PERLA
O que fazer para vingar a morte da minha filha e a vida que ele roubou de mim?
Este tem sido meu questionamento de todos os dias.
Desde que Donna se foi, me recolhi em seu quarto. Depois de tudo que aconteceu, não consegui ficar no mesmo ambiente que Salvatore. Ele consegue ser ainda pior do que eu tinha visto e sentido na minha própria pele.
Salvatore não me informou o que havia acontecido com a minha filha, muito menos que ela estava hospitalizada entre a vida e a morte. Em nenhum momento ele se colocou no meu lugar, lugar de uma mãe que teve sua filha levada por homens a quem ele fez mal e que a usaram para se vingarem. Se não fosse
Giovanni me levar ao hospital por vontade própria, eu só veria Donna no caixão. Não teria me despedido da minha filha antes do seu último suspiro. Minha menina foi tratada como qualquer uma pelo próprio pai.
Faz dois meses que não o vejo, não sei qual será minha reação quando o encontrar. Vou precisar reunir forças não sei de onde para continuar com meu teatro, continuar com minha encenação. Com certeza vai ser bem mais difícil do que antes.
Na primeira semana após a partida da minha menina, não conseguia engolir nem água, minha garganta doía de tanto que gritei. A dor que sentia em meu peito ecoou naquele cemitério silencioso, de onde Salvatore e seus comandados haviam ido embora. Minha única companhia era o Giovanni, que permaneceu o tempo todo ao meu lado, silenciosamente apoiando-me, exercendo um papel que não o pertencia.
Lamentei e pranteei aos gritos, com toda dor existente no meu coração e na minha alma.
Perdi um pedaço de mim.
A parte essencial.
A que me dava vida.
Giovanni teimava em trazer refeições para mim todos os dias. Via sua frustração quando ele retornava e a bandeja permanecia intacta. Com o passar dos dias, meu corpo começou a dar sinais de fraqueza, a dor física se confundia com a dor que sentia na alma. Tirar a vida da minha menina foi o golpe mais duro que Salvatore poderia ter me dado.
Uma semana depois do velório, Giovanni me encontrou desmaiada. Eu estava fraca por não me alimentar. Acordei no soro e aos poucos fui obrigada a introduzir alimentos. No início, só me alimentava com líquidos, meu estômago estava frágil. Donna era o que me mantinha viva, agora o que me mantém viva é o acerto de contas que prometi a minha filha em seu túmulo, minha vingança contra aquele que nos destruiu.
Não sei como dar início a minha vingança, não tenho acesso aos negócios do Salvatore. Não sei nem exatamente o que ele faz além de controlar e matar pessoas. Tenho que pegar o fio da meada. Primeiramente, descobrir como e por que vim parar
em suas mãos. Para isso, preciso descobrir sobre a minha origem, minha família, sobre o tempo em que eles viviam na Itália.
Hoje é o meu último dia de reclusão. Vou voltar a faculdade, reunir forças e munição para me vingar deste homem que, desde que conheci, vem causando-me sofrimento.
Comuniquei ao Giovanni que precisava ir até a biblioteca nacional para fazer uma pesquisa. Ele ligou para meu dono e carrasco, que autorizou minha ida. Na biblioteca, procuro matérias de jornais antigos que falem sobre a máfia. Encontro disputas territoriais que resultaram em muito banho de sangue. Descubro que os Bazzoti têm um inimigo de longa data, os Mancinni. A matéria diz que há anos os Bazzoti tentam dominar toda a Itália, seu único empecilho são os Mancinni, que têm importantes apoios por não serem tão violentos como os Bazzoti, que não perdoam ninguém.
Eles não dizem nenhuma mentira, realmente os Bazzoti não perdoam ninguém, nem a própria família.
Algumas reportagens dizem que o filho do senhor Vicenzo consegue ser mais implacável que o pai. Quando assumiu a máfia após o falecimento do seu pai, Salvatore foi atrás de todos que de alguma forma haviam prejudicado os negócios da sua família.
⸻ Meu Deus! Será que é por isso que ele viajou até Nova Iorque atrás da minha família? Será que eu faço parte de um acerto de contas?
A data de falecimento do pai do Salvatore coincide com o ano que ele me trouxe para a Itália. Preciso de mais informações, o ideal seria obter de alguém de dentro, alguém da máfia. O que torna minha missão quase impossível, mas não posso desistir.
Giovanni me disse que Nina me ligou algumas vezes. Ele a contou sobre Donna e ela sempre liga para saber como eu estou.
Hoje será a primeira vez que vou vê-la depois daquele dia em que fui arrastada pelos corredores da faculdade.
⸻ Boa tarde ⸻ digo assim que entro na sala de aula. Todos me olham com pesar. O professor me pergunta se estou bem e apenas balanço a cabeça. Ele diz que posso pegar a matéria do período em que estive ausente e que se precisar de ajuda, é só falar com ele. Nina chega logo depois de mim. Quando me vê, me dá um abraço do qual eu precisei desde que minha filha se foi. Seguro-me para não desabar minha tristeza em seus braços.
