sua casa, da sua família, que acordou casada com um desconhecido em outro país. Que, com esse homem, formou uma “família”. Depois
desses cinco anos, ainda não sei o verdadeiro motivo e o que há por trás disso tudo.
Não posso fazer perguntas, não posso chorar, não posso sequer abrir a boca sem que meu marido permita. Levei apenas um dia para entender isso. A primeira e única vez que o questionei, fiquei uma semana trancada em um quarto escuro onde me era servido apenas pão e água. Meu rosto e minha boca ficaram ensanguentados, inchados e doloridos, resultado de dois socos que ele havia me dado.
O quarto escuro faz parte da minha vida. Se Salvatore não gostar do jantar, é para lá que vou. Se eu apenas respirar na hora errada, o quarto escuro é o meu castigo. A quantidade de tempo depende do meu juiz. Já fiquei trancada por horas, dias. Muitas vezes, não sei dizer com precisão, pois quando estou dentro daquele quarto perco a noção do tempo.
Na frente dos seus comandados e suas famílias, meu captor é um excelente marido, porém, quando estamos apenas nós dois, não tenho permissão para ficar próxima a ele sem ser solicitada. E, quando isso acontece, são raros os momentos em que ele não me agride com suas duras palavras, ou algumas vezes
fisicamente. Os únicos momentos que essa distância não existe é quando, sem uma prévia permissão, ele quer usar meu corpo. É nojento, eu odeio suas mãos sobre mim. Não se trata de sexo, muito menos de fazer amor.
Salvatore me estupra, me bate, sente prazer com a minha dor, com meu sofrimento.
Sorrio sem atuar somente quando estou com minha filha, quando Salvatore viaja, principalmente quando ele se ausenta por muitos dias, ou quando ele não me usa sexualmente. Por diversas vezes, ele trouxe prostitutas para nossa casa. Nessas ocasiões, ele se deita com elas em nossa cama. No intuito de me humilhar. Depois de usar e abusar dessas mulheres, ele as esfrega na minha cara, faz questão de dizer que elas o dão mais prazer do que eu. Se ele soubesse que fico feliz quando ele dorme com essas mulheres…
Elas escolheram essa vida, já eu não tive opção. Sou obrigada a me deitar com um homem que não escolhi, que não sei a origem. Que, antes daquele maldito jantar, nunca tinha visto. Até hoje não sei como vim parar nessa casa, nessa vida, nem se meus pais ainda estão vivos.
Quando Salvatore está acompanhado, o quarto da Donna é o meu refúgio, o único lugar desta casa em que me sinto bem. Minha filha é o meu sopro de vida. Às vezes reflito sobre minha gestação e o nascimento da minha pequena. Lembro o quanto fui rejeitada e humilhada. Meu coração dói, porque Donna não é fruto do amor, mas de uma violência. Salvatore a rejeitou quando ela nasceu, por ser menina. Quando completou um ano de idade, Donna conseguiu "conquistar" o coração do monstro, pois a sua primeira palavra foi papai.
Nossa enorme casa é uma fortaleza. Homens armados por todos os lados, não vou a nenhum lugar sem os soldados do Salvatore no meu encalço, sem ser monitorada. Foi difícil aceitar que minha vida não seria mais a mesma. Antes de ser capturada, estava finalizando o segundo período no curso de direito, tinha amigos, família, uma vida como qualquer jovem na minha idade. De repente, um jantar e tudo mudou.
Quando me vi nessa casa, só tive duas opções. Continuar lutando, não aceitar a triste realidade de estar casada com um
homem bem mais velho do que eu, nos seus quarenta anos, e continuar sendo castigada por isso. Ou me render à minha nova vida. Em qualquer outro cenário, eu teria lutado por meus direitos, mas o que fazer quando seu marido é o chefe da máfia? Como escapar de algo assim?
Numa tentativa fugaz da minha mente, influenciada pelos tolos romances que li, cheguei a me iludir que Salvatore poderia se apaixonar por mim, e eu por ele, já que estamos casados. Meu tolo e romântico coração se encheu de esperança. Como protagonista da minha própria história, imaginei que aqueles homens armados estavam aqui para me proteger, que o amor do meu marido era tão grande que ele tinha medo de me perder.
