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Capítulo 3 - O Louco que me atropelou

Eu senti um pouco de dor de cabeça. Abri meus olhos e vi que estava deitada num sofá enorme e confortável, coberta por uma manta grossa e quente. Uma lareira com labaredas de fogo consumiam a lenha vorazmente, deixando o lugar agradável e aconchegante. Levantei a cabeça e olhei à minha volta, não vendo ninguém. O lugar era muito amplo. A sala era bonita e bem decorada e as janelas de vidro ocupavam todo o espaço das paredes em madeira de lei escuras. Tentei levantar e percebi que estava somente de calcinha e sutiã. Fiquei com medo e meu coração acelerou. O que estava acontecendo? Vi minhas roupas penduradas próximo do fogo e tentei me acalmar. Se alguém tivesse me sequestrado não seria cuidadoso para secar minhas roupas. Não vi minha mochila em nenhum lugar. Eu tinha roupas secas lá dentro. Logo vi um homem vindo na minha direção. Meu coração disparou instantaneamente, parecendo querer pular para fora do meu peito. Quem era aquele estranho? Ele sorriu, mostrando os dentes brancos e perfeitamente alinhados na boca bem desenhada e harmoniosa com seu rosto. Ele era alto, e tinha os cabelos castanhos lisos e desalinhados. A barba estava por fazer, mas ainda assim o deixava extremamente sensual. Ele era bonito. Fitei o belo par de olhos castanhos, confusa. Ele me perguntou:

- Você está bem?

- Quem é você?

Ele sentou na poltrona, próximo de mim, em frente à lareira. Tomou um gole da bebida escura que trazia no copo, tranquilamente. Usava calça jeans escura e uma camisa branca dobrada até a altura dos cotovelos, com vários botões abertos, mostrando o peito desnudo.

- Eu perguntei quem é você? – repeti no caso de ele não ter me ouvido, fingindo não ter sido completamente ignorada.

- E eu perguntei se você está bem.

- O que aconteceu?

- Você não lembra o que aconteceu? Vai me dizer que perder a memória?

- Você... Estava no carro por acaso? É o louco que me atropelou?

Levantei a coberta e olhei para o meu corpo. Não tinha nenhum arranhão. Percebi-o me olhando divertidamente e puxei rapidamente a manta, me cobrindo envergonhada. 

- Não sou o louco que a atropelou... Na verdade você é a louca que se atravessou na frente do meu carro. Estava tentando se matar?

- Claro que não... Estava tentando achar sinal no meu celular.

- No meio da rua? Durante uma chuva torrencial? Seu celular nem funciona mais.

- Você tentou usá-lo por acaso? Onde estão minhas coisas? E... Minhas roupas.

Ele apontou para as roupas penduradas. 

- Onde está minha mochila? Tenho roupas secas lá dentro. 

Ele levantou e saiu, voltando em seguida com a mochila, me entregando.

- Pode me dizer o que houve, por favor? – pedi um pouco mais gentil, afinal, ele não estava de um todo errado. Eu havia sido uma idiota descuidada ao parar no meio da rua, mesmo que quase nunca passasse carro por ali.

- Eu quase a atropelei. Por sorte consegui frear a tempo. Mas você acabou desmaiando. E eu trouxe você para minha casa.

- Por que... Não me levou para um hospital?

- Porque eu não atropelei você. Como deve ter visto, você não tem nenhum arranhão. Para onde eu a levaria? Não sei onde você mora... E não podia deixá-la desacordada no meio da estrada naquela chuva toda. Aliás, a chuva continua. 

Olhei pela janela e não vi a chuva, mas ouvia o som dela caindo. Levantei-me e usei a manta para me cobrir. 

- Há um lugar onde eu possa me trocar?

- Subindo as escadas, primeira porta à direita.

Eu peguei a mochila e subi. Pisei na manta e cai um lance de escada, sendo observada debochadamente por ele. Entrei no cômodo com uma enorme e bem arrumada cama de casal e um armário grande. O chão era de madeira, exatamente igual as paredes. Abri a mochila e coloquei o jeans seco e uma camiseta mais larga branca. Troquei também minhas roupas íntimas. Naquela hora fiquei brava comigo mesma por não usar nada mais sexy ou sensual. Ao tirar minhas roupas ele se deparou uma calcinha larga e confortável de algodão e um sutiã da mesma cor. Antes eu tivesse ouvido os conselhos de Martina: “viva a vida, vai que você seja atropelada”. Ela só não imaginou que eu pudesse ser atropelada pelo homem mais lindo de Noriah. Droga, eu quase tinha sido atropelada... Poderia ter sido sério. E estava na casa de um desconhecido. Eu deveria sentir medo e não me preocupar com o que ele viu quando tirou minha roupa. Eu não era assim.

Desci, descalça, levando comigo minha mochila agarrada ao peito. 

- Poderia me levar embora? – eu pedi.

- Nem pensar. – ele disse. – A estrada está péssima, a chuva forte e não há iluminação nesta estrada maldita. 

- Poderia me emprestar seu telefone?

- Sem sinal.

- Que diabos de lugar estamos? – perguntei.