Assim que somos liberadas para o intervalo, Nina, com seu jeito moleca, tenta me animar. Durante toda aula, a peguei sorrindo sozinha, mas ela tentava disfarçar por minha causa. Acho que ela deve estar interessada em algum rapaz.
⸻ Estou tão feliz, Perla;
⸻ Percebo pelo seu sorriso, Nina. Me diga, o que te deixou tão feliz?
⸻ Lorenzo. Meu irmão chega hoje, não vejo a hora de estar com ele.
⸻ Pelo jeito você gosta muito dele.
⸻ Amo todos meus irmãos, mas Lorenzo é igual ao meu pai, carinhoso e protetor. Ele me ama do jeito que sou, sem discriminação.
⸻ O que você quer dizer com isso?
⸻ Não acredito, Perla, que você nunca percebeu?
Fico sem entender.
⸻ Namoro meninas, Perla.
Minha reação não é nada legal: fico de boca aberta. Nina ri.
⸻ Você é hilária, Perla. Não precisa se preocupar que não estou a fim de você, o nosso lance é só amizade, e eu sei que você é casada.
⸻ Desculpa, Nina, por minha reação, é que eu realmente não desconfiava. Fico feliz que sua família aceite numa boa.
⸻ Meus irmãos foram obrigados a me respeitar por causa do meu pai e Lorenzo, a palavra deles é lei.
⸻ Seu irmão parece ser muito legal.
⸻ Ele é ótimo, e lindo. Quem não o conhece como eu, tem um certo receio de se aproximar. Lorenzo aparentemente é imponente, chega a ser soberbo, mas no fundo é um príncipe.
⸻ Vamos embora, Nina, para você curtir seu irmão. Giovanni já deve estar me esperando.
⸻ Posso te dizer uma coisa? ⸻ Balanço a cabeça para ela, confirmando, enquanto guardo meu material na mochila. ⸻ Seu segurança é caidinho por você.
⸻ Para de inventar história, Nina. ⸻ Dou um tapa no braço dela e saio da sala, com ela logo atrás de mim
⸻ Sério, Perla, o jeito que ele te olha.
Paro por um instante e olho sério para Nina, que cessa o riso.
⸻ Nina, por favor, mesmo que seja verdade, não comente mais sobre isso. Meu marido é um cara muito violento. Se ele apenas desconfiar de algo assim, acaba com Giovanni e comigo. De todos os seus seguranças, Giovanni é o único que me deixa à vontade, na medida do possível. Se não fosse por ele, eu não teria me despedido da minha filha. Você não tem ideia como é minha vida. Infelizmente, não posso te contar, só quero que você saiba que sou obrigada a viver uma vida que não escolhi. A minha única alegria era Donna e eu não a tenho mais. O que ainda me mantém de pé é algo que prometi a minha filha, preciso do Giovanni para isso, e preciso continuar a estudar. A faculdade é o único lugar em que consigo respirar, o único lugar em que posso ser eu mesma.
Nina me abraça por uns longos minutos. Seu motorista a chega e nos despedimos.
REENCONTROPERLARetorno à biblioteca, procurando por algo relacionado ao Salvatore. Não tenho muito sucesso, apenas pequenas matérias de assassinatos em que eles suspeitam do envolvimento da máfia. Penso no que Nina me disse a respeito do Giovanni. Do jeito dele, sempre foi gentil comigo. Talvez eu possa conseguir algumas informações, mas tenho medo de pôr tudo a perder.Ando pelos corredores da biblioteca, procurando algum livro de direito para que Giovanni não desconfie da minha real intenção neste lugar. Estou distraída e não percebo que há um homem de terno na estante atrás de mim. Dou dois passos para trás acabo esbarrando nele.⸻ Perdão ⸻ digo, um pouco sem graça, de cabeça baixa enquanto ajeito minha bolsa que escorregou no meu ombro, por pouco não caiu no chão.Inebriada com seu cheiro,
DESEJOLORENZOAndando por minha cidade, entro na biblioteca. Quando jovem, passava horas pesquisando neste lugar. Meu pai, mesmo sendo Don e tendo a maior parte da Itália aos seus pés, sempre fez questão que seus filhos estudassem. Os corredores imensos da biblioteca sempre me atraíram, os livros expostos nela me fascinavam. Quando minha mãe perdeu a vida por causa dos maledetto Bazzoti, foi nela que me refugiei. Entre os livros.Alguém esbarra nas minhas costas. Coloco minha mão na arma que está na minha cintura. Com os homens do Bazzoti espalhados por toda cidade, todo cuidado é pouco. Ao me virar, vejo-me deparo com a mulher mais linda que já vi na minha vida. Sua aparência triste não esconde toda sua beleza. Assim que seu corpo delicado vai de encontro ao meu, ela pede desculpa em inglês; provavelmente é americana, a mais linda americana
