A escuridão em volta era viva.As sombras sussurravam, deslizando e ondulando pelas paredes como serpentes etéreas. O espaço onde Yara se encontrava não era físico — era algo entre um sonho e um delírio, um cárcere construído com as fibras da noite e o sopro do medo.Ela estava deitada sobre uma superfície que não conseguia ver, mas sentia o peso das trevas sobre seu corpo. Frio. Suave. Quase um amante.Um som longínquo percorreu o ambiente. Passos.Lentos. Contidos. Calculados.A escuridão pareceu encolher em volta de Yara, como se tivesse medo do que se aproximava.Então, ele surgiu.Tupã.Os olhos dela se arregalaram, ao que um soluço escapou de seus lábios secos.— Tupã!Ele estava ali, em pé à sua frente, seu corpo forte e ágil como ela se lembrava. A pele morena reluzia sob a tênue luz azulada que emergia de lugar algum, e seus olhos — oh, seus olhos! — eram profundos como o oceano antes da tempestade.Ela quis se levantar, correr para ele, mas seu corpo não respondeu. O que era
A floresta tremia com uma presença sutil, mas inegável.Duncan se mantinha afastado da aldeia, seu olhar perdido na escuridão, sentindo um sussurro invisível. Os exorcistas da Irmandade da Aurora eram treinados para perceber distorções no fluxo natural das energias, e algo estava errado.O vento sibilava entre as árvores, assobiando melodias que soavam antigas demais para serem apenas obra do acaso. Pequenas folhas e poeira dançavam em espirais pelo ar. Duncan soube, antes mesmo de ver, que alguém se aproximava.Foi então que o redemoinho tomou forma.Uma risada travessa, um giro ágil no vento, e ali estava ele:Os olhos do garoto brilhavam como um par de estrelas infantis, o sorriso tão travesso quanto sempre fora – mas havia algo diferente nele agora. Ele não era apenas um menino fugindo dos horrores do mundo. Ele era algo além.Duncan estreitou os olhos.— Andou aprendendo novos truques, garoto?Saci Tumbleweed riu, sua voz se misturando ao vento que o trouxera.— Ou talvez sempre
Hei esboçou um sorriso surpreso, seus olhos encontrando um pitinho na boca do garoto.— Então… você se tornou um saci!Kaena piscou, o coração aliviando-se por vê-lo de pé e bem. — Mas como? Como...?Tumbleweed deu de ombros, puxando a carapuça sobre a cabeça, seus olhos brilhando travessos.— Digamos que a mata viu potencial em mim.Kaena se aproximou um passo, tocando o ombro do menino como se para se certificar de que era real. Mas algo na postura de Duncan e na espectral presença de Nagato a fez lembrar que aquele momento de surpresa e alívio não duraria muito.— Duncan. Nagato. O que está acontecendo? — a voz dela saiu grave, já preparando-se para o pior.Duncan lançou um olhar para a figura do xamã. Nagato, com seus olhos sempre enigmáticos, respirou fundo antes de falar.— A guerra se aproxima.Hei e Kaena trocaram olhares.Nagato continuou, sua voz ecoando como um trovão distante:— Donaldo... Seu exército marchará contra as tribos ao amanhecer. Uma de nossas agentes consegui
O vento rugia como um espírito inquieto, chicoteando as folhas das árvores retorcidas que moldavam a trilha estreita. A lua, tímida e semicoberta por nuvens, lançava sua pálida luz sobre a mata cerrada, onde Duncan Callahan avançava com passos calculados, o capuz baixo ocultando o brilho afiado em seu olhar.O batedor sombrio ainda estava lá, deslizando entre as sombras como um predador paciente. Caçando. Espreitando. Assombrando.Mas Duncan não corria apenas para confrontá-lo.Ele corria para confrontar uma dúvida que o assombrava.Nagato sempre lhe dissera que a escuridão não nasce do nada — ela precisa de uma semente. Um coração para enraizar. Uma alma para corromper.E segundo antigos manuscritos que Duncan estudara, Naaldlooyee nem sempre fora um mestre das sombras.Havia um tempo — um tempo perdido entre os véus da história e do mito — em que ele era um guerreiro de honra, um protetor de um reino distante, talvez até de outro plano de existência.E um dia, ele tombou.Ferido. Ce