Tolice.
Controle.
Salvatore controla a tudo e a todos. Controla nossas vidas como peças de xadrez.
Faz exatamente cinco anos que deixei de existir, sou apenas uma sombra de uma vida que não pedi, de uma vida que mais parece morte.
Minha morte.
Estou cansada de ser a dona de casa perfeita, a mulher impecável que oferece jantares para homens poderosos e mafiosos como ele. A mulher que tem que sorrir para as outras mulheres enquanto tudo o que mais quer é chorar, se descabelar, gritar, pedir ajuda.
Tenho quase certeza que essas mulheres têm em seus rostos um sorriso tão falso quanto o meu. Vejo, através do olhar de cada uma, medo, insegurança e tristeza. Mas nenhuma se atreve a dizer uma sequer palavra, ou demostrar com algum gesto, o menor que seja, que entendemos nossas dores.
Ao mesmo tempo, penso que é somente no que quero acreditar, pois não pode ser possível que todos esses homens sejam como Salvatore.
Frio.
Salvatore manda e desmanda, ele é o Don dos Bazzoti. O poderoso chefão. Parece até nome de filme, mas é a mais pura realidade. Sou casada com o chefe da máfia, o que me resta é obedecer, por minha vida e por amor a Donna.
Todos o obedecem. Nunca o questionam. Os que já tentaram não estão mais entre nós.
FACULDADEPERLA⸻ Salvatore, permite-me falar?⸻ Dimmi. ⸻ “Diga-me”, ele fala com seu jeito duro de ser.⸻ Eu quero sua permissão para voltar a estudar.Falo pausadamente e me preparo para uma retaliação por minha ousadia em pedir algo. Desde que fui obrigada a viver com ele, nunca pedi nada com medo da sua reação, mas estou farta de ser apenas expectadora da minha própria vida. Preciso respirar, viver. Sei que não será nada fácil, o cenário ao meu redor é completamente desfavorável a mim.Salvatore termina de amarrar o cadarço do seu sapato. De pé, próxima à cama, aguardo sua reação. Tento não demostrar medo nas minhas feições, mesmo que por dentro meu corpo esteja tremendo. Não me permito mais desabar na sua frente, muito menos agir como
QUEBRADAPERLAHoje completa um mês que retornei para a faculdade. Ainda custo a acreditar nas pequenas e preciosas mudanças em minha vida. A primeira foi voltar a cursar direito; nem nos meus melhores sonhos poderia imaginar que Salvatore permitiria que eu voltasse a estudar.Continuo não demostrando medo em sua presença. Algumas vezes, o pego observando-me. Não sei o que se passa em sua mente tão perversa, mas sou grata por ele nunca mais ter me violentado sexualmente. Depois daquela nossa primeira vez de sexo sem violência, continuo entregando-me a ele todas as vezes que ele me quer. Com isso, ele não age mais como um monstro. Se a situação fosse outra, poderia até dizer que fazemos amor, mesmo que este sentimento não exista da minha parte,muito menos da parte dele. Salvatore deve desconhecer esse sentimento. Todos somos instrumentos em suas mãos,
ACERTO DE CONTASPERLAO que fazer para vingar a morte da minha filha e a vida que ele roubou de mim?Este tem sido meu questionamento de todos os dias.Desde que Donna se foi, me recolhi em seu quarto. Depois de tudo que aconteceu, não consegui ficar no mesmo ambiente que Salvatore. Ele consegue ser ainda pior do que eu tinha visto e sentido na minha própria pele.Salvatore não me informou o que havia acontecido com a minha filha, muito menos que ela estava hospitalizada entre a vida e a morte. Em nenhum momento ele se colocou no meu lugar, lugar de uma mãe que teve sua filha levada por homens a quem ele fez mal e que a usaram para se vingarem. Se não fosseGiovanni me levar ao hospital por vontade própria, eu só veria Donna no caixão. Não teria me despedido da minha filha antes do seu último suspiro. Minha menina foi tratada como qualquer uma pelo pr&oacu