MULHER DO INIMIGOPERLAO desconhecido me fez ver que ainda posso ter uma vida. O que senti quando nos beijamos foi real. Seu toque, seu beijo e seu cheiro despertaram em mim o desejo de amar e ser amada.Pode parecer loucura, ou um desejo profundo da minha alma. Acredito que minha história com o desconhecido está apenas começando, apesar de todas as condições desfavoráveis. Pode até ser meu coração querendo me pregar uma peça, ainda mais porque sou casada com o chefe da máfia, um homem frio e sanguinário. Porém, dentro de mim algo me diz que, em um futuro não muito distante, Salvatore será passado.Esse estranho, sem saber, me deu o ânimo que estava precisando para cumprir a promessa que fiz à minha filha em seu leito de morte. Pensei por diversos dias e concluí que sem a ajudado Giovanni vai ser impossí
COVARDEGIOVANNISaí da casa do Salvatore pensando na conversa que tive com meu amigo Leonel. A raiva me toma toda vez que penso o quanto sou fraco por servir ao homem que levou dor e tristeza para minha família. Tive medo que Salvatore acabasse com minha família do mesmo jeito que acabou com a do meu irmão. Meus pais não aguentaram tanto sofrimento e se foram meses depois de enterrar seu filho, nora e neto.Fui covarde, recuei por amor à minha família. Salvatore é um sanguinário. Já eliminei diversos homens que se opuseram a nós, mas nunca toquei em suas famílias. Na máfia, as famílias sempre foram respeitadas, os únicos que não seguem a essa lei são os Bazzoti. A briga para ser Don de toda a Itália dura há anos.Para a maioria dos empresários, políticos e uma boa parte da popula&
BELOPERLAO desconhecido caminha comigo por entre as flores. O cheiro das rosas é maravilhoso, mas não tanto quanto o seu cheiro. Andamos por alguns minutos até chegarmos no final do campo de rosas. Lá, há uma cabana. Ele abre a porta com a chave que retira do seu bolso. Sei que essa cabana simples não o pertence. Pelas roupas caras que ele veste, é mais provável que ele seja dono deste lugar, e esta cabana seja de algum funcionário. Tudo relacionado a ele é um mistério, não sei nada a seu respeito e não pretendo saber.O belo homem que me deixa de pernas bambas fecha a porta e fica parado encostado nela, com seus olhos sobre mim. Eles me examinam de cima a baixo, com desejo. Sinto como se emitissem fogo, um fogo que me queima por dentro e pelasminhas partes íntimas. Neste momento, meus pensamentos são de pura luxúria. N&at
ATUANDOPERLAPara minha sorte, Salvatore viajou. Deito-me sobre minha cama, com meu corpo ainda em chamas. Os poucos minutos que passei com o Belo foram os melhores da minha vida. Não tive coragem de tomar banho, para não perder seu cheiro em meu corpo. Ao fechar os olhos, vivencio todos os momentos que passamos juntos. Cada sorriso, cada olhar, cada beijo. A forma com que ele me amou. Sua língua e sua boca exploraram cada parte do meu corpo, proporcionando-me um prazer tão grande, tão intenso, que me perdi em mim mesma.Agora, mais do que nunca, estou determinada a acabar com Salvatore. Quero poder ser amada livremente, quero ser completamente do Belo. Sem medo, sem empecilho. O que sentimos quando estamos juntos é uma força da natureza. Nossoscorpos se pertencem; eles se conheceram, se quiseram, se desejaram, bem antes que soubéssemos disso. Bastou estarem no mesmo lugar para que
UM PELO OUTROPERLAA semana passou. Continuei a interpretar meu papel de esposa, e não empregada. Minha mudança não é apenas com o Salvatore, mas também com os funcionários da casa; eles passaram a me respeitar como senhora Bazzoti, dona da casa. Antes, qualquer coisa que eu quisesse, eles perguntavam primeiro ao meu captor; agora, eles apenas obedecem. Devo a isso às vezes que dei ordens na frente do meu marido, que não me desautorizou. Pareceu até satisfeito com isso.Todos os dias, Salvatore tem saído à noite, chegando ao amanhecer. Por enquanto, tenho escapado de me deitar com ele, mas continuo o provocando. Comprei mais alguns vestidos justos para usar em casa e ele não para de me olhar. Com isso, tem aceitado algumas modificações. Ontem, durante o almoço,como quem não quer nada, sugeri trocar as cortinas da casa, que s&atil
EVENTO DA MÁFIAPERLATudo está caminhando perfeitamente bem. Não vou dizer que Salvatore se tornou o melhor homem do mundo porque irei mentir. Ele está mais maleável comigo, não me agride mais, não me pune e aceita as poucas coisas que peço. Na maioria das vezes, o comunico uma decisão de uma forma que pareça que quero sua permissão.Ele não implica quando tenho que passar mais horas na faculdade, mas, como sempre, continua atento nas coisas que faço. No Brasil, as meninas usam um termo que cabe muito bem no meu casamento: depois que dei um chá de boceta no Salvatore, do jeito dele, tenta fazer de tudo para me agradar. Nãose enganem pensando que estou gostando dele, ou que esqueci tudo que ele fez; apenas faz parte do plano.Estou com muitas saudades do Belo. Recebi uma mensagem dele dizendo que precisou viajar a trabalho. Tem um