A escuridão sussurrava.Seu toque frio, sedento, ansioso.A jovem não sabia há quanto tempo caía pelo abismo, nem tinha certeza de quando exatamente se flagrara ali, naquele altar de pedra e sombras.Yara olhou em volta.Ainda estava caindo?Não sabia dizer.Estava deitada sobre a pedra, tomada pela vertigem, seu corpo exposto às sencientes sombras que serpenteavam sobre sua pele como línguas vivas, deixando rastros de gelo e agonia. Seus grilhões, feitos da mais pura escuridão, pareciam mais do que simples prisões — correntes vivas, pulsantes, que sugavam sua força a cada segundo que passava.Ela tentou se mover, mas a dor a puxou de volta.Os símbolos esculpidos em sua carne ardiam, cada traço deixando um caminho de sangue fresco e magia profana.Era um ritual.E ela era... o sacrifício?As sombras a seu redor se contorciam, assumindo formas grotescas, espectros sem rostos que murmuravam em línguas esquecidas, suas vozes se entrelaçando num cântico sufocante.Yara fechou os olhos, t
As lâminas dançavam como relâmpagos na escuridão.Cada golpe preciso, cada desvio, uma fração de segundo entre a vida e a morte. Duncan girava, sua energia espiritual pulsando em cada músculo, conforme o batedor sombrio surgia e desaparecia a seu redor, deslizando entre as sombras como um sussurro da própria noite.O ar vibrava com um peso antinatural, como se algo invisível estivesse dobrando a realidade em volta.E então aconteceu.O mundo rasgou-se em dois.Uma onda de rodopiantes sombras engoliu Duncan como uma tempestade sem som. Ele sentiu o chão sumir sob seus pés. Seu corpo foi puxado para trás, como se caísse através de uma fenda oculta no próprio tecido da existência.Por um instante, tudo se tornou um vácuo sem luz, sem forma, sem tempo.Então…Ele tocou o solo novamente.Mas não era mais o mesmo solo.Duncan piscou, seus olhos se ajustando ao novo mundo.Era um reflexo distorcido do mundo real.O céu… não existia.O que havia acima era um opressor vazio, um manto negro sal
Dor e escuridão e prazer...Será que, no íntimo, uma parte dela desejou aquilo?Ela estremeceu, soltando um gemido seco, enquanto sombras acariciavam suavemente seus volumosos seios.Yara levou as mãos ao rosto, pressionando-as contra a boca para conter um soluço que insistia em irromper.O Lorde Sombrio... dentro dela, uma presença que agora se revelava... inegável.Aquela escuridão, aquela assombração de sombras, aquela sensação...O simples pensamento de engravidar, de gerar um filho das trevas, fazia seu estômago revirar.Ali, de olhos fechados, a cabeça latejante e tomada por uma vertigem, ela sentia mais uma vez a presença do mestre sombrio sobre ela, dentro dela, cavalgando-a repetidamente, sem cessar.O coração da jovem galopava loucamente — conforme ela lutava para se desvencilhar da mistura de prazer e dor, conforme procurava conter-se, evitando esguichar mais uma vez, conforme a escuridão se infiltrava nela com inexorável força.A noite se avultava como um abismal véu sobre
A névoa pairava densa sobre o vale, absorvendo os sons da noite e tornando a escuridão ainda mais profunda. O fogo da lamparina tremulava fracamente, projetando sombras dançantes sobre as pedras desgastadas do templo em ruínas.Duncan estava só.O peso dos últimos acontecimentos pressionava seus ombros, e sua mente, mesmo treinada para o silêncio e a contenção, o traía, arrastando-o de volta a lembranças que ele tentava manter enterradas.Ele fechou os olhos, e o passado o engoliu como um redemoinho inevitável.Era jovem quando tudo começou.Um órfão sem nome.Um menino perdido entre as frestas do mundo, alimentado pela fúria do abandono e pela necessidade de sobreviver.Foi Nagato quem o encontrou.— Duncan. Esse será o seu nome.O agente mais velho o ergueu pelos ombros finos, e pela primeira vez, alguém o viu.Viu o que ele poderia ser.A Sociedade do Crepúsculo o acolheu.Mas acolhimento, naquele mundo, não significava ternura.Significava disciplina.Significava sangue e suor.Si