REENCONTROPERLARetorno à biblioteca, procurando por algo relacionado ao Salvatore. Não tenho muito sucesso, apenas pequenas matérias de assassinatos em que eles suspeitam do envolvimento da máfia. Penso no que Nina me disse a respeito do Giovanni. Do jeito dele, sempre foi gentil comigo. Talvez eu possa conseguir algumas informações, mas tenho medo de pôr tudo a perder.Ando pelos corredores da biblioteca, procurando algum livro de direito para que Giovanni não desconfie da minha real intenção neste lugar. Estou distraída e não percebo que há um homem de terno na estante atrás de mim. Dou dois passos para trás acabo esbarrando nele.⸻ Perdão ⸻ digo, um pouco sem graça, de cabeça baixa enquanto ajeito minha bolsa que escorregou no meu ombro, por pouco não caiu no chão.Inebriada com seu cheiro,
DESEJOLORENZOAndando por minha cidade, entro na biblioteca. Quando jovem, passava horas pesquisando neste lugar. Meu pai, mesmo sendo Don e tendo a maior parte da Itália aos seus pés, sempre fez questão que seus filhos estudassem. Os corredores imensos da biblioteca sempre me atraíram, os livros expostos nela me fascinavam. Quando minha mãe perdeu a vida por causa dos maledetto Bazzoti, foi nela que me refugiei. Entre os livros.Alguém esbarra nas minhas costas. Coloco minha mão na arma que está na minha cintura. Com os homens do Bazzoti espalhados por toda cidade, todo cuidado é pouco. Ao me virar, vejo-me deparo com a mulher mais linda que já vi na minha vida. Sua aparência triste não esconde toda sua beleza. Assim que seu corpo delicado vai de encontro ao meu, ela pede desculpa em inglês; provavelmente é americana, a mais linda americana
MULHER DO INIMIGOPERLAO desconhecido me fez ver que ainda posso ter uma vida. O que senti quando nos beijamos foi real. Seu toque, seu beijo e seu cheiro despertaram em mim o desejo de amar e ser amada.Pode parecer loucura, ou um desejo profundo da minha alma. Acredito que minha história com o desconhecido está apenas começando, apesar de todas as condições desfavoráveis. Pode até ser meu coração querendo me pregar uma peça, ainda mais porque sou casada com o chefe da máfia, um homem frio e sanguinário. Porém, dentro de mim algo me diz que, em um futuro não muito distante, Salvatore será passado.Esse estranho, sem saber, me deu o ânimo que estava precisando para cumprir a promessa que fiz à minha filha em seu leito de morte. Pensei por diversos dias e concluí que sem a ajudado Giovanni vai ser impossí
COVARDEGIOVANNISaí da casa do Salvatore pensando na conversa que tive com meu amigo Leonel. A raiva me toma toda vez que penso o quanto sou fraco por servir ao homem que levou dor e tristeza para minha família. Tive medo que Salvatore acabasse com minha família do mesmo jeito que acabou com a do meu irmão. Meus pais não aguentaram tanto sofrimento e se foram meses depois de enterrar seu filho, nora e neto.Fui covarde, recuei por amor à minha família. Salvatore é um sanguinário. Já eliminei diversos homens que se opuseram a nós, mas nunca toquei em suas famílias. Na máfia, as famílias sempre foram respeitadas, os únicos que não seguem a essa lei são os Bazzoti. A briga para ser Don de toda a Itália dura há anos.Para a maioria dos empresários, políticos e uma boa parte da popula&
BELOPERLAO desconhecido caminha comigo por entre as flores. O cheiro das rosas é maravilhoso, mas não tanto quanto o seu cheiro. Andamos por alguns minutos até chegarmos no final do campo de rosas. Lá, há uma cabana. Ele abre a porta com a chave que retira do seu bolso. Sei que essa cabana simples não o pertence. Pelas roupas caras que ele veste, é mais provável que ele seja dono deste lugar, e esta cabana seja de algum funcionário. Tudo relacionado a ele é um mistério, não sei nada a seu respeito e não pretendo saber.O belo homem que me deixa de pernas bambas fecha a porta e fica parado encostado nela, com seus olhos sobre mim. Eles me examinam de cima a baixo, com desejo. Sinto como se emitissem fogo, um fogo que me queima por dentro e pelasminhas partes íntimas. Neste momento, meus pensamentos são de pura luxúria. N&at