- Na minha casa. 

Eu suspirei e sentei no sofá.

- Que horas são? 

Ele olhou o relógio de pulso e disse:

- 9 horas.

- Eu... Tenho pessoas que devem estar preocupadas comigo. – eu afirmei, com um pouco de medo.

- Aposto que sim, por isso deixaram você naquela estrada deserta na chuva durante a noite.

Eu olhei-o confusa. Ele pensava que ninguém se preocupava comigo? Pensei em meus pais em Noriah Norte, correndo atrás da herança do tio desconhecido que nos deixara rico. Martina devia estar aproveitando a vida como ela mesma sempre dizia: transando como se não houvesse amanhã. Michelle provavelmente já havia bebido tudo que podia e em pouco tempo estaria em seu quarto acompanhada de um dos amigos. Penélope nem sei se me esperaria de verdade em sua casa, pois deixou claro que não acreditava que eu iria. Nem mesmo minha carona acreditava que eu pudesse aparecer. Então realmente ninguém sabia onde eu estava... E pouco se preocupavam com isso. 

- Pois bem, a escolha de ir por aquela estrada foi minha... Mas eu não estava tentando me matar, acredite. Estava indo para a casa de uma amiga.

- Então talvez ela a procure... Vai dar sua falta. Mas infelizmente não temos o que fazer. 

- Não... Ela não vai dar minha falta. Ela nunca acreditou que eu realmente iria chegar lá. – confessei rindo tristemente da minha situação. 

Com tantas pessoas sabendo onde eu estava, incrivelmente ninguém daria a minha falta. Minhas irmãs achavam que eu estaria na casa de Penélope. Esta, por sua vez, acharia que eu estava na minha casa e que havia desistido de ir.

- E sua família? – ele perguntou. 

- Cada um fazendo uma coisa diferente neste momento... E pode apostar que tudo é bem mais importante do que eu. – falei ironicamente e nem entendendo bem o porque estava conversando aquilo com aquele estranho.

Ele riu e continuou:

- Namorado, marido? Ele vai dar falta de você.

Balancei minha cabeça:

- Acho que exatamente por ninguém dar falta de mim é que não tenho um namorado. 

- O mundo não a quer... – ele brincou. – Sei bem como é isso. Uma típica revolta adolescente.

Encarei-o seriamente. Será que ele realmente sabia o que era aquilo? Não. Certamente aquele homem tinha qualquer mulher que quisesse aos seus pés. E... Eu não era adolescente.

- Quem é você? – perguntei.

- Um estranho... E de partida.

- Como assim?

- Estou partindo de Noriah... E espero nunca mais voltar.

- Nossa, que ódio é este do reino?

- Não é do reino... É das pessoas que fazem parte dele. E não me refiro à rainha, acredite.

Eu ri:

- Entendo... 

- Então você me confessou que ninguém está à sua procura? Posso fazer o que quiser com você que ninguém sentirá sua falta?

- Não... Eu não disse isso... No caso que você pode fazer o que quiser comigo. – expliquei preocupada. 

- Estou brincando.

- Eu... Sei. – falei sem estar muito certa do que eu dizia. 

Meus olhos encontraram os dele novamente. Meu coração acelerou. Que poder aquele desconhecido tinha sobre mim e meu corpo? Eu nunca senti aquilo antes. Medo misturado com desejo. Eu tremi ao perceber o olhar firme dele sobre mim. 

- Esta casa linda e perfeita é sua e você vai deixá-la? – tentei falar sobre outra coisa para aliviar a tensão.

- Sim.

- Onde exatamente estamos? – perguntei. 

- Zona B.

Eu levantei confusa:

- Zona B? Como eu vim parar aqui? Agora estou preocupada. Você me trouxe para muito longe.

- Calma, menina. Está tudo bem. Amanhã vai ser domingo... O dia vai amanhecer sem chuva e eu vou deixá-la exatamente onde eu a encontrei.

- No meio da rua? – perguntei sarcasticamente.

- Se você quiser, sim.

Eu sentei novamente.

- Está com fome? – ele perguntou.

- Sim... – confessei.

- Me acompanha até a cozinha? – ele me ofereceu a mão.

Eu aceitei, pegando a mão dele e seguindo até a cozinha ampla e planejada, sob medida. Paramos próximos da mesa e ele me fitou, não soltando a mão. Senti a pele quente dele junto da minha e meu corpo arrepiou-se involuntariamente. Senti pela primeira vez na minha vida um desejo intenso se apossar de mim, tendo vontade de tocar naquele homem e explorar cada parte do seu corpo. Pensei nele me tocando o corei. Nossos olhos se encontraram novamente e ele perguntou, ainda segurando a minha mão:

- Seria muito indiscreto perguntar a sua idade?

- Eu... Tenho 18. – menti.

 Por que menti? Eu não tinha certeza. Acho que não queria que ele pensasse que estava com uma garota de 17. Eu sabia que ele era mais velho e de alguma forma não queria que parecesse que tínhamos grande diferença de idade.

- E você? – perguntei.

- Eu tenho... Mais... Um pouco mais. – ele se limitou a dizer, misteriosamente.

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