O vento rugia como um espírito inquieto, chicoteando as folhas das árvores retorcidas que moldavam a trilha estreita. A lua, tímida e semicoberta por nuvens, lançava sua pálida luz sobre a mata cerrada, onde Duncan Callahan avançava com passos calculados, o capuz baixo ocultando o brilho afiado em seu olhar.O batedor sombrio ainda estava lá, deslizando entre as sombras como um predador paciente. Caçando. Espreitando. Assombrando.Mas Duncan não corria apenas para confrontá-lo.Ele corria para confrontar uma dúvida que o assombrava.Nagato sempre lhe dissera que a escuridão não nasce do nada — ela precisa de uma semente. Um coração para enraizar. Uma alma para corromper.E segundo antigos manuscritos que Duncan estudara, Naaldlooyee nem sempre fora um mestre das sombras.Havia um tempo — um tempo perdido entre os véus da história e do mito — em que ele era um guerreiro de honra, um protetor de um reino distante, talvez até de outro plano de existência.E um dia, ele tombou.Ferido. Ce
A escuridão sussurrava.Seu toque frio, sedento, ansioso.A jovem não sabia há quanto tempo caía pelo abismo, nem tinha certeza de quando exatamente se flagrara ali, naquele altar de pedra e sombras.Yara olhou em volta.Ainda estava caindo?Não sabia dizer.Estava deitada sobre a pedra, tomada pela vertigem, seu corpo exposto às sencientes sombras que serpenteavam sobre sua pele como línguas vivas, deixando rastros de gelo e agonia. Seus grilhões, feitos da mais pura escuridão, pareciam mais do que simples prisões — correntes vivas, pulsantes, que sugavam sua força a cada segundo que passava.Ela tentou se mover, mas a dor a puxou de volta.Os símbolos esculpidos em sua carne ardiam, cada traço deixando um caminho de sangue fresco e magia profana.Era um ritual.E ela era... o sacrifício?As sombras a seu redor se contorciam, assumindo formas grotescas, espectros sem rostos que murmuravam em línguas esquecidas, suas vozes se entrelaçando num cântico sufocante.Yara fechou os olhos, t
As lâminas dançavam como relâmpagos na escuridão.Cada golpe preciso, cada desvio, uma fração de segundo entre a vida e a morte. Duncan girava, sua energia espiritual pulsando em cada músculo, conforme o batedor sombrio surgia e desaparecia a seu redor, deslizando entre as sombras como um sussurro da própria noite.O ar vibrava com um peso antinatural, como se algo invisível estivesse dobrando a realidade em volta.E então aconteceu.O mundo rasgou-se em dois.Uma onda de rodopiantes sombras engoliu Duncan como uma tempestade sem som. Ele sentiu o chão sumir sob seus pés. Seu corpo foi puxado para trás, como se caísse através de uma fenda oculta no próprio tecido da existência.Por um instante, tudo se tornou um vácuo sem luz, sem forma, sem tempo.Então…Ele tocou o solo novamente.Mas não era mais o mesmo solo.Duncan piscou, seus olhos se ajustando ao novo mundo.Era um reflexo distorcido do mundo real.O céu… não existia.O que havia acima era um opressor vazio, um manto negro sal
Dor e escuridão e prazer...Será que, no íntimo, uma parte dela desejou aquilo?Ela estremeceu, soltando um gemido seco, enquanto sombras acariciavam suavemente seus volumosos seios.Yara levou as mãos ao rosto, pressionando-as contra a boca para conter um soluço que insistia em irromper.O Lorde Sombrio... dentro dela, uma presença que agora se revelava... inegável.Aquela escuridão, aquela assombração de sombras, aquela sensação...O simples pensamento de engravidar, de gerar um filho das trevas, fazia seu estômago revirar.Ali, de olhos fechados, a cabeça latejante e tomada por uma vertigem, ela sentia mais uma vez a presença do mestre sombrio sobre ela, dentro dela, cavalgando-a repetidamente, sem cessar.O coração da jovem galopava loucamente — conforme ela lutava para se desvencilhar da mistura de prazer e dor, conforme procurava conter-se, evitando esguichar mais uma vez, conforme a escuridão se infiltrava nela com inexorável força.A noite se avultava como um abismal véu sobre
