Capítulo 5

Eu estava me olhando no espelho. Vestia um vestido lindo, que Ana me emprestou, eu ainda não havia voltado em casa e só pretendia voltar quando fosse para pegar o que era meu de volta.

– Tem certeza que quer ir sozinha? – questionou, preocupada.

– Tenho, eu preciso disso. – suspirei. – Eu volto logo.

– Tudo bem, mas se precisar de mim, me avise. – falou com o olhar pesaroso.

Eu estava vivendo o pior momento da minha vida, mas não deixaria que isso me transformasse em uma pobre coitada. Pedi um táxi e fui até a empresa de Ronaldo, eu sabia que ele estaria lá.

Caminhei pelos corredores da empresa com passos firmes, mas minha mente estava em ebulição. A cada passo, meu peito ardia com a possibilidade do que poderia acontecer a seguir. Eu precisava encarar João, precisava ouvir da boca dele o que já começava a parecer óbvio. Meu coração batia forte, mas não era medo. Era raiva. Uma raiva sufocante que me impelia para frente.

Empurrei as portas do escritório de João sem sequer anunciar minha chegada. O olhar surpreso dele me atingiu como um golpe, mas foi a mulher ao lado dele que realmente chamou minha atenção. Gabriela. Sua expressão oscilou entre o choque e um sorriso forçado.

Subi lentamente pelo seu corpo, os saltos, eram os mesmos que eu encontrei naquela noite com Ronaldo. Seria uma grande coincidência?

Não. Porque quando ouvi sua voz, finalmente a ficha caiu. Por isso eu sabia que conhecia aquela voz de algum lugar. Gabriela. Ela é a amente de João.

— Margarida! Que surpresa! —  disse, sua voz melosa demais para ser verdadeira.

Meus olhos deslizaram pelo ambiente. Sua cadeira estava colocada ao lado da cadeira dele. Patrão e funcionária não sentam tão juntos assim, sem falar no botão de sua camisa social, está aberto até quase mostrar os seios. Não perdi tempo olhando para ela.

Virei-me para João, que já havia se levantado e ajeitava a gravata, tentando manter a compostura.

— Quando chegou? — Ele perguntou, a voz carregada de frustração disfarçada.

A risada amarga escapou antes que eu pudesse contê-la.

— Na mesma noite em que você levou Gabriella para a nossa cama. — Cruzei os braços. — Quero que pare de agir como se fosse um homem decente, João. Porque eu já sei de tudo.

Ele trocou um olhar com Gabriela, que mantinha a expressão de quem estava se divertindo com a situação. Isso só aumentou minha fúria. Dei um passo à frente, reduzindo a distância entre nós.

— Diga, Gabriela — falei, sorrindo friamente. — Há quanto tempo você e o meu marido me fazem de idiota?

Ela piscou algumas vezes e, então, soltou um risinho debochado. Por um breve momento, ela tentou manter sua máscara de falsa cordialidade, mas ao ver que eu não recuava, sua expressão mudou. Tornou-se mais dura, mais venenosa.

— Você finalmente percebeu, não é? — Gabriela cruzou os braços. — Eu já estava me perguntando quanto tempo levaria para você juntar as peças.

O sangue fervia em minhas veias, mas me mantive firme. Não lhe daria o prazer de ver minha dor. No entanto, a ira estampada em meu olhar era impossível de esconder.

— Eu poderia quebrar a sua cara agora mesmo — murmurei, com um sorriso sem humor.

— Ora, Margarida, pare de se fazer de vítima. — Ela revirou os olhos. — João nunca te amou. Eu sou a única que ele quer. E você deveria fazer um favor a todos e sair do caminho.

Minha risada ecoou pelo escritório, fria e carregada de desdém.

— Você realmente acha que vou facilitar a vida de vocês? — Minha voz saiu cortante. — Você acha que pode aparecer na minha frente e me dizer essas coisas como se eu fosse me encolher e aceitar?

Gabriela aproximou-se, sua expressão distorcida pelo desprezo.

— Aceitar ou não, pouco me importa. O João já fez a parte dele. Ele transferiu os bens. Ele garantiu que você não saísse disso com nada. E se ainda restava alguma dúvida, deixe-me esclarecer algo que talvez parta seu frágil coração: o seu aborto, Margarida... não foi um acidente. Ele nunca te quis de verdade.

Meu corpo ficou imóvel. As palavras de Gabriela pairaram no ar, cortando meu fôlego como uma lâmina afiada.

— O... quê? — Minha voz era um sussurro fraco.

Ela sorriu, triunfante.

— João nunca quis aquele bebê. Ele fez questão de garantir que você também não o tivesse. Você realmente acha que foi só um incidente infeliz? João te odeia, Margarida. Sempre odiou. E ele quer que você desapareça da vida dele. Aceite logo isso e pare de incomodá-lo.

O mundo girou ao meu redor. O ar parecia denso, pesado. Um grito silencioso rasgava minha alma. Aquela dor que eu carregava por tanto tempo, aquela perda que me assombrava, agora tinha uma causa, um culpado.

E esse culpado estava parado bem na minha frente.

Eu podia sentir meus dedos tremendo, mas não de medo. De raiva. De um ódio ardente, avassalador, diferente de tudo que já senti antes. Minhas unhas cravaram-se na palma da minha mão enquanto minha respiração se tornava pesada. Eu queria gritar, queria destruir tudo à minha volta, queria acabar com eles ali mesmo. Mas, ao invés disso, um sorriso frio desenhou-se em meus lábios.

— Vocês vão se arrepender — sussurrei, encarando Gabriela primeiro, depois João. — Eu juro que vão pagar por cada gota de dor que me causaram.

João levantou a mão, impaciente e balançou a cabeça.

— Ah, por favor. O que você vai fazer? Choramingar para o seu advogado? Boa sorte com isso. Margarida. Aceite e saia com um mínimo de dignidade.

Fechei os olhos por um instante, absorvendo a humilhação. Então, quando os abri novamente, minha determinação estava selada.

— Vocês pensam que já venceram. Mas vocês não me conhecem— Me aproximei de João, que permanecia em silêncio, evitando meu olhar. — E você, João... vai se arrepender amargamente de cada escolha que fez.

Minha voz estava firme, cortante como uma lâmina. Eu podia ver Gabriela se remexendo desconfortável e, pela primeira vez, uma pequena faísca de preocupação cruzar os olhos de João. Se João achava que poderia me descartar como algo descartável, se Gabriela acreditava que podia pisar em mim impunemente, estavam muito enganados.

A guerra havia começado. E eu não pretendia perder.

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