A névoa pairava densa sobre o vale, absorvendo os sons da noite e tornando a escuridão ainda mais profunda. O fogo da lamparina tremulava fracamente, projetando sombras dançantes sobre as pedras desgastadas do templo em ruínas.Duncan estava só.O peso dos últimos acontecimentos pressionava seus ombros, e sua mente, mesmo treinada para o silêncio e a contenção, o traía, arrastando-o de volta a lembranças que ele tentava manter enterradas.Ele fechou os olhos, e o passado o engoliu como um redemoinho inevitável.Era jovem quando tudo começou.Um órfão sem nome.Um menino perdido entre as frestas do mundo, alimentado pela fúria do abandono e pela necessidade de sobreviver.Foi Nagato quem o encontrou.— Duncan. Esse será o seu nome.O agente mais velho o ergueu pelos ombros finos, e pela primeira vez, alguém o viu.Viu o que ele poderia ser.A Sociedade do Crepúsculo o acolheu.Mas acolhimento, naquele mundo, não significava ternura.Significava disciplina.Significava sangue e suor.Si
As luzes dos lampiões prateavam o acampamento no meio das antigas ruínas, sombras se contorcendo entre as pedras negras.O vento levava um aroma de terra molhada. E um sussurro, distante, como se os próprios espíritos locais se enfadassem.Numa das tendas finamente decoradas, um casal descansava após uma veemente dança entre lençóis de seda.— Você está mesmo decidido a seguir com isso? — murmurou a mulher, a voz embalada num sedutor timbre, mas cheia de suspeita.Seu corpo, coberto apenas por uma fina manta de linho, refletia o suave brilho da lamparina ao lado do leito. Os cabelos escuros emaranhavam-se sobre os travesseiros, e seus olhos, amendoados e afiados como lâminas, fitavam o homem a seu lado.Ele se encontrava reclinado, as costas nuas marcadas por cicatrizes de tempos antigos, os dedos girando um medalhão dourado entre eles, um gesto habitual sempre que absorto em pensamentos.— Estou, minha bela — respondeu ele, com um sorriso torto, os olhos claros reluzindo com a mesma
Poder e riquezas e mulheres...Donaldo saboreava a ressaca da madrugada, os músculos relaxados sob as cobertas macias de sua luxuosa tenda. O calor morno das concubinas que ainda dormiam ao seu lado trazia-lhe uma sensação de poder absoluto. Ele era o rei daquele território, o senhor das riquezas, o comandante da desgraça alheia.E, por todos os demônios do inferno, ele merecia isso.Ou, ao menos, pensava que merecia, até um rugido gutural de um de seus soldados romper o silêncio do acampamento.— MEU CANTIL TÁ CHEIO DE URINA! QUEM FOI O DESGRAÇADO?!Donaldo franziu a testa.— Mas que diabos?O segundo grito veio de um canto diferente do acampamento:— PELO AMOR DOS ESPÍRITOS, TEM BOSTA NA MINHA BOTA!Foi então que os alarmes começaram a soar.A confusão explodiu no acampamento como pólvora acesa.Donaldo levantou-se num salto, puxando a calça com raiva conforme saía da tenda como um trovão em carne e osso.E o que viu?Caos.Puro, brilhante, espetacular caos.Os cavalos estavam solto
Tupã mergulhou nas sombras, seu corpo desmaterializando-se em fiapos de escuridão, cada salto uma facada de frio e vertigem, como se o mundo se dobrasse e desdobrasse a seu redor. Ele surgiu em clareiras iluminadas pela lua, em florestas onde o ar pesava com o cheiro de terra molhada, e em esquecidas ruínas, até que seus pés encontraram uma estreita trilha. Esta serpenteava por uma rochosa colina.As pedras afiadas cortavam o céu.Como dentes de um antigo predador.Abaixo, o Vale Negro se estendia, uma mancha de escuridão tão densa que quase engolia a luz da lua. Tupã hesitou por um momento, sentindo o peso daquela escuridão.Como um presságio.Ele parou à beira do precipício, seus pés sobre a rocha fria e irregular. Seus olhos, como brasas sob a penumbra, fixaram-se no horizonte sombrio que se estendia à frente.O vale abaixo era... uma abissal cicatriz na terra — um deserto morto.Onde nem mesmo o vento ousava soprar.A paisagem aparentava ter sido esvaziada de vida, como